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Análise da superfície e osseointegração de implantes dentários com superfícies biomiméticas contedo Ca, Mg e F

Surface analyze and osseointegration of dental implant with biomimetic surface with Ca, Mg and F

Resumos

Os tratamentos das superfícies dos implantes dentários osseointegráveis sofreram modificações significativas com o objetivo de melhorar a estabilidade primária e secundária. Entre as modificações destaca-se a deposição de íons, como flúor, cálcio e magnésio. Estes íons possuem baixa taxa de degradação no meio corpóreo e ótima interação biológica com as células e com os tecidos ósseos. No presente trabalho, para avaliar os efeitos do F, Ca e do Mg na osseointegração foram realizados ensaios in vitro e in vivo. Implantes foram inseridos em tíbias de coelhos e determinou-se os torques de inserção e remoção após 2, 4 e 8 semanas. Os ensaios in vivo foram complementados pela medida da rugosidade, molhabilidade e análise da superfície em microscopia eletrônica de varredura. Os resultados foram comparados com os obtidos com implantes com a superfície tratada com ácido (superfície Porous) e com deposição de flúor (superfície Porous Nano). Os resultados obtidos mostraram que o torque para remover os implantes Porous 8 semanas após a cirurgia foi de 16,96 + 1,32 N.cm, o tratado com flúor apresentou melhores resultados (17,93 ± 4,47 N.cm) e a superfície com Ca e Mg foi a que apresentou a interface osso-implante com menor resistência (10,83 + 1,20 N.cm). O maior torque indica que a adição de flúor facilita os mecanismos envolvidos na osseointegração dos implantes e permite o carregamento da prótese em tempos menores.

implante; superfície biomimética; superfície com Ca, Mg e F


Surfaces treatments improve the primary and secondary stability of dental implants. Among surfaces modifications the deposition of ions, such as fluorine, calcium and magnesium has been studied. These ions have low degradation rate in the body environment and great biological interaction with the cells and bone tissue. In the present work, in vitro and in vivo test evaluated the effects of F, Ca and Mg in osseointegration. Implants were inserted into the tibia of rabbits, insertion and removal torque was measured after 2, 4 and 8 weeks. In vivo testing was complemented by measuring the roughness, wettability and surface analysis in scanning electron microscopy. The results were compared with those obtained with implants with the acid treated surface (Porous surface) and fluoride deposition (Porous Nano surface). The results showed that the group treated with fluoride showed better results on the removal torque (17.93 ± 4.47 N.cm) and the surface with Ca and Mg (10,83 + 1,20 N.cm) ) showed the lowest bone-interface implant resistance. The higher torque indicates that the addition of fluoride facilitates the mechanisms involved in the dental implant osseointegration and allows the loading of the prosthesis in early time.

implant; biomimetic surface; Ca, Mg, fluoride surface


1. INTRODUÇÃO

O titânio comercialmente puro (Ti cp) possui propriedades que permitem sua aplicação como biomaterial, destacando: a) formação espontânea de uma camada de dióxido de Ti altamente biocompatível que favorece a adesão de células osteoblásticas [1[1] BRUNETTE, D.M., TEXTOR, M., TENGVALL, P., et al. Titanium in Medicine: Material Science, Surface Science, Engineering, Biological Reponses and Medical applications. Springer Edited. Berlin-Heidelberg: 2001.]; b) alta resistência à corrosão em ambientes corpóreos [1[1] BRUNETTE, D.M., TEXTOR, M., TENGVALL, P., et al. Titanium in Medicine: Material Science, Surface Science, Engineering, Biological Reponses and Medical applications. Springer Edited. Berlin-Heidelberg: 2001.]; c) capacidade de atuar nas reações de redox na interface tecidual influenciando no comportamento dos tecidos [1[1] BRUNETTE, D.M., TEXTOR, M., TENGVALL, P., et al. Titanium in Medicine: Material Science, Surface Science, Engineering, Biological Reponses and Medical applications. Springer Edited. Berlin-Heidelberg: 2001.]; e d) adequada resistência mecânica para a fabricação de produtos médicos-odontológicos [2[2] ELIAS, C.N., "Titanium dental implant surfaces", Matéria (Rio J.), v.15, n.2, p.138-142, 2010.,3[3] RYU, J.J., PARK, K., KIM, H.S., et al., "Effects of Anodized Titanium with RGD Peptide Immobilized Via Chemical Grafting or Physical Adsorption on Bone Cell Adhesion and Differentiation", JOMI, v. 28, n. 4, pp. 963-72, 2013.].

A estabilidade primária dos implantes dentários de titânio cp é fundamental para o sucesso do tratamento, pois favorece a realização de eventos necessários para a reparação óssea, tais como: adsorção de proteínas, liberação de fatores de crescimento, vasoconstricção, interação dos fatores de coagulação, produção de fibrilas e todas as etapas de neoformação óssea [4[4] ALBERTS, B., JOHNSON, A., LEWIS, J., et al. Molecular Biology of the Cell., 5th ed. New York, Garland Science, 2008. ].ELIAS et al [2[2] ELIAS, C.N., "Titanium dental implant surfaces", Matéria (Rio J.), v.15, n.2, p.138-142, 2010.] analisaram as propriedades necessárias que o Ti cp deve apresentar para o uso em implantes dentários, destacando a importância da rugosidade e da molhabilidade na osseointegração. Além da rugosidade [5[5] ELIAS, C.N., MEIRELLES, L., "Improving osseointegration of dental implants", Expert review of medical devices, v. 7, n. 2, pp. 241-256, 2010.] há necessidade da superfície do implante apresentar características morfológicas em escala micro e nanométrica, as quais melhoram a osseointegração [6[6] SALOU, L., HOORNAERT, A., LOUARN, G., et al., "Enhanced osseointegration of titanium implants with nanostructured surfaces: An experimental study in rabbits", Acta Biomaterialia, v. 11, pp. 494-502, 2015.].

Alguns estudos mostraram que o revestimento do Ti com adição de íons como cálcio [7[7] COELHO, P.G., TAKAYAM, T., YOO, D., JIMBO, R., et al., "Nanometer-scale features on micrometer-scale surface texturing: A bone histological, gene expression, and nanomechanical study", Bone, v.65, pp. 25-32, 2014.] e flúor [8[8] HE, F.M., TANG, G.L., ZHAO, S.F., et al., "Mechanical and Histomorphometric Evaluations of Rough Titanium Implants Treated with Hydrofluoric Acid/Nitric Acid Solution in Rabbit Tibia", JOMI, v. 26, n. 1, pp. 115-122, 2011. ] na superfície dos implantes aumenta a resistência da interface osso-implante após a cicatrização, melhora a resistência à corrosão e altera os mecanismos envolvidos na osseointegração [9[9] DASMAH, A., KASHANI, H., THOR, A., et al., "Integration of fluoridated implants in onlay autogenous bone grafts - An experimental study in the rabbit tibia", J. Cranio-Maxillo-Facial Surgery, v. 42, pp. 796-800, 2014.].

Existe uma lacuna na literatura sobre a influência da nanoestrutura, bem como os mecanismos envolvidos na osseointegração dos implantes com estas características. São necessários estudos para determinar a melhor combinação das características da superfície em escala macro, micro e nanométrica. Diante do exposto, novos trabalhos devem ser realizados para determinar a influencia dos diferentes parâmetros para melhor elucidar tais questionamentos.

O presente estudo compara as características físico-químicas e a osseointegração de implantes dentários com diferentes tratamentos de superfície (tratado com ácido, com deposição de flúor e contendo Ca e Mg). Foram realizados ensaios para caracterizar a morfologia da superfície, medir a rugosidade, molhabilidade, torque de inserção e remoção dos implantes em tíbias de coelhos.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

Foram utilizados discos e implantes de Ti cp ASTM G4. Inicialmente, as amostras receberam tratamento da superfície mediante a imersão em misturas de ácidos. A seguir, foram desenvolvidos novos tratamentos de superfície do Ti G4 para obter características nanométricas. Os desempenhos dos novos tratamentos de superfície foram comparados com o tratamento com ácido. Foram realizados ensaios in vitro (medida da rugosidade e molhabilidade) e in vivo mediante a instalação cirúrgica e remoção de tíbias de coelhos.

2.1 Tratamento da superfície das amostras

O tratamento da superfície consistiu na imersão em solução contendo ácido nítrico, clorídrico e sulfúrico, mantendo a solução em agitação para garantir que o oxigênio liberado na reação com o titânio não formasse uma película protetora. O tratamento dos implantes odontológicos com ácido foi o mesmo adotado pela empresa Conexão Sistemas e Prótese (Arujá, SP), o qual possui designação comercial superfície Porous.

Após os tratamentos com ácido, foram realizados os tratamentos eletroquímicos das superfícies dos implantes e discos mediante a eletrodeposição de íons de Ca e Mg ou F em escala nanométrica.

As amostras foram divididas em três Grupos, a saber:

Grupo I: tratamento com ácido (Porous)

Grupo II : Porous + tratamento com fluoretos (Porous Nano)

Grupo III : Porous + tratamento com Ca e Mg (Porous CaMg)

2.2 Medida da rugosidade e molhabilidade

Foram medidos os parâmetros da rugosidade da superfície com emprego do rugosímetro de contato (Mitutoyo SJ 201P). Foram usados 10 discos de cada grupo com tratamento de superfície semelhante aos dos implantes usados nos ensaios in vivo. Os parâmetros medidos foram a rugosidade média (Ra) e a média quadrática (Rq).

A molhabilidade foi determinada através do ângulo de contato da água com a superfície dos discos. Foi utilizada uma gota com 8 µL de água deionizada. Foi utilizado o goniômetro FTA 100 (First Ten Angstroms, Portsmouth, VG, EUA). Em cada grupo foram realizadas 5 medidas dos ângulos de contato.

2.3 Ensaios "in vivo"

Para os ensaios in vivo foram usados implantes com 2 mm de diâmetro, 5 mm de comprimento e 1,0 mm de perfil transmucoso, o quais foram inseridos na tíbia de coelhos.

Os procedimentos cirúrgicos foram realizados em 18 coelhos, da espécie Nova Zelândia (Oryctolaguscuniculus), com peso entre 2900 e 3400gf, todos com 6 meses de idade.

Cada coelho recebeu 3 implantes na tíbia do lado direito e 3 do lado esquerdo. O mesmo coelho recebeu dois implantes de cada tratamento de superfície. Determinou-se os torques de inserção e de remoção para avaliação da influencia do tratamento da superfície na osseointegração. Os períodos de análise foram 2, 4 e 8 semanas após a instalação.

2.4 Procedimentos cirúrgicos

Todas as cirurgias foram realizadas sob anestesia geral utilizando cetamina 50mg/kgf (DOPALEN(r)), administrado intramuscularmente (IM).

O Isoflurano a 1,5% foi inalado no transcorrer do procedimento para auxiliar na anestesia. Como medicação pré-anestésica para reduzir a secreção do trato respiratório e para bloquear o reflexo inibitório vagal no coração foi aplicado o Sulfato de Stropina 0,1 mg/kgf.

Foi administrada Xilazina 5 mg/kgf (ANASEDAN(r)), IM, com finalidade sedativa, relaxante muscular e principalmente analgésica. O fármaco Meloxican foi utilizado durante o procedimento para alívio da dor e para o controle inflamatório na dosagem de 0,1mg/kgf, por via subcutânea (SC). Para analgesia transoperatória foi empregado o Citrato de Fentanila à 0,005 mg/kg, IV.

Após a tricotomia da tíbia dos coelhos (Figura 1 A) foi realizada a anti-sepsia da região com solução de povidona e álcool 70% (Figura 1 B). As incisões lineares de 5 cm, nas porções internas dos membros inferiores dos animais (lados direito e esquerdo), foram realizadas com cabo de bisturi nº 3 (Schwert, Tuttlingen) e com lâmina 15 C (Swann Morton-Sheffield). Os tecidos foram afastados, com o auxílio de uma cureta Molt n° 4 (Medesy, Maniago - Itália) e de uma pinça Dietrich (Medesy, Maniago - Itália), expondo o osso tibial (Figura 1 C). Foram preparados os leitos ósseos corticais nas tíbias dos coelhos (Figura 1 D) por intermédio de sequência de brocas do kit de implantes de pesquisa da empresa Conexão Sistema e Próteses.

Figura 1:
A) Face interna da pata do coelho após tricotomia; B) Antisepsia realizada na tíbia do coelho; C) Exposição da tíbia como o auxílio da cureta Molt n° 4; D) Implantes instalados na tíbia do coelho; E) Preparos realizados com a sequência de brocas para a inserção dos implantes.

Os preparos dos leitos de inserção dos implantes foram realizados por intermédio de um contra-ângulo 20:1, motor cirúrgico à 600 rpm com irrigação abundante com soro fisiológico à 0,9%.

Posteriormente, foram realizadas as instalações dos implantes com os diferentes tratamentos de superfície. Mostra-se na Fig 1 D as posições dos implantes: o controle (proximal), o com flúor (medial) e o grupo que recebeu Ca e Mg (distal). As cirurgias foram feitas pelo mesmo cirurgião.

Após a cirurgia, os animais receberam para analgesia, Meloxican gotas durante 5 dias de 24/24h, por via SC (sub-cutânea), porém não foram administrados antibióticos.

2.5 Medidas dos torques de inserção e remoção

A justificativa para o uso do torque de inserção e de remoção dos implantes deve-se ao fato que, entende-se como biocompatibilidade a capacidade de um biomaterial desempenhar com resposta tecidual apropriada uma aplicação específica. Portanto, o conceito de biocompatibilidade envolve a compatibilidade biológica e a função. No caso dos implantes dentários a compatibilidade deve ser avaliada pela osseointegração do implante, a qual pode ser quantificada pela resistência a pancada medida com perioteste, área de contato implante-osso medida por frequência de ressonância ou pelo torque de remoção nos ensaios com cobaias. No presente trabalho a biocompatibilidade foi quantificada pelo torque de remoção. Foram comparados os torques máximos (picos) tanto na inserção quanto na remoção dos implantes após 2, 4 e 8 semanas. Foram usados 9 implantes de cada grupo. Os torques foram quantificados com o torquímetro digital Lutron (modelo TQ 8800, Taiwan).

2.6 Análise da superfície

Antes e após os ensaios in vivo, as amostras dos diferentes grupos foram analisadas no microscópio eletrônico FEI Quanta FEG250. O objetivo da análise antes dos ensaios in vivo foi avaliar a morfologia da superfície dos implantes após os diferentes tratamentos. Após as remoções dos implantes das cobaias, o objetivo foi avaliar a possível presença de células ósseas na superfície dos implantes. Para as análises os implantes não receberam nenhum tipo de recobrimento prévio.

Após a remoção das tíbias, os blocos ósseos contendo os implantes foram mantidos em hipoclorito de sódio à 10% por 24 horas, e após armazenado em álcool 70% até o momento da análise. Após limpeza, as amostras foram imersas durante 15 minutos em diferentes concentrações de álcool (30, 50, 75, 80 e 95%) para a desidratação. A última etapa foi a imersão em álcool anidro para análise (PA) durante 30 minutos.

3. RESULTADOS

Mostra-se na Figura 2 a morfologia da superfície dos implantes após os diferentes tratamentos. Pode-se observar que as três superfícies apresentam característica homogêneas. As microcavidades foram formadas durante a imersão das amostras em solução ácida. Estas superfícies possuem rugosidade com relação do tamanho pico/vale mais adequada para a osseointegração que a dos implantes usinados ou submetidos apenas a imersão em solução contendo apenas um ácido. Estes tratamentos proporcionam uma melhor condição para a proliferação celular. Além disso, há um aumento da área superficial e melhor bioadesão celular em relação à superfície usinada ou somente jateada. [3[3] RYU, J.J., PARK, K., KIM, H.S., et al., "Effects of Anodized Titanium with RGD Peptide Immobilized Via Chemical Grafting or Physical Adsorption on Bone Cell Adhesion and Differentiation", JOMI, v. 28, n. 4, pp. 963-72, 2013.].

Figura 2:
Morfologias das superfícies dos implantes. (A) Porous; (B) com tratamento com flúor (PorousNano) e (C) com tratamento com cálcio e magnésio (Porous CaMg).

Os resultados das análises das médias de rugosidade Ra e Rq dos grupos são mostrados na Tabela 1. Pode-se observar que as amostras controle (Porous) apresentaram Ra de 1,60 µm e Rq de 1,97 µm. Os discos tratados com flúor (Porous Nano) apresentaram Ra de 1,58 µm e Rq de 1,91 µm e o grupo tratado com magnésio e cálcio (Porous CaMg) Ra e Rq de 1,57 µm e 1,92 µm, respectivamente. A análise estatística indicou que não há diferença significativa entre os grupos.

Tabela 1:
Parâmetros da rugosidade de superfície (µm) dos implantes.

As medidas dos ângulos de contato mostraram que o tratamento Porous apresenta ângulo de contato de 118,69º ± 13,07 º, o tratamento com adição de flúor de 113,97º ± 13,20º. A superfície contendo CaMg apresentou melhores propriedades hidrófilas (78,06º ± 9,99). Na Figura 3 são mostrados exemplos da molhabilidade das superfícies analisadas.

Figura 3:
Molhabilidade da superfície dos implantes. Da esquerda para a direita: (A) Porous com ângulo de contato de 110,35 graus; (B) Porous Nano com ângulo de contato de 100,72 graus e (C) Porous CaMg com ângulo de contato de 76,02 graus.

Os torques (Ncm) de inserção e remoção de 2, 4 e 8 semanas após as cirurgias dos três grupos são apresentados na Tabela 2. O torque de inserção dos implantes do grupo controle (Porous) removido 2 semanas após a cirurgia foi de 10,26 ± 0,30 Ncm, o removido após 4 semanas foi de 10,33 ± 0,20 Ncm e 10,06 ± 0,05 Ncm após 8 semanas. Independendo do tempo de remoção após a cirurgia, o torque médio foi de 10,24 Ncm. O torque de remoção do implante Porous foi de 6,45 ± 1,86 Ncm, 15,63 ± 1,58 Ncm e 16,96 ± 1,32 Ncm para 2, 4 e 8 semanas, respectivamente.

O torque médio de inserção dos implantes com adição de flúor (Porous Nano) foi 10,40 ± 0,51 Ncm para o grupo removido após 2 semanas, 10,23 ± 0,11 Ncm em 4 semanas e 10,10 ± 0,17 Ncm em 8 semanas. O torque de remoção foi de 12,33 ± 0,32 Ncm após 2 semanas, 15,83 ± 3,07 Ncm após 4 semanas e 17,93 ± 4,47 Ncm após 8 semanas. O torque médio de inserção dos implantes com adição de CaMg removidos após 2, 4 e 6 semanas foram de 10,43 ± 0,60 Ncm, 10,56 ± 1,87 Ncm e 9,20 ± 1,21 Ncm, respectivamente. O torque de remoção deste grupo foi de 5,43 ± 0,32 Ncm após 2 semanas, 5,73 ± 0,15 Ncm após 4 semanas e 10,83 ± 1,20 Ncm após 8 semanas. Apesar da queda da resistência da interface osso/implante nas primeiras semanas, pode-se observar que ocorreu um aumento entre a quarta e a oitava semana.

Tabela 2:
Torque (Ncm) de inserção (Ins) e de remoção (Rem) dos implantes diferentes tempos após as cirurgias.

Pode-se observar na tabela 2 que na segunda semana após a inserção do implante Porous há queda significativa do torque de remoção. Após a quarta semana há aumento do torque de remoção. Após a oitava semana o aumento do torque de remoção é semelhante ao observado após a quarta semana.

Quanto aos implantes com superfície Porous Nano, a interface implante-osso aumenta em relação ao torque de instalação desde a segunda semana. O maior aumento foi observado após a oitava semana. Quanto ao implante com superfície Porous CaMg, a perda da estabilidade primária não é compensada pela estabilidade secundária até a oitava semana após a cirurgia.

Para analisar a variação do torque de remoção em função do tempo, no presente trabalho é proposto o Indice da Osseointegração (IO) calculado pela equação abaixo:

IO = ( Ti - T0) / T0

Onde Ti é o torque de remoção no tempo i (i = 2, 4 e 6 semanas) e T0 é o torque de inserção do implante.

Mostra-se na Fig 4 a diferença entre os torques de remoção e de inserção para todos os implantes testados, considerando-se a equação acima proposta. Pode-se observar que na segunda semana após a cirurgia, o torque para remover os implantes Porous e CaMg foram menores que os torques de inserção (IO negativo). Isto indica que ocorreu perda significativa da estabilidade primária. Na quarta semana após a cirurgia o torque de remoção do implante Porous foi superior ao torque de inserção e o torque de remoção do implante CaMg foi inferior ao torque de inserção.

Figura 4:
Variação ( % ) entre o torque de remoção e inserção após 2, 4 e 8 semanas após a cirurgia. Os valores negativos significa que o torque de remoção é menor do que o de inserção.

Pode-se observar na Tabela 2 e Figura 4 que após 8 semanas há aumento do torque de inserção em relação ao torque de remoção de 67,98%, 78,14% e 17,75% para os grupos Porous, Porous Nano e Porous CaMg, respectivamente.

No caso dos implantes Porous Nano, a partir da segunda semana após as cirurgias os torques de remoção foram superiores aos torques de inserção. Este resultado mostra, que após a inserção apesar da perda da estabilidade primária, o início da remodelação óssea nos sítios com implantes Porous Nano compensa a reabsorção óssea. Para os implantes Porous nano a estabilidade secundária inicia em tempos menores.

4. DISCUSSÃO

No presente trabalhou analisou-se a influencia do tratamento da superfície dos implantes na rugosidade, molhabilidade e biocompatibilidade quantificada pelo torque de remoção. Foram utilizados implantes e discos, os quais receberam tratamento ácido seguido ou não pela eletrodeposição de íons de F, Ca e Mg. Fez-se a opção de iniciar os tratamentos de eletrodeposição após o ataque com ácido, uma vez que existem comprovações científicas mostrando que este tratamento é eficiente para a osseointegração dos implantes [2[2] ELIAS, C.N., "Titanium dental implant surfaces", Matéria (Rio J.), v.15, n.2, p.138-142, 2010.].

Mediante o tratamento da superfície dos implantes com ácido foi possível controlar a rugosidade, o número, o tamanho e a distribuição das porosidades em escala micro e nanométrica.

A rugosidade obtida, com os tratamentos deste estudo, foi de 1,5 à 1,6 µm, a qual é considerada na literatura como microrugosidade moderada [10[10] SANTOS, M.V., ELIAS, C.N., LIMA, J.H.C., "The effects of superficial roughness and design on the primary stability of dental implants", Clinical Implant Dentistry and Related Research., v.13, n.3, pp.215-223, 2011.].

No presente trabalho, procurou-se reduzir os números de variáveis que poderiam influenciar na osseointegração. Dois grupos receberam adição de flúor ou de CaMg em escala nanométrica para não alterar a rugosidade. Considerando que não foi observada diferença estatística significativa na rugosidade dos implantes entre os grupos e, houve diferença no torque de remoção, é possível afirmar que a rugosidade não influenciou na diferença do torque de remoção entre os grupos.

Analisando-se a Figura 4 pode-se observar que os torques de remoção dos implantes Porous Nano, a partir da segunda semana após as cirurgias, foram superiores aos torques de inserção. Este resultado mostra, que após a inserção apesar da perda da estabilidade primária, o início da remodelação óssea nos sítios com implantes Porous Nano compensa a reabsorção óssea, ou seja a estabilidade secundária inicia em tempos menores

Pode-se observar na Tabela 2 que após a segunda semana ocorreu perda significativa da estabilidade primária dos implantes Porous e dos CaMg. Na quarta semana após a cirurgia o torque de remoção do implante Porous foi superior ao torque de inserção e o torque de remoção do implante CaMg foi inferior ao torque de inserção. Este resultado indica que a cicatrização do sítio com o implante Porous é significativamente mais rápida que a do implante CaMg. Este resultado mostra que o período mais crítico para carregamento do implante com superfície Porous ocorre até a segunda semana após a cirurgia. Em hipótese alguma deve-se colocar em função os implantes Porous antes de 2 semanas quando inseridos em osso de baixa densidade e semelhante ao da tíbia de coelho.

Para os implantes com superfície Porous Nano (ataque ácido seguido de deposição de flúor) a perda da estabilidade primária até a segunda semana foi compensada pelo início da estabilidade secundária (osseointegração), a estabilidade total aumentou. Portanto, é viável o carregamento imediato dos implantes com a superfície Porous Nano quando instalados em osso com características semelhantes ao da tíbia de coelho e com estabilidade primária adequada.

Os resultados mostrados na Tabela 2 e Figura 4 indicam que, apesar dos mecanismos que envolvem a interação das células com a superfície do implante não serem totalmente explicados, existem evidências que as características nanométricas influenciam na energia de superfície e, portanto, na interação superfície/proteínas. Este resultado corrobora o disponível na literatura [11[11] ABRAHAMSSON, I., LINDER, E., LARSSON, L., et al., "Deposition of nanometer scaled calcium-phosphate crystals to implants with a dual acid-etched surface does not improve early tissue integration", Clin Oral Implants Res., v. 24, n. 1, pp. 57-62, 2013.]. A adição de flúor com o objetivo de alterar as características da superfície em escala nanométrica aumenta a resistência da interface osso/implante nas primeiras duas semanas após a cirurgia. Este aumento é significativo em relação aos demais tratamentos. Apesar da deposição de flúor na superfície ter sido em escala nanométrica, ela foi capaz de aumentar o torque de remoção em relação ao torque de inserção, confirmando os dados obtidos por HE et al [8[8] HE, F.M., TANG, G.L., ZHAO, S.F., et al., "Mechanical and Histomorphometric Evaluations of Rough Titanium Implants Treated with Hydrofluoric Acid/Nitric Acid Solution in Rabbit Tibia", JOMI, v. 26, n. 1, pp. 115-122, 2011. ].

Apesar da superfície que recebeu deposição de Ca e Mg apresentar característica mais hidrofílicas em relação aos demais grupos e rugosidade moderada (similar ao grupo Porous), não foi possível observar aumento da resistência da interface osso-implante nos 3 períodos observados. Possivelmente, a quantidade de Ca e Mg utilizada no presente trabalho não foi adequada.

5. CONCLUSÕES

Com base nos resultados obtidos no presente trabalho pode-se concluir que:

  • a) As superfícies das amostras com tratamento com ácido, deposição de flúor e deposição de CaMg apresentam rugosidade superficial (Ra e Rq) semelhantes.

  • b) A deposição de Ca e Mg melhora a molhabilidade da superfície em relação as amostras tratadas com ácido com e sem deposição de flúor.

  • c) A adição em escala nanométrica de flúor (Porous Nano) na superfície do implante tratado com ácido aumento a resistência da interface osso-implante medida pelo torque de remoção da tíbia de coelhos, principalmente 2 semanas após a cirurgia.

  • d) O torque de remoção dos implantes com a adição de Ca e Mg foi significativamente inferior aos implantes tratados com ácido (Porous) e aos com deposição de flúor (Poros Nano).

6. AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a empresa Conexão Sistemas de Prótese pela fabricação dos implantes em dimensões adequadas para inserção na tíbia de coelhos. Este trabalho recebeu apoio financeiro da FAPERJ e CNPq.

  • [1]
    BRUNETTE, D.M., TEXTOR, M., TENGVALL, P., et al. Titanium in Medicine: Material Science, Surface Science, Engineering, Biological Reponses and Medical applications. Springer Edited. Berlin-Heidelberg: 2001.
  • [2]
    ELIAS, C.N., "Titanium dental implant surfaces", Matéria (Rio J.), v.15, n.2, p.138-142, 2010.
  • [3]
    RYU, J.J., PARK, K., KIM, H.S., et al., "Effects of Anodized Titanium with RGD Peptide Immobilized Via Chemical Grafting or Physical Adsorption on Bone Cell Adhesion and Differentiation", JOMI, v. 28, n. 4, pp. 963-72, 2013.
  • [4]
    ALBERTS, B., JOHNSON, A., LEWIS, J., et al. Molecular Biology of the Cell., 5th ed. New York, Garland Science, 2008.
  • [5]
    ELIAS, C.N., MEIRELLES, L., "Improving osseointegration of dental implants", Expert review of medical devices, v. 7, n. 2, pp. 241-256, 2010.
  • [6]
    SALOU, L., HOORNAERT, A., LOUARN, G., et al., "Enhanced osseointegration of titanium implants with nanostructured surfaces: An experimental study in rabbits", Acta Biomaterialia, v. 11, pp. 494-502, 2015.
  • [7]
    COELHO, P.G., TAKAYAM, T., YOO, D., JIMBO, R., et al., "Nanometer-scale features on micrometer-scale surface texturing: A bone histological, gene expression, and nanomechanical study", Bone, v.65, pp. 25-32, 2014.
  • [8]
    HE, F.M., TANG, G.L., ZHAO, S.F., et al., "Mechanical and Histomorphometric Evaluations of Rough Titanium Implants Treated with Hydrofluoric Acid/Nitric Acid Solution in Rabbit Tibia", JOMI, v. 26, n. 1, pp. 115-122, 2011.
  • [9]
    DASMAH, A., KASHANI, H., THOR, A., et al., "Integration of fluoridated implants in onlay autogenous bone grafts - An experimental study in the rabbit tibia", J. Cranio-Maxillo-Facial Surgery, v. 42, pp. 796-800, 2014.
  • [10]
    SANTOS, M.V., ELIAS, C.N., LIMA, J.H.C., "The effects of superficial roughness and design on the primary stability of dental implants", Clinical Implant Dentistry and Related Research., v.13, n.3, pp.215-223, 2011.
  • [11]
    ABRAHAMSSON, I., LINDER, E., LARSSON, L., et al., "Deposition of nanometer scaled calcium-phosphate crystals to implants with a dual acid-etched surface does not improve early tissue integration", Clin Oral Implants Res., v. 24, n. 1, pp. 57-62, 2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    22 Jun 2015
  • Aceito
    02 Set 2015
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