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Utilização de sulfato de bário como constituinte de concreto para blindagem de salas de radiologia

The use of barium sulfate as a constituent of concrete for shielding of radiology rooms

RESUMO

A exposição à radiação ionizante está mais presente na rotina da sociedade atual em consequência do avanço das práticas de saúde. Desta forma, deve-se atentar aos mecanismos de proteção radiológica de modo a minimizar a radiação absorvida pelos indivíduos, principalmente em unidades de saúde. Uma sala de radiologia deve contar com uma blindagem adequada, considerando materiais com densidade e espessura apropriados. Nesse contexto, este estudo propõe um concreto específico para construção de salas de radiologia, utilizando o sulfato de bário (barita) e a rocha de basalto em sua composição. O concreto possui uma densidade aparente média de 2,46 g/cm³, sendo classificado como normal, de acordo com sua densidade, evitando assim excessos de carregamento gerados pela sua estrutura. Nos testes de resistência à compressão axial característica (fck), o concreto atingiu o valor de 102,90 MPa, um aumento de 157% quando comparado ao fck para maior classe de agressividade ambiental (40 MPa), conforme estipulado pela NBR 6118. Para os ensaios de blindagem frente à radiação X, foram moldados 5 corpos de prova prismáticos de seção transversal 10 cm x 10 cm, com espessuras variando de 2 mm a 10 mm. A eficácia da blindagem foi aferida por uma câmara de ionização, posicionada abaixo dos corpos de prova, para diferentes valores de energia do feixe de raios X (60, 90 e 125 kVp). Os resultados indicam que mesmo para 125 kVp, um dos maiores valores utilizados na maioria dos equipamentos de radiologia, uma espessura de 16,70 mm é suficiente para barrar 95% da radiação X, conforme recomendado pela Portaria Federal n°453 da Anvisa. Esse conjunto de fatores, em especial a sua capacidade de blindagem, mostram que o concreto proposto é adequado para aplicações em blindagens de salas de radiologia.

Palavras-chave
Sulfato de bário; blindagem; radiologia; radiação ionizante

ABSTRACT

Exposure to ionizing radiation is increasingly common in the routine of modern society, due to the advances in health practices. Thus, attention should be drawn to the mechanisms of radiological protection in order to minimize the radiation absorbed by individuals, especially in healthcare facilities. A radiology room must have adequate shielding, considering materials with the appropriate density and thickness. In this context, this study proposes a concrete specific for the construction of radiology rooms, using barium sulfate (barite) and basalt rock in its composition. The concrete has an average apparent density of 2.46 g/cm³, being classified as normal, according to its density, avoiding overload generated by its structure. During resistance to axial compression characteristic (fck) tests, the concrete reached the value of 102.90 MPa. This value represents an increase of 157% when compared to fck for a higher class of environmental aggressiveness (40 MPa), as provided in NBR 6118. For the radiation shielding tests, 5 prismatic samples with area 10 cm x 10 cm, and thicknesses varying from 2 mm to 10 mm, were molded. The shielding efficiency was measured by an ionization chamber, positioned below the samples, for different energy values of the X-ray beam (60, 90 and 125 kVp). The results indicate that even for 125 kVp, one of the highest values used in most radiology equipment, a thickness of 16.70 mm is sufficient to block 95% of X-radiation, as recommended by the Federal Ordinance No. 453 of Anvisa. This set of factors, in particular its shielding capacity, shows that the proposed concrete is suitable for applications in radiology room shielding.

Keywords
Barium sulfate; shielding; radiology; ionizing radiation

1. INTRODUÇÃO

A radiologia surgiu em 1895, com o físico alemão Wilhelm Conrad Roentgen, através da realização da primeira radiografia. Este experimento proporcionou um avanço na área da saúde, devido à sua aplicabilidade em exames médicos [11 PEREIRA, A.J., DANILIAUSKAS, M., LOPES, R.M., Manual para técnicos em radioterapia, 1 ed., Rio de Janeiro, Instituto do Câncer, 2000.].

O uso crescente das radiações ionizantes ocasionadas pelo avanço tecnológico, impulsionou organizações nacionais e internacionais a estabelecerem recomendações para a proteção dos indivíduos e do meio ambiente, em relação aos efeitos danosos causados por estas radiações [22 JUNIOR, A.T.A. Caracterização de argamassas de barita como blindagens contra a radiação X e determinação experimental dos coeficientes de atenuação desses materiais. Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Engenharia dos Materiais da REDEMAT, Ouro Preto, MG, Brasil, 2014.].

Visando proteger as pessoas contra as radiações ionizantes, principalmente em unidades de saúde, a utilização de novos compostos vem sendo estudada por diversos pesquisadores da área de forma a obter alternativas aos materiais já utilizados em barreiras protetoras (também conhecidas como blindagens) como o chumbo, o concreto e o ferro [33 ALBUQUERQUE, S.M. Estudo para o desenvolvimento e caracterização de concretos de massa específica elevada para proteção às radiações gama e x. Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Ciências na área de Tecnologia Nuclear do IPEN-CNEN/SP, São Paulo, SP, Brasil, 2014.]. Por se tratarem de partes indispensáveis para a proteção e operação em instalações de equipamentos geradores estão, dentre os componentes utilizados na construção civil das salas, os que têm maior impacto sobre os custos das obras [44 VIGNA FILHO, E.D., FALCÃO, R.C., Blindagem em Radioterapia – Técnicas e Normas, 1 ed., Rio de Janeiro, Instituto Nacional do Câncer, 2000.].

Helene e Andrade destacam que o concreto de cimento Portland é o material estrutural e de construção civil mais importante da atualidade. Mesmo sendo um material ainda recente no ramo das construções estruturais, pode ainda ser considerado como uma das grandes descobertas para a contribuição do desenvolvimento da humanidade e de sua qualidade de vida [55 HELENE, P., ANDRADE, T., “Concreto de cimento Portland”, In: Isaia, G.C. (ed), Materiais em Construção Civil e Princípios de Ciência e Engenharia de Materiais, 2 ed., capítulo 2, São Paulo, Instituto Brasileiro de Concerto. 2010.]. Para tanto, deve-se atentar para aplicação consciente dos recursos naturais disponíveis atualmente, visando o emprego de menores níveis de consumo de recursos, como o de cimento, por exemplo [66 REBMANN, M.S. Durabilidade de concretos estruturais com baixo consumo de cimento Portland e alta resistência. Dissertação de Mestrado. Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo - USP, São Carlos, SP, Brasil, 2011.].

Uma alternativa para otimizar a concepção de uma sala de radiologia é deter-se ao estudo particular do concreto a ser utilizado na sua construção. A falta de estudos específicos de dosagens deste tipo de concreto acarreta na inexistência de curvas de atenuação apropriadas, o que por consequência, contra indicam sua utilização de rotina. Atualmente, no processo construtivo das referidas salas, são utilizados concretos comuns, ou seja, objetiva-se em atingir a espessura desejada independente do material utilizado na mistura [44 VIGNA FILHO, E.D., FALCÃO, R.C., Blindagem em Radioterapia – Técnicas e Normas, 1 ed., Rio de Janeiro, Instituto Nacional do Câncer, 2000.].

Sendo assim, esta pesquisa tem como objetivo principal a obtenção de um concreto eficaz, quanto da blindagem à radiação, e viável, quanto da obtenção dos agregados, para aplicação na construção de salas de radiologia. Para isso foi elaborado um traço a base de sulfato de bário e cimento Portland.

Com intuito de comprovar a eficácia da aplicação do composto, avaliou-se a sua resistência característica à compressão axial com 28 dias de idade, sua densidade aparente e por fim, sua a capacidade de atenuação da radiação ionizante para blocos de concreto de 2 mm à 10 mm de espessura.

Os resultados indicam que utilizando uma configuração de energia próxima do máximo estabelecido pelo equipamento de raios X (125 kVp) uma espessura de 16.70 mm é suficiente para barrar 95% da radiação, estando em conformidade com o exigido pela Portaria Federal n° 453 da Anvisa [77 AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Portaria Federal n° 453 de 1° de junho de 1998. Brasília, DF, Brasil, 1998.]

Com base nesses aspectos, o trabalho mostra-se relevante pois propõe um estudo de viabilidade de um concreto capaz de blindar a radiação ionizante proveniente de um aparelho de raios X.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

O sulfato de bário natural (ou barita) é um mineral de constituição inorgânica, quimicamente inerte, extraído de jazidas e beneficiado em diversas faixas granulométricas de acordo com a aplicação desejada. Possui fórmula química BaSO4 e sua densidade pode variar de acordo com a amostra da barita utilizada, podendo ser barita branca bruta (3,79 g/cm³), barita branca mista (3,10 g/cm³), barita roxa bruta (2,99 g/cm³), entre outras. Por apresentar elevada densidade é amplamente utilizado para aumentar a referida característica em outros materiais, como por exemplo, em tintas e derivados do petróleo, e ainda, em materiais isolantes para tratamentos radiológicos [22 JUNIOR, A.T.A. Caracterização de argamassas de barita como blindagens contra a radiação X e determinação experimental dos coeficientes de atenuação desses materiais. Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Engenharia dos Materiais da REDEMAT, Ouro Preto, MG, Brasil, 2014.], como no caso deste estudo.

A barita utilizada nesse trabalho é do tipo branca bruta (98,46% de pureza - empresa Minérios Ouro Branco, Vila Nova Cachoeirinha, São Paulo - SP), ilustrada na Figura 1

Figura 1
Sulfato de bário em pó (BaSO4) ou barita branca bruta.

O basalto é uma rocha ígnea eruptiva (magmática) de composição máfica, rica em silicatos de magnésio e ferro, o que constitui uma das rochas mais abundantes na crosta terrestre. O basalto, pela sua dureza e resistência à meteorização, é explorado para a produção de alvenarias e de agregados de construção civil e como rocha ornamental para revestimentos e calçadas. A produção de fibras de basalto é uma indústria em expansão [88 GILL, R., Rochas e processos ígneos: um guia prático. Porto Alegre, Bookman, 2014.].

Por outro lado, o cimento utilizado foi do tipo ARI (alta resistência inicial) classe CPV por apresentar menor teor de adições (mais puro) e também por proporcionar concretos mais duráveis. Suas características químicas estão apresentadas na tabela 1 conforme indicado pelo fabricante do cimento (Votoran).

Tabela 1
Propriedades químicas do cimento, segundo dados do fabricante.

De forma a avaliar as dimensões das partículas dos agregados utilizados na mistura (cimento CPV e barita) foi realizada uma análise granulométrica através de difração de laser (CILAS modelo 1064). Para diâmetros maiores que 149 𝜇m, como no caso do basalto em areia e em pó, foi utilizado uma série de peneiras padrão, seguindo as prescrições de ensaio estabelecidos na NBR NM 248 [99 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR NM 248: Agregados - Determinação da composição granulométrica. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2003.]. A tabela 2 exibe os diâmetros médios de cada matéria prima, assim como as frações encontradas no intervalo estatístico.

Em seguida, foi realizado o ensaio de determinação da densidade real dos agregados. Este ensaio tem como objetivo avaliar e quantificar a densidade real e efetiva do material ensaiado de acordo com a normativa DNER-ME 093/94 [1010 DNER-ME, 093/94 Departamento Nacional de Estradas de Rodagem. Solos – Determinação da densidade real. Brasília, DF, Brasil, 1994.]. Parte deste ensaio está ilustrado na Figura 2.

Tabela 2
Granulometria das matérias primas utilizadas no concreto.
Figura 2
Ensaio de densidade real para o sulfato de bário.

A Tabela 3 apresenta os resultados obtidos para cada matéria prima de acordo com o ensaio de determinação da densidade real dos grãos. Os valores estão indicados em grama por centímetro cúbico (g/cm3).

Tabela 3
Densidade real dos materiais utilizados.

Para determinação das relações unitárias utilizou-se como referência o método Unisinos de dosagem para concretos de ultra alto desempenho (UHPC). Este método consiste em obter o melhor empacotamento entre diferentes materiais presentes na mistura utilizando o modelo de empacotamento de partículas proposto por Funk e Dinger que determina a quantidade em porcentagem de um determinado diâmetro ideal a ser empregado na mistura [1111 CHRIST, R. Proposição de um método de dosagem para concretos de ultra alto desempenho (UHPC). Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Unisinos, São Leopoldo, RS, Brasil, 2019.].

Através deste método proposto e ainda, com testes experimentais em laboratório para verificação das proporções adotadas, obteve-se as seguintes relações unitárias para o traço denominado “traço padrão”, conforme apresenta a Tabela 4.

Tabela 4
Traço padrão – composições unitárias.

Em seguida, foram moldados 5 (cinco) corpos de prova prismáticos de dimensões 10 cm x 10cm com a espessura variando de 2 mm em 2 mm, partindo de uma espessura mínima de 2 mm até uma espessura máxima de 10 mm. Estes corpos de provas (CP’s) estão ilustrados na Figura 3.

Figura 3
Corpos de prova prismáticos do traço padrão.

Nas primeiras 48 h de cura, conforme estipulado pela NBR 5738, os corpos de prova permaneceram em temperatura ambiente. Após este período os mesmos foram deformados com todo o cuidado, de forma a não causar nenhum dano. Em seguida, os corpos de prova foram curados por 28 dias em câmara úmida com temperatura controlada de (23 ± 2)°C , seguindo o protocolo estabelecido pela NBR 9479 [1212 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9479: Argamassa e concreto - Câmaras úmidas e tanques para cura de corpos-de-prova. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2006.].

Para garantir uma equivalência entre as características construtivas das amostras, foram utilizados produtos da mesma marca (cimento CPV Votoran, sulfato de bário Neon e rocha de basalto Pedraccon Mineração), com as amostras sendo confeccionadas no mesmo dia e sob as mesmas condições de temperatura.

A eficácia da blindagem radioativa de cada corpo de prova foi avaliada por uma câmara de ionização da Radcal Corporation, Modelo 9010, posicionada atrás de cada amostra em relação a fonte de emissão de raios X (tubo de raios-X), de forma a mensurar a radiação transmitida através do referido CP de concreto. A câmara de ionização utilizada nesse estudo está ilustrada na Figura 4 posicionada junto a uma amostra de concreto de 6 mm, no lado oposto a face exposta à radiação.

Para os ensaios radiológicos foram escolhidas as energias cinéticas do tubo de raios-X (quilovoltagem pico) de 60, 90 e 125 kVp. Tais valores escolhidos da quilovoltagem pico estão associados com o mínimo, máximo e um valor intermediário utilizados em equipamentos de raios X durante exames de radiologia com pacientes. Para esses valores de kVp, a dose máxima aplicada aos corpos de prova foi de 40 mR (miliroentgen), 87 mR e 153 mR, respectivamente.

Figura 4
Câmara de ionização (Radcal Corporation) sobre o corpo de prova do traço padrão.

Além dos corpos de prova prismáticos, foram moldados 6 corpos de prova cilíndricos para determinar as resistências à compressão axial e também, as densidades aparentes do concreto proposto. Com 5 cm de diâmetro e 10 cm de altura, os CP’s foram rompidos uma metade com 7 dias e a outra metade com 28 dias de idade.

Para determinar a densidade aparente de cada CP cilíndrico foi realizada a razão da massa pelo volume do respectivo molde. Com o auxílio de uma balança de precisão, foram obtidas as massas em gramas dos 6 corpos de prova cilíndricos e na sequência, realizada a razão pelo volume dos moldes. Desta forma, o resultado final de densidade aparente do concreto proposto nesta pesquisa, será o valor médio das densidades aparentes obtidas para cada um dos 6 corpos de prova, moldados sobre as mesmas condições.

A fim de determinar os valores de resistência à compressão obtidos, as amostras cilíndricas foram ensaiadas na sua integralidade conforme descreve a NBR 5739 [1313 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 5739: Concreto – Ensaio de compreensão de corpos de prova cilíndricos. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2018.]. Após o posicionamento dos CP's na prensa (marca WPM, modelo 300b, com capacidade de 300 t) foram posicionados pratos, nas faces inferior e superior, a fim de arrematar os CP’s para receberem forças verticais de forma distribuída.

Na sequência, a prensa hidráulica foi acionada com aplicação de carga contínua, e sem choque sobre o CP, com velocidade de carregamento de 0,45 MPa/s. Esta velocidade foi mantida enquanto o CP Sofria deformação, até atingir a sua ruptura. O valor final de resistência à compressão foi obtido dividindo a carga de ruptura pela área da seção transversal do corpo de prova. A prensa hidráulica utilizada no ensaio de resistência à compressão axial, assim como, os corpos de prova em seu estado normal e rompido estão ilustrados nas Figuras 5, 6, 7 e 8.

Figura 5
Corpos de prova cilíndricos do traço padrão.
Figura 6
Prensa hidráulica no rompimento do corpo de prova cilíndrico.
Figura 7
Corpo de prova em processo de rompimento na prensa hidráulica.
Figura 8
Corpo de prova rompido/colapsado na prensa hidráulica.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Na Tabela 5 estão dispostos os valores das densidades aparentes obtidas para cada corpo de prova cilíndrico, assim como, o valor da densidade aparente final obtida para o concreto proposto neste estudo, elaborado com o traço padrão.

Tabela 5
Densidade obtida para o traço padrão.

Com base nos resultados da Tabela 4, obteve-se uma densidade média aparente de 2,46 g/cm³ sobre seis medidas para o traço padrão, sendo este classificado como “normal” de acordo com a NBR 8953 [1414 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 8953: Concreto para fins estruturais – Classificação pela massa específica, por grupos de resistência e consistência. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2015.].

Diferentemente dos concretos pesados (densidade superior a 2,80 g/cm³) o novo composto por ser considerado “normal”, viabiliza um menor carregamento da estrutura construída com este material. Estruturas menos carregadas impactam em fundações significativamente menores além de proporcionarem um melhoramento na concepção do projeto como um todo.

Os resultados obtidos para o ensaio de resistência à compressão axial estão ilustrados na Figura 9, onde com 7 dias de idade o concreto obteve 94,07 MPa e com 28 dias de idade a resistência atingiu 100,19 MPa. Os resultados apresentados para cada idade são os valores médios obtidos do rompimento de três corpos de prova cilíndricos.

Figura 9
Resistências características dos concretos à compressão axial em MPa.

Estes resultados foram obtidos nas duas idades a fim de avaliar a evolução da resistência à compressão axial neste período. No entanto, a resistência característica do concreto (fck) é dada aos 28 dias. Portanto, o fck obtido para o traço padrão foi de 102,90 MPa.

O cimento aplicado nesta pesquisa foi o da classe CPV, também denominado cimento ARI (Alta Resistência Inicial). Este aglomerante possui alta reatividade em baixas idades por ser um material mais puro, ou seja, possui menor teor de adições. Dessa forma, a evolução e o ganho da resistência à compressão axial dos 7 dias para os 28 dias foram de apenas 3,58%, justificada pelo emprego do cimento em questão.

A NBR 6118 [1515 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118: Projeto de estruturas de concreto – Procedimento. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2014.], de acordo com a exposição ambiental das estruturas de concreto, define as classes de agressividades, assim como, as resistências mínimas à compressão (fck) a serem atingidas e respeitadas pelo concreto de acordo com sua aplicação.

A mesma normativa ainda divide os concretos em protendidos e armados, sendo o último aplicado na construção de uma sala de radiologia, por exemplo. Para concretos armados estruturais a resistência mínima a ser atingida é de 30 MPa. No entanto, se esta estrutura estiver localizada na classe de agressividade ambiental mais severa (classe IV) a resistência mínima deve ser de 40 MPa.

Sendo assim, é possível observar que o fck obtido para o concreto proposto (102,90 MPa), atende aos critérios estruturais e de severidade do meio conforme estipulado pelas normativas vigentes, tendo superado os valores mínimos em mais de 157%.

O comportamento dos CP’s frente à exposição à radiação ionizante está ilustrado nas Figuras 10, 11 e 12, que relacionam a espessura dos CP’s com a intensidade de radiação transmitida. Cada ponto nessas Figuras representa uma média sobre cinco medidas experimentais, e em todos os casos, o desvio padrão foi inferior a 0,68%.

Vale ressaltar que a radiação emitida pela fonte de raios X é dividida em partes: atenuada e transmitida. A parte atenuada é aquela absorvida pelo CP, responsável pela eficácia da blindagem. Já a parte transmitida, representa o que atravessou o CP e, por consequência, a radiação que ele não foi capaz de ser blindar.

A atenuação da radiação ionizante para os CP’s de 2 mm, 4 mm, 6 mm, 8 mm e 10 mm foram, respectivamente, de 70%, 79%, 90%, 95% e 97% para a energia cinética de 60 kVp, conforme mostra a Figura 10. De acordo com a Portaria Federal n° 453 da Anvisa [77 AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Portaria Federal n° 453 de 1° de junho de 1998. Brasília, DF, Brasil, 1998.], a atenuação da radiação ionizante admissível para espaços acessíveis a indivíduos deve ser de no mínimo 95%. Assim, para os CP’s com espessura de 10 mm, esta condição de segurança é atendida, conforme indica a Figura 10.

Figura 10
Radiação transmitida, em porcentagem, versus espessura dos corpos de prova, em milímetros, para uma energia de 60 kVp.

A radiação incidida em um material diminui exponencialmente à medida que aumentamos sua a espessura, conforme previsto pela Lei de Beer-Lambert [1616 FOX, M. Optical Properties of Solids, 2nd edition, Oxford University Press, 2010.] vista na Equação 1:

I = I 0 e k x (1)

O I0 representa a intensidade de radiação do feixe de raios X incidente nos CP’s e I é a intensidade transmitida por esse mesmo feixe após ser atenuada por qualquer um dos CP’s para uma determinada espessura x. O parâmetro k é denominado coeficiente de atenuação e controla a velocidade de queda da curva exponencial. Quanto maior o valor de k, mais eficaz é a atenuação da radiação à medida que se aumenta a espessura.

Se considerarmos que a aquisição da intensidade transmitida foi realizada pela câmara de ionização no mesmo intervalo de tempo para todas as amostras, ela segue os princípios da Lei de Beer-Lambert. Esse resultado está exibido nas Figuras 10 (e também nas Figuras 11 e 12), na forma normalizada e em escala percentual, ou seja, dividida pela intensidade da fonte sem a blindagem e multiplicada por 100. Através do ajuste exponencial, obteve-se um coeficiente de atenuação k= 0,312 para energia cinética de 60 kVp.

Já para energia cinética de 90 kVp as atenuações obtidas foram de 59%, 68%, 81%, 87% e 91%, para as espessuras de 2 mm, 4 mm, 6 mm, 8 mm e 10 mm, respectivamente. Os referidos resultados podem ser verificados na Figura 11.

Ainda na Figura 11, é possível observar que para energia cinética de 90 kVp, k=0,221. Em comparação com o coeficiente apresentando para a energia cinética de 60 kVp, este índice teve um decréscimo de 29%, aproximadamente, justificado pelo aumento da energia do equipamento de raios-X.

Por fim, para a energia cinética de 125 kVp um limite máximo para a maioria dos exames de radiologia, considerando ainda os mesmos corpos de prova citados anteriormente, as atenuações foram de 49%, 58%, 71%, 79% e 84%, conforme demonstra na Figura 12.

Observa-se ainda que o ajuste exponencial para energia de 125 kVp, apresenta o maior distanciamento, em y em relação à origem do plano. Ou seja, apresentou a menor velocidade de queda com um coeficiente de atenuação k=0,169. O valor de k decresceu aproximadamente 46% quando comparado com a energia de 60 kVp, e 24% em comparação com o equipamento operando em 90 kVp. Essa diminuição do coeficiente era esperada tendo em vista o aumento progressivo da energia cinética do tubo de raios-X.

Figura 11
Radiação transmitida em porcentagem versus espessuras dos corpos de prova em milímetros, para uma energia de 90 kVp.
Figura 12
Radiação transmitida em porcentagem versus espessuras dos corpos de prova em milímetros, para uma energia de 125 kVp.

4. CONCLUSÕES

Neste estudo foi apresentada a viabilidade do uso do sulfato de bário como constituinte de concreto para aplicação em blindagens de radiação X em salas de radiologia.

Para comprovar a eficácia da blindagem, foram fabricadas amostras de concreto com um traço com barita na sua constituição, com espessuras de 2 mm, 4 mm, 6 mm, 8 mm e 10 mm, as quais foram irradiadas por diferentes energias (60, 90 e 125 kVp). Tais energias foram escolhidas a partir da radiação transmitida ao paciente em exames reais, considerando uma dose recebida de mínima, média e máxima.

Os gráficos de atenuação mostram que, para a menor energia escolhida, de 60 kVp, a atenuação com uma espessura de 10 mm foi de 97% (Figura 10). Já para a energia intermediária, de 90 kVp, e máxima, 125 kVp, foram obtidas atenuações de 91,1% e 84%, respectivamente. Assim, para a energia de 125 kVp, seria necessária uma espessura de concreto de 16,70 mm para que a concepção da sala de radiologia estivesse de acordo com a Portaria Federal n° 453 da Anvisa [77 AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Portaria Federal n° 453 de 1° de junho de 1998. Brasília, DF, Brasil, 1998.], que exige um mínimo de 95% de atenuação da radiação X.

Do ponto de vista mecânico, o concreto estudado foi classificado como “normal”, seguindo a NBR 8953 [1414 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 8953: Concreto para fins estruturais – Classificação pela massa específica, por grupos de resistência e consistência. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2015.], propiciando uma estrutura de menor sobrecarga em relação aos seus carregamentos, quando comparadas às estruturas construídas com concretos ou materiais de elevada densidade.

Se tratando do fck (resistência à compressão característica), o concreto estudado está 157% acima do normatizado pela NBR 6118 [1515 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118: Projeto de estruturas de concreto – Procedimento. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2014.] para pior condição de agressividade, portanto, o mesmo atende com folga as condições de aceitação para fins estruturais.

AGRADECIMENTOS

À Universidade Católica de Pelotas (UCPel) pela disponibilização do Laboratório de Engenharia Civil (LEC) no qual foi realizada parte das medidas experimentais. Ao Hospital Escola da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) administrado pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) pela disponibilização do equipamento de raios X. Por fim, à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) pela concessão da bolsa de iniciação científica ao longo desta pesquisa.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    12 Nov 2020
  • Aceito
    17 Maio 2021
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