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Análise microestrutural de um aço assistido pelo efeito TRIP obtido a partir de três diferentes ciclos térmicos

Microstructural analysis of a TRIP assisted steel obtained through three different heat treatments

RESUMO

A indústria automotiva está em constante busca pela diminuição do peso dos veículos, visando menor consumo de combustível e, conseqüentemente, a redução da emissão de gases tóxicos à atmosfera. Nesse contexto, foi desenvolvido o aço assistido pelo efeito TRIP, com o objetivo de aliar elevada resistência mecânica e ductilidade, características associadas tanto à sua microestrutura multiconstituída como à possibilidade de transformação da austenita retida em martensita durante a deformação plástica. Neste trabalho foram analisados os efeitos de três diferentes rotas de processamento térmico e da variação do tempo de austêmpera na microestrutura final e na dureza de um aço com baixo teor de carbono, de forma a obter uma microestrutura multiconstituída com a presença de austenita retida, o que possibilitaria a ocorrência do efeito TRIP. Os ciclos investigados envolveram etapa intercrítica seguida por austêmpera (ciclo CD), além de etapas prévias à intercrítica - têmpera (ciclo CT) e austenitização completa (ciclo CC). Observou-se que a aplicação dos ciclos térmicos distintos resultou em microestruturas cujos constituintes apresentaram distribuição, dimensões e morfologias diferentes entre si e que a elevação do tempo de austêmpera favoreceu a formação de bainita, reduzindo a quantidade de constituinte MA. Foi verificado ainda que, para os três ciclos, essa elevação do tempo de austêmpera provocou um aumento na proporção de austenita retida e de seu teor de carbono e uma redução nos valores de dureza verificados para o material.

Palavras-chave
Aços avançados de elevada resistência mecânica; Efeito TRIP; Microestrutura multiconstituída; Austenita retida

ABSTRACT

The automotive industry is always interested in decreasing cars’ weight, in order to promote fuel economy and, consequently, less emission of toxic gases into the atmosphere. In this context, TRIP steels stand out since they present an excellent combination of high strength and ductility. The union of these characteristics in the same steel is due to its multiphase microstructure and to the TRIP effect, characterized by the transformation of retained austenite into martensite induced by plastic deformation. In this work, the effects of three different thermal processing routes and the austempering time on the final microstructure and on the hardness of a low carbon steel were analyzed. One cycle (CD) was based on an intercritical stage followed by a subsequent austempering process, while the others included stages prior to the intercritical step - quenching (CT cycle) and complete austenitization (CC cycle). It was observed that different thermal processing cycles resulted in microstructures whose constituents had different distribution, dimensions and morphologies. The increase in austempering time favored the formation of bainite, but caused a reduction in the amount of MA constituent. In addition, the longer this time, the greater the proportion of retained austenite and its carbon content and the lower the hardness values were verified for the material.

Keywords
Advanced high-strength steels; TRIP effect; Multiphase microstructure; Retained austenite

1. INTRODUÇÃO

Um dos principais desafios da indústria automotiva tem sido a necessidade de adequar-se às novas demandas do mercado global, que busca, além de eficiência nos projetos, atender às exigências ambientais, produzindo veículos cada vez mais leves, que consumam menos combustível e, conseqüentemente, que lancem menor quantidade de gases tóxicos à atmosfera [11 FONSTEIN, N., Advanced High Strength Sheet Steels: Physical Metallurgy, Design, Processing and Properties, 1 ed., Switzerland, Springer, 2015.]. Diante disso, novos materiais foram desenvolvidos, dentre os quais podem ser destacados os chamados aços assistidos pelo efeito TRIP (Transformation Induced Plasticity). Esses aços, por apresentarem, relativamente, elevados valores de limite de resistência e de alongamento, permitem que chapas finas possam ser empregadas na fabricação de componentes estruturais, resultando na diminuição do peso dos automóveis sem, no entanto, causar prejuízos à segurança dos passageiros [22 BILLUR, E., ALTAN T., “Three generations of advanced high-strength steels for automotive applications, Part I: The first generation”, Stamping Journal, pp.16-17, 2013.].

Essa combinação de propriedades consideradas antagônicas, típica desse tipo de aço, deve-se à presença de uma microestrutura multiconstituída, composta por bainita e martensita, mais duras, e ferrita e austenita retida, mais dúcteis, e ainda à ocorrência do efeito TRIP, caracterizado pela transformação induzida por deformação plástica da austenita em martensita [33 DIEGO-CALDERÓN, I., DE KNIJF, D., MONCLÚS, M. A., et al. “Global and local deformation behavior and mechanical properties of individual phases in a quenched and partitioned steel”, Materials Science and Engineering A, v. 630, pp. 27-35, 2015., 44 ABBASI, E., RAINFORTH, W.M., “Microstructural evolution of Nb–V–Mo and V containing TRIP-assisted steels during thermomechanical processing”, Journal of Materials Science &Technology, v. 33, pp. 311-320, 2016., 55 SHEN, Y. F., QIU, L. N., SUN, X., et al. “Effects of retained austenite volume fraction, morphology, and carbon content on strength and ductility of nanostructured TRIP-assisted steels”, Materials Science and Engineering A, v. 636, pp. 551-564, 2015.]. Nesse contexto, torna-se essencial a compreensão das condições de processamento e tratamentos termomecânicos que produzirão essa microestrutura complexa, marcada especialmente pela presença de austenita retida (AR), ou seja, de austenita estabilizada à temperatura ambiente.

O processamento térmico empregado para a obtenção dos aços assistidos pelo efeito TRIP mais convencional, denominado de ciclo direto (CD) no presente estudo, é baseado em uma primeira etapa de recozimento intercrítico, na qual o material é submetido a uma temperatura da zona intercrítica (entre Ac1 e Ac3 - campo de estabilidade das fases ferrita e austenita no diagrama Fe-Fe3C), seguida por um estágio de austêmpera, onde ocorre a formação de bainita, e posterior resfriamento brusco [66 SAEIDI, N., RAEISSI, M., VAGHEI, H.R., et al. “Extraordinary strength and ductility obtained in transformation-induced plasticity steel by slightly modifying its chemical composition”, Materials Science and Engineering A, v. 702, pp. 225-231, 2017.]. Durante todo o ciclo, a estabilização da austenita é promovida por seu enriquecimento com carbono, decorrente da redistribuição desse elemento entre os constituintes. No entanto, durante a austêmpera, esse fenômeno acontece de maneira mais intensa, devido ao processo de rejeição de carbono da ferrita para a austenita circundante, onde os carbonetos precipitariam, formando a estrutura típica da bainita [77 DING, W., HEDSTRÖM, P., LI, Y., “Heat treatment, microstructure and mechanical properties of a C–Mn–Al–P hot dip galvanizing TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 674, pp. 151-157, 2016., 88 JACQUES, P.J., “Transformation-induced plasticity for high strength formable steels”, Current Opinion in Solid State and Materials Science, v. 8, pp. 259-265, 2004.]. Ao inibir a precipitação desses carbonetos por meio da adição de alguns elementos de liga, como Mn e Si, é possível promover o enriquecimento de carbono da austenita, resultando em sua estabilização à temperatura ambiente, uma vez que a temperatura inicial de transformação martensítica (Ms) diminui e a austenita não se transforma em martensita ou transforma-se apenas parcialmente quando o material é resfriado [66 SAEIDI, N., RAEISSI, M., VAGHEI, H.R., et al. “Extraordinary strength and ductility obtained in transformation-induced plasticity steel by slightly modifying its chemical composition”, Materials Science and Engineering A, v. 702, pp. 225-231, 2017., 99 XIE, Z.J., REN, Y.Q., ZHOU, W.H., et al. “Stability of retained austenite in multi-phase microstructure during austempering and its effect on the ductility of a low carbon steel”, Materials Science and Engineering A, v. 603, pp. 69-75, 2014., 1010 BLECK, W. GUO, X., MA, Y., “The TRIP effect and its application in cold formable sheet steels”, Steel Research International, v. 88, n. 10, pp. 1-21, 2017.].

Rotas alternativas de processamento dos aços assistidos pelo efeito TRIP que poderiam levar à obtenção de microestruturas multiconstituídas com morfologias distintas também foram desenvolvidas e a influência dos parâmetros de tratamento térmico (temperatura e tempo de encharque) nessas microestruturas tem sido investigada, visando atingir a combinação de propriedades desejadas ao aço. CHIANG et al. [11, 1212 CHIANG, J., BOYD, J.D., PILKEY, A.K., “Effect of microstructure on retained austenite stability and tensile behaviour in an aluminum-alloyed TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 638, pp. 132-142, 2015.] e XI et al. [99 XIE, Z.J., REN, Y.Q., ZHOU, W.H., et al. “Stability of retained austenite in multi-phase microstructure during austempering and its effect on the ductility of a low carbon steel”, Materials Science and Engineering A, v. 603, pp. 69-75, 2014.] estudaram um tratamento térmico, denominado neste estudo de ciclo com têmpera prévia (CT), introduzido por SUGIMOTO et al. [1313 SUGIMOTO, K., MUKHERJEE, M., “TRIP aided and complex phase steels”, In: RANA R., SINGH, S.B., Automotive steels: design, metallurgy, processing and applications, 1 ed., chapter 8, Woodhead Publishing, 2017.], que apresenta uma etapa de têmpera realizada previamente às duas etapas que compõem o ciclo térmico convencional. LI et al. [1414 LI, M.L., JIANG, H., HE, Y.L., et al. “Effect of two-step cooling process on mechanical properties of TRIP steel with high performance”, Journal of Iron and Steel Research International, v.25, pp. 426-432, 2018.] propuseram um outro ciclo, em três estágios, identificado neste trabalho como ciclo contínuo (CC), no qual uma austenitização completa do material, sem ocorrência de deformação plástica, precede a etapa intercrítica e a austêmpera.

Dessa forma, apesar de vários estudos terem investigado os impactos dos parâmetros de processamento térmico na microestrutura formada e no desempenho mecânico dos aços TRIP, não há publicações que apresentem uma comparação direta do material produzido por meio desses três ciclos térmicos. Nesse sentido, o presente trabalho teve como objetivo comparar e discutir os efeitos da aplicação dessas diferentes rotas térmicas, considerando ainda a influência do tempo de austêmpera, na morfologia da microestrutura produzida, na fração volumétrica de austenita retida e em seu teor de carbono. Por fim, foram avaliados ainda os resultados de dureza do material.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

O material utilizado neste estudo foi um aço com baixo teor de carbono, obtido na forma de chapas de 1,5mm de espessura, laminadas a frio e galvanizadas. A composição química do material (% em peso), determinada por meio de espectrometria de emissão óptica, é apresentada na Tabela 1.

Tabela 1
Composição química (% em peso) do aço estudado.

Para a realização dos ciclos térmicos propostos, foram cortadas placas (1,5mm × 100mm × 210mm) ao longo da direção de laminação da chapa original, que foram inicialmente normalizadas, com aquecimento a 860°C por 30 minutos, seguido por resfriamento ao ar, visando garantir a eliminação dos efeitos de quaisquer tratamentos térmicos e/ou mecânicos conduzidos anteriormente. A temperatura de normalização, assim como as demais utilizadas no trabalho, foi determinada por meio de simulações termodinâmicas com o auxílio dos softwares Thermo-Calc [1515 FERREIRA, R.N.V., Influência do estado inicial e dos parâmetros de processamento na microestrutura e no comportamento mecânico de um aço assistido pelo efeito TRIP após processamentos térmicos diversos, Dissertação de M.Sc., POSMAT/CEFETMG, Belo Horizonte, MG, Brasil, 2018.] e MAP_STEEL_MUCG83 [1616 PHASE TRANSFORMATIONS & COMPLEX PROPERTIES RESEARCH GROUP, https://www.phase-trans.msm.cam.ac.uk/map/steel/programs/mucg83.html, acessado em agosto de 2021.], considerando uma composição simplificada do aço estudado, ou seja, considerando somente os elementos ferro, carbono, silício e manganês.

Posteriormente, as amostras foram submetidas a três rotas distintas de processamento térmico, realizadas em fornos com banho de sal com capacidade de 0,65m³: (i) ciclo térmico direto (CD), com aquecimento intercrítico a 730°C por 20 minutos, seguido por resfriamento até a temperatura de austêmpera de 400°C, com encharque de 60, 120 e 360 segundos; (ii) ciclo contínuo (CC), composto por novo aquecimento a 860°C, resultando em austenitização completa, desta vez por 20 minutos, seguido por resfriamento até 730°C durante 20 minutos e posterior permanência na temperatura de 400°C por 60, 120 e 360 segundos; (iii) ciclo com têmpera prévia (CT), caracterizado por apresentar uma etapa de têmpera precedendo o ciclo direto, na qual o material foi aquecido novamente a 860°C e resfriado bruscamente em água antes de serem realizadas as mesmas etapas às quais as amostras do ciclo CD foram submetidas. Todas as amostras foram resfriadas bruscamente em água após a realização da etapa de austêmpera. A representação esquemática das rotas de tratamentos térmicos conduzidas é mostrada na Figura 1.

Figura 1
Ciclos térmicos realizados para a obtenção de aço assistido pelo efeito TRIP a) ciclo CD, b) ciclo CC e c) ciclo CT.

Após os ciclos térmicos, amostras foram retiradas de cada uma das chapas e passaram por um processo de decapagem, utilizando ácido clorídrico PA, com o objetivo de remover resíduos da camada galvanizada ou óxidos presentes na superfície do material. Uma parte dessas amostras foi submetida à preparação metalográfica e a ataque químico por imersão durante cerca de 10s com o reativo Nital 3% para posterior análise microestrutural por meio de microscopia eletrônica de varredura (MEV) e avaliação do comportamento mecânico a partir de ensaios de dureza. O outro grupo de amostras foi encaminhado para a análise da estrutura por meio de difração de raios X.

A análise microestrutural por microscopia eletrônica de varredura (MEV) foi conduzida a partir de elétrons secundários, utilizando um microscópio FEG – Quanta 200 FEI. Com base nas imagens obtidas, além da observação visual da estrutura desenvolvida, realizada com duas ampliações, foram determinadas as frações volumétricas dos constituintes ferrita, bainita e MA (martensita + austenita retida) pelo método de contagem por pontos, conforme a norma ASTM E562-11. Nesse caso, a medição foi realizada em diversas imagens de duas amostras de cada condição, utilizando-se uma rede com pontos sobreposta a essas imagens de MEV com ampliações inferiores àquelas empregadas para a análise da morfologia e dimensões gerais dos constituintes. O objetivo dessa avaliação semiquantitativa foi observar tendências de comportamento quanto à proporção de ferrita, bainita e constituinte MA de acordo com o tipo de tratamento térmico e seus parâmetros. Em adição à avaliação dos constituintes desenvolvidos, o teor de manganês no constituinte MA foi determinado por espectroscopia de energia dispersiva (EDS), empregando um microscópio eletrônico de varredura Shimadzu SSX-550 Superscan. Para o caso específico da microestrutura do aço após a normalização e após a normalização seguida de têmpera (etapas iniciais dos ciclos térmicos investigados no trabalho), a análise da microestrutura foi conduzida por microscopia óptica em um microscópio Fortel com sistema de digitalização Kontrol.

A análise de difração de raios X (DRX) foi realizada por meio de um difratômetro modelo Shimadzu, modelo XRD – 7000, empregando radiação CuKα, tensão de 40 kV, corrente de 30 mA, com 2θ variando de 40° a 120° e tempo fixo de 5 segundos por passo. A partir desses resultados, o volume de austenita retida no material foi estimado pelo método de integração dos picos de austenita (111), (200), (220), (311) [1717 HAJIANNIA, I., SHAMANIAN, M., ATAPOURI, M., et al. “Development of ultrahigh strength TRIP steel containing high volume fraction of martensite and study of the microstructure and tensile behavior”, Transactions of the Indian Institute of Metals, v. 71, n. 6, pp. 1363-1370, 2018.].

O cálculo do teor de carbono na austenita retida foi conduzido a partir dos resultados da análise de DRX e do teor de manganês determinado por EDS. Por meio da Lei de Bragg (Equação 1), obteve-se a distância interplanar (d) para cada pico de austenita identificado que, juntamente com os índices de Miller dos planos cristalográficos correspondentes, foi utilizado para o cálculo do parâmetro de rede da austenita (a) referente a cada pico, utilizando-se a Equação 2.

n λ = 2 d   s e n   θ (1)
a = d h k l × h 2 + k 2 + l 2 (2)

Para estruturas cúbicas, quando o valor de a é associado à função cos² θ em um gráfico, obtêm-se uma reta e o a0 (verdadeiro valor de a) pode ser determinado por meio da sua extrapolação para cos² θ = 0 [1818 CULLITY, B.D., Elements of X-ray Diffraction, Addison-Wesley Publishing, 1956.]. O parâmetro de rede (a0) se relaciona com o teor de carbono da austenita por meio da Equação 3 [1919 DIJK, N.H., BUTT, A.M., ZHAO, L., et al. “Thermal stability of retained austenite in TRIP steels studied by synchrotron X-ray diffraction during cooling”, Acta Materialia, v.53, pp. 5439-5447, 2005.].

a 0 = 3 , 556 + 0 , 0453 % C + 0 , 00095 % M n (3)

Os ensaios de dureza foram realizados em um microdurômetro Shimadzu modelo HMV-2T, com carga de 1kgf e tempo de penetração de 15s. Esses experimentos foram conduzidos em duas amostras de cada condição de processamento térmico, por sua vez com dez ensaios para cada. A preparação do material para os testes foi similar à realizada para a análise da microestrutura.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Análise microestrutural

As imagens obtidas por microscopia óptica das amostras normalizada e normalizada e posteriormente temperada, relativas ao início dos ciclos térmicos, ou seja, que representam as condições iniciais do material, são mostradas na Figura 2. Nota-se que a amostra normalizada é composta por grãos de ferrita e colônias de perlita, enquanto o material temperado após a normalização exibiu, como esperado, uma microestrutura de morfologia acicular, típica de resfriamento brusco.

Figura 2
Imagens obtidas por MO das microestruturas do material após: a) normalização, b) normalização e têmpera.

Nas Figuras 3 e 4 são apresentadas, como exemplos, imagens obtidas por MEV das microestruturas resultantes dos três ciclos térmicos adotados no presente trabalho, considerando os tempos de permanência na etapa de austêmpera de 60s e 360s. Essas imagens e ampliações foram escolhidas por permitirem melhor visualização da estrutura do material, ressaltando-se que as demais regiões das amostras exibem constituintes com características similares às escolhidas. A observação e identificação da estrutura, conduzidas a partir da comparação com imagens de trabalhos diversos [55 SHEN, Y. F., QIU, L. N., SUN, X., et al. “Effects of retained austenite volume fraction, morphology, and carbon content on strength and ductility of nanostructured TRIP-assisted steels”, Materials Science and Engineering A, v. 636, pp. 551-564, 2015., 1111 CHIANG, J., LAWRENCE, B., BOYD, J.D., et al. “Effect of microstructure on retained austenite stability and work hardening of TRIP steels”, Materials Science and Engineering A, v. 528, pp. 4516-4521, 2011., 1212 CHIANG, J., BOYD, J.D., PILKEY, A.K., “Effect of microstructure on retained austenite stability and tensile behaviour in an aluminum-alloyed TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 638, pp. 132-142, 2015., 1717 HAJIANNIA, I., SHAMANIAN, M., ATAPOURI, M., et al. “Development of ultrahigh strength TRIP steel containing high volume fraction of martensite and study of the microstructure and tensile behavior”, Transactions of the Indian Institute of Metals, v. 71, n. 6, pp. 1363-1370, 2018.], permitiram constatar que a aplicação de cada um dos ciclos resultou no desenvolvimento de constituintes com distribuição, dimensões e morfologias relativamente diferentes entre si.

O ciclo direto (CD) produziu uma microestrutura típica dos aços TRIP, composta por grãos equiaxiais de ferrita, bainita e constituinte MA em forma em blocos. O ciclo contínuo (CC) originou grãos de ferrita, MA e porções ou feixes de bainita de maiores dimensões, sendo essa bainita formada por ripas aparentemente mais finas e longas que as geradas pelo ciclo CD, além dos feixes aparecerem de forma contígua ao constituinte MA. O ciclo com têmpera prévia (CT), por sua vez, similarmente ao direto, gerou uma estrutura mais refinada como um todo, considerando tanto os grãos de ferrita como o constituinte MA e os feixes de bainita. Nesse caso, entretanto, verifica-se a presença de grãos de ferrita um pouco mais alongados e bainita com ripas mais curtas. Considerando a elevação do tempo de austêmpera, em geral, observa-se o aumento das regiões com bainita em detrimento do constituinte MA.

Figura 3
Imagens obtidas por MEV das microestruturas produzidas após etapa de austêmpera de 60 segundos pelos ciclos a) e b) CD, c) e d) CC, e) e f) CT.
Figura 4
Imagens obtidas por MEV das microestruturas produzidas após etapa de austêmpera de 360 segundos pelos ciclos a) e b) CD, c) e d) CC, e) e f) CT.

As diferenças observadas estão associadas às distintas microestruturas presentes nas amostras anteriormente à etapa intercrítica de cada rota térmica. O ciclo CD apresentava uma microestrutura inicial composta por ferrita e perlita, resultante do tratamento de normalização, como anteriormente mostrado na Figura 2. Com o aquecimento do material a 730°C (levando, portanto, o aço ao campo bifásico do diagrama Fe-Fe3C), essa perlita e parte da ferrita transformaram-se em austenita, resultando em uma estrutura composta por α + γ. Nesse caso, a austenita inicialmente desenvolvida na etapa intercrítica deveria exibir o teor de carbono da perlita e, com a transformação subsequente α → γ ainda nesse estágio, os átomos de carbono difundiriam para essa austenita recém formada, tornando esse constituinte mais homogêneo como um todo.

As amostras submetidas ao ciclo CC, por outro lado, apresentavam uma microestrutura prévia à etapa intercrítica composta totalmente por austenita, visto que o estágio intercrítico (730 °C) foi realizado após a permanência do material em uma temperatura do campo austenítico (860 °C), o que propiciou a nucleação de γ e crescimento dos grãos gerados. Nesse caso, durante a etapa intercrítica, a transformação observada foi γ → α, oposta à do ciclo CD, com a migração do carbono da região a ser transformada em ferrita para a austenita remanescente. Dessa forma, a ferrita já desenvolvida e a bainita formada posteriormente na austêmpera foram derivadas de uma austenita com grãos de dimensões mais elevadas, que começaram a crescer durante o estágio de austenitização completa, prosseguindo nas demais etapas antes da transformação nos outros constituintes. Considerando o ciclo CT, a têmpera realizada antes do tratamento intercrítico levou à formação de uma microestrutura predominantemente acicular, conforme a Figura 2. No aquecimento a 730°C, uma parte dessa estrutura transformou-se em austenita e outra parte em ferrita, sendo que essa última transformação possivelmente envolveu etapas de precipitação de carbonetos e difusão posterior do carbono para a austenita gerada. Dessa forma, pode-se supor que ao menos uma parte da ferrita presente surgiu a partir da transformação da estrutura TCC em estrutura CCC, mantendo, portanto, algo do formato relativamente acicular da martensita. A austenita desenvolvida no campo bifásico, por sua vez, possivelmente teve seu crescimento e sua morfologia limitados pelos grãos de ferrita mais alongados, o que impactou também no formato dos demais constituintes presentes (bainita e MA). CHIANG et al. [1111 CHIANG, J., LAWRENCE, B., BOYD, J.D., et al. “Effect of microstructure on retained austenite stability and work hardening of TRIP steels”, Materials Science and Engineering A, v. 528, pp. 4516-4521, 2011., 1212 CHIANG, J., BOYD, J.D., PILKEY, A.K., “Effect of microstructure on retained austenite stability and tensile behaviour in an aluminum-alloyed TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 638, pp. 132-142, 2015.] denominam de estrutura lamelar essa microestrutura acicular produzida a partir de estrutura martensítica submetida a recozimento intercrítico seguido de austêmpera.

Na Figura 5 estão exibidos os resultados da análise semiquantitativa dos constituintes ferrita, bainita e MA gerados pelo método de contagem de pontos, por meio do qual pode ser observada a influência do tempo de austêmpera na microestrutura final. Ressalta-se que a técnica foi empregada a partir de diversas imagens de distintas amostras de cada condição de tratamento térmico avaliada, com ampliação reduzida em relação às imagens previamente mostradas, como mencionado anteriormente, representando, portanto, uma média de comportamento observado. Nesse caso, mesmo com o desvio padrão apresentado, os resultados evidenciam uma tendência de comportamento da microestrutura quanto ao tempo de austêmpera.

Figura 5
Variação da proporção dos constituintes em função do tempo de austêmpera para as amostras submetidas aos ciclos a) CD, b) CC e c) CT.

Para os três ciclos térmicos foi verificado o aumento na fração volumétrica de bainita com a elevação do tempo de permanência na etapa de austêmpera. FONSTEIN [11 FONSTEIN, N., Advanced High Strength Sheet Steels: Physical Metallurgy, Design, Processing and Properties, 1 ed., Switzerland, Springer, 2015.] afirma que o tempo de permanência do material na temperatura de transformação bainítica seria a etapa mais importante do processamento térmico dos aços TRIP, devido à partição do carbono da bainita para a austenita, responsável por promover a estabilização austenítica à temperatura ambiente, e que com a elevação do tempo de austêmpera ocorre um aumento na fração volumétrica de bainita, como observado no presente trabalho. A proporção de ferrita sofreu uma flutuação discreta com o aumento do tempo de permanência na etapa de austêmpera. Nesse caso, uma vez que a ferrita presente na microestrutura é proveniente da etapa intercrítica, considerando o equilíbrio na transformação de fases nessa, sua quantidade deveria manter-se relativamente constante, mesmo com o aumento do tempo de austêmpera. Porém, como a técnica utilizada para a quantificação dos constituintes é baseada na identificação visual e que a microestrutura do material é, de certa forma, heterogênea, variações nos valores podem ser observados. Ressalta-se que, mesmo com alguma alteração, a proporção de ferrita situou-se, em geral, próxima ao valor teoricamente esperado, de 61%, determinado de acordo com o digrama de fases para a composição química do aço investigado. Por fim, em relação à variação na fração volumétrica de MA, percebe-se, para os três ciclos, uma redução desse constituinte com a elevação do tempo de austêmpera. DING et al. [77 DING, W., HEDSTRÖM, P., LI, Y., “Heat treatment, microstructure and mechanical properties of a C–Mn–Al–P hot dip galvanizing TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 674, pp. 151-157, 2016.] explicam que se o tempo de austêmpera é muito curto, pouca bainita é formada e, conseqüentemente, há uma grande quantidade de austenita disponível para compor o constituinte MA.

3.2 Análise da fração volumétrica de austenita retida e seu teor de carbono

Na Figura 6 são exibidas as curvas referentes à fração volumétrica de austenita retida (AR) e ao teor de carbono presente nessa fase em função dos tempos de austêmpera utilizados nos três ciclos térmicos.

Figura 6
Variação da fração volumétrica e do teor de carbono da austenita retida em função do tempo de austêmpera para os ciclos a) CD, b) CC e c) CT.

Verifica-se que, em geral, há uma tendência de aumento da fração de AR, bem como de seu teor de carbono, com a elevação do tempo de permanência na temperatura de transformação bainítica. Sabe-se que o volume de austenita retida na microestrutura é diretamente associado à formação de bainita [1212 CHIANG, J., BOYD, J.D., PILKEY, A.K., “Effect of microstructure on retained austenite stability and tensile behaviour in an aluminum-alloyed TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 638, pp. 132-142, 2015., 1313 SUGIMOTO, K., MUKHERJEE, M., “TRIP aided and complex phase steels”, In: RANA R., SINGH, S.B., Automotive steels: design, metallurgy, processing and applications, 1 ed., chapter 8, Woodhead Publishing, 2017.]. Nesse caso, à medida que essa bainita é formada durante a austêmpera, ocorre a partição do carbono, aumentando a concentração desse elemento na austenita remanescente. Evita-se, assim, que essa austenita transforme-se completamente em martensita quando o aço é resfriado até a temperatura ambiente, melhorando, portanto, a sua estabilidade térmica [2020 EBNER, S., SUPPAN, C., SCHNITZER, R., et al. “Microstructure and mechanical properties of a low C steel subjected to bainitic or quenching and partitioning heat treatments”, Materials Science and Engineering A, v. 735, pp. 1-9, 2018.]. Dessa forma, a princípio, com a elevação do tempo, quanto mais bainita transformada, mais carbono estaria presente na austenita e, após o resfriamento, maior proporção de austenita retida seria verificada. Esses resultados estão de acordo com a tendência de diminuição na proporção de constituinte MA ao final dos ciclos térmicos com a elevação do tempo de austêmpera observada por meio da análise semiquantitativa (Figura 5). A redução na proporção de MA com a elevação da quantidade de bainita teria origem na menor proporção de austenita disponível ao final do tempo de austêmpera, o que também contribuiria, a princípio, para que a fase mencionada apresentasse maior teor de carbono e, conseqüentemente, fosse mais estável termicamente. Por fim, para o ciclo CT, no entanto, foi observada uma leve queda na quantidade de AR entre os tempos de 120s e 360s. Segundo CHIANG et al. [1111 CHIANG, J., LAWRENCE, B., BOYD, J.D., et al. “Effect of microstructure on retained austenite stability and work hardening of TRIP steels”, Materials Science and Engineering A, v. 528, pp. 4516-4521, 2011., 1212 CHIANG, J., BOYD, J.D., PILKEY, A.K., “Effect of microstructure on retained austenite stability and tensile behaviour in an aluminum-alloyed TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 638, pp. 132-142, 2015.], nesta etapa do processamento térmico ainda existe a possibilidade de desenvolvimento de carbonetos a partir do carbono rejeitado pela bainita em formação, o qual deixa de enriquecer a austenita que, por sua vez, pode tornar-se menos estável à temperatura ambiente.

Considerando os três ciclos térmicos investigados, nota-se que o CT levou a maiores níveis de austenita retida, seguido do CC e, por fim, do CD. Ao confrontar esse comportamento com os resultados de teor de carbono, observa-se que, em geral, o ciclo CD foi aquele cuja quantidade de carbono na austenita retida atingiu os maiores níveis, seguido dos ciclos CT e CC, não acompanhando totalmente, portanto, o comportamento verificado em termos de proporção de AR. Ainda que o teor de carbono seja um dos aspectos fundamentais para a estabilidade térmica da austenita, outros fatores também exercem influência nos resultados, como o tamanho de grão e a morfologia da própria austenita, as características das fases ou constituintes que a circundam e ainda a orientação cristalográfica [2121 KAMMOUNI, A., SAIKALY, W., DUMONT, M., et al. “Effect of the bainitic transformation temperature on retained austenite fraction and stability in Ti microalloyed TRIP steels”, Materials Science and Engineering A, v. 518, pp. 89-96, 2009., 22 BILLUR, E., ALTAN T., “Three generations of advanced high-strength steels for automotive applications, Part I: The first generation”, Stamping Journal, pp.16-17, 2013.2]. A avaliação do efeito particular de cada um dos parâmetros mencionados, no entanto, pode ser considerada limitada, pois muitas vezes esses não são modificados individualmente no processamento [2222 TJAHJANTO, D. D., SUIKER, A. S. J., TURTELTAUB, S., et al. “Parametric study of multiphase TRIP steels undergoing cyclic loading”, Computational Materials Science, v. 50, pp. 1490-1498, 2011.]. Uma vez que os tratamentos térmicos empregados para produzir a estrutura multifásica no presente trabalho apresentavam seqüências diversas de transformações de fase na etapa intercrítica, a diferença de comportamento da austenita retida quanto ao teor de carbono pode estar associada ao fato de que a microestrutura gerada em cada ciclo possui distintas características, comentadas nas Figuras 3 e 4, como morfologia e dimensões diferentes, que irão influenciar, em adição ao teor de carbono, a quantidade de AR para cada condição. Por fim, ressalta-se que a importância da austenita retida no material está relacionada ao fato de que o efeito TRIP é caracterizado pela ocorrência de transformação de fase induzida pela plasticidade, ou seja, é baseado na transformação da austenita retida, obtida por processamento anterior, em martensita durante a deformação plástica subseqüente. Esse fenômeno tem por conseqüência a elevação da taxa de encruamento do material que, por sua vez, adia o início da estricção, aumentando a capacidade de deformação uniforme do aço, significando, portanto, maiores ductilidade e tenacidade.

3.3 Análise da dureza

Os resultados de dureza Vickers, acompanhados de seus desvios padrão, estão representados graficamente na Figura 7. Em geral, observa-se uma redução dos valores médios de dureza das amostras em função da elevação do tempo de austêmpera, para os três tipos de ciclos térmicos investigados. Esses resultados estão relacionados à elevação da proporção de bainita na microestrutura em tempos de austêmpera mais longos o que, por sua vez, está associado ao mecanismo de estabilização da austenita e, conseqüentemente, à formação de menor quantidade martensita no material, constituinte que, isoladamente, apresenta maior dureza. Essa estabilização da fase austenítica reduz a temperatura de início de transformação martensítica (Ms) [66 SAEIDI, N., RAEISSI, M., VAGHEI, H.R., et al. “Extraordinary strength and ductility obtained in transformation-induced plasticity steel by slightly modifying its chemical composition”, Materials Science and Engineering A, v. 702, pp. 225-231, 2017., 77 DING, W., HEDSTRÖM, P., LI, Y., “Heat treatment, microstructure and mechanical properties of a C–Mn–Al–P hot dip galvanizing TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 674, pp. 151-157, 2016., 1010 BLECK, W. GUO, X., MA, Y., “The TRIP effect and its application in cold formable sheet steels”, Steel Research International, v. 88, n. 10, pp. 1-21, 2017.], fazendo com que, à medida que o tempo de austêmpera é elevado, menos austenita se transforme em martensita ao final do tratamento térmico, resultando em uma dureza menor do material, conforme foi observado. Além disso, como foi verificado na análise semiquantitativa dos constituintes, ocorreu, no geral, uma tendência de diminuição da proporção de MA em função do aumento do tempo de austêmpera, fator que comprova a redução na quantidade de martensita, uma vez que a proporção de austenita apresentou comportamento contrário, elevando-se com o aumento do tempo de austêmpera.

Figura 7
Dureza Vickers em função do tempo de austêmpera para os ciclos a) CD, b) CC e c) CT.

Analisando, finalmente, a diferença de dureza encontrada entre as microestruturas obtidas por meio dos distintos ciclos térmicos, o ciclo CT apresentou os valores mais elevados, seguido dos ciclos CC e CD. Esse comportamento pode ser relacionado à estimativa de proporção dos constituintes, especialmente ao constituinte MA, mostrada na Figura 5. Observa-se que a proporção de constituinte MA, em geral, foi maior na seguinte ordem: ciclos CT, CC e CD. Em adição à fração volumétrica de MA, pode-se ainda ressaltar as características particulares de cada microestrutura multiconstituída desenvolvida, destacando-se o fato de que a rota térmica CT gerou uma estrutura aparentemente mais refinada como um todo.

Ainda que não tenha sido avaliado no presente trabalho o comportamento do material em relação a outras propriedades, como resistência e ductilidade, diversos estudos, envolvendo processamentos térmicos distintos, associaram as características das microestruturas multiconstituídas desenvolvidas ao desempenho mecânico do aço assistido pelo efeito TRIP. DING et al. [77 DING, W., HEDSTRÖM, P., LI, Y., “Heat treatment, microstructure and mechanical properties of a C–Mn–Al–P hot dip galvanizing TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 674, pp. 151-157, 2016.], por exemplo, empregando operações similares ao ciclo térmico direto CD, concluíram que os parâmetros de austêmpera seriam aqueles que alterariam de forma mais acentuada a estrutura do material e suas propriedades. Nesse caso, observaram que, similarmente ao que é mostrado nas Figuras 5 e 6, a elevação do tempo de austêmpera levaria à redução na proporção de martensita e ao aumento da quantidade de austenita retida e de seu teor de carbono, características que implicariam na diminuição do limite de resistência à tração e no aumento do alongamento percentual. CHIANG et al. [1212 CHIANG, J., BOYD, J.D., PILKEY, A.K., “Effect of microstructure on retained austenite stability and tensile behaviour in an aluminum-alloyed TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 638, pp. 132-142, 2015.], por outro lado, comparando as microestruturas e propriedades geradas em tratamentos análogos aos dos ciclos CD e CT, porém conduzidos com parâmetros distintos daqueles investigados no presente trabalho, mostraram que, além da elevação em geral da quantidade de austenita retida com o tempo de austêmpera, o processamento CT, gerando uma estrutura denominada como um todo de lamelar, resultaria em valores menores de limite de resistência e maiores de alongamento uniforme, em comparação com a estrutura equiaxial obtida por meio do tratamento CD. Esses resultados estariam relacionados a diferenças de estabilidade mecânica da austenita retida desenvolvida em cada uma das operações. Essa estabilidade mecânica, associada à ocorrência da transformação de fase induzida por deformação plástica – efeito TRIP, seria, por sua vez, influenciada basicamente pelo teor de carbono da austenita retida, dimensões e morfologia dessa e ainda pelo tipo ou características das fases/constituintes adjacentes [1212 CHIANG, J., BOYD, J.D., PILKEY, A.K., “Effect of microstructure on retained austenite stability and tensile behaviour in an aluminum-alloyed TRIP steel”, Materials Science and Engineering A, v. 638, pp. 132-142, 2015.]. Dessa forma, verifica-se que o comportamento mecânico subseqüente do aço com microestrutura multiconstituída assistido pelo efeito TRIP dependeria não somente da presença e da quantidade das fases ou constituintes, mas ainda de outros fatores, justificando a importância de investigar os efeitos do tipo de ciclo térmico e de seus parâmetros.

4. CONCLUSÕES

A aplicação de ciclos térmicos distintos, compostos por etapas diferentes e temperaturas de encharque variadas, ao mesmo material levaram ao desenvolvimento de microestruturas cujos constituintes apresentaram algumas diferenças em termos de morfologia e dimensões.

Além disso, os diversos tempos de austêmpera resultaram na variação das proporções dos constituintes da microestrutura (ferrita, bainita e constituinte MA) e da quantidade de austenita retida, bem como de seu teor de carbono. Dentre os três tipos de processamentos térmicos, o ciclo com têmpera prévia (CT) foi o que resultou em maior quantidade de austenita retida, para os três tempos de austêmpera investigados no trabalho.

Essas diferenças microestruturais, tanto em termos de morfologia e tamanho, quanto em relação à quantidade de cada constituinte, refletiram na dureza das amostras. Verificou-se que a elevação do tempo de permanência na temperatura de transformação bainítica levou, no geral, à redução dos valores para as três rotas térmicas estudadas. Quanto aos efeitos das características do processamento térmico, o ciclo com têmpera prévia CT foi o que levou a maiores valores de dureza, seguido pelo ciclo contínuo (CC).

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à CAPES, à FAPEMIG e à FINEP pelo apoio financeiro e ao Centro de Microscopia da UFMG pela utilização do microscópio eletrônico de varredura.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    03 Jun 2020
  • Aceito
    31 Jan 2022
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