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Alteração dimensional de amálgama de prata e liga à base de gálio

Dimensional alteration of silver amalgam and gallium-based alloy

Resumos

As ligas de gálio surgiram como alternativa à problemática da toxicidade do mercúrio. Apresentam propriedades semelhantes às do amálgama, mas as pesquisas apontam duas características desfavoráveis: corrosão excessiva e grande magnitude de expansão de presa, podendo causar fraturas e rachaduras nas estruturas dentais. O objetivo foi avaliar in vitro a alteração dimensional durante 7 dias de uma liga de gálio (Galloy, SDI, Austrália), comparativamente com uma liga de amálgama contendo zinco (F-400, SDI, Austrália), em função do contato e/ou contaminação com solução salina (NaCl 0,9%) nos estágios iniciais da cristalização. As condições experimentais de armazenagem foram em: ambiente seco; armazenagem em solução salina e contaminação com solução salina durante a condensação. Para o amálgama, foi ainda estudada a condição de contaminação introduzida na cápsula durante a trituração e para a liga de gálio, a proteção com resina fluida durante as primeiras 24 h ou durante todo o experimento. Os corpos-de-prova foram mantidos à temperatura de 37ºC ± 1ºC e suas dimensões monitoradas a cada 24 h, durante sete dias. O contato da liga de gálio com a solução salina durante a condensação ou nas primeiras horas após a condensação desencadeou uma expansão significantemente maior que as outras condições experimentais ao fim dos 7 dias. A aplicação de uma resina fluida para proteger a superfície dos cilindros foi capaz de evitar o aumento da expansão provocado pela umidade superficial. O amálgama não apresentou alterações significantes em nenhuma das condições experimentais, exceto quando contaminado durante a trituração.

Amálgama dentário; Ligas dentárias; Gálio


Gallium-based dental alloys were created with the aim of solving the problem of toxicity of mercury. The material shows mechanical properties similar to those of dental amalgam, but researches point out two unfavorable characteristics: great corrosion and excessive post-setting expansion, and the latter is capable of cracking dental structures. The aim of this study was to evaluate, during 7 days, the in vitro dimensional alteration of a gallium dental alloy (Galloy, SDI, Australia), in comparison with a dental amalgam containing zinc (F400, SDI, Australia), as a function of the contact with saline solution (0.9% NaCl) during the setting period. The storage experimental conditions were: storage in dry environment, immersion in saline solution and contamination during condensation. Additionally, the effects of contamination during the trituration of dental amalgam and the effects of protecting the surface of the gallium alloy with a fluid resin were studied. Specimens were stored at 37ºC ± 1ºC, and measuring was carried out, sequentially, every 24 h during 7 days. When the gallium alloy was either contaminated or immersed, an expansion significantly greater than that observed in the other experimental conditions was noticed after 7 days. The application of a fluid resin to protect the surface of the cylinders was able to avoid the increase in expansion caused by superficial moisture. The amalgam alloy did not show significant dimensional alterations, except when it was contaminated during trituration.

Dental amalgam; Dental alloys; Gallium


Materiais Dentários

Alteração dimensional de amálgama de prata e liga à base de gálio

Dimensional alteration of silver amalgam and gallium-based alloy

Rafael Yagüe BALLESTER* * Professor Associado; *** Doutorando – Departamento de Materiais Dentários da Faculdade de Odontologia da USP.

Roberto Adrian MARKARIAN** * Professor Associado; *** Doutorando – Departamento de Materiais Dentários da Faculdade de Odontologia da USP.

Alessandro Dourado LOGUERCIO*** * Professor Associado; *** Doutorando – Departamento de Materiais Dentários da Faculdade de Odontologia da USP.

BALLESTER, R. Y.; MARKARIAN, R. A.; LOGUERCIO, A. D. Alteração dimensional de amálgama de prata e liga à base de gálio. Pesqui Odontol Bras, v. 15, n. 4, p. 341-347, out./dez. 2001.

As ligas de gálio surgiram como alternativa à problemática da toxicidade do mercúrio. Apresentam propriedades semelhantes às do amálgama, mas as pesquisas apontam duas características desfavoráveis: corrosão excessiva e grande magnitude de expansão de presa, podendo causar fraturas e rachaduras nas estruturas dentais. O objetivo foi avaliar in vitro a alteração dimensional durante 7 dias de uma liga de gálio (Galloy, SDI, Austrália), comparativamente com uma liga de amálgama contendo zinco (F-400, SDI, Austrália), em função do contato e/ou contaminação com solução salina (NaCl 0,9%) nos estágios iniciais da cristalização. As condições experimentais de armazenagem foram em: ambiente seco; armazenagem em solução salina e contaminação com solução salina durante a condensação. Para o amálgama, foi ainda estudada a condição de contaminação introduzida na cápsula durante a trituração e para a liga de gálio, a proteção com resina fluida durante as primeiras 24 h ou durante todo o experimento. Os corpos-de-prova foram mantidos à temperatura de 37ºC ± 1ºC e suas dimensões monitoradas a cada 24 h, durante sete dias. O contato da liga de gálio com a solução salina durante a condensação ou nas primeiras horas após a condensação desencadeou uma expansão significantemente maior que as outras condições experimentais ao fim dos 7 dias. A aplicação de uma resina fluida para proteger a superfície dos cilindros foi capaz de evitar o aumento da expansão provocado pela umidade superficial. O amálgama não apresentou alterações significantes em nenhuma das condições experimentais, exceto quando contaminado durante a trituração.

UNITERMOS: Amálgama dentário; Ligas dentárias; Gálio.

INTRODUÇÃO

O amálgama de prata vem sendo utilizado como material restaurador por mais de 150 anos, e isso se deve às suas características positivas, tais como a facilidade de manipulação, o baixo custo, as propriedades mecânicas condizentes com suas indicações (notadamente a resistência ao desgaste), a capacidade de autovedamento marginal com o decorrer do tempo e, sobretudo, pela longa experiência de utilização clínica7.

O uso do amálgama tem sobrevivido às controvérsias levantadas desde há mais de cem anos. Na atualidade, as pressões para obtenção de resultados estéticos, ou por parte de grupos ambientalistas, ou de defensores da medicina ortomolecular, preocupados com a toxicidade do mercúrio, têm levado a propor outras alternativas18.

Uma dessas alternativas seria o uso de ligas com gálio que, como o mercúrio, permanece líquido à temperatura ambiente (29,8ºC). As ligas de gálio permanecem plásticas por um curto espaço de tempo após a trituração, podendo então ser inseridas na cavidade preparada23. Em meados da década de 50, ocorreu a idéia de substituir o mercúrio pelo gálio19,20, mas só na última década é que duas ligas que utilizam esse metal foram lançadas no mercado: Gallium Alloy GF (Tokurike Holtan - Japão) e Galloy (SDI - Austrália).

A Gallium Alloy GF apresenta-se em um sistema pó-líquido (semelhante ao do amálgama), contendo uma mistura de Ga-In-Sn no líquido e Ag-Pd-Cu no pó. Posteriormente, foi lançada uma versão melhorada dessa liga, denominada Gallium Alloy GF II. A marca Galloy é constituída por um pó metálico semelhante ao do amálgama, com Ag-Sn-Cu, sem Pd (considerado deletério nas formulações anteriores), e um líquido contendo Ga-In-Sn10. Esta liga apresentou facilidade de manipulação e melhores propriedades mecânicas que as primeiras24. Além disso, cumpriu os requisitos da especificação n° 1 da ANSI/ADA, recebendo em 1994 seu selo de aprovação, sendo ainda aceita pela FDA (Food and Drug Administration - EUA) e pelo Scandinavian Institute of Dental Materials13,14.

As características de manipulação das ligas de gálio lembram as do amálgama de prata por serem trituradas, condensadas, esculpidas e polidas de forma muito semelhante10,16,25. Em testes laboratoriais, a liga de gálio apresentou resistência à compressão e à tração diametral1,5, microinfiltração7 e retenção mecânica em cavidades6 semelhantes às do amálgama. Entretanto, o valor de "creep"5, o limite de fadiga26, e a resistência ao cisalhamento21 foram maiores para as ligas de gálio. VENUGOPALAN et al.22 (1998) atribuíram um índice de corrosão mil vezes maior para a liga de gálio do que para o amálgama e, além disso, demonstraram que a contaminação com água causa uma grande expansão da liga pela formação de óxidos com grande volume molecular no interior da restauração.

Os estudos clínicos também apontam para a precoce deterioração superficial da restauração. KAGA et al.10 (1996) verificaram que, após 4 meses, 81% das restaurações de gálio em cavidades classe I de dentes decíduos obtiveram notas Bravo ou Charlie para aparência superficial, adquirindo uma coloração enegrecida e uma textura rugosa que persistiu.

Num acompanhamento clínico realizado por PRAZERES17 (1996), foi demonstrado que restaurações feitas com uma liga de gálio foram responsáveis pelo aparecimento de dor pós-operatória permanente e/ou crescente, bem como por fraturas e trincas ocorridas nas coroas dentais, o que impossibilitou a continuidade dos testes clínicos. Isto também foi confirmado por NAVARRO et al. 11 (1996) num estudo em que, após 8 meses, algumas restaurações tiveram de ser substituídas devido ao elevado número de fraturas e de sensibilidade. Pelas mesmas razões, NEO et al.12 (2000) substituíram 43% das restaurações realizadas com uma liga de gálio, em seu acompanhamento clínico de um ano, enquanto apenas uma restauração de amálgama (1,6%) necessitou ser refeita.

Em estudo recente, OSBORNE; SUMMITT14 (1999) contra-indicaram o uso clínico das ligas de gálio mesmo em cavidades classe I conservadoras, pois após três anos de acompanhamento, ocorreram complicações como dor e fraturas dentais, além de grande porcentagem de corrosão (32%) e rugosidade superficial (37%). Os mesmos sinais de deterioração das restaurações já eram evidentes no acompanhamento clínico de 2 anos15.

O mesmo autor verificou em outro estudo13 que essas falhas se deram pelo contato da liga de gálio com umidade. A contaminação causou a expansão do material, extruindo-o de um molde de resina fotoelástica, com aparecimento de grandes tensões após 6 semanas. Também foi notada a formação de produtos de corrosão na superfície do corpo-de-prova.

Para tentar contornar o problema da umidade, o fabricante da liga Galloy preconiza uma técnica metódica, com isolamento do campo operatório, impermeabilização das paredes cavitárias e proteção da superfície exposta da restauração com uma camada de resina fluida. Entretanto, não existem dados na literatura que comprovem a eficácia do procedimento.

O presente trabalho se propôs a avaliar a alteração dimensional in vitro nos primeiros sete dias de uma liga à base de gálio, comparando-a com a de um amálgama de prata contendo zinco, em função do contato e contaminação com umidade nos estágios iniciais de presa.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizadas uma liga para amálgama de prata contendo zinco com partículas em forma de aparas finas (F-400, SDI, Austrália, lote 605301052896) e uma liga à base de gálio (Galloy, SDI, Austrália, lote 609016). A metodologia utilizada para a confecção dos corpos-de-prova e a tomada das medidas seguiu a especificação nº 1 da ADA2,3 para alteração dimensional de amálgamas dentários, produzindo espécimes cilíndricos de 4 mm de diâmetro por 8 mm de altura. Este procedimento foi adotado, na falta de uma norma específica para as ligas de gálio, baseando-se na similaridade dos materiais.

Foram utilizadas para os dois materiais cápsulas de 2 porções, suficientes para a construção do corpo-de-prova no tamanho especificado, trituradas em amalgamador (Ultramat 2, SDI, Austrália) pelo tempo recomendado pelo fabricante (8 segundos). Os grupos experimentais utilizados estão descritos na Tabela 1.

O ambiente de armazenagem "seco" foi caracterizado pelo contato apenas com o ar. O ambiente úmido era obtido pela imersão em solução salina (NaCl 0,9%). Em ambos casos, a temperatura foi mantida a 37ºC.

Os grupos C e G foram contaminados durante a condensação, mediante o gotejamento de 3 gotículas de solução salina (3 ml cada) entre cada um dos quatro incrementos, em que a massa plástica foi inserida na matriz, antes de ser condensada, de modo a assegurar que realmente entrasse em contato com o contaminante. No grupo D, a contaminação foi mais intensa: inicialmente a liga foi triturada por 4 segundos; procedeu-se então à abertura da cápsula para introdução de 1 ml de solução salina, fechamento e complementação da trituração por outros quatro segundos. Esta contaminação mais intensa foi projetada com a finalidade de se obter uma condição "controle positivo de expansão tardia" do amálgama, já que o plano piloto mostrou que a contaminação introduzida durante a condensação preconizada pela ADA2,3, não era eficiente para produzir a expansão tardia correspondente.

No caso da liga com gálio, foram testados dois modos de armazenamento inspirados nas indicações do fabricante (grupos H e I): o cilindro recém-condensado foi protegido com a resina fluida fornecida juntamente ao kit da Galloy (Galloy Sealant, SDI, Austrália, lote 61010), aplicada conforme a indicação do fabricante (duas camadas, cada uma fotopolimerizada por 20 s). A resina fluida possui em sua constituição trietilenoglicol dimetacrilato, uretano dimetacrilado, EBADMA, e Bis-GMA, sem carga inorgânica. Como unidade ativadora, foi utilizado o fotopolimerizador QHL75 (Dentsply, EUA). No grupo I, o selante foi raspado após 24 horas de modo a verificar os efeitos do contato da liga de gálio com umidade após esse período; no grupo H o selante permaneceu em posição durante todo o tempo da experiência.

Para cada grupo experimental, foram confeccionados três corpos-de-prova. Todos os corpos-de-prova foram mantidos em estufa à temperatura de 37ºC ± 1ºC durante todo o período de estudo. As medidas foram obtidas com relógios comparadores digitais (Sylvac, Suíça) para alteração dimensional linear com precisão de 10-3 mm. Foram especialmente confeccionadas estruturas metálicas de aço inox para montagem das unidades de medição (Figura 1), os corpos-de-prova eram colocados em posição antes dos cinco minutos após o fim da trituração; o relógio comparador era zerado no tempo de cinco minutos (medida inicial) e o corpo-de-prova não era mais removido do lugar até o final da experiência, exceto para o grupo I, em que o espécime era retirado para raspagem da resina fluida após o tempo de 24 horas. Antes da retirada, o valor de expansão até o momento era registrado e as expansões ocorridas após a raspagem e reposicionamento do corpo-de-prova eram somadas à expansão registrada. Os valores de alteração dimensional foram colhidos a cada 24 horas durante 7 dias, totalizando sete dados seqüenciais por corpo-de-prova. Os resultados foram transformados em mm/cm e então submetidos a análise de variância (programa MINITAB), levando-se em consideração apenas duas fontes de variação: grupo experimental (em nove níveis) e tempo (em dois níveis), aplicando-se o teste de contraste de Tukey (a = 0,05).


RESULTADOS

A análise de variância apontou diferenças significantes entre tempos (p < 0,000), entre grupos experimentais (p < 0,000) e na interação entre eles (p = 0,017). A Tabela 2 apresenta as médias das interações e as comparações estatísticas.

Para o amálgama, tanto para 24 horas como para 7 dias, apenas o grupo D (amálgama contaminado durante a trituração) apresentou expansão significativamente maior, que também foi maior aos 7 dias quando comparada com a de 24 horas.

Para a liga de gálio, os grupos não apresentaram diferenças dentro do tempo de 24 horas. Entretanto, os grupos F e G apresentaram-se significantemente mais expandidos em relação às outras condições em 7 dias e também na comparação entre os tempos, evidenciando que houve expansão significativa entre 24 horas e 7 dias, do mesmo modo que para o grupo D (amálgama contaminado na trituração).

DISCUSSÃO

Os resultados deste estudo laboratorial concordam com os achados na literatura. O controle da umidade demonstrou ser crítico na utilização das ligas de gálio, podendo trazer como principal conseqüência a expansão em médio prazo.

As médias de alteração dimensional da Galloy mantiveram-se dentro dos limites da ADA. Porém, é preciso destacar que a especificação nº1 da ADA2,3 apresenta como valor aceitável ± 20 mm/cm de alteração dimensional do amálgama para as primeiras 24 horas, pois deve considerar que este período é suficiente para completar a reação de presa dos amálgamas não contaminados.

Esta especificação não foi projetada para monitorar, por exemplo, os efeitos da contaminação de amálgamas com zinco, que podem resultar em alterações dimensionais tardias e prejuízo nas propriedades mecânicas, mesmo depois de concluído o endurecimento, por ocorrerem reações químicas após a cristalização4. Assim, embora existam semelhanças entre os amálgamas e as ligas de gálio, a norma da ADA para amálgama não é suficiente para garantir certificação de ligas de gálio, pois estas apresentam uma reação de cristalização que parece ser mais complexa e prolongada que a do amálgama8, podendo sofrer interferências de efeito retardado sobre sua estabilidade dimensional provocadas por contaminantes incorporados durante os estágios iniciais da presa.

Enquanto o amálgama parece não ser crítico quanto à alteração dimensional, pelo contato com umidade nos momentos iniciais após a condensação, a liga de gálio foi severamente afetada.

A contaminação do amálgama durante a condensação (grupo C) não foi suficiente para promover expansões tardias no período de 7 dias, sendo necessária a contaminação da cápsula para observar tais efeitos. Ao observar os resultados, podemos perceber que, independentemente do tratamento, os grupos de amálgama de prata comportaram-se de maneira similar. Apenas a contaminação introduzida na cápsula durante a trituração (grupo D) ocasionou expansões maiores do que o permitido pela norma após 7 dias. Verificou-se também que a contaminação de uma liga de amálgama, contendo zinco, com solução salina é menos crítica que para as ligas de gálio (comparar os grupos B e C com os grupos F e G).

Teria sido de se esperar que o grupo de amálgama contaminado durante a condensação tivesse apresentado expansão exagerada no período de 7 dias. A explicação de não se ter verificado a expansão tardia está relacionada com o modo de confecção dos corpos-de-prova preconizado pela especificação: como a condensação é realizada de uma única vez aplicando uma pressão relativamente elevada (14 MPa) é possível que a solução contaminante, introduzida na fôrma cilíndrica junto com o amálgama, tenha sido removida completamente por ação da pressão de condensação sem ter chegado a interagir suficientemente com a massa plástica de amálgama. Com a extrusão do contaminante da massa de amálgama, não ocorreriam as reações entre a água e o zinco que pudessem provocar a expansão tardia.

No caso da liga de gálio, não ficou claro se este tipo de contaminação foi suficiente para provocar expansão significativamente maior após 7 dias, já que o grupo F não foi contaminado e, assim como o grupo G, apresentou expansão significativamente maior aos 7 dias. Isto indicaria que basta o contato com umidade durante estágios iniciais do armazenamento para provocar expansão maior aos 7 dias, o que mascararia o possível efeito da contaminação durante a condensação. O gráfico de alteração dimensional em função do tempo indica que a curva de alteração dimensional está ainda em ascensão, fazendo prever que continue a expandir mesmo decorridos os sete dias (Gráfico 1). HUANG et al.9 (1999) observaram uma alteração dimensional contínua em 60 dias de observação da liga Galloy armazenada em diferentes ambientes, tendendo a persistir por um maior período de tempo. Esta característica aponta para a necessidade de elaborar uma norma específica para as ligas de gálio e ajuda a compreender o motivo da restrição para o uso clínico recentemente feitas por OSBORNE; SUMMITT14 (1999). Os cilindros da liga de gálio mantidos em ambiente seco ou protegidos da umidade nas primeiras 24 horas permaneceram estáveis dimensionalmente (grupos E, H e I).


Os grupos H e I desta pesquisa simularam a proteção contra a umidade preconizada pelo fabricante. No teste in vitro parece ter sido eficiente para prevenir o progresso da expansão. Resta saber se este tipo de proteção seria eficaz nas condições clínicas, já que a camada protetora de resina não é aderente à liga de gálio: seria evidentemente perigoso para o paciente se essa película se desprendesse inadvertidamente por atrito durante a mastigação. A perda da proteção é virtualmente imperceptível, e as conseqüências em médio prazo podem ser desastrosas para a preservação do dente restaurado. OSBORNE; SUMMITT16 (1995) observaram a perda da camada de resina fluida na superfície da restauração após três meses de acompanhamento clínico.

A raspagem dos cilindros que possuíam proteção de selante após 24 horas de aplicação (grupo I) não levou a variações dimensionais significantes, comportando-se de maneira similar aos grupos do gálio seco e àquele com aplicação de selante (grupos E e H). VENUGOPALAN et al.22 (1998) justificam este achado, pois afirmam que, após a reação de presa, não existe o perigo de expansão da liga por contato com umidade.

Nos cilindros da liga de gálio mantidos em ambiente seco, observamos a formação de uma gotícula semelhante em aspecto ao gálio em estado líquido. Nos espécimes mantidos em ambiente úmido, foram encontrados produtos de corrosão com coloração branca ou marrom. Depósitos semelhantes foram descritos por VENUGOPALAN et al.22 (1998), sendo que o produto marrom correspondia ao Ga2O3, enquanto o branco foi identificado como SnO2.

CONCLUSÕES

1.O amálgama de prata e a liga de gálio apresentam alterações dimensionais semelhantes quando cristalizam em ambiente seco e não são contaminados.

2.Quando a liga de gálio cristaliza tomando contato superficial com umidade nas primeiras horas (grupo F), apresenta uma expansão progressiva que, aos 7 dias, alcança valores semelhantes aos de um amálgama com zinco efetivamente contaminado com umidade.

3.A resina fluida aplicada na superfície da liga de gálio logo após sua condensação é eficiente para prevenir o efeito expansivo da umidade circundante.

AGRADECIMENTOS

Este projeto contou com apoio financeiro do CNPq, e da empresa SDI, que forneceu as ligas necessárias para a realização dos estudos. Agradecemos a ilustração da Figura 1 a Paulo Santos e Antonio Carlos Lascala e à FAPESP (99/05124-0) pelo apoio a Alessandro Dourado Loguercio.

BALLESTER, R. Y.; MARKARIAN, R. A.; LOGUERGIO, A. D. Dimensional alteration of silver amalgam and gallium-based alloy. Pesqui Odontol Bras, v. 15, n. 4, p. 341-347, out./dez. 2001.

Gallium-based dental alloys were created with the aim of solving the problem of toxicity of mercury. The material shows mechanical properties similar to those of dental amalgam, but researches point out two unfavorable characteristics: great corrosion and excessive post-setting expansion, and the latter is capable of cracking dental structures. The aim of this study was to evaluate, during 7 days, the in vitro dimensional alteration of a gallium dental alloy (Galloy, SDI, Australia), in comparison with a dental amalgam containing zinc (F400, SDI, Australia), as a function of the contact with saline solution (0.9% NaCl) during the setting period. The storage experimental conditions were: storage in dry environment, immersion in saline solution and contamination during condensation. Additionally, the effects of contamination during the trituration of dental amalgam and the effects of protecting the surface of the gallium alloy with a fluid resin were studied. Specimens were stored at 37ºC ± 1ºC, and measuring was carried out, sequentially, every 24 h during 7 days. When the gallium alloy was either contaminated or immersed, an expansion significantly greater than that observed in the other experimental conditions was noticed after 7 days. The application of a fluid resin to protect the surface of the cylinders was able to avoid the increase in expansion caused by superficial moisture. The amalgam alloy did not show significant dimensional alterations, except when it was contaminated during trituration.

UNITERMS: Dental amalgam; Dental alloys; Gallium.

Recebido para publicação em 16/11/00

Enviado para reformulação em 03/05/01

Aceito para publicação em 22/05/01

**Graduando do curso de Odontologia na USP, bolsista do PIBIC-CNPq (processo nº 112233/98-8).

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  • *
    Professor Associado;
    ***
    Doutorando – Departamento de Materiais Dentários da Faculdade de Odontologia da USP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Fev 2002
    • Data do Fascículo
      Dez 2001

    Histórico

    • Aceito
      22 Maio 2001
    • Revisado
      03 Maio 2001
    • Recebido
      16 Nov 2000
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