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A disciplinarização do ensino de Música e as contingências do meio escolar

Shaping music in Brazilian curricula and the constraints of the schooling environment

Resumos

A partir da promulgação da Lei 11.769/2008, a educação musical busca sua inserção e aceitação no contexto escolar. Neste artigo, são consideradas algumas características inerentes a este processo. É alegado que as teorizações advindas do campo dos estudos curriculares podem contribuir para o aprofundamento do assunto. Conclui-se que a busca por procedimentos e metodologias adequados pode ser improdutiva se não forem levadas em consideração as várias influências que os conhecimentos sofrem ao se tornarem disciplinas escolares.

ensino de música no Brasil; currículo de música; conhecimento escolar; disciplina escolar


Since the proclamation of Law 11.769/2008 in Brazil, music education has been seeking full acceptance as an academic focus in that country. This article considers some of the characteristics inherent in this process. It has been alleged that theories in the field of curricular development may contribute to the serious study of this subject. The article concludes that the search for appropriate procedures and methodologies may be unproductive if it does not take into consideration several influences that the study of music undergoes to become an educational discipline.

music teaching in Brazil; music curriculum; school knowledge; educational subjects


ARTIGOS CIENTÍFICOS

A disciplinarização do ensino de Música e as contingências do meio escolar1 1 Uma versão preliminar deste texto foi apresentada no ENDIPE (Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, 2010)

Shaping music in Brazilian curricula and the constraints of the schooling environment

Silvia Sobreira

UNIRIO, Rio de Janeiro, RJ, silviasobreira2009@gmail.com

RESUMO

A partir da promulgação da Lei 11.769/2008, a educação musical busca sua inserção e aceitação no contexto escolar. Neste artigo, são consideradas algumas características inerentes a este processo. É alegado que as teorizações advindas do campo dos estudos curriculares podem contribuir para o aprofundamento do assunto. Conclui-se que a busca por procedimentos e metodologias adequados pode ser improdutiva se não forem levadas em consideração as várias influências que os conhecimentos sofrem ao se tornarem disciplinas escolares.

Palavras chave: ensino de música no Brasil; currículo de música; conhecimento escolar; disciplina escolar.

ABSTRACT

Since the proclamation of Law 11.769/2008 in Brazil, music education has been seeking full acceptance as an academic focus in that country. This article considers some of the characteristics inherent in this process. It has been alleged that theories in the field of curricular development may contribute to the serious study of this subject. The article concludes that the search for appropriate procedures and methodologies may be unproductive if it does not take into consideration several influences that the study of music undergoes to become an educational discipline.

Keywords: music teaching in Brazil; music curriculum; school knowledge; educational subjects.

1 - Introdução

Este trabalho tem como objetivo contribuir para o debate sobre o ensino de música, tendo em vista a entrada em cena da lei nº 11.769/2008 que institui a música como conteúdo obrigatório nas escolas de Educação Básica. Nesse sentido, chamo atenção para a utilização da palavra conteúdo, no artigo 26 da Lei 11.769 2 2 Disponível em < http://leifederal.wordpress.com/2008/06/19/lei-9394/>. Acessado em 07/-2/2011. , que tem despertado dúvidas sobre o modo como a música deve ser implementada nas escolas. Por conteúdo, pode-se compreender a possibilidade de inserção do ensino de música em outros modelos, como em projetos, por exemplo, ou em atividades optativas. Contudo, como a lógica hegemônica da organização curricular é feita pela disciplinarização dos saberes, é compreensível a luta empreendida pelos educadores musicais para que seja aplicado o modelo tradicional, ou seja, disciplinar. Qualquer outro tipo de disposição não facilitaria um posicionamento do ensino de música no currículo equiparado ao das outras disciplinas já estabelecidas. Trago uma citação de Regina Marcia Simão Santos, pesquisadora do currículo de música que expõe os principais desejos dos professores, dos quais, destaco aqueles julgo relacionados à disposição da música dentro da hierarquia das disciplinas. Segundo a autora os professores de música

(...) 5) querem o direito e autoridade de dar nota e reprovar: 'de avaliar', como todo professor faz, em todas as outras disciplinas (o império da força reativa). Querem ter conteúdos obrigatórios e ordenados por série, para serem cumpridos. Acham que está tudo muito solto e que cada professor faz o que quer. Querem experimentar o 'poder' dos artefatos da 'cultura escolar', dos grupos disciplinares;(...).

7) querem a possibilidade de fazer funcionar 'na grade' aquilo que funciona 'fora da grade', como atividade 'extra-curricular' ( a oficina-coral, o grupo de percussão, o conjunto de flauta-doce). (SANTOS, 2005, p.53, aspas da autora).

Saliento que a não utilização do termo também ocorre em outras áreas. No artigo 26 da atual LDB (Lei nº 9.394/2006) pode-se considerar que apenas se especifica o ensino de Português e de Matemática:

§ 1º Os currículos a que se refere o caput devem abranger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política, especialmente do Brasil 3 3 Disponível em < http://leifederal.wordpress.com/2008/06/19/lei-9394/>. Acessado em 07/-2/2011. .

Isso deixa margem para que disciplinas como História e Geografia, por exemplo, possam ser acopladas em uma única disciplina ou colocadas no currículo de forma menos convencional. Química e Biologia também podem estar dentro de uma mesma disciplina que contemple "o mundo natural". Entretanto, as disciplinas tradicionais continuam nos currículos.

A divisão dos conteúdos curriculares em disciplinas escolares faz parte do cotidiano escolar, sendo um elemento de estruturação reconhecido pelos professores, alunos e sociedade (MACEDO; LOPES, 2002, p.73). Nessa visão contemporânea, a disciplina surge como a "principal manifestação do currículo" (GOODSON, 2001, p.75). Apesar de existirem tentativas e propostas no intuito de se operar o currículo de maneira integrada, a organização deste por disciplinas permanece hegemônica na escola dos tempos atuais.

Por isto, defendo que, apesar da utilização do termo "conteúdo", o processo pelo qual a música está sujeita a passar deve ser considerado um processo de disciplinarização, pois representa uma trajetória, envolvendo embates estabelecidos entre a comunidade disciplinar e grupos externos a ela pelo reconhecimento desta área do saber no currículo escolar em sua disposição hegemônica: compartimentado em disciplinas.

Também defendo que a Música passará, em seu processo de inserção como disciplina em escolas regulares, por contingências e injunções que possuem características semelhantes às que ocorrem em outras disciplinas. Sem deixar de considerar as especificidades do campo da educação musical, procuro um enfoque que privilegie, também, os elementos comuns com outras disciplinas, no intuito de ajudar a avançar nos debates específicos da área. Para nortear as reflexões aqui contidas, busco apoio nos franceses CHERVEL (1990), CHEVALLARD (1991), FORQUIN (1993) e JULIA (2001), além de produções brasileiras no campo do Currículo como as de LOPES (1999, 2002 e 2008) e FERREIRA (2007).

A mudança imposta pela lei nº 11.769/2008 ampliou o interesse sobre a problemática do ensino de música em escolas regulares, antes restrito a poucos educadores que atuavam naqueles contextos. Desde dezembro de 2009, a FUNARTE (Fundação Nacional de Artes), através de seu Centro de Música, vem conduzindo um processo de discussão com o objetivo de buscar estratégias que viabilizem a implementação do ensino de música. Entre as questões discutidas, destaco a preocupação com a formação docente e a proposta de elaboração, por um grupo de especialistas, "de material que possa orientar e fundamentar uma eventual reformulação curricular na área da educação musical (LEMOS, 2010, p.119). Além dos debates oficiais, os quais visam produzir sentidos que se transformarão em normas, o campo específico da educação musical tem se mobilizado para compreender o assunto, uma vez que a inserção da música como obrigatoriedade exigirá novas posturas dos educadores e também das instituições formadoras.

Muitas das preocupações que vêm afligindo os educadores musicais já foram problematizadas no campo mais abrangente dos estudos curriculares, embora tais estudos não sejam comumente utilizados como referencial teórico no campo da educação musical. Procurar compreender como determinados aspectos foram analisados por outras áreas de ensino pode ajudar a ampliar o enfoque nas questões que dizem respeito especificamente à educação musical.

A presença obrigatória do ensino de música em escolas não é um fato inédito, tendo ocorrido em outros períodos. No Estado de São Paulo, por exemplo, pode ser citada uma bem sucedida inserção da música como disciplina nas escolas públicas, movimento idealizado e posto em prática por João Gomes Júnior, na primeira década do século XX. (JARDIM, 2008, p. 59). Em se tratando, porém, de políticas de abrangência nacional, a questão do ensino de música se efetivou, pela primeira vez, na década de 1930 com a implantação do Canto Orfeônico, sob o comando de Villa-Lobos. Tendo deixado de ser obrigatório com a edição da Lei nº 4.024 de 1961, o ensino de música enfraqueceu, embora não tenha desaparecido. Entretanto, com a Lei nº 5.692/1971, a música voltou aos currículos como uma atividade embutida na área de Educação Artística. O ensino polivalente resultante desta lei é tido, pela maioria dos educadores, como responsável pela ausência do ensino de música nas escolas. A partir da atual Lei de Diretrizes e Bases, promulgada em 1996 (Lei nº 9.394/1996), a Música passou a ser uma das modalidades dentro do ensino de Artes. A sanção da Lei nº 11.769/2008, que vigora desde agosto de 2008, coloca a música como conteúdo obrigatório, embora não exclusivo, na Educação Básica, alterando o artigo 26 da Lei nº 9.394/1996. Desde sua promulgação, a lei fez emergir a urgência de se focalizar o ensino de música nas escolas regulares, alimentando debates, lançamento de livros didáticos e palestras sobre o assunto.

2 - A disciplinarização dos saberes

Seria imprudente dissertar a respeito do conhecimento difundido pela escola e dos problemas comuns na disciplinarização dos saberes sem definir determinados conceitos que são inerentes ao campo. Os processos pelos quais uma determinada área de conhecimento se torna uma disciplina escolar podem ser articulados com os conceitos de conhecimento escolar, de transposição didática, de cultura escolar, bem como com os estudos inseridos no campo da História das Disciplinas Escolares ampliando, assim, a compreensão do assunto. Esses elementos fornecem um referencial fértil para a compreensão da dinâmica dos vários e simultâneos processos que são comuns às disciplinas escolares em geral, influenciando o modo como os projetos pedagógicos serão configurados dentro da escola.

Defino conhecimento escolar nos temos propostos por LOPES (2002):

[...] instância própria de conhecimento que se define em relação aos demais saberes sociais, notadamente o conhecimento científico e o conhecimento cotidiano. O conhecimento escolar é compreendido assim como constituído por processos de transposição didática e disciplinarização que transformam o conhecimento científico das demais práticas sociais de referência segundo os objetivos da escolarização (LOPES, 2002, p.46).

Como se pode perceber, a citação anterior nos remete a outro conceito central para a compreensão do assunto aqui proposto: a transposição didática, termo utilizado para designar o processo de reorganização e adaptação que os saberes passam ao serem escolarizados. De acordo com a apreciação de autores como CHEVALLARD (1991), nessa transformação ocorreriam deturpações, surgidas em função da finalidade de didatização dos conteúdos.

Um exemplo que ilustra este tipo de raciocínio pode ser retirado do campo da educação musical. Sem mencionar o conceito de transposição didática, SWANWICK (2003) , eminente teórico e educador musical inglês, demonstra se aproximar da concepção de CHEVALLARD (1991):

A educação musical não é problemática até que venha à superfície em escolas e colégios, até que se torne forma, institucionalizada. Se queremos dedilhar um violão, entrar na trama de uma ópera de Wagner, tocar cítara ou cantar em um coro, e depois encontrar um professor, ler um livro ou participar de um grupo musical, talvez isso seja tudo o que precisamos fazer. Não é necessário formar uma comissão de currículo, produzir uma fundamentação filosófica ou escrever uma lista de objetivos (SWANWICK, 2003, p. 50).

A visão que desqualifica o saber escolar é complementada pelo autor, quando este acrescenta que as variadas metodologias ou enfoques pedagógicos privilegiados pela educação musical, muitas vezes transformam a música produzida na escola em algo que ele caracteriza como "subcultura musical" (SWANWICK, 2003, p.50), um tipo de música desvinculado dos padrões aceitos como 'música' pelos estudantes. O problema não parece se limitar ao conteúdo ou metodologia escolhidos. Aparentemente, o simples fato deste saber ser difundido pela escola já é suficiente para desconfigurá-lo, como se pode conferir na citação a seguir.

Mais recentemente, e em uma tentativa de reconhecer a realidade da música "lá de fora", elementos da música popular entraram em cena na educação formal. Mas, para tornar-se respeitável e apropriadamente institucionalizada, a música popular tem que ser modificada, abstraída e analisada para se adequar às salas de aula, aos horários fixos e aos objetivos da educação musical. O impacto do nível de volume é reduzido, dançar é impraticável e o contexto cultural é excluído. Durante esse processo redutivo, a atividade frequentemente torna-se o que Ross chama 'pseudomúsica' (SWANWICK, 2003, p.52. aspas do autor).

Na concepção de Swanwick, o ensino de música torna-se problemático a partir do momento em que ele passa a fazer parte do currículo escolar. Essa visão parece conceber a escola como mero local de transmissão de conhecimentos provindos de um saber legitimado em outras instâncias. Segundo essa visão, a escola seria apenas responsável pela padronização e pela rotina, descaracterizando os saberes de referência.

Essa opinião não é consensual entre os teóricos. LOPES (2008, p.46) afirma que as interpretações da disciplinarização na escola tendem a aceitar como pressuposto que as disciplinas escolares são fruto de adaptações feitas a partir de uma ciência ou saber de referência. Subentende-se nesta idéia que os conhecimentos ensinados na escola, através das disciplinas escolares, são constituídos pela reprodução do conhecimento produzido fora da escola. Em geral, questiona-se a validade dos conhecimentos escolares relacionados com as ciências de referência que lhes dizem respeito. Aqueles seriam deformações do verdadeiro conhecimento. A autora argumenta a favor da identidade de cada uma dessas instâncias:

[...] o conhecimento escolar e o científico são instâncias próprias de conhecimento, e que as disciplinas escolares possuem uma constituição epistemológica e sócio-histórica distinta das disciplinas científicas, não cabendo, assim, uma transposição tão direta de interpretações das ciências de referência para o contexto escolar' (LOPES, 2008, p.46).

A rejeição da idéia de uma escola inerte e passiva é confrontada por CHERVEL (1990), que julga que o sistema escolar é detentor de um poder criativo insuficientemente valorizado.

A concepção da escola como puro e simples agente de transmissão de saberes elaborados fora dela está na origem da idéia, muito amplamente partilhada no mundo das ciências humanas e entre o grande público, segundo a qual ela é, por excelência, o lugar do conservadorismo, da inércia, da rotina. Por mais que se esforce, raramente pode-se vê-la seguir, etapa por etapa, nos seus ensinos, o progresso das ciências que se supõe ela deva difundir (CHERVEL, 1990, p.182).

Outros teóricos (JULIA, 2001; FORQUIN, 1993; LOPES, 1999, 2002, 2008) concebem a escola como instituição criadora de uma cultura específica que deve ser compreendida em outros termos. Os conceitos como conhecimento escolar, cultura escolar e transposição didática são vistos a partir de um ponto de vista destituído de conotação negativa:

Destacar-se-á enfim que, se o imperativo da 'transposição didática' impõe a emergência de configurações cognitivas específicas (os saberes e os modos de pensamento tipicamente escolares), essas configurações tendem a escapar de seu estatuto puramente funcional de instrumentos pedagógicos e de auxiliares das aprendizagens, para se constituir numa espécie de 'cultura escolar' sui generis, dotada de sua dinâmica própria e capaz de sair dos limites da escola para imprimir sua marca 'didática' e 'acadêmica' a toda espécie de outras atividades (que intervêm, por exemplo, no contexto dos lazeres, dos jogos, do turismo, no campo político ou no campo profissional), sustentando assim com as outras dinâmicas culturais (com as diferentes expressões da cultura 'erudita', com as diferentes formas da cultura dita 'popular', com os meios de comunicação de massa, com as práticas cognitivas ou as maneiras próprias de alguns grupos) relações complexas e sempre sobredeterminadas, de nenhum modo redutíveis, em todo caso, aos processos de simples reflexo ou de 'repartição de tarefas' (FORQUIN, 1993, p.17, aspas do autor).

Acredito que para os educadores seja muito difícil fazer escolhas sob a pressão de concepções que desqualificam o saber escolar. Embora as reflexões sobre este saber sejam de grande utilidade para o aprimoramento da prática pedagógica, a visão de que a escola deturpa o conhecimento pode ter efeito paralisante sobre os professores, desmotivando-os a com relação à certeza de serem capazes de exercer um ensino eficaz. A contribuição de teóricos que abrem perspectivas para se pensar a escola como instituição com características específicas que, ao contrário de serem negativas, se situam em pé de igualdade com outras culturas, podendo ser reelaboradas e difundidas em outras instâncias, ajuda a quebrar o impasse criado por visões mais restritas do saber escolar. A escola não precisa ser vista, necessariamente, como um repositório de saberes externos, mas como local onde ocorrem processos de interação por meio dos quais um saber característico é criado, podendo vir a ser difundido para além dos muros escolares. Pensando nesses termos, o conceito de transposição didática não seria o mais adequado, conforme sugere Lopes:

[...] defendo que o termo transposição didática não representa bem o processo ao qual me refiro: (re)construção de saberes na instituição escolar. O termo transposição pode ser associado à idéia de reprodução, movimento de transportar de um lugar a outro, sem alterações. Mais coerentemente, devemo-nos referir a um processo de mediação didática. Todavia, não no sentido genérico, ação de relacionar duas ou mais coisas, de servir de intermediário ou 'ponte', de permitir a passagem de uma coisa a outra. Mas no sentido dialético: um processo de constituição de uma realidade a partir de mediações contraditórias, de relações complexas, não imediatas. Um profundo sentido de dialogia (LOPES 1999, p.208, grifo da autora).

Ainda seguindo a lógica que analisa a escola como produtora de um saber específico, temos autores como JULIA (2001) que ajuda a compreender a temática:

Seria conveniente analisar atentamente as transferências culturais que foram operadas da escola em direção a outros setores da sociedade em termos de formas e de conteúdos e, inversamente, as transferências culturais operadas a partir de outros setores em direção à escola (JULIA, 2001, p.37).

Ou seja, a partir desta ótica, a escola não apenas reflete e descaracteriza determinados saberes, mas também os refrata, produzindo uma cultura sui generis que será disseminada em outros meios.

Tomando como referência essa noção de que a cultura escolar se expande para além dos muros escolares, SELLES e FERREIRA (2005) destacam o quanto, ao longo do século XX, a unificação das Ciências Biológicas foi beneficiada por um discurso escolar que passou a defender a existência de uma ciência unificada denominada Biologia. A direção deste movimento - da escola para a ciência de referência - é um exemplo típico daquilo que LOPES (1999) caracteriza como "mediação didática". Neste caso, enquanto o consenso a respeito da unificação não havia sido atingido no seio acadêmico, a escola já havia adotado a Biologia como disciplina unificadora das demais, fato que acabou impelindo a aceitação da unificação no universo acadêmico.

CHERVEL (1990) exemplifica que a redação em três partes, exigência escolar típica do ensino francês influenciou a prosa francesa de maneira duradoura e indelével. Também nas cartas escritas pelos soldados franceses durante a I Guerra Mundial percebe-se a utilização de modelos aprendidos na escola. Segundo o autor, as cartas repetem os clichês das redações do ensino primário demonstrando a influência que os saberes da escola exercem sobre as práticas sociais e sobre a própria língua.

Outros exemplos da expansão do conhecimento escolar na vida cotidiana podem ser demonstrados no caso de programações televisivas, tais como o "Show do Milhão" ou o "Soletrando", ambos programas que utilizam conteúdos tipicamente escolares que, apropriados pelos meios de comunicação, atingem sucesso junto ao público.

No campo específico da música, também pode-se confirmar a mescla entre uma tradição escolar que influencia um determinado saber, ao mesmo tempo em que tal saber é reconfigurado, passando a ser contemplado além dos muros da escola:

O caráter científico dado aos processos de aquisição e compreensão da leitura escrita [...] foram transplantados para a música, visto ela também se expressar por meio de uma 'linguagem falada' (os sons) e uma 'linguagem escrita' (a notação musical) [...] Os procedimentos escolares ligados ao processos de alfabetização também foram incorporados às aulas de música, por meio das atividades e do uso dos materiais: a lousa, as cópias, os cadernos apropriados, e inclusive cadernos de caligrafia musical" (JARDIM, 2008, p.147).

Desta forma, após a implantação do Canto Orfeônico, a importância dada aos exercícios de escrita musical na escola influenciou a padronização do código gráfico musical. A nova demanda, inexistente nos compêndios do ensino especializado de música da época, passou a ser difundida, também, na esfera do ensino especializado (JARDIM, 2008, p.150).

Seguindo tal lógica, caberia aqui especular até que ponto o grande número de grupos vocais surgidos a partir do final dos anos 1950 como "Os Cariocas" e "Trio Irakitan", além de grupos que surgiram nas duas ou três décadas seguintes, tais como "Quarteto em Cy", "MPB4" e "Boca Livre", entre outros, seriam tributários do Canto Orfeônico. Pode-se supor que as práticas do cantar em grupo, advindas da cultura escolar teriam sido reconfiguradas no meio social, passando a ter um outro significado. Sob esse mesmo ponto de vista, podemos também nos interrogar se o fértil período da história da 'dita' música popular brasileira transcorrido dos anos 1960 até fins de 1970 também não teria tido suporte em toda uma cultura escolar habituada ao ensino da música. Especulações como essas trazem alento em um momento de dúvidas, quando se questiona, legitimamente, a eficácia de imposições legais instituindo o ensino de música.

3 - Ensino de Música: divergências e convergências com outras áreas

Pensar na disciplinarização da Música nos remete às especificidades que a diferenciam de outras áreas de ensino, mas também em alguns aspectos que, em maior ou menor grau, se aproximam de problemáticas apontadas por pesquisadores de outras disciplinas. Uma primeira distinção pode ser feita entre o ensino mais geral de Artes e o das disciplinas mais tradicionais, consideradas científicas. Mas, dentro do campo das Artes, a música também guarda certas características que valem ser ressaltadas.

A Música, pela atual LDBEN, é um dos componentes do campo das Artes; por isso, ela mantém com as outras formas de artes algumas características comuns, como o baixo status das disciplinas desta área, por exemplo. Contrapondo-se às disciplinas artísticas com aquelas mais tradicionais, como a Física, a Matemática e a Biologia, destaca-se que, enquanto essas últimas estão ligadas a áreas científicas de referência, as Artes estão vinculadas a um saber social de referência ou a "práticas sociais de referência" (LOPES, 2008, p.54).

Em geral, a força da disciplina é comprovada em relação ao conteúdo exigido nos exames acadêmicos, como os do ENEM, por exemplo, conexão apontada por GOODSON (2001, p.101). Outro ponto que demarca a força da disciplina está em seu direito de aprovar ou reprovar o aluno. A questão do status pode influenciar a aceitação que o alunado tem pela disciplina. A tendência é que as disciplinas de caráter científico sejam mais valorizadas do que aquelas de caráter artístico.

Se, por um lado, a questão do baixo status impõe algumas restrições, por outro, essa condição favorece menor regulação externa. A inexistência de imposições criadas por livros didáticos ou sistemas de avaliação deixa margem para que o professor tenha maior liberdade em suas escolhas pedagógicas. Diretrizes abertas ou um nível de controle baixo abrem espaço para que ocorram inovações onde, aparentemente, espera-se estagnação (FERREIRA, 2007). Sob este ponto de vista, a educação musical pode vir a perder essa característica, caso consiga se igualar às outras disciplinas, entrando no esquema tradicional das mesmas.

Outra distinção a respeito do ensino de Artes e de outras áreas de conhecimento a ser ressaltada é a sua condição de fazer parte do cotidiano das pessoas. Tal característica faz com que seu uso e seu estudo independam de imposições criadas por dispositivos curriculares. Mas aqui se pode determinar um aspecto que diferencia o ensino de música do ensino de outras artes.

A música parece ser o tipo de arte que tem maior aproximação com os indivíduos e com o cotidiano dos mesmos. Independentemente das escolhas, pode-se afirmar que a maior parte das pessoas tem preferência por um determinado tipo de música, compositores ou intérpretes. A música também se destaca de outras artes por ser um elemento utilizado nas mais variadas funções sociais. Tal característica faz com que os gostos e escolhas musicais pré-existam às influências da escolarização. Devido ao fato de sua função social já estar estabelecida a priori, não em um sentido universal, mas individual, o significado e expectativas que os alunos atribuem à música já estão demarcados antes da oficialização de seu ensino. As consequências desta afirmação podem ser distintas, mas sempre geram influências no ensino de música. Por um lado, o aluno pode decepcionar-se com o ensino proposto e, conforme já assinalado por Swanwick, julgar a música produzida na escola como de menor valia. Por outro lado, se levarmos em consideração que uma das funções do ensino de música deve ser a de ajudar o aluno a conhecer outros estilos e gêneros, além daqueles de sua preferência, pode ser que esse confronto entre a música esperada e a música efetivada em sala de aula tenha potencial pedagógico frutífero e significativo.

Outro problema diz respeito à cultura escolar e ao uso que esta faz da música. De certa forma, este aspecto nos remete ao que foi discutido no parágrafo anterior, podendo ser visto como mais um meio de apropriação social da música. Entretanto, como tal apropriação gera um tipo de prática pedagógica específico, cabe aqui uma explanação maior do assunto.

FUKS (1991), em estudo focalizando cinco Escolas Normais do estado do Rio de Janeiro, informa sobre a prática musical e a função da música naqueles contextos. A pesquisadora percebeu que as Escolas Normais pesquisadas valorizavam a música, incluindo-a em diversas atividades e festas, mas aquele fazer musical não era gerenciado pelo professor de música. As práticas musicais observadas pela autora eram ensinadas pelo professor de didática ou aprendidas de maneira informal, entre as normalistas. Tais práticas eram compostas por um repertório específico, que incluía hinos cívicos e canções que a autora denomina "musiquinhas de comando" (p.28), repertório utilizado para reforçar o condicionamento das crianças.

Essa função dada à música é fortemente difundida entre as professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental e pode ser um elemento de estranhamento quando os educadores musicais entrarem em cena, uma vez que as práticas estruturadas e institucionalizadas já existentes na escola serão difíceis de serem modificadas. Desta forma pode ocorrer o enfraquecimento de um modelo de ensino de música pelo qual a classe dos educadores musicais vem lutando:

os concursos curriculares ganho em uma esfera podem ser perdidos em outra esfera, revelando a possibilidade de grandes variações entre os locais quanto às suas definições dominantes de currículo (BATES apud GOODSON, 1997, p.48)

FUKS conclui que a música era utilizada nos ambientes das escolas normais, como um forte elemento disciplinador, embora dissimulado sob um canto infantilizado, aspecto que a levou cunhar a expressão "poder pudor" (FUKS, 1991, p.57) para definir a função da música naquelas escolas. Cabe aqui ressaltar as similaridades deste aspecto da música com outras disciplinas consideradas de baixo status acadêmico: as disciplinas que não têm alguma ciência como saber de referência são as que, em geral, cumprem o papel de disciplinarizar os corpos e comportamentos, como a Educação Física, por exemplo.

Com relação às funções que o ensino de música deve exercer, pode-se afirmar que essas são quase tão diversas quanto as escolhas e preferências musicais de cada indivíduo. A dúvida entre a função a ser atribuída em seu ensino na escola é uma questão comum a outras áreas. De uma maneira geral, os educadores musicais advogam por um ensino que tenha valor por trabalhar as características intrínsecas da música, como o conhecimento das estruturas, a possibilidade de expressão e criação, entre outros elementos. Cabe esclarecer que, embora essa opinião não seja consensual, pois "as disciplinas escolares são constituídas por grupos de elementos individuais com identidades, valores e interesses distintos" (GOODSON, 2001, p.174), esta é uma opinião que tem prevalecido nas publicações reconhecidas pela área da Educação Musical. Opondo-se a essa visão de ensino, temos a do senso comum, isto é, a da sociedade que, em geral, pensa em termos de características extrínsecas, como a socialização, o lazer e até em termos terapêuticos, entendendo que a música "acalma".

A adoção de objetivos mais utilitários ou de caráter mais acadêmico fazem parte da disputa que as disciplinas travam por recursos, status e território (GOODSON, 2001, p. 101). Ou seja, as dificuldades que a música encontra em sua aceitação fazem parte de um processo que ocorre em todas as áreas que buscam aumentar seu prestígio acadêmico. Embates similares são encontrados na Biologia onde se oscila entre um ensino que enfatiza o conhecimento científico e outro que enfoca as necessidades pessoais/sociais dos estudantes (SELLES e FERREIRA, 2005). Caberá ao educador musical encontrar um meio termo entre essas as distintas funções mencionadas, uma vez que elas não são, necessariamente, excludentes. Na Biologia, por exemplo, a Reprodução Humana é uma temática percebida por SELLES e FERREIRA (2005) como explicitando uma espécie de oscilação entre essas variadas finalidades.

Um ponto bem específico do ensino de música está relacionado a questões da didática. Pode-se afirmar a existência da difusão de uma pedagogia - nos Conservatórios de Música ou mesmo nas Universidades - voltada para pessoas determinadas a se profissionalizar no campo da música. Este tipo de pedagogia ainda é, equivocadamente, o referencial de ensino mais utilizado na formação dos futuros professores que irão lecionar nas escolas de Educação Básica. Essa característica tem consequências diretas na questão da formação docente, pois a maior parte dos professores que atua ou irá atuar em escolas regulares teve esse tipo de instrução e a tendência a repetir os modelos a que foram submetidos é muito forte. Este problema impõe aos cursos formadores o compromisso de criar uma nova maneira de pensar o ensino da música.

Outros questionamentos a respeito da cultura adquirida no espaço escolar podem ser aqui colocados, demonstrando mais um ponto comum entre o ensino da música e outras disciplinas. A pergunta feita por JULIA, "afinal o que sobra da escola após a escola?" (JULIA, 2001, p.37) não parece ter resposta fácil. Enquanto SWANWICK (2003, p.51) argumenta que, para alguns indivíduos, a contribuição da educação institucional para a sua formação musical pessoal poderá ser negligente e, inclusive, negativa, CHERVEL (1990) nos alerta sobre os efeitos perversos da aculturação imposta pela escola:

Numerosos docentes notaram, no século XIX e mesmo mais cedo, que o trabalho escolar sobre a gramática, a ortografia ou os textos clássicos criava entre os alunos um desgosto profundo e definitivo por essas matérias. O ódio pela literatura antiga por vezes viria daí, a tal ponto que 'eles olhariam como um suplício retornar aos autores gregos e latinos' uma vez saídos dos colégios (CHERVEL, 1990, p.212).

Penso que este temor de que algo semelhante ocorra com o ensino da música deva ser a preocupação principal dos educadores musicais. Neste sentido, tentei contribuir, neste texto, com questionamentos que devem estar presentes entre aqueles que pretendem lidar com o ensino de música. Apenas a boa vontade e a busca incessante por procedimentos didáticos apropriados não são suficientes para que o ensino de música seja implementado com eficácia. Embora o professor não possa abster-se de conduzir sua prática diária com o máximo de zelo e eficiência possível, ele deverá ter em mente que existem contingências que são mais fortes do que sua vontade pessoal. Reconhecê-las é um primeiro passo para poder ultrapassar as dificuldades que possam surgir.

4 - Conclusão

É compreensível que, nesse momento inicial, os debates a respeito do ensino escolarizado de música fiquem restritos ao aspecto mais pragmático e imediato, ou seja, às escolhas dos conteúdos e metodologias de ensino. Entretanto, um olhar sobre outras instâncias que exercem influências e que configuram as práticas pedagógicas se faz necessário. Defendo, então, que os estudos no campo do Currículo e, mais especificamente, aqueles que operam com os conceitos de 'conhecimento escolar', 'transposição didática' e 'cultura escolar', podem fomentar as reflexões e instigar os debates a respeito do ensino de Música nas escolas.

A constituição da uma disciplina Música no âmbito escolar não pode significar a defesa de um ensino puramente acadêmico, distanciado da realidade e dos desejos dos alunos ou, então, desprovido do prazer que o fazer musical deveria trazer. De modo inverso, vale questionar o histórico lugar ocupado pelo ensino de Música na cultura escolar, reconhecendo que este vem exercendo o ambíguo papel de permanecer com baixo status. A compreensão da temática será maior se conseguirmos refletir acerca das várias influências que constituem os conhecimentos escolares, inserindo-os em uma cultura sui generis, que é a cultura escolar. Defendo que percebê-las nos destitui de uma falsa 'ilusão' de que a solução para um melhor ensino de Música deve ser buscada somente na construção de procedimentos didáticos mais adequados.

Notas

Recebido em: 12/08/2011

Aprovado em: 11/03/2012

Silvia Sobreira é graduada em Regência pela Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ(1988) e Mestre em Música pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro-UNIRIO (2002), especialização que lhe rendeu o livro Desafinação Vocal, editado pela Musimed, em 2003. É doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRJ dentro da linha de Currículo e Linguagem. Atua como professora das disciplina "Processos de Musicalização" e "Prática de Conjunto" no curso de Licenciatura em Música da UNIRIO, além de fazer a supervisão dos Estágios. Desde 2006, é responsável pelo Projeto de Extensão Universitária "A prática contemporânea do ensino de música", realizado em uma escola municipal na cidade do Rio de Janeiro onde também coordena o Projeto "Banco áudio visual de atividades pedagógicas (PIBID/CAPES).

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  • 1
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      12 Ago 2011
    • Aceito
      11 Mar 2012
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