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Capacidade funcional e força muscular respiratória de candidatos ao transplante hepático

Resumos

INTRODUÇÃO: A doença hepática crônica resulta em grande impacto funcional, causando perda de massa e função muscular com consequente redução da capacidade funcional. OBJETIVO: Avaliar e comparar a força muscular respiratória e a capacidade funcional dos candidatos ao transplante hepático que possuem classe B ou C segundo o Child-Pugh Score e correlacionar estas variáveis dentro de cada grupo. MÉTODOS: Estudo transversal, com amostra de conveniência composta por 35 pacientes, divididos em dois grupos a partir da pontuação obtida no Child-Pugh Score, sendo B (19 pacientes) e C (16 pacientes). Todos os indivíduos foram avaliados em um único momento, sendo mensuradas as pressões inspiratória máxima (PImáx) e expiratória máxima (PEmáx) e a distância percorrida no teste de caminhada de seis minutos (TC6M). RESULTADOS: Os indivíduos classificados com Child-Pugh Score B apresentaram maiores valores na PImáx (-86,05 ± 23,89 vs. -57,94 ± 14,14), p = 0,001, na PEmáx (84,16 ± 28,26 vs. 72,00 ± 16,94), p = 0,142, e na distância percorrida no TC6M (473,63 ± 55,276 vs. 376,13 ± 39,00), p = 0,001. Encontramos, ainda, correlação positiva entre os valores da PImáx e a distância percorrida no TC6M dentro grupo Child-Pugh Score B, r = 0,64 e p = 0,003. CONCLUSÃO: O progresso da doença hepática contribui para o surgimento de diversas complicações que, em conjunto, parecem contribuir para a redução da capacidade funcional dos indivíduos. Em nosso trabalho, isso ficou evidenciado pelo pior desempenho do grupo Child-Pugh Score C. Isto pode sugerir que a espera para o transplante hepático (TxH) pode agravar a capacidade funcional e a força muscular respiratória desses indivíduos.

doença hepática; capacidade funcional; força muscular respiratória; escore Child-Pugh


INTRODUCTION: Chronic liver disease results in large functional impact, causing loss of muscle mass and function with consequent reduction of functional capacity. OBJECTIVE: To evaluate and compare the respiratory muscle strength and functional capacity of candidates for liver transplantation who are under Class B or C according to Child Pugh Score and to correlate these variables within each group. METHODS- Cross-sectional study with a convenience sample of 35 patients divided into two groups based on the score obtained in the Child Pugh Score B (19 patients) and Child Pugh Score C (16 patients). All subjects were evaluated in a single moment, and the maximal inspiratory pressure (MIP) and maximal expiratory pressure (MEP) as well as the distance walked during the 6-minute walk test (6MWT) were measured. RESULTS: Individuals classified with Child Pugh Score B showed higher values in the MIP (- 86.05 vs. 23.89 - 57.94 14.14), p = 0.001, in MEP (84.16 vs. 28.26 72.00 16 1994), p = 0.142, and the distance walked in 6MWT (473.63 vs 376.13 39.00 55.276), p = 0.001. We also found a positive correlation between the values of MIP and distance walked during 6MWT in group B of the Child Pugh Score, r = 0.64 and p = 0.003. CONCLUSION: The progress of liver disease contributes to the onset of several complications, which together appear to contribute to the reduction of functional capacity of individuals. In our study this was evidenced by the worse performance of Child Pugh score C group. This may suggest that the wait for liver transplantation (LTx) can worsen the functional capacity of these individuals.

liver disease; functional capacity; respiratory muscle strength; Child-Pugh score


ARTIGO ORIGINAL

CLÍNICA MÉDICA DO EXERCÍCIO E DO ESPORTE

Capacidade funcional e força muscular respiratória de candidatos ao transplante hepático

José Leonardo Faustini PereiraI; Tanara Carreira Meus FigueredoI; Lucas Homercher GalantII; Luiz Alberto Forgiarini JuniorIII; Cláudio Augusto MarroniII; Mariane Borba MonteiroI; Alexandre Simões DiasIV

ICentro Universitário Metodista-IPA

IIUniversidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre

IIICentro Universitário Metodista-IPA e Universidade Federal do Rio Grande do Sul

IVUniversidade Federal do Rio Grande do Sul

Correspondência Correspondência: Alexandre Simões Dias Rua Hipólito da Costa, 543, casa 18, Morro Santa Teresa 90840-110 – Porto Alegre, RS. Brasil E-mail: simoesdias@ufrgs.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: A doença hepática crônica resulta em grande impacto funcional, causando perda de massa e função muscular com consequente redução da capacidade funcional.

OBJETIVO: Avaliar e comparar a força muscular respiratória e a capacidade funcional dos candidatos ao transplante hepático que possuem classe B ou C segundo o Child-Pugh Score e correlacionar estas variáveis dentro de cada grupo.

MÉTODOS: Estudo transversal, com amostra de conveniência composta por 35 pacientes, divididos em dois grupos a partir da pontuação obtida no Child-Pugh Score, sendo B (19 pacientes) e C (16 pacientes). Todos os indivíduos foram avaliados em um único momento, sendo mensuradas as pressões inspiratória máxima (PImáx) e expiratória máxima (PEmáx) e a distância percorrida no teste de caminhada de seis minutos (TC6M).

RESULTADOS: Os indivíduos classificados com Child-Pugh Score B apresentaram maiores valores na PImáx (-86,05 ± 23,89 vs. -57,94 ± 14,14), p = 0,001, na PEmáx (84,16 ± 28,26 vs. 72,00 ± 16,94), p = 0,142, e na distância percorrida no TC6M (473,63 ± 55,276 vs. 376,13 ± 39,00), p = 0,001. Encontramos, ainda, correlação positiva entre os valores da PImáx e a distância percorrida no TC6M dentro grupo Child-Pugh Score B, r = 0,64 e p = 0,003.

CONCLUSÃO: O progresso da doença hepática contribui para o surgimento de diversas complicações que, em conjunto, parecem contribuir para a redução da capacidade funcional dos indivíduos. Em nosso trabalho, isso ficou evidenciado pelo pior desempenho do grupo Child-Pugh Score C. Isto pode sugerir que a espera para o transplante hepático (TxH) pode agravar a capacidade funcional e a força muscular respiratória desses indivíduos.

Palavras-chave: doença hepática, capacidade funcional, força muscular respiratória, escore Child-Pugh.

INTRODUÇÃO

A cirrose hepática é caracterizada pela substituição difusa da estrutura hepática normal por nódulos de estrutura anormal circundados por fibrose e está presente no estado final de uma série de processos patológicos hepáticos decorrentes de diversas causas(1). A doença hepática causa um grande impacto nutricional, independente de sua etiologia, pois o fígado realiza inúmeras reações bioquímicas, como produção, modificação e utilização de nutrientes e substâncias metabolicamente importantes para o organismo(2,3-4).

Uma das complicações causadas pela doença hepática avançada são as alterações metabólicas associadas à desnutrição dos pacientes, já que os mesmos perdem grande quantidade de massa muscular, apresentando, assim, alterações na funcionalidade, o que propicia um quadro de inatividade física. A associação de todos estes fatores causa influência negativa nas atividades de vida diária (AVD) e na qualidade de vida dessa população(5-7). Em estudo prévio realizado por nosso grupo, encontramos alterações na frequência e na severidade das doenças hepáticas, bem como na funcionalidade e na qualidade de vida dos indivíduos que possuem doença hepática grave e aguardam na lista de espera para realizar o transplante hepático (TxH)(8).

Devido ao aumento no número de candidatos ao TxH, modelos de classificação contendo diversas variáveis clínicas foram criados para determinar a gravidade da doença hepática. Inicialmente, foi criado o Child-Pugh Score e, recentemente, o Model for End Stage Liver Disease (MELD) também está sendo muito utilizado na prática diária. O primeiro foi tradicionalmente utilizado na estratificação de riscos pré-operatórios, e o último foi usado principalmente para prever a sobrevida três meses após o transplante, utilizando para sua classificação, valores séricos de bilirrubina e creatinina, e provas de coagulação. A pontuação do MELD varia entre 0 e 40, em que é inversamente proporcional à relação escore e sobrevida(9-11). O Child-Pugh Score utiliza variáveis como a bilirrubina e a albumina sérica, o tempo de protrombina e a presença de ascite e encefalopatia. Quanto maior a pontuação pior o estado clínico do indivíduo, e o estado de "descompensação" clínica que indica cirrose hepática deve ser maior ou igual a 7 (classe B). Esta classe é um critério aceito para inclusão dos pacientes na lista de espera para realizar o TxH(12).

A indicação precoce do TxH possibilitou aos pacientes atingir uma sobrevida superior a 70% em cinco anos, e também reduziu os custos com o tratamento. Além disso, é importante salientar que os pacientes que utilizam tratamento medicamentoso para tratar a doença em estágio terminal apresentam mortalidade de 70% ao ano(13,14). Esses dados fizeram com que a procura pelo procedimento cirúrgico para a solução da doença hepática aumentasse significativamente. Dessa forma, muitos candidatos passam um longo período na lista de espera, o que favorece o aparecimento de novas complicações que, por sua vez, pioram a funcionalidade destes indivíduos.

No entanto, nenhum dos modelos criados para graduar o estágio da doença hepática utiliza variáveis funcionais. A realização do teste da caminhada de seis minutos (TC6M) é uma mensuração eficaz da capacidade submáxima de exercício que apresenta forte correlação com a capacidade funcional(15). Já foi demonstrado que indivíduos que percorrem uma menor distância no teste apresentam aumento na mortalidade em decorrência da doença hepática avançada(16).

Acredita-se também que, devido à presença de ascite (50% a 60% dos casos), ocorra uma desvantagem mecânica no músculo diafragma, o que poderá interferir no comprimento-tensão do músculo e, consequentemente, na força muscular respiratória, prejudicando ainda mais a funcionalidade dos indivíduos(17).

Embora exista uma grande variedade de estudos abordando a doença hepática e seus estágios, pouco vemos em relação à capacidade funcional dessa população. Acreditamos que entender as limitações desses indivíduos pode contribuir para uma abordagem mais precisa, que possibilite atingir uma melhor recuperação pós-TxH, reintegrando-os mais rapidamente às suas AVD.

Este estudo tem como objetivo avaliar e comparar a força muscular respiratória e a capacidade funcional dos pacientes candidatos ao TxH que possuem classe B ou C segundo o Child-Pugh Score e, posteriormente, correlacionar estas variáveis dentro de cada grupo.

MATERIAIS E MÉTODOS

Este estudo caracteriza-se por ser transversal, sendo recrutados 35 pacientes adultos que estavam sob acompanhamento do Serviço de Transplante Hepático do Complexo Hospitalar Santa Casa de Porto Alegre no período de fevereiro a novembro de 2009. Foram incluídos no estudo todos os indivíduos que apresentavam condições clínicas para realizar todos os procedimentos propostos, bem como aqueles que aguardavam na lista de espera para realizar o transplante hepático. Como critérios de exclusão foram considerados a presença de encefalopatia grave (grau III e IV), doenças degenerativas graves, como distrofia muscular e esclerose múltipla, instabilidade hemodinâmica ou qualquer outro fator que impedisse a realização dos procedimentos propostos. Não houve nenhuma exclusão no decorrer do estudo. Os pacientes foram selecionados após verificação dos prontuários. As variáveis do Child-Pugh Score forneceram uma pontuação mínima de 1 e máxima de 3, sendo que a pontuação final variou entre 5 e 15. Após isso, os indivíduos foram classificados em A (de 5 a 6 pontos), B (de 7 a 9 pontos), ou C ( acima de 10 pontos). Todo esse procedimento foi realizado pelo corpo clínico do hospital. A verificação dos prontuários foi realizada no período máximo de 15 dias antes da avaliação funcional, para não haver diferença entre os tempos de acompanhamento médico e fisioterapêutico.

Os pacientes realizaram, em um único momento, a seguinte avaliação: registro dos dados e das características da amostra através de uma ficha de avaliação especificamente elaborada, avaliação da força dos músculos respiratórios através da manovacuometria e o TC6M. As mensurações foram realizadas sempre pelo mesmo avaliador.

O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi obtido de cada paciente e o trabalho foi aprovado pelos Comitês de Ética e Pesquisa do Centro Universitário Metodista do IPA e do Complexo Hospitalar Santa Casa de Porto Alegre.

Para mensurar a força dos músculos respiratórios, foi utilizado um manovacuômetro digital MVD 500 da marca Globalmed®, o qual foi sempre calibrado antes de cada coleta de dados. Para avaliação da PImáx, foi solicitado ao indivíduo que realizasse uma expiração máxima, até o volume residual (VR), e, após o posicionamento adequado do equipamento na boca do paciente, foi realizada uma inspiração forçada máxima. Para avaliar a PEmáx, foi solicitado ao indivíduo que iniciasse a manobra a partir da capacidade pulmonar total, que foi seguida por uma expiração forçada máxima. Para a realização das manobras, o equipamento deveria estar adequadamente posicionado na boca do paciente para não existir falha no teste. Utilizou-se uma presilha nasal para evitar o escape aéreo, e havia no manuvacuômetro orifício de fuga. Foi necessária a sustentação da manobra por pelo menos um segundo, e um tempo total da mesma de no mínimo dois segundos, em que foi verificada a pressão de pico. Os resultados foram obtidos após a realização de cinco manobras, com intervalo de, no mínimo, um minuto entre elas, obtendo-se, no mínimo, três aceitáveis, ou seja, que os valores não diferiram entre si por mais de 10%. Foi registrada a pressão mais elevada em centímetros de água (cmH2O), e utilizado os valores de normalidade preconizados pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia(18,19).

O TC6M foi realizado em um corredor, reto, plano, com 30 metros de comprimento, sendo que o mesmo não possuía nenhum tipo de obstáculo. Antes de iniciar o teste, todos os pacientes foram instruídos pelo avaliador, e, durante o teste, foi utilizado estímulo verbal padronizado a cada minuto de caminhada, sendo que os pacientes eram incentivados a percorrer a maior distância possível. No final do teste, foi mensurada a distância percorrida. Os pacientes foram monitorados através da frequência respiratória, frequência cardíaca e saturação periférica de oxigênio, utilizando um oxímetro Nonin (9500, Estados Unidos), e a sensação de dispneia e de fadiga nos membros inferiores foram mensuradas através da escala de Borg modificada (escala 0-10), de acordo com a American Thoracic Society (ATS)(15). Todas as variáveis acima descritas foram mensuradas antes e após o teste da caminhada, com exceção da distância, que somente foi quantificada após o TC6M.

ANÁLISE ESTATÌSTICA

A análise estatística foi realizada no programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences) versão 16.0. Para verificar a normalidade dos dados, foi aplicado o teste de Kolmogorov-Smirnov. Para as comparações das médias das variáveis da força muscular (PImáx e PEmáx), distância percorrida no TC6M, características antropométricas e clínicas entre os dois grupos, foi utilizado o teste t de Student, e, para as correlações entre as variáveis, foi utilizado o teste de correlação de Pearson. O nível de significância adotado foi p < 0,05.

RESULTADOS

Em nosso estudo, foram avaliados 35 pacientes, não havendo nenhuma perda ou exclusão. As características antropométricas da amostra estão descritas na tabela 1. Dezenove indivíduos foram classificados como Child-Pugh Score B e 16 como Child-Pugh Score C. Encontramos diagnóstico de cirrose alcoólica em nove pacientes do grupo B e em sete do grupo C; de hepatite viral pelo vírus C (HVC) em sete pacientes, em ambos os grupos; e de hepatite viral pelo vírus B (HVB) em três pacientes do grupo B e em dois do grupo C. O tempo de diagnóstico da doença não difere significativamente dos grupos B e C, 14 ± 3 vs. 12 ± 5 meses, respectivamente (p = 0,9). Não houve diferença significativa entre os grupos em relação às variáveis clínicas e antropométricas. Em relação à terapêutica medicamentosa de ambos os grupos, eram equivalentes, visto que a utilização dos antirretrovirais por parte dos pacientes acometidos pelos processos virais geralmente se equivale.

Na tabela 2, apresentamos a comparação das variáveis do TC6M dos dois grupos avaliados. Também não houve diferença significativa entre os dois grupos, tanto nos valores que precederam ao teste, quanto nos posteriores ao mesmo.

O grupo Child-Pugh Score B apresentou maiores valores na PImáx (cmH2O), -86,05 ± 23,89 vs. -57,94 ± 14,14, p = 0,001, na PEmáx (cmH2O), 84,16 ± 28,26 vs. 72,00 ± 16,94, p = 0,142, e na distância percorrida no TC6M (metros), 73,63 ± 55,276 vs. 376,13 ± 39,00, p = 0,001 (Tabela 3).

Encontramos, ainda, correlação positiva entre os valores da PImáx e a distância percorrida no TC6M dentro do grupo Child-Pugh Score B, r = 0,64 e p = 0,003 (Gráfico 1), fato que não foi verificado no grupo Child-Pugh Score C.


DISCUSSÃO

Os indivíduos com doença hepática desenvolvem um quadro de desnutrição devido à diminuição na ingestão dos alimentos, déficit na absorção e no transporte de nutrientes, e ao aumento do gasto energético em repouso(20,21). Em nosso estudo, os pacientes de ambos os grupos apresentaram um índice de massa corpórea média (IMC) que não corresponde a um quadro de desnutrição e caquexia.

Os pacientes deste estudo, classificados como Child-Pugh Score C, apresentaram uma menor distância percorrida no TC6M e menores valores na força muscular respiratória do que aqueles classificados como Child-Pugh Score B. No estudo realizado por Leitão et al.(22), constatou-se que os indivíduos que aguardam para realizar o transplante hepático percorrem em média 383,8 metros no TC6M, indo de encontro ao encontrado com os nossos achados. Alameri et al.(16) também avaliaram a capacidade funcional dos pacientes candidatos ao transplante hepático através do TC6M, e a média da distância percorrida foi de 306 metros dos pacientes Child-Pugh Score C, sendo que os mesmos apresentaram pior desempenho e sobrevida quando comparados aos indivíduos classificados como B e A.

O TC6M apresenta boa correlação com o consumo máximo de oxigênio (O2)(23). Dharancy et al.(24) demonstraram que a grande maioria dos indivíduos cirróticos apresenta menores valores de pico de O2 do que o previsto. Além disso, Epstein et al. verificaram que pacientes classe A do Child-Pugh Score apresentaram melhores valores de pico de O2 quando comparados com os indivíduos pertencentes aos grupos B e C(25).

Outro fator contribuinte para o prejuízo na capacidade funcional desta população são as anormalidades nas trocas gasosas. A mais relevante destas anormalidades é uma inadequada oxigenação do sangue arterial, pois a diferença no gradiente alvéolo-arterial de oxigênio

(P[A-a]O2) fica aumentada em torno de 50% dos casos. Przybylowski et al.(26) investigaram 104 pacientes e demonstraram que os indivíduos que possuíam doença hepática apresentavam menor pressão parcial de oxigênio arterial (PaO2), menor capacidade de difusão de monóxido de carbono (DLco) e maior diferença no gradiente alvéolo-arterial de oxigênio (P[A-a]O2) quando comparados ao grupo que não apresentava cirrose. Os investigadores ainda encontraram que existe uma correlação positiva entre a P(A-a)O2 e o Child-Pugh Score e uma correlação negativa entre DLco e o Child-Pugh Score.

No que diz respeito à força da musculatura respiratória, existem poucos achados na literatura. Carvalho et al.(17) verificaram que aqueles indivíduos com maior mortalidade na lista de espera para realizar o transplante hepático apresentavam valores menores de PImáx do que o grupo controle. Nossos achados sugerem que o grupo Child-Pugh Score C apresenta uma redução da PImáx quando comparado ao grupo Child- Pugh Score B, demonstrando que o avanço da doença hepática também compromete a musculatura respiratória, seja através da perda de massa ou através da interferência no comprimento-tensão do músculo.

Quando foram correlacionados os valores da PImáx com a distância percorrida no TC6M obtivemos significância estatística apenas no grupo Child-Pugh Score B. As complicações, já citadas anteriormente, parecem ter contribuído para que os indivíduos classificados como Child-Pugh Score C não apresentassem correlação entre as variáveis; fatores complicadores, como ascite e encefalopatia hepática, podem ter comprometido a avaliação das mesmas.

O nosso estudo apresenta alguns aspectos limitantes relacionados, principalmente, com o controle de variáveis nutricionais. A análise do IMC pode não refletir o real aspecto nutricional da amostra devido à presença de ascite em alguns pacientes. A terapêutica medicamentosa pode ser uma variável confundidora, visto que, no momento da exacerbação da doença hepática, outros recursos farmacológicos podem ser utilizados, como, por exemplo, os corticosteroides, os quais interferem negativamente no sistema musculoesquelético. Outro fator limitante refere-se ao tamanho amostral existente em ambos os grupos.

CONCLUSÃO

O avanço da doença hepática contribui para o aparecimento de diversas complicações, as quais, em conjunto, tendem a reduzir a capacidade funcional dessa população. Isso foi evidenciado em nosso estudo através do pior desempenho do grupo Child-Pugh Score C, o qual apresenta um quadro clínico agravado, sugerindo, assim, que a espera para o transplante hepático (TxH) pode agravar a capacidade funcional e a força muscular respiratória desses indivíduos.

Todos os autores declararam não haver qualquer potencial conflito de interesses referente a este artigo.

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  • Correspondência:
    Alexandre Simões Dias
    Rua Hipólito da Costa, 543, casa 18, Morro Santa Teresa
    90840-110 – Porto Alegre, RS. Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2011
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