Acessibilidade / Reportar erro

O CHÁ VERDE POTENCIALIZA EFEITOS DO TREINAMENTO FÍSICO NA VARIABILIDADE DA FREQUÊNCIA CARDÍACA?

RESUMO

Introdução:

O chá verde está associado a uma série de benefícios à saúde, assim como o treinamento físico. Porém, a associação de ambos apresenta efeitos cronotrópicos e autonômicos cardíacos pouco conhecidos.

Objetivo:

Avaliar o efeito da associação da administração crônica de chá verde e do treinamento físico sobre a frequência cardíaca (FC) basal e a variabilidade da frequência cardíaca (VFC) em ratos Wistar.

Métodos:

Quarenta e três ratos Wistar (Rattus norvegicus, var. albinus), pareados pelo peso e por idade, foram distribuídos em quatro grupos experimentais, intitulados de controle sedentário (CONsed, n = 10), controle treinado (CONtre, n = 08), chá sedentário (CHÁsed, n = 16) e chá treinado (CHÁtre, n = 09). A ingestão de chá foi "ad libitum". O protocolo de treinamento físico teve duração de oito semanas e foi realizado através de sessões de natação com incrementos de carga. Ao final, foram determinadas a frequência cardíaca basal e a variabilidade da frequência cardíaca (VFC) nos domínios do tempo e da frequência. O nível de significância adotado foi de 5% (p < 0,05).

Resultados:

Tanto o treinamento físico quanto o consumo de chá verde promoveram bradicardia de repouso maior, quando comparados com os animais do grupo CONsed. Com relação à VFC, os grupos CONtre, CHÁsed e CHÁtre apresentaram valores significativamente maiores que o grupo CONsed. A suplementação do chá verde ocasionou aumento da variância, do componente de alta frequência (HF) e do balanço simpato-vagal com relação ao grupo CONsed. O treinamento físico (TF) não potencializou nenhum dos parâmetros avaliados.

Conclusões:

Não houve otimização significativa nos parâmetros hemodinâmicos e autonômicos cardiovasculares em decorrência da associação entre administração de chá verde e treinamento físico em ratos Wistar. Nível de Evidência IV; Série de casos.

Descritores:
Chá; Treinamento físico; Medicina esportiva; Sistema cardiovascular; Frequência cardíaca

ABSTRACT

Introduction:

Green tea is associated with a series of health benefits, as is physical training. However, in combination they present little known chronotropic and autonomic cardiac effects.

Objective:

To evaluate the effect of the association of chronic administration of green tea and physical training on basal heart rate (HR) and heart rate variability (HRV) in Wistar rats.

Methods:

Forty-three Wistar rats (Rattus norvegicus, var. albinus), paired by weight and age, were distributed among four experimental groups, titled sedentary control (CONsed, n = 10), trained control (CONtre, n = 08), sedentary tea (CHÁsed, n = 16) and trained tea (CHÁtre, n = 09). Ingestion of the tea was ad libitum. The physical training protocol lasted for eight weeks and consisted of sessions of swimming with incremental loads. At the end of the training, basal heart rate and heart rate variability (HRV) in both time and frequency domains were determined. The level of significance adopted was 5% (p < 0.05).

Results:

Both physical training and consumption of green tea caused higher resting bradycardia than that of the CONsed group animals. Regarding HRV, the CONtre, CHÁsed, and CHÁtre groups presented significantly higher values than the CONsed group. Supplementation with green tea caused an increase in the variance, high frequency (HF) component, and sympathovagal balance as compared to the CONsed group. Physical training (PT) did not enhance any of the parameters evaluated.

Conclusions:

There was no significant optimization of the hemodynamic or autonomic cardiovascular parameters resulting from the association between the administration of green tea and physical training in Wistar rats. Level of Evidence IV; Case Series.

Keywords:
Tea; Exercise; Sports medicine; Cardiovascular system; Heart rate

RESUMEN

Introducción:

El té verde está asociado a una serie de beneficios para la salud, así como el entrenamiento físico. Sin embargo, la asociación de ambos presenta efectos cronotrópicos y autonómicos cardíacos poco conocidos.

Objetivo:

Evaluar el efecto de la asociación de la administración crónica de té verde y el entrenamiento físico sobre la frecuencia cardíaca (FC) basal y la variabilidad de la frecuencia cardíaca (VFC) en ratas Wistar.

Métodos:

Cuarenta y tres ratas Wistar (Rattus norvegicus, var. albinus), clasificadas por peso y edad, fueron distribuidas en cuatro grupos experimentales denominados control sedentario (CONsed, n = 10), control entrenado (CONtre, n = 08), té sedentario (CHÁsed, n = 16) y té entrenado (CHÁtre, n = 09). La ingesta de té fue “ad libitum”. El protocolo de entrenamiento físico duró ocho semanas y se realizó mediante sesiones de natación con incrementos de carga. Al final, se determinó la frecuencia cardíaca basal y la variabilidad de la frecuencia cardíaca (VFC) en los dominios del tiempo y la frecuencia. El nivel de significancia adoptado fue del 5% (p < 0,05).

Resultados:

Tanto el entrenamiento físico como el consumo de té verde promovieron una mayor bradicardia en reposo en comparación con los animales del grupo CONsed. En cuanto a la VFC, los grupos CONtre, CHÁsed y CHÁtre presentaron valores significativamente más altos que el grupo CONsed. La suplementación con té verde provocó un aumento de la varianza, del componente de alta frecuencia (HF) y del balance simpático-vagal en relación con el grupo CONsed. El entrenamiento físico (TF) no potenció ninguno de los parámetros evaluados.

Conclusiones:

No hubo una optimización significativa de los parámetros hemodinámicos y autonómicos cardiovasculares derivada de la asociación entre la administración de té verde y el entrenamiento de ejercicio en ratas Wistar. Nivel de Evidencia IV; Serie de casos.

Descriptores:
Té; Ejercicio físico; Medicina deportiva; Sistema cardiovascular; Frecuencia cardíaca

INTRODUÇÃO

Mais conhecido pelos seus efeitos termogênicos, o chá verde está associado a uma série de benefícios à saúde,11 Mineharu Y, Koizumi A, Wada Y, Iso H, Watanabe Y, Date C, et al. Coffee, green tea, black tea and oolong tea consumption and risk of mortality from cardiovascular disease in Japanese men and women. J Epidemiol Community Health. 2011;65:230-40.,22 Chacko SM, Thambi PT, Kuttan R, Nishigaki I. Beneficial effects of green tea: a literature review. Chin Med. 2010;5:13. atribuídos principalmente pela presença de catequinas, que são polifenóis cujo representante com maior poder biológico é a epigalocatequina-3-galato (EGCG).

No sistema cardiovascular essas substâncias possuem efeitos protetores,22 Chacko SM, Thambi PT, Kuttan R, Nishigaki I. Beneficial effects of green tea: a literature review. Chin Med. 2010;5:13. possivelmente devido ao seu poder anti-inflamatório, com primordial redução do estresse oxidativo, além de repercussões importantes também no sistema nervoso autônomo, principalmente por prolongar e intensificar a estimulação parassimpática.33 Garcia ML, Pontes RB, Nishi EE, Ibuki FK, Oliveira V, Sawaya A, et al. The antioxidant effects of green tea reduces blood pressure and sympathoexcitation in an experimental model of hypertension. J. Hypertens. 2017;35:348-54.

Benefícios semelhantes também são proporcionados pelo treinamento físico. Sabe-se que o treinamento físico aeróbio em intensidade moderada reduz a atividade nervosa simpática em diversas populações,44 Macdonald JR. Potential causes, mechanisms and implications of post exercise hypotension. J Hum Hypertens. 2002;16:225-36.,55 Araújo CEL, Ferreira-Silva R, Gara EM, Goya TT, Guerra RS, Matheus L, et al. Effects of exercise training on autonomic modulation and mood symptoms in patients with obstructive sleep apnea. Braz J Med Biol Res. 2021;54(5):e10543. com repercussões importantes na fisiologia cardiovascular e consequente diminuição nas taxas de mortalidade.66 Andrade DC, Arce-Alvarez A, Toledo C, Diaz HS, Lucero C, Schultz HD, et al. Exercise training improves cardiac autonomic control, cardiac function, and arrhythmogenesis in rats with preserved-ejection fraction heart failure. J Appl Physiol. 2017;123:567-77.

Quando associados sabe-se que, por exemplo, o efeito termogênico do chá verde pode ser potencializado,77 Venables MC, Hulston CJ, Cox HR, Jeukendrup AE. Green tea extract ingestion, fat oxidation, and glucose tolerance in healthy humans. Am J Clin Nutr. 2008;87:778-84. uma vez que o dispêndio energético se torna maior durante o treinamento físico, o que favorece o metabolismo e, dessa forma, o emagrecimento.88 Bagheri R, Rashidlamir A, Ashtary-Larky D, Wong A, Grubbs B, Motevalli MS, et al. Effects of green tea extract supplementation and endurance training on irisin, pro-inflammatory cytokines, and adiponectin concentrations in overweight middle-aged men. Eur J Appl Physiol. 2020;120(4):915-23. Porém, quanto ao sistema cardiovascular, até o momento são limitados os estudos que evidenciam os efeitos a longo prazo da combinação de chá verde e exercício físico.

Propõe-se assim que a aplicação de chá verde aliada ao treinamento físico por um período de oito semanas influenciará os padrões cronotrópicos e autonômicos cardíacos. O objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito da associação da administração crônica de chá verde e do treinamento físico sobre a frequência cardíaca (FC) basal e a variabilidade da frequência cardíaca (VFC) em ratos Wistar.

MATERIAL E MÉTODOS

Quarenta e três ratos Wistar (Rattus norvegicus, var. albinus), pareados pelo peso (356,23 gramas) e por idade (± 12 semanas), foram mantidos em caixas coletivas (ZOOTECH 375) de polipropileno autoclavável 414 x 344 x 168 mm forradas por maravalha, com tampa (grade) em aço galvanizado e separadores em aço inox, em temperatura ambiente de 22- 23°C, umidade de 40-70% e fotoperíodo de 12 horas claro/escuro, com livre acesso à água ou chá e ração (Nuvilab CR1, Nuvital Nutrientes Ltda, Curitiba, Paraná, Brasil).

Os animais foram distribuídos, de acordo com o tratamento recebido, em quatro grupos experimentais, nomeados de controle sedentário (CONsed, n=10), controle treinado (CONtre, n=08), chá sedentário (CHAsed, n=16) e chá treinado (CHAtre, n=09).

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) (protocolo 338) e todos os procedimentos experimentais empregados estão de acordo com as normas para o uso e cuidados dos animais de laboratório em pesquisa.99 Albus U. Guide for the Care and Use of Laboratory Animals (8th edn). LabAnimals. 2012;46(3):267-8.,1010 Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (CONCEA). Diretriz Brasileira para o cuidado e a utilização de animais para fins científicos e didáticos. Brasília (DF). 2013 [acesso em 2021 abr 04]. Disponível em: http://sbcal.org.br/conteudo/view?ID_CONTEUDO=65
http://sbcal.org.br/conteudo/view?ID_CON...

Treinamento Físico

Os animais do grupo treinado foram submetidos a sessões de treinamento físico (TF) por natação com uma frequência de cinco vezes por semana durante um período de oito semanas. O protocolo de TF adotado foi adaptado de estudo prévio,1111 Medeiros A, Oliveira EM, Gianolla R, Casarini DE, Negrão CE, Brum PC. Swimming training increases cardiac vagal activity and induces cardiac hypertrophy in rats. Braz J Med Biol Res. 2004;37(12):1909-17. com metodologia semelhante, e caracterizado como moderada intensidade, suficiente para otimizar a capacidade oxidativa muscular (Figura 1).

Figura 1
Protocolo de natação adotado pelos grupos treinados.

Os grupos sedentários foram dispostos no tanque por dez minutos, cinco vezes por semana, sem peso na cauda, com intuito de descartar possíveis alterações fisiológicas que pudessem ocorrer devido ao estresse aquático.

O TF, iniciado diariamente às 13 horas, foi realizado em um tanque de vidro com dimensões de 100 x 50 x 60 cm, com água aquecida em 30 °C ± 2 °C e a uma profundidade de 50 cm, suficiente para evitar que os animais encostassem a cauda no fundo do tanque e repousasse.

Após as seções de TF, os animais eram secados com papel toalha, colocados em um ambiente seco sem maravalha por cinco minutos e, em seguida, em um ambiente com maravalha sob luz incandescente (60 watts) por um período de 15 minutos, para que fossem aquecidos antes de retornarem para as caixas.

Preparo e administração do chá verde

Para o preparo do chá verde foram utilizadas folhas da erva Camellia Sinensis, no total de dois gramas do vegetal adicionados em 1000 mililitros de água fervente (método de infusão). Após 20 minutos, a mistura foi filtrada e um volume determinado colocado em bebedouros opacos.

O chá foi preparado diariamente concomitante com o período de treinamento físico. A partir da 12ª semana de vida, os animais dos grupos que ingeriram o chá tiveram o mesmo “ad libitum”. O chá foi preparado sempre às 08:00h. Foi separada uma alíquota desse chá para a verificação e liofilização da massa do chá verde, a fim de ser estimada a quantidade de chá ingerida por cada animal.

Análise cronotrópica

No período de 24 horas após a última sessão do protocolo de natação, os animais de ambos os grupos treinados foram submetidos a procedimento cirúrgico para canulação da artéria femoral direita. Em seguida, os cateteres foram exteriorizados para a região dorsal, a fim de posicioná-los adequadamente para o momento do registro direto dos parâmetros hemodinâmicos. Os animais permaneceram alojados em caixas individuais com água ou chá verde e ração ad libitum para recuperação pós-operatória.

No dia seguinte a cirurgia, o cateter arterial foi conectado a um transdutor de pressão arterial (PA) e a um amplificador de sinais (Model 8805A®, Hewlett-Packard, EUA), onde o sinal foi convertido por placa análogo-digital com frequência de amostragem de 1000 Hz. Em seguida, o sinal foi transferido para um sistema computadorizado de aquisição de dados (Aqdados®, Lynx Tec. Eletron. SA, São Paulo, Brasil) e posteriormente armazenado no computador.

No momento do registro, todos os animais permaneceram em uma sala com controle de ruído e com temperatura de 27 °C. Após o posicionamento dos animais e conexão ao equipamento, eles foram submetidos a um período de adaptação de 15 minutos para, em seguida, realizarem os registros. Após o período de adaptação do animal e adequação da captação do sinal, iniciou-se o registro contínuo da PA pulsátil por 30 minutos, para obtenção dos valores da frequência cardíaca (FC). Posteriormente, esses valores basais foram utilizados para analisar a Variabilidade da Frequência Cardíaca (VFC) no domínio do tempo (DT), através da variância dos valores de intervalo de pulso (IP), e no domínio da frequência, através de análise espectral autorregressiva.1212 Task Force of the European Society of Cardiology and the North American Society of Pacing and Electrophysiology. Heart rate variability: standards of measurement, physiological interpretation, and clinical use. Eur Heart J. 1996;17:354-81.

Variabilidade da frequência cardíaca

Séries temporais de IP, coletadas durante os 30 minutos basais, foram divididas em segmentos seriados de 300 batimentos, nas quais a decomposição espectral foi realizada. Este procedimento permitiu automaticamente quantificar a frequência central e a potência de cada componente espectral relevante em unidades absolutas, bem como em unidades normalizadas. A normalização dos valores minimiza a interferência da potência total sobre os componentes.

O procedimento de normalização foi realizado pela divisão da potência do componente de baixa frequência (low frequency – LF; 0,15-0.4 Hz) ou de alta frequência (high frequency – HF; 0.04 –0,15 Hz) pela potência espectral total, da qual se subtraiu a potência da banda de muito baixa frequência (very low frequency – VLF, 0.01-0.20 Hz), multiplicando-se o resultado por 100.1212 Task Force of the European Society of Cardiology and the North American Society of Pacing and Electrophysiology. Heart rate variability: standards of measurement, physiological interpretation, and clinical use. Eur Heart J. 1996;17:354-81.

Os parâmetros espectrais obtidos para cada segmento estacionário individual de 300 batimentos foram medidos, e valores médios resultantes para os 30 minutos basais foram coletados para cada animal. O quociente entre LF e HF (razão LF/HF) foi utilizado para expressar o balanço simpato-vagal. A potência normalizada dos componentes de LF e HF foi calculada em unidades normalizadas (nu), usando as equações citadas anteriormente.1212 Task Force of the European Society of Cardiology and the North American Society of Pacing and Electrophysiology. Heart rate variability: standards of measurement, physiological interpretation, and clinical use. Eur Heart J. 1996;17:354-81.

Análise estatística

A normalidade dos dados foi testada por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov. Para dados normais, foram realizados o teste ANOVA "two way" seguido do Post hoc de Tukey ou o teste Mann- Whitney, de acordo com a normalidade. O nível de significância adotado foi de 5% (p <0,05). As análises foram conduzidas utilizando-se o software SigmaStat 8.0 (Jandel Scientific Software; SPSS, Chicago, IL).

RESULTADOS

O consumo médio de chá pelos animais foi de 207,1 mg ao longo do dia, sem diferença significativa entre os grupos.

Tanto o treinamento físico (CONtre 309,2 ± 9,9 bpm) quanto o consumo de chá verde (CHÁsed 302,5 ± 7,13 bpm e CHÁtre 305,6 ±10,8 bpm) promoveram uma maior bradicardia de repouso, quando comparados aos animas do grupo CONsed (348 ± 12,56; p<0,05). Por outro lado, a suplementação do chá verde aliada ao TF não potencializou a bradicardia entre os grupos CONtre, CHÁsed e CHÁtre (Figura 2).

Figura 2
Frequência cardíaca basal dos grupos do estudo (apresentados como média e erro padrão da média).

Em relação à VFC, os grupos CONtre, CHÁsed e CHÁtre apresentaram valores significativamente maiores que o grupo CONsed. A suplementação do chá verde ocasionou um aumento da variância, do componente HF e do balanço simpato-vagal em relação ao grupo CONsed, e o TF não potencializou este aumento. Os grupos CONtre, CHÁsed e CHÁtre apresentaram o componente LF significativamente maior que o grupo CONsed. Em adição, o grupo CHÁtre apresentou aumento do LF em relação ao grupo CHÁsed. Os demais dados da VFC não apresentaram diferenças significativas entre eles (Tabela 1).

Tabela 1
Valores dos componentes da VFC nos domínios do tempo e da frequência.

DISCUSSÃO

Os principais achados desse estudo foram que tanto a suplementação do chá verde quanto o TF promoveram melhores ajustes do ritmo cardíaco, porém a associação desses fatores não evoluiu com potencialização dos efeitos.

O TF empregado no estudo e a suplementação de chá verde promoveram uma significativa bradicardia de repouso. Em se tratando do efeito do treinamento, dados semelhantes foram observados em estudos prévios, realizados através de protocolo similar de TF.1111 Medeiros A, Oliveira EM, Gianolla R, Casarini DE, Negrão CE, Brum PC. Swimming training increases cardiac vagal activity and induces cardiac hypertrophy in rats. Braz J Med Biol Res. 2004;37(12):1909-17.,1313 Chaar LJ, Alves TP, Batista Junior AM, Michelini LC. Early Training-Induced Reduction of Angiotensinogen in Autonomic Areas-The Main Effect of Exercise on Brain Renin-Angiotensin System in Hypertensive Rats. PLoS ONE. 2015;10: e0137395.,1414 Sá JC, Costa EC, da Silva E, Tamburús NY, Porta A, Medeiros LF, et al. Aerobic exercise improves cardiac autonomic modulation in women with polycystic ovary syndrome. Int J Cardiol. 2016;202:356-61. Sabe-se que o exercício aeróbio realizado cronicamente reduz os valores da FC de repouso tanto em humanos1515 Dawkins TG, Shave RE, Baggish AL, Drane AL, Parisi EJ, Roberts MG, et al. Electrocardiographic changes following six months of long-distance triathlon training in previously recreationally active individuals. Eur J Sport Sci. 2020;20(4):553-62. quanto em modelos animais,1616 Polyák A, Kui P, Morvay N, Leprán I, Ágoston G, Varga A, et al. Long-term endurance training-induced cardiac adaptation in new rabbit and dog animal models of the human athlete’s heart. Rev Cardiovasc Med. 2018;19(4):135-42. e isso é considerado um importante marcador de adaptação deste tipo de treinamento no sistema cardiovascular.1717 De Angelis K, Wichi RB, Jesus WR, Moreira ED, Morris M, Krieger EM, et al. Exercise training changes autonomic cardiovascular balance in mice. J Appl Physiol. 2004;96(6):2174-8. Esse achado mostra, portanto, a efetividade do protocolo utilizado no atual estudo.

O chá verde também foi eficaz em reduzir a FC de repouso, resultado esse que foi semelhante ao observado em outros estudos.1818 Ikeda M, Suzuki C, Umegaki K, Saito K, Tabuchi M, Tomita T. Preventive effects of green tea catechins on spontaneous stroke in rats. Med Sci Monit. 2007;13(2):40-5.,1919 Chakraborty M, Kamath JV. Pharmacodynamic interaction of green tea extract with hydrochlorothiazide against ischemia-reperfusion injury-induced myocardial infarction. J Adv Pharm Technol Res. 2014;5(3):134-9. Essa bradicardia de repouso possivelmente está associada aos mecanismos que justificam os achados de outros efeitos cardioprotetores do extrato do chá verde, como melhoria do padrão diastólico em portadores de miocardiopatia,2020 Quan J, Jia Z, Lv T, Zhang L, Liu L, Pan B, et al. Green tea extract catechin improves cardiac function in pediatric cardiomyopathy patients with diastolic dysfunction. J Biomed Sci. 2019;26(1):32. controle dos níveis pressóricos em hipertensos,33 Garcia ML, Pontes RB, Nishi EE, Ibuki FK, Oliveira V, Sawaya A, et al. The antioxidant effects of green tea reduces blood pressure and sympathoexcitation in an experimental model of hypertension. J. Hypertens. 2017;35:348-54. dentre outros.2121 Nacerai H, Gregory T, Sihem B, Salah A, Souhila AB. Green tea beverage and epigallocatecihin gallate attenuate nicotine cardiocytotoxicity in rat. Acta Pol Pharm. 2017;74(1):277-87.,2222 Chen TS, Liou SY, Lin HH, Hung MY, Lin CC, Lin YM, et al. Oral administration of green tea Epigallocatechin-3-gallate reduces oxidative stress and enhances restoration of cardiac function in diabetic rats receiving autologous transplantation of adipose-derived stem cells. Arch Physiol Biochem. 2021;127(1):82-9. Desses mecanismos, o mais conhecido atualmente é o seu potencial de atuar no controle do estresse oxidativo, tanto em nível vascular quanto sistêmico.22 Chacko SM, Thambi PT, Kuttan R, Nishigaki I. Beneficial effects of green tea: a literature review. Chin Med. 2010;5:13.,33 Garcia ML, Pontes RB, Nishi EE, Ibuki FK, Oliveira V, Sawaya A, et al. The antioxidant effects of green tea reduces blood pressure and sympathoexcitation in an experimental model of hypertension. J. Hypertens. 2017;35:348-54.,2323 Mineharu Y, Koizumi A, Wada Y, Iso H, Watanabe Y, Date C, et al. Coffee, green tea, black tea and oolong tea consumption and risk of mortality from cardiovascular disease in Japanese men and women. J Epidemiol Community Health. 2011;65(3):230-40.

Sabe-se que a bradicardia de repouso é mais pronunciada em praticantes de exercício físico em intensidades crescentes, com o principal exemplo de baixas FC entre atletas profissionais.1515 Dawkins TG, Shave RE, Baggish AL, Drane AL, Parisi EJ, Roberts MG, et al. Electrocardiographic changes following six months of long-distance triathlon training in previously recreationally active individuals. Eur J Sport Sci. 2020;20(4):553-62. Porém, quanto à associação entre suplementação em doses crescentes de chá verde e a bradicardia de repouso, os achados atuais são conflitantes.1919 Chakraborty M, Kamath JV. Pharmacodynamic interaction of green tea extract with hydrochlorothiazide against ischemia-reperfusion injury-induced myocardial infarction. J Adv Pharm Technol Res. 2014;5(3):134-9.,2424 Bérubé-Parent S, Pelletier C, Doré J, Tremblay A. Effects of encapsulated green tea and Guarana extracts containing a mixture of epigallocatechin-3-gallate and caffeine on 24 h energy expenditure and fat oxidation in men. Br J Nutr. 2005;94(3):432-6.

Os resultados da bradicardia de repouso evidenciada pelo TF e pela administração de chá verde podem ser corroborados também pelo aumento da variância da FC, o qual é correspondente por uma maior atividade vagal sobre o nó sinusal estimada no domínio do tempo.1212 Task Force of the European Society of Cardiology and the North American Society of Pacing and Electrophysiology. Heart rate variability: standards of measurement, physiological interpretation, and clinical use. Eur Heart J. 1996;17:354-81. Em adição, também foi observado um aumento da banda de alta frequência (HF) nos animais dos grupos CHÁsed e CHÁtre, que é o componente espectral modulado pelo sistema nervoso parassimpático. Esses resultados, de certa forma, mostram que o uso crônico do chá verde promoveu um melhor ajuste do ritmo cardíaco diante de diferentes momentos e estímulos, como por exemplo do TF.

Observou-se a exiguidade de potencialização de efeitos, tanto em relação à bradicardia de repouso quanto à VFC, na associação entre chá verde e TF. A ausência dessa intensificação de efeitos também foi verificada em estudo duplo-cego e randomizado que avaliou os parâmetros da VFC durante suplementação de bebida energética (cafeína e chá verde) e treinamento de ciclismo.2525 Clark NW, Herring CH, Goldstein ER, Stout JR, Wells AJ, Fukuda DH. Heart Rate Variability Behavior during Exercise and Short-Term Recovery Following Energy Drink Consumption in Men and Women. Nutrients. 2020;12(8):2372. Portanto, até o momento, os estudos sugerem que não há uma incrementação dessas variáveis hemodinâmicas na associação.

Quanto a outros fatores, os achados da literatura são discordantes. Recente metanálise observou que a suplementação de chá verde associada ao exercício físico não mostrou uma maior potencialização na melhora do perfil lipídico em humanos.2626 Zhang Tengfei, Chen Si, Saito Atushi. A meta-analysis of the effects of green tea combined with physical activity on blood lipids in humans. Rev Bras Med Esporte [Internet]. 2020 Oct [acesso em 2021 abr 04]; 26(5):454-60. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S151786922020000500454&lng=en.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
Porém, estudos em humanos obesos evidenciou-se potencialização dos efeitos da associação entre suplementação do chá verde e o treinamento aeróbio sobre parâmetros anti-inflamatórios e antropométricos.88 Bagheri R, Rashidlamir A, Ashtary-Larky D, Wong A, Grubbs B, Motevalli MS, et al. Effects of green tea extract supplementation and endurance training on irisin, pro-inflammatory cytokines, and adiponectin concentrations in overweight middle-aged men. Eur J Appl Physiol. 2020;120(4):915-23.,2727 Bagheri R, Rashidlamir A, Ashtary-Larky D, Wong A, Alipour M, Motevalli MS, et al. Does green tea extract enhance the anti-inflammatory effects of exercise on fat loss? Br J Clin Pharmacol. 2020;86(4):753-62.

As principais limitações do nosso estudo consistem na ausência de ingestão do chá verde pelo método de gavagem e de suplementação de doses crescentes entre os grupos. De uma forma geral, a variedade de resultados na literatura que abordam esse tema sugere que é preciso, inicialmente, um melhor entendimento acerca dos parâmetros que envolvem a suplementação, como a concentração, diluição, tempo e forma de administração, para assim conhecermos a melhor forma de obter os resultados buscados com essa intervenção. Entretanto, aliado aos conhecimentos atuais, sugere-se que a concomitância entre chá verde e TF pode não resultar em soma de efeitos autonômicos cardiovasculares.

CONCLUSÃO

Nossos dados demonstram que não houve otimização significativa nos parâmetros hemodinâmicos e autonômicos cardiovasculares em decorrência da associação entre administração de chá verde e treinamento físico em ratos Wistar.

REFERENCES

  • 1
    Mineharu Y, Koizumi A, Wada Y, Iso H, Watanabe Y, Date C, et al. Coffee, green tea, black tea and oolong tea consumption and risk of mortality from cardiovascular disease in Japanese men and women. J Epidemiol Community Health. 2011;65:230-40.
  • 2
    Chacko SM, Thambi PT, Kuttan R, Nishigaki I. Beneficial effects of green tea: a literature review. Chin Med. 2010;5:13.
  • 3
    Garcia ML, Pontes RB, Nishi EE, Ibuki FK, Oliveira V, Sawaya A, et al. The antioxidant effects of green tea reduces blood pressure and sympathoexcitation in an experimental model of hypertension. J. Hypertens. 2017;35:348-54.
  • 4
    Macdonald JR. Potential causes, mechanisms and implications of post exercise hypotension. J Hum Hypertens. 2002;16:225-36.
  • 5
    Araújo CEL, Ferreira-Silva R, Gara EM, Goya TT, Guerra RS, Matheus L, et al. Effects of exercise training on autonomic modulation and mood symptoms in patients with obstructive sleep apnea. Braz J Med Biol Res. 2021;54(5):e10543.
  • 6
    Andrade DC, Arce-Alvarez A, Toledo C, Diaz HS, Lucero C, Schultz HD, et al. Exercise training improves cardiac autonomic control, cardiac function, and arrhythmogenesis in rats with preserved-ejection fraction heart failure. J Appl Physiol. 2017;123:567-77.
  • 7
    Venables MC, Hulston CJ, Cox HR, Jeukendrup AE. Green tea extract ingestion, fat oxidation, and glucose tolerance in healthy humans. Am J Clin Nutr. 2008;87:778-84.
  • 8
    Bagheri R, Rashidlamir A, Ashtary-Larky D, Wong A, Grubbs B, Motevalli MS, et al. Effects of green tea extract supplementation and endurance training on irisin, pro-inflammatory cytokines, and adiponectin concentrations in overweight middle-aged men. Eur J Appl Physiol. 2020;120(4):915-23.
  • 9
    Albus U. Guide for the Care and Use of Laboratory Animals (8th edn). LabAnimals. 2012;46(3):267-8.
  • 10
    Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (CONCEA). Diretriz Brasileira para o cuidado e a utilização de animais para fins científicos e didáticos. Brasília (DF). 2013 [acesso em 2021 abr 04]. Disponível em: http://sbcal.org.br/conteudo/view?ID_CONTEUDO=65
    » http://sbcal.org.br/conteudo/view?ID_CONTEUDO=65
  • 11
    Medeiros A, Oliveira EM, Gianolla R, Casarini DE, Negrão CE, Brum PC. Swimming training increases cardiac vagal activity and induces cardiac hypertrophy in rats. Braz J Med Biol Res. 2004;37(12):1909-17.
  • 12
    Task Force of the European Society of Cardiology and the North American Society of Pacing and Electrophysiology. Heart rate variability: standards of measurement, physiological interpretation, and clinical use. Eur Heart J. 1996;17:354-81.
  • 13
    Chaar LJ, Alves TP, Batista Junior AM, Michelini LC. Early Training-Induced Reduction of Angiotensinogen in Autonomic Areas-The Main Effect of Exercise on Brain Renin-Angiotensin System in Hypertensive Rats. PLoS ONE. 2015;10: e0137395.
  • 14
    Sá JC, Costa EC, da Silva E, Tamburús NY, Porta A, Medeiros LF, et al. Aerobic exercise improves cardiac autonomic modulation in women with polycystic ovary syndrome. Int J Cardiol. 2016;202:356-61.
  • 15
    Dawkins TG, Shave RE, Baggish AL, Drane AL, Parisi EJ, Roberts MG, et al. Electrocardiographic changes following six months of long-distance triathlon training in previously recreationally active individuals. Eur J Sport Sci. 2020;20(4):553-62.
  • 16
    Polyák A, Kui P, Morvay N, Leprán I, Ágoston G, Varga A, et al. Long-term endurance training-induced cardiac adaptation in new rabbit and dog animal models of the human athlete’s heart. Rev Cardiovasc Med. 2018;19(4):135-42.
  • 17
    De Angelis K, Wichi RB, Jesus WR, Moreira ED, Morris M, Krieger EM, et al. Exercise training changes autonomic cardiovascular balance in mice. J Appl Physiol. 2004;96(6):2174-8.
  • 18
    Ikeda M, Suzuki C, Umegaki K, Saito K, Tabuchi M, Tomita T. Preventive effects of green tea catechins on spontaneous stroke in rats. Med Sci Monit. 2007;13(2):40-5.
  • 19
    Chakraborty M, Kamath JV. Pharmacodynamic interaction of green tea extract with hydrochlorothiazide against ischemia-reperfusion injury-induced myocardial infarction. J Adv Pharm Technol Res. 2014;5(3):134-9.
  • 20
    Quan J, Jia Z, Lv T, Zhang L, Liu L, Pan B, et al. Green tea extract catechin improves cardiac function in pediatric cardiomyopathy patients with diastolic dysfunction. J Biomed Sci. 2019;26(1):32.
  • 21
    Nacerai H, Gregory T, Sihem B, Salah A, Souhila AB. Green tea beverage and epigallocatecihin gallate attenuate nicotine cardiocytotoxicity in rat. Acta Pol Pharm. 2017;74(1):277-87.
  • 22
    Chen TS, Liou SY, Lin HH, Hung MY, Lin CC, Lin YM, et al. Oral administration of green tea Epigallocatechin-3-gallate reduces oxidative stress and enhances restoration of cardiac function in diabetic rats receiving autologous transplantation of adipose-derived stem cells. Arch Physiol Biochem. 2021;127(1):82-9.
  • 23
    Mineharu Y, Koizumi A, Wada Y, Iso H, Watanabe Y, Date C, et al. Coffee, green tea, black tea and oolong tea consumption and risk of mortality from cardiovascular disease in Japanese men and women. J Epidemiol Community Health. 2011;65(3):230-40.
  • 24
    Bérubé-Parent S, Pelletier C, Doré J, Tremblay A. Effects of encapsulated green tea and Guarana extracts containing a mixture of epigallocatechin-3-gallate and caffeine on 24 h energy expenditure and fat oxidation in men. Br J Nutr. 2005;94(3):432-6.
  • 25
    Clark NW, Herring CH, Goldstein ER, Stout JR, Wells AJ, Fukuda DH. Heart Rate Variability Behavior during Exercise and Short-Term Recovery Following Energy Drink Consumption in Men and Women. Nutrients. 2020;12(8):2372.
  • 26
    Zhang Tengfei, Chen Si, Saito Atushi. A meta-analysis of the effects of green tea combined with physical activity on blood lipids in humans. Rev Bras Med Esporte [Internet]. 2020 Oct [acesso em 2021 abr 04]; 26(5):454-60. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S151786922020000500454&lng=en.
    » http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S151786922020000500454&lng=en
  • 27
    Bagheri R, Rashidlamir A, Ashtary-Larky D, Wong A, Alipour M, Motevalli MS, et al. Does green tea extract enhance the anti-inflammatory effects of exercise on fat loss? Br J Clin Pharmacol. 2020;86(4):753-62.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    08 Abr 2021
  • Aceito
    04 Out 2021
Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte Av. Brigadeiro Luís Antônio, 278, 6º and., 01318-901 São Paulo SP, Tel.: +55 11 3106-7544, Fax: +55 11 3106-8611 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: atharbme@uol.com.br