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RELAÇÃO QUANTITATIVA ENTRE ATIVIDADE FÍSICA E ANTI-HIPERTENSIVOS EM IDOSAS

RESUMO

Introdução:

A atividade física é uma importante ferramenta no manejo da hipertensão arterial sistêmica. No entanto, pouco se sabe sobre a relação entre a atividade física e a quantidade de anti-hipertensivos usados por idosos.

Objetivo:

O objetivo deste estudo foi realizar uma comparação entre o número de anti-hipertensivos usados por idosas (≥ 60 anos) com baixo nível de atividade física com o número usado por aquelas com alto nível de atividade física, verificando quantas participantes usaram mais de dois anti-hipertensivos.

Métodos:

Vinte e oito idosas fisicamente ativas com hipertensão arterial sistêmica que participavam de um programa de atividade física para idosas da comunidade foram divididas em dois grupos: as participantes que apresentaram níveis mais baixos de atividade física habitual foram colocadas no grupo 1 e as participantes que apresentaram maiores níveis de atividade física foram colocados no grupo 2, de acordo com o questionário de Baecke. Ademais, coletou-se o número de medicamentos anti-hipertensivos utilizados pelas participantes.

Resultados:

O número de fármacos anti-hipertensivos prescritos foi de 2,0 (mediana) para ambos os grupos investigados. Não houve diferença significativa entre os grupos quanto ao número de comprimidos anti-hipertensivos prescritos (p>0,05). Embora não tenha havido diferença estatística, uma maior proporção de participantes entre o grupo de menor atividade física utilizava mais de dois anti-hipertensivos.

Conclusão:

O nível de atividade física habitual não afetou a quantidade de comprimidos anti-hipertensivos utilizados pelas idosas hipertensas. Nível de evidência II; Estudos terapêuticos - Investigação dos resultados do tratamento.

Descritores:
Exercício físico; Atividade Física; Pressão Sanguínea; Terapêutica, Hipertensão; Comprimidos

ABSTRACT

Introduction:

Physical activity is an important tool to manage systemic arterial hypertension. However, less is known about the relationship of physical activity with the number of antihypertensive drugs used by older adults.

Objective:

The aim of this study was to compare the number of antihypertensive drugs used by older female adults (aged ≥ 60 years) with a low level of physical activity with the number used by those with a high level of physical activity, and to verify how many participants used more than two antihypertensive drugs.

Methods:

Twenty-eight physically active older women with systemic arterial hypertension who participated in a physical activity program for community-dwelling older female adults were divided into two groups: participants who presented lower habitual physical activity levels were placed in group 1 and participants that presented higher habitual physical activity levels were placed in group 2, according to the Baecke questionnaire. In addition, the number of antihypertensive drugs used by participants was collected.

Results:

The number of prescribed antihypertensive drugs was 2.0 (median) for both groups investigated. There was no significant difference between groups regarding the number of antihypertensive tablets prescribed (p>0.05). Although there was no statistical difference, a higher proportion of participants from the lower physical activity group used more than two antihypertensive drugs.

Conclusion:

The level of habitual physical activity did not affect the number of antihypertensive tablets used by hypertensive elderly women. Level of evidence II; Therapeutic studies – investigation of treatment results.

Keywords:
Exercise; Physical activity; Blood pressure; Therapeutics; Hypertension; Tablet

RESUMEN

Introducción:

La actividad física es una herramienta importante para el manejo de la hipertensión arterial sistémica. Sin embargo, se sabe poco sobre la relación de la actividad física con la cantidad de medicamentos antihipertensivos utilizados por las ancianas.

Objetivo:

El objetivo de este estudio fue hacer una comparación entre el número de medicamentos antihipertensivos utilizados por mujeres adultas mayores (≥ 60 años) y bajo nivel de actividad física con el número utilizado por aquellas con alto nivel de actividad física, y verificar cuántas de las participantes usaron más de dos medicamentos antihipertensivos.

Métodos:

Veintiocho ancianas físicamente activas con hipertensión arterial sistémica que participaron en un programa de actividad física para mujeres adultas mayores residentes en la comunidad fueran divididas en dos grupos: las participantes que presentaron niveles más bajos de actividad física habitual se ubicaron en el grupo 1 y las participantes que presentaron los mayores niveles de actividad física se ubicaron en el grupo 2, según el cuestionario de Baecke. Además, se recogió el número de medicamentos antihipertensivos utilizados por las participantes.

Resultados:

El número de comprimidos antihipertensivos prescritos fue de 2,0 (mediana) para ambos grupos investigados. No hubo diferencia significativa entre los grupos en cuanto al número de medicamentos antihipertensivos prescritos (p>0,05). Aunque no hubo diferencia estadística, una mayor proporción de participantes del grupo de menor actividad física usó más de dos medicamentos antihipertensivos.

Conclusión:

El nivel de actividad física habitual no afectó el número de comprimidos antihipertensivos utilizados por las ancianas hipertensas. Nivel de evidencia II; Estudios terapéuticos: investigación de los resultados del tratamiento.

Descriptores:
Ejercicio Físico; Actividad Física; Presión Sanguínea, Terapéutica; Hipertensión; Comprimidos

IntroduÇÃO

O envelhecimento da população e o aumento da prevalência de doenças crônicas não transmissíveis entre os idosos são grandes desafios para a sociedade e comunidade médica 1. Dentre estas doenças, a hipertensão arterial sistêmica é causa e consequência significativa de incapacidade entre os idosos 2,3.

A hipertensão arterial sistêmica é uma condição clínica multifatorial caracterizada por níveis pressóricos elevados e sustentados. É frequentemente associada a alterações funcionais e/ou estruturais em órgãos-alvo (por exemplo, coração, cérebro, rins e vasos sanguíneos) e alterações metabólicas, com o consequente aumento do risco de eventos cardiovasculares 3,4.

De acordo com a High Blood Pressure Clinical Practice Guideline, 46% da população tem hipertensão arterial sistêmica. Além disso, a prevalência aumenta drasticamente com o aumento da idade e é maior em pessoas negras do que em caucasianos, asiáticos e hispânicos 5. Além disso, a prevalência da hipertensão arterial sistêmica é menor em mulheres do que nos homens até a quinta década, mas é maior no final da vida em mulheres do que em homens 5. Por estas razões, o estudo da hipertensão arterial sistêmica em mulheres idosas é uma área de crescente interesse.

O tratamento mais frequentemente utilizado para hipertensão arterial sistêmica é a medicação anti-hipertensiva6,7. Contudo, nas últimas décadas, terapias alternativas como a atividade física vêm ganhando notoriedade pelos importantes efeitos benéficos sobre a pressão arterial de pacientes com hipertensão arterial sistêmica8–10. De fato, uma infinidade de estudos mostrou que a atividade física pode ser um potencial tratamento não farmacológico para a melhora da pressão arterial em pacientes com hipertensão11. Devido a esses efeitos, alguns autores sugeriram que o exercício pode reduzir ou mesmo substituir o tratamento farmacológico. Neste sentido, Maruf et al. 12 investigaram os efeitos do exercício aeróbio combinado com medicamentos anti-hipertensivos sobre a pressão arterial e o número de anti-hipertensivos utilizados por indivíduos com hipertensão. Esses autores constataram que a combinação de exercícios aeróbios e anti-hipertensivos reduz o número de anti-hipertensivos necessários para alcançar o controle da pressão arterial e melhorar o controle da pressão arterial em indivíduos com hipertensão em uso de dois anti-hipertensivos. Em outro estudo, Dimeo et al. 13 demonstraram que o exercício é capaz de diminuir a pressão arterial mesmo em participantes com baixa responsividade ao tratamento médico, e concluíram que o exercício deve ser incluído na abordagem terapêutica da hipertensão resistente. Reid, Maher, e Jennings 14 mostraram que 71% dos pacientes submetidos ao manejo do estilo de vida (incluindo atividade física) que tinham sido bem controlados com medicação anti-hipertensiva foram capazes de permanecer normotensos e livres de terapia medicamentosa por 9 meses.

Pelo exposto, é indubitável o papel da atividade física no controle da pressão arterial em indivíduos com hipertensão arterial sistêmica. Por esta razão, existem muitas iniciativas governamentais que visam estimular a participação da população em programas de atividade física15,16. Essas iniciativas são programas comunitários de atividades físicas caracterizados por atividades ao ar livre que acontecem em espaços públicos, como praças, praias e parques. No Brasil, a principal preocupação com esses programas comunitários de atividade física é a falta de individualização da prescrição de exercícios, em alguns casos a falta de profissionais especializados (treinadores e/ou profissionais de educação física) para orientar e supervisionar os participantes e instalações adequadas para a prática de exercícios. Assim, é razoável supor que fatores relacionados ao treinamento físico, tais como intensidade, frequência semanal e volume, não sejam estritamente controlados. Como consequência, os benefícios à saúde podem não ser obtidos17. Especificamente, no caso de pacientes com hipertensão arterial sistêmica, espera-se, além da diminuição da pressão arterial, diminuição da quantidade de medicamentos anti-hipertensivos utilizados 7,12.

Dado que uma infinidade de estudos mostrou efeitos benéficos da atividade física sobre a pressão arterial de indivíduos com hipertensão arterial sistêmica, a atividade física pode complementar os efeitos hipotensores dos anti-hipertensivos12,18 reduzindo assim o número e/ou a dose de medicamentos necessários7,12. Este assunto é muito importante porque um número de comprimidos anti-hipertensivos diários superior a dois tem sido associado a não adesão à terapia medicamentosa 19. Considerando que os medicamentos custam dinheiro e podem produzir efeitos colaterais negativos20, é muito importante investigar estratégias que levem a uma redução na ingestão diária de comprimidos anti-hipertensivos.

Portanto, o objetivo do presente estudo foi comparar o número de medicamentos anti-hipertensivos tomados por mulheres com baixo nível de atividade física com o número de medicamentos anti-hipertensivos tomados por aquelas com alto nível de atividade. Também queríamos estabelecer quantos participantes de um grupo tomaram mais de dois medicamentos anti-hipertensivos em comparação com os participantes do outro grupo. Hipotetizamos que quanto maior o nível de atividade física habitual, menor o número de anti-hipertensivos usados e que esses participantes usariam dois ou menos anti-hipertensivos. Ressalta-se que investigar programas comunitários de atividade física tem grande validade ecológica, pois eles refletem situações e cenários reais.

MATERIAL E MÉTODOS

Participantes

Foi realizado um estudo transversal composto por 28 participantes idosas recrutadas por meio de anúncios veiculados em um programa de atividade física para idosos da comunidade (localizado na cidade de Serra, Espírito Santo, Brasil) e era composta por mulheres em uso de anti-hipertensivos. O n (28) foi determinado a partir do método de conveniência não probabilística em uma população de 280 idosas. Embora não tenhamos efetuado o cálculo amostral a priori, o poder da amostra (1 – β err prob) foi de 1,00 sendo superior ao recomendado na literatura de 0,802121 Cohen J, editor. Statistical Power Analysis for the Behavioral Sciences Second Edition. Mahwah: Lawrence Erlbaum Associates; 1988.. Para o cálculo do poder da amostra utilizamos o software G*Power (versão 3.1.9.7, Heinrich-Heine-Universität Düsseldorf, Düsseldorf, Germany) e os procedimentos propostos por Kang2121 Cohen J, editor. Statistical Power Analysis for the Behavioral Sciences Second Edition. Mahwah: Lawrence Erlbaum Associates; 1988. por meio do método post hoc para o teste de Mann-Whitney (two groups). Considerando as medianas e erros padrões da pontuação total do Baecke de 5.6 ± 0.1 (Grupo 1) e 6.5 ± 0.2 (Grupo 2), encontrou-se um effect size d = 6.01 e ainda considerando o α err prob de 0.05, o n de 14 participantes para cada grupo é apropriado.

Os critérios de inclusão utilizados foram: ser fisicamente ativa (participar de um programa de atividade física para idosos residentes na comunidade); relatar ter hipertensão arterial; fazer uso regular de pelo menos um medicamento anti-hipertensivo prescrito por médicos; e ter idade ≥ 60 anos. Foram excluídos da amostra idosos sedentários e do sexo masculino.

Após uma explicação clara dos procedimentos experimentais, incluindo os riscos e benefícios da participação, foi obtido o consentimento por escrito. A idade e as características antropométricas dos participantes são apresentadas na Tabela 1. A aprovação ética para todos os procedimentos experimentais foi concedida pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Humanos da Universidade Federal do Espírito Santo (número de protocolo [CAAE]: 63228215.1.3001.5505) e está em conformidade com os princípios delineados na Declaração de Helsinque, revisada em 2013.

Tabela 1
Características gerais dos participantes.

Desenho do estudo

Os participantes responderam a um questionário sobre o uso de medicamentos anti-hipertensivos e níveis de atividade física habitual usando o Questionário de Atividade Física Habitual Baecke 21. Devido à baixa escolaridade da amostra, utilizou-se uma entrevista para o preenchimento das questões. Os participantes foram divididos em dois grupos, de acordo com os resultados do questionário. Para isso, utilizamos o valor da mediana (mediana = 6,00) da pontuação total da atividade física habitual fornecidos pelo questionário Baecke. Assim, os participantes que apresentaram níveis mais baixos de atividade física habitual (valores abaixo da mediana) foram colocados no grupo 1 e aqueles que apresentaram valores maiores (valores acima da mediana) foram colocados no grupo 2.

Programa de atividade física para idosos residentes na comunidade

O programa de atividade física para idosos da comunidade fornece ações de promoção à saúde por meio do incentivo à prática de atividade física e alimentação saudável, visando à prevenção de doenças. São oferecidas aulas em grupo, 2 a 3 vezes por semana, com orientação para exercícios aeróbios (corrida e caminhada), ginástica localizada e alongamento, entre outros. Cada aula tinha a duração de 45- 50 minutos.

Questionário sobre o uso de medicamentos anti-hipertensivos

O questionário era composto por questões destinadas a captar informações sobre o número de medicamentos anti-hipertensivos utilizados. Vale ressaltar que o número de medicamentos anti-hipertensivos foi contabilizado independentemente de ter sido uma dose completa ou meia dose.

Questionário de Atividade Física Habitual Baecke

O nível habitual de atividade física foi avaliado pelo questionário Baecke 22. Este questionário é composto por 16 questões envolvendo três escores de atividade física habitual referentes aos últimos 12 meses: atividade física ocupacional (oito questões); exercício físico no lazer (quatro questões); e atividades físicas de lazer e locomoção (quatro questões). Como as participantes eram aposentadas ou donas de casa, avaliamos apenas o exercício físico de lazer e as atividades físicas de lazer e locomoção para os propósitos do presente estudo. A pontuação total para atividade física habitual foi obtida pela soma do exercício físico de lazer e atividades de lazer e locomoção. Quanto maior a pontuação obtida, maior o nível de atividade física habitual.

Análises estatísticas

Como o nível de atividade física habitual e o número de medicamentos anti-hipertensivos utilizados pelos participantes não estavam normalmente distribuídos de acordo com o teste de normalidade Shapiro-Wilk, os dados foram expressos como medianas (Quartil 1 - Quartil 3) e o teste Mann-Whitney foi usado para comparar variáveis entre os grupos [grupo 1 (menor atividade física habitual) vs. grupo 2 (maior atividade física habitual)]. O teste exato de Fisher foi utilizado para verificar a associação entre o nível de atividade física habitual (grupo 1 e grupo 2) e o número de anti-hipertensivos consumidos (≤2 e >2). O V de Cramer foi usado para expressar o tamanho do efeito nessas análises a fim de testar a força de qualquer associação ou significância prática da análise do teste exato de Fisher. O tamanho do efeito pode ser interpretado da seguinte forma: o tamanho do efeito de 0,1 é pequeno, o tamanho do efeito de 0,3 é médio, e o tamanho do efeito de 0,5 é grande. 23 O pacote estatístico SPSS, versão 23.0 (IBM Corp., Armonk, NY) foi usado para a análise estatística e um nível de significância de 0,05 foi estabelecido para todos os testes estatísticos.

RESULTADOS

Os medicamentos anti-hipertensivos utilizados pelos participantes foram diuréticos (n=13), bloqueadores dos canais de cálcio (n=6), β-bloqueadores (n=11), inibidores da enzima conversora da angiotensina (n=5), bloqueadores da angiotensina II tipo 1 (n=11) e agonistas de receptores α-2 adrenérgicos (n=2). A soma do número de medicamentos anti-hipertensivos não resulta no número total de participantes, pois houve participantes que usavam mais de um medicamento.

A Tabela 2 mostra a atividade física habitual avaliada pelo questionário Baecke no grupo1 (menor atividade física habitual) e no grupo 2 (maior atividade física habitual). O teste Mann-Whitney revelou diferenças significativas entre os grupos para as subescalas e pontuação total.

Tabela 2
Subescalas do questionário Baecke e pontuação total.

A Tabela 3 mostra o consumo de medicamentos anti-hipertensivos pelos participantes [menor (grupo 1) vs. maior (grupo 2) atividade física habitual]. O teste Mann-Whitney não revelou diferenças significativas.

Tabela 3
Número de medicamentos anti-hipertensivos usados pelos participantes.

A Tabela 4 mostra a associação de participantes que usaram mais de dois medicamentos anti-hipertensivos entre grupos. O teste exato de Fisher não revelou associação significante entre as variáveis. No entanto, o tamanho do efeito expresso pelo V de Cramer foi de 0,316, indicando que existe um efeito médio a grande.

Tabela 4
Número de participantes que usaram mais de duas drogas anti-hipertensivas.

DISCUSSÃO

O objetivo principal do presente estudo foi verificar se o número de medicamentos anti- hipertensivos ingeridos é diferente entre uma amostra de dois grupos de mulheres idosas com diferentes níveis de atividade física habitual (menor vs. maior). Verificamos que não houve diferenças significantes no número de medicamentos anti-hipertensivos consumidos em uma amostra categorizada de acordo com a atividade física habitual fornecida pelo questionário Baecke. Apesar de não ter havido diferença estatística na proporção de participantes do grupo de menor atividade física que usaram mais de dois anti-hipertensivos, o tamanho do efeito expresso pelo V de Cramer foi médio a grande, sugerindo que uma proporção maior de participantes do grupo mais ativo fisicamente consumiu dois ou menos comprimidos anti-hipertensivos.

Anteriormente, vários estudos foram realizados para avaliar a eficácia da atividade física no manejo da hipertensão arterial sistêmica 24,25. De modo geral, estes estudos mostraram os efeitos benéficos da atividade física por meio de protocolos controlados, padronizados e estruturados. As recomendações de exercício existentes para a hipertensão arterial defendem que, no que diz respeito à frequência, o exercício aeróbio deve ser realizado na maioria (de preferência todos) os dias da semana e o exercício resistido em dois a três dias por semana 25. Com relação à intensidade, a recomendação é para exercícios aeróbios de intensidade moderada (ou seja, 40 a 60% do consumo máximo de oxigênio ou reserva de frequência cardíaca; 11-13 classificação de esforço percebido na Escala de Borg 6-20 e exercício resistido dinâmico de intensidade moderada (60% a 80% de uma repetição máxima) 25. Em termos de tempo, a duração do exercício deve totalizar 150 min ou mais por semana 25. Por fim, a progressão deve ser gradual, evitando grandes aumentos em qualquer componente do exercício (frequência, intensidade e tempo).

A partir do exposto, a ausência de diferença no número da ingestão de medicamentos anti-hipertensivos entre os grupos (atividade física habitual menor vs. maior) encontrada no presente estudo, provavelmente pode ser atribuída às características do programa de atividade física para idosos da comunidade. Reumidamente, esse programa é caracterizado pela falta de padronização no que diz respeito à intensidade da atividade física, duração da sessão e frequência semanal. De acordo com Dimeo et al. 13, na vida diária, a atividade física na hipertensão arterial geralmente não é monitorada por um método sofisticado, como a concentração de lactato. Portanto, a recomendação de intensidade de treinamento tem que ser mantida mais prática. Nesse sentido, é razoável supor que a atividade física realizada pelos participantes não tenha seguido as diretrizes de prescrição do exercício para o manejo da hipertensão arterial sistêmica. Entretanto, as idosas que estudamos fizeram parte de um programa de saúde pública que busca promover e educar para a saúde e qualidade de vida e mudar hábitos de saúde negativos, o que a nosso ver, é um ponto forte do programa.

Outro aspecto que pode ser considerado para explicar os resultados obtidos pelo presente estudo é que no Brasil, pelo menos, os médicos não estão envolvidos com conceitos relacionados com o exercício e a ciência do esporte. De acordo com o Centers for Disease Control and Prevention [CDC], 26 apenas 19% dos médicos aconselham os pacientes sobre atividade física. Provavelmente, estes resultados podem ser atribuídos porque os médicos não estão interessados em aprender sobre a ciência do exercício devido a pressões de tempo. Como resultado, é razoável supor que os médicos poderiam atribuir as melhoras clínicas de um paciente ao tratamento farmacológico e não à atividade física, e por este motivo, não diminuíram o número de medicamentos prescritos. Corroborando com esta afirmação, já foi demonstrado que apenas alguns pacientes recebem aconselhamento de médicos sobre exercícios para o controle da pressão arterial para melhorar os resultados de saúde 27.

A administração diária de mais de dois medicamentos anti-hipertensivos tem sido associada a não adesão à terapia medicamentosa 19. Indivíduos com hipertensão arterial sistêmica que interrompem a medicação ou não aderem à terapia medicamentosa prescrita correm o risco de desenvolver complicações cardiovasculares 20. No presente estudo, 28,6% (seis participantes no grupo 1 e dois no grupo 2) utilizaram mais de dois medicamentos anti-hipertensivos. Embora não tenha havido associação significante de participantes que usaram mais de dois medicamentos anti-hipertensivos entre os grupos, o número de participantes do grupo 2 (maiores níveis de atividade física habitual) que ingeriram mais de dois medicamentos foi um terço que aquele do grupo 1 (menores níveis de atividade física habitual), consequentemente a proporção de participantes que usaram dois ou menos comprimidos anti- hipertensivos é maior no grupo 2. O tamanho do efeito desta análise expresso pelo V de Cramer foi de médio a grande. Este resultado tem significado clínico, pois destaca que embora o programa de atividade física para idosos da comunidade não tenha seguido estritamente as recomendações atuais de exercícios para reduzir a hipertensão arterial, o Grupo 2 mostrou um efeito importante, pois o número de participantes que fazia uso de mais de dois medicamentos anti-hipertensivos foi menor; isto provavelmente ocorre porque a intensidade e o volume de exercícios realizados pelo Grupo 2 foram maiores. Além disso, este resultado sugere que a necessidade de prescrição de um terceiro medicamento anti-hipertensivo seria minimizada nesses indivíduos, o que sugere que o exercício em conjunto com a terapia medicamentosa anti-hipertensiva melhora o controle da pressão arterial e pode até levar a menos medicamentos anti-hipertensivos prescritos. Em termos práticos, os profissionais da atenção primária à saúde, conscientes destes resultados, poderiam recomendar que os pacientes com hipertensão arterial sistêmica aumentem a quantidade de atividade física a fim de diminuir o número de medicamentos anti- hipertensivos ingeridos.

Limitações do estudo

Algumas limitações do estudo devem ser mencionadas. Primeiro, este estudo foi transversal e, portanto, não conseguimos avaliar responsividade da participação no exercício físico ao longo do tempo. Segundo, os dados transversais dificultaram a avaliação da direção da causalidade. Portanto, justifica-se a realização de futuros estudos longitudinais. Terceiro, não medimos os valores da pressão arterial; portanto, não sabíamos a gravidade da hipertensão arterial. Quarto, não avaliamos os participantes em função do tipo de hipertensão. Quinto, não avaliamos a dose dos anti-hipertensivos; é possível que a dose prescrita tenha sido diminuída, porém a quantidade de comprimidos ingeridos permaneceu a mesma. Sexto, não avaliamos os tipos de anti-hipertensivos utilizados. Sétimo, o estudo atual utilizou uma amostra de conveniência relativamente pequena de mulheres idosas, porém com poder estatístico adequado. Portanto, as generalizações devem ser feitas com cautela. No entanto, acreditamos que estas limitações não impedem que se tirem conclusões do estudo, pois as investigações sobre este tipo de programa de atividade física comunitária têm considerável validade ecológica, pois refletem situações e cenários reais.

CONCLUSÕES

Em conclusão, os achados mostram que o número de comprimidos anti- hipertensivos ingeridos não foi diferente entre grupos constituídos por idosas com diferentes níveis de atividade física habitual (menor vs. maior) engajadas em um programa comunitário de atividade física. Além disso, embora não tenha havido associação estatística, os participantes com maior nível de atividade física habitual apresentaram menor proporção de participantes que ingeriram mais de dois medicamentos anti-hipertensivos e este resultado tem significância clínica.

  • Financiamento
    Esta pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (FAPES, Edital nº. 007/2014 - Universal - Projeto Integrado de Pesquisa; nº. FAPES: 0423/2015 - Número da bolsa: 67640427), Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (FAPES, Brasil)/Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq, Brasil) (edital FAPES/CNPq/Decit-SCTIE-MS/SESA nº 03/2018 - Programa de Pesquisa para o SUS - PPSUS; nº de bolseiro: 212/2018).

AGRADECIMENTO

Os autores gostariam de agradecer ao Sr. Claudino Rodrigues dos Santos Júnior e ao Sr. Marcelo dos Santos Teixeira (Programa de Orientação ao Exercício Físico, Serra, Espírito Santo) pelo apoio técnico e a todas participantes que se voluntariaram para participar do estudo. CABL teve uma bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior, Programa Nacional de Pós-Doutorado (CAPES/PNPD - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior, Programa Nacional de Pós- Doutorado, Brasil). RLV é bolsista de produtividade da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (FAPES) (Edital Nº 18/2018 - Bolsa Pesquisador Capixaba).

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Editado por

Editor Associado responsável pelo processo de revisão: Patricia Oliveira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    04 Abr 2022
  • Aceito
    27 Jul 2022
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