Acessibilidade / Reportar erro

OSTEOARTRITE DE JOELHO E ENVELHECIMENTO: INVESTIGAÇÃO DE DIFERENTES MÚSCULOS DA COXA

RESUMO

Introdução:

A osteoartrite (OA) é uma doença inflamatória crônico-degenerativa, caracterizada pela degeneração progressiva da cartilagem articular, acometendo em maior parte a articulação do joelho. A população idosa é a mais atingida, intensificando o processo de envelhecimento. A concentração de tecido adiposo intramuscular nos músculos da coxa e a OA de joelho em diferentes idades permanece em investigação.

Objetivo:

Investigar a área de secção transversa dos músculos da coxa em diferentes idades com a relação da presença de gordura intramuscular e OA de joelho.

Métodos:

80 participantes foram pareados em 4 grupos: Grupo Osteoartrite Jovem e Grupo Osteoartrite Idoso, ambos sedentários com diagnóstico de OA de joelho II ou III; Grupo Jovem Saudável e Grupo Idoso Saudável, ambos saudáveis e sedentários. Os grupos foram pareados de acordo com sexo e índice de massa corporal, submetidos à avaliação fisioterapêutica, questionário WOMAC, exames de raio-x dos joelhos e tomografia computadorizada da coxa. A análise morfométrica foi realizada manualmente com software ITK-SNAP (versão 3.6), por um único avaliador. Análise estatística utilizou o teste ANOVA one-way seguido pelo post-hoc de Bonferroni, para variáveis dependentes (p≤0,05).

Resultados:

A comparação da área de secção transversa dos músculos reto femoral, vasto lateral, semitendinoso, sartório e grácil, entre os grupos, não indicou diferenças significativas (p>0,05). O estudo da atenuação para o tecido adiposo muscular não indicou diferença significativa nos valores de entre os grupos OA-Jovem e Idoso-S para todos os músculos avaliados.

Conclusão:

Indivíduos jovens com OA de joelho apresentam características morfológicas musculares semelhantes às encontradas durante o processo de envelhecimento, caracterizando um envelhecimento precoce dos músculos da coxa.Nível de Evidência III; Estudo retrospectivo transversal e observacional.

Descritores:
Articulação do Joelho; Gorduras; Tomografia Computadorizada por Raios X; Envelhecimento; Osteoartrite

ABSTRACT

Introduction:

Osteoarthritis (OA) is a chronic inflammatory degenerative disease, characterized by progressive degeneration of the articular cartilage, affecting mostly the knee joint. The elderly population is the most affected, intensifying the aging process. The concentration of intramuscular adipose tissue in the thigh muscles and knee OA at different ages remains under investigation.

Objective:

Investigate the cross-sectional area of thigh muscles at different ages with the relationship of the presence of intramuscular fat and knee OA.

Methods:

80 participants were paired into 4 groups: Young Osteoarthritis Group and Old Osteoarthritis Group, both sedentary with knee OA diagnosis II or III; Healthy Young Group and Healthy Old Group, both healthy and sedentary. The groups were paired according to gender and body mass index, submitted to physiotherapeutic evaluation, WOMAC questionnaire, knee X-ray and thigh CT scans. Morphometric analysis was performed manually with ITK-SNAP software (version 3.6), by a single evaluator. Statistical analysis used the one-way ANOVA test followed by Bonferroni post-hoc for dependent variables (p≤0.05).

Results:

Comparison of the cross-sectional area of the rectus femoris, vastus lateralis, semitendinosus, sartorius and gracilis muscles between the groups indicated no significant differences (p>0.05). The study of attenuation for muscle adipose tissue indicated no significant difference in the values of between the OA-Young and Aged-S groups for all the muscles evaluated.

Conclusion:

Young individuals with knee OA present muscle morphological characteristics similar to those found during the aging process, characterizing early aging of the thigh muscles. Level of Evidence III; Retrospective cross-sectional and observational study.

Keywords:
Knee Joint; Fats; Tomography; X-Ray Computed; Aging; Osteoarthritis

RESUMEN

Introducción:

La artrosis (OA) es una enfermedad inflamatoria degenerativa crónica, caracterizada por la degeneración progresiva del cartílago articular, que afecta principalmente a la articulación de la rodilla. La población anciana es la más afectada, intensificándose el proceso de envejecimiento. La concentración de tejido adiposo intramuscular en los músculos del muslo y la OA de rodilla a diferentes edades sigue siendo objeto de investigación.

Objetivo:

Investigar el área transversal de los músculos del muslo a diferentes edades con la relación de la presencia de grasa intramuscular y la OA de rodilla.

Métodos:

Se emparejó a 80 participantes en 4 grupos: Grupo de jóvenes con osteoartritis y Grupo de mayores con osteoartritis, ambos sedentarios y con diagnóstico de OA de rodilla II o III; Grupo de jóvenes sanos y Grupo de mayores sanos, ambos sanos y sedentarios. Los grupos fueron emparejados según sexo e índice de masa corporal, sometidos a evaluación fisioterapéutica, cuestionario WOMAC, exámenes radiográficos de las rodillas y tomografía computarizada del muslo. El análisis morfométrico se realizó manualmente con el software ITK-SNAP (versión 3.6), por un único evaluador. En el análisis estadístico se utilizó la prueba ANOVA unidireccional seguida del post-hoc de Bonferroni para las variables dependientes (p≤0,05).

Resultados:

La comparación del área transversal de los músculos recto femoral, vasto lateral, semitendinoso, sartorio y gracilis entre los grupos no indicó diferencias significativas (p>0,05). El estudio de la atenuación para el tejido adiposo muscular no indicó diferencias significativas en los valores de entre los grupos OA-Young y Aged-S para todos los músculos evaluados.

Conclusión:

Individuos jóvenes con OA de rodilla presentan características morfológicas musculares similares a las encontradas durante el proceso de envejecimiento, caracterizando el envejecimiento precoz de los músculos del muslo. Nivel de Evidencia III; Estudio transversal y observacional retrospectivo.

Descriptores:
Articulación de la rodilla; Grasas; Tomografía Computarizada por Rayos X; Envejecimiento; Osteoartritis

INTRODUÇÃO

A osteoartrite (OA) é uma doença articular inflamatória crônico-degenerativa, caracterizada por degeneração na cartilagem articular e comprometimento dos tecidos adjacentes.11 Jones RK, Nester CJ, Richards JD, Kim WY, Johnson DS, Jari S, et al. A comparison of the biomechanical effects of valgus knee braces and lateral wedged insoles in patients with knee osteoarthritis. Gait Posture. 2013;37(3):368-72. Dentre as articulações do corpo, o joelho destaca-se como uma das mais acometidas,22 Messier SP, Mihalko SL, Beavers DP, Nicklas BJ, DeVita P, Carr JJ, et al. Strength Training for Arthritis Trial (START): design and rationale. BMC Musculoskelet Disord. 2013;14:208.,33 Scopaz KA, Piva SR, Gil AB, Woollard JD, Oddis CV, Fitzgerald GK. Effect of baseline quadriceps activation on changes in quadriceps strength after exercise therapy in subjects with knee osteoarthritis. Arthritis Rheum. 2009;61(7):951-7. resultando em diversas consequências funcionais, sociais e econômicas.44 Marques AP, Kondo A. A fisioterapia na osteoartrose: uma revisão de literatura. Rev Bras Reumatol. 1998;38(2):83-90.

O tecido muscular é um dos mais afetados pela presença da AO.55 Coimbra IB, Pastor EH, Greve JMD, Puccinelli MLC, Fuller R, Cavalcanti FS, et al. Osteoartrite (artrose): tratamento. Rev Bras Reumatol. 2004;44(6):450-3. Além disso, a presença aumentada de tecido adiposo no ventre muscular (gordura intramuscular) e entre os feixes musculares (gordura intermuscular) tem sido relacionada à redução da capacidade de produção de força muscular e função física.66 Marcus RL, Addison O, Kidde JP, Dibble LE, Lastayo PC. Skeletal muscle fat infiltration: impact of age, inactivity, and exercise. J Nutr Health Aging. 2010;14(5):362-6. doi:10.1007/s12603-010-0081-2.
https://doi.org/10.1007/s12603-010-0081-...

Estudos mostraram, por meio de imagens de tomografia, que a quantidade de infiltrado de gordura intramuscular pode afetar a quantidade de massa musculoesquelética e, consequentemente, a performance muscular e a mobilidade do grupo muscular envolvido.77 Goodpaster BH, Theriault R, Watkins SC, Kelley DE. Intramuscular lipid content is increased in obesity and decreased by weight loss. Metabolism. 2000;49(4):467-72. Portanto, como forma de analisar a relação entre fraqueza muscular e envelhecimento, é necessário investigar quais componentes musculares levam a essa perda funcional.88 Visser M, Goodpaster BH, Kritchevsky SB, Newman AB, Nevitt M, Rubin SM, et al. Muscle mass, muscle strength, and muscle fat infiltration as predictors of incident mobility limitations in well-functioning older persons. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2005;60(3):324-33. e também quais outros fatores relacionados a esse processo podem ser semelhantes ao desenvolvimento de OA de joelho.99 Roubenoff R. Sarcopenic obesity: does muscle loss cause fat gain? Lessons from rheumatoid arthritis and osteoarthritis. Ann N Y Acad Sci. 2000;904:553-7. Atualmente, não há na literatura estudos que investiguem esses componentes.

Santos et al. (2011)1010 Santos ML, Gomes W, Queiroz B, Rosa N, Pereira D, Dias JM, et al. Desempenho muscular, dor, rigidez e funcionalidade de idosas com osteoartrite de joelho. Acta Ortop Bras. 2011;19(4):193-7. em um estudo composto por 80 idosas com diagnóstico de OA de joelho, avaliaram a força, a resistência e o equilíbrio muscular por meio do dinamômetro isocinético. Os autores concluíram que no processo de envelhecimento ocorrem mudanças na área de secção transversa importantes, como a diminuição da massa muscular e o aumento da concentração de tecido adiposo intramuscular. Diante disso, embora as mudanças que ocorrem na composição muscular durante o processo de envelhecimento sejam conhecidas, ainda não está claro como a OA de joelho pode intensificá-las.

A semelhança do processo de envelhecimento com os fatores de risco relacionados à OA de joelho pode ser uma hipótese para a relação entre a doença e as mudanças observadas com o tempo, em adultos e idosos. Sendo assim, a diminuição da massa muscular e aumento do infiltrado de gordura intramuscular são as condições que estão relacionadas tanto com a presença de OA de joelho quanto com o processo de envelhecimento.1111 Silva T, Junior A, Pinheiro M, Szejnfeld V. Sarcopenia associada ao envelhecimento: aspectos etiológicos e opções terapêuticas. Rev Bras Reumatol. 2006;46(6):391-7. Estudos recentes elencaram fatores predisponentes à OA de joelho e as mudanças do envelhecimento na área de secção transversa dos músculos da coxa. Entretanto, faz-se necessário também investigar a concentração de tecido adiposo intramuscular nos diferentes músculos da coxa.

Portanto, o objetivo do presente estudo foi avaliar e comparar a área de secção transversa e a atenuação muscular de diferentes músculos da coxa em indivíduos, com e sem OA de joelho, distribuídos em diferentes faixas etárias.

MÉTODOS

As avaliações foram realizadas no Laboratório de Análise da Função Articular (LAFAr), no Departamento de Fisioterapia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), e os exames de imagem foram realizados no Hospital Universitário (HU), em São Carlos, São Paulo.

Foram incluídos no estudo 80 participantes, de ambos os sexos, divididos em quatro grupos pareados pelo sexo e índice de massa corporal. Participantes com idade entre 40 e 50 anos, sedentários e diagnosticados radiográfica e clinicamente com OA de joelho II ou III foram alocados no Grupo Osteoartrite Jovem; os participantes com 70 anos ou mais, sedentários e diagnosticados radiográfica e clinicamente com OA de joelho II ou III foram alocados no Grupo Osteoartrite Idoso. Já os indivíduos com idade entre 40 e 50 anos, sedentários e saudáveis, foram alocados no Grupo Saudável Jovem, e os indivíduos com 70 anos ou mais, sedentários e saudáveis, no Grupo Saudável Idoso.

O projeto de pesquisa foi divulgado em mídia local, redes sociais, site da UFSCar e rádio da cidade de São Carlos. Os participantes foram contatados por ligações telefônicas, e-mail, ou visita presencial.

Este projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética de Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Federal de São Carlos-SP (CAAE: 64171617.9.0000.5504). Os participantes foram informados quanto aos procedimentos aos quais seriam submetidos e após concordarem em participar, assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. O trabalho foi conduzido de acordo com as normas da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde sobre pesquisa envolvendo seres humanos.

Foram incluídos no estudo participantes entre 40 e 50 anos e ≥70 anos saudáveis, e participantes da mesma faixa etária que apresentaram diagnóstico radiográfico de OA de joelho unilateral ou bilateral, grau II ou III, de acordo com os critérios de Kellgren and Lawrence (1956)1212 Kellgren JH, Lawrence JS. Radiological assessment of osteo-arthrosis. Ann Rheum Dis. 1957;16(4):494-502. e do American College of Rheumatology (2000). Para os participantes com OA de joelho bilateral, o lado mais sintomático foi utilizado para avaliação.

Os critérios de exclusão seguiram os mesmos descritos previamente por Aily et al. (2019).1313 Aily JB, de Noronha M, de Almeida AC, Pedroso MG, Maciel JG, Mattiello-Sverzut AC, et al. Evaluation of vastus lateralis architecture and strength of knee extensors in middle-aged and older individuals with knee osteoarthritis. Clin Rheumatol. 2019;38(9):2603-11.

Na primeira visita, realizada no LAFAr/UFSCar, os participantes foram submetidos a avaliação fisioterapêutica consistindo em inspeção, palpação, testes de força, flexibilidade e amplitude de movimento (ADM) de joelho e quadril, além de testes para avaliar integridade ligamentar. Posteriormente, os participantes foram orientados e familiarizados quanto aos procedimentos experimentais a serem realizados. Foi preenchida uma ficha de avaliação e o TCLE. Nesta mesma visita, o participante recebeu um encaminhamento para realizar exame de raio-x dos joelhos.

A segunda visita foi agendada após o diagnóstico e classificação da OA por meio da radiografia. Nesta visita, os participantes realizaram o exame de composição corporal (Absortometria de Raios-X de Dupla Energia - DXA) e aplicação do questionário WOMAC. Além disso, foi entregue ao voluntário o encaminhamento e as orientações para a realizar exame de tomografia computadorizada.

O exame radiográfico foi realizado bilateralmente nas incidências póstero-anterior com joelho semifletido (45°) com descarga de peso (posição ortostática), axial para a articulação patelofemoral1414 Bhattacharya R, Kumar V, Safawi E, Finn P, Hui AC. The knee skyline radiograph: its usefulness in the diagnosis of patello-femoral osteoarthritis. Int Orthop. 2007;31(2):247-52. e perfil ou lateral, na posição de supino a 45° de flexão do joelho. A classificação da OA de joelho foi realizada por uma médica radiologista, colaboradora deste estudo, de acordo com os critérios de Kellgren & Lawrence (1956) e do American College of Rheumatology (2000).

Para avaliar dor, rigidez articular e função física, foi utilizado o questionário WOMAC (Western Ontário and McMaster Universities), composto por 24 questões auto relatadas, com base em informações nas 48 horas antecedentes à sua aplicação. Esse questionário é dividido em três domínios: dor, rigidez e função física, e a pontuação é feita por meio de escala do tipo Likert.1515 Fernandes MI. Tradução e validação do questionário de qualidade de vida específico para osteoartrose WOMAC (Western Ontario Mc Master Universities) para a língua portuguesa [dissertação]. São Paulo: Unifesp/EPM-Reumatologia; 2002. A pontuação final foi obtida por meio da pontuação máxima em cada domínio, sendo considerada pior quanto maior a pontuação alcançada.

As imagens da coxa foram obtidas por meio de um Tomógrafo Multislice (Brilliance CT 16-slice, Phillips) do Hospital Universitário da UFSCar. O exame foi realizado por um profissional especializado sob a supervisão de um médico radiologista.

Para a aquisição das imagens foram utilizados os critérios do estudo de Eastwood et al (2014).1616 Eastwood SV, Tillin T, Wright A, Mayet J, Godsland I, Forouhi NG, et al. Thigh fat and muscle each contribute to excess cardiometabolic risk in South Asians, independent of visceral adipose tissue. Obesity (Silver Spring). 2014;22(9):2071-9. O protocolo sugerido forneceu uma imagem referente ao meio da coxa da perna mais acometida, ou escolhida aleatoriamente. A aquisição das imagens dos músculos da coxa foi realizada por um corte de 5mm de espessura, referente à metade da distância entre o trocânter maior e a fossa intercondilar do fêmur.

As áreas musculares foram analisadas manualmente por um único avaliador previamente treinado utilizando o software ITK-SNAP (versão 3.6). A área de interesse foi selecionada conforme a taxa de atenuação do tecido desejado (em mm22 Messier SP, Mihalko SL, Beavers DP, Nicklas BJ, DeVita P, Carr JJ, et al. Strength Training for Arthritis Trial (START): design and rationale. BMC Musculoskelet Disord. 2013;14:208.). A taxa de atenuação para tecido adiposo intramuscular corresponde ao intervalo de -190 a -30 Hounsfield (HU).1717 Avila JJ, Gutierres JA, Sheehy ME, Lofgren IE, Delmonico MJ. Effect of moderate intensity resistance training during weight loss on body composition and physical performance in overweight older adults. Eur J Appl Physiol. 2010;109(3):517-25.

As confiabilidades inter examinador e teste-reteste foram calculadas com 10 participantes em dois dias diferentes. O coeficiente de correlação intraclasse para os músculos reto femoral, vasto lateral, semimembranoso, semitendinoso, grácil, cabeça longa do bíceps, sartório e adutor magno e longo foi de 0,971, 0,865, 0,794, 0,675, 0,986, 0,992, 0,916 e 0,909, respectivamente.

Análises estatísticas

Os dados foram analisados por meio do Software Statistical Package for the Social Science versão 20.0 (SPSS Inc, Chicago, IL, USA). Foi realizada a análise descritiva das variáveis estudadas por meio da média, desvio padrão e coeficiente de variação. Após, foram verificadas a normalidade e homogeneidade de variâncias por meio dos testes de Kolmogorov-Smirnov e Levene, respectivamente. Caso não fosse observada a distribuição normal, os dados foram transformados para possibilitar a aplicação de testes paramétricos. A comparação entre os grupos usou ANOVA one-way seguido pelo post-hoc de Bonferroni, para cada uma das variáveis dependentes. Para todas as análises foi adotado um nível de significância de 5% (p≤0,05).

RESULTADOS

As características da amostra e as variáveis antropométricas dos grupos osteoartrite e controle estão resumidas na Tabela 1. Não houve diferença entre os grupos com relação ao IMC e escore total do WOMAC (p> 0,05). A área de secção transversa e atenuação muscular dos músculos da coxa estão descritos na Tabela 2.

Tabela 1
Características dos participantes.
Tabela 2
Área de secção transversa e atenuação muscular dos músculos da coxa.

Reto femoral

A área de secção transversa do músculo reto femoral não apresentou diferença entre os grupos (p>0,05). Porém, a média da atenuação muscular do grupo Jovem-S apresentou os maiores valores de densidade muscular comparado aos outros três grupos, enquanto o grupo OA-Idoso apresentou os menores. Por fim, os grupos OA-Jovem e Idoso-S não apresentaram diferenças significativas.

Vasto lateral

Não houve diferença entre os grupos para a área de secção transversa do músculo vasto lateral (p>0,05). Entretanto, a média de atenuação muscular do grupo Jovem-S apresentou os maiores valores de densidade muscular comparado aos outros grupos, enquanto o grupo OA-Idoso, os menores. Contudo, os grupos OA-Jovem e o Idoso-S não apresentaram diferenças significativas.

Semitendinoso

A área de secção transversa do músculo semitendinoso também não obteve diferença entre os grupos (p>0,05). Porém, a análise da média da atenuação muscular mostrou que o grupo Jovem-S obteve os maiores valores de densidade muscular dentre os grupos, e o grupo OA-Idoso, os menores. Todavia, os grupos OA-Jovem e Idoso-S não apresentaram diferenças significativas.

Cabeça longa do bíceps

A área de secção transversa do músculo cabeça longa do bíceps do grupo OA-Jovem apresentou diferenças significativas quando comparado ao grupo OA-Idoso (p<0,05). A média da atenuação muscular do grupo Jovem-S foi a maior para densidade muscular dentre os grupos, enquanto o grupo OA-Idoso apresentou a menor. Os grupos OA-Jovem e Idoso-S não apresentaram diferenças significativas entre si.

Sartório

A área de secção transversa do músculo sartório não apresentou diferença entre os grupos (p>0,05). Já a média de atenuação muscular do grupo Jovem-S apresentou os maiores valores para densidade muscular em relação aos outros grupos, enquanto o grupo OA-Idoso, os menores. O grupo OA-Jovem obteve resultados significativamente diferentes quando comparado ao grupo OA-Idoso (p<0,05), e o grupo OA-Idoso também apresentou resultados diferentes quando comparado ao grupo Jovem-S.

Grácil

Para a área de secção transversa do músculo grácil, não houve diferença entre os grupos (p>0,05). Entretanto, a média de atenuação muscular do grupo OA-Idoso mostrou-se significativamente menor em relação ao grupo Jovem-S. Além disso, a maior média de atenuação muscular encontrada foi a do grupo Jovem-S, e a menor, do grupo OA-Idoso.

Adutor magno e longo

A área de secção transversa dos músculos adutor magno e longo, do grupo OA-Jovem foram significativamente diferentes quando comparados ao grupo OA-Idoso. A média da atenuação muscular do grupo Jovem-S foi a maior, enquanto o grupo OA-Idoso, a menor.

Semimembranoso

Para a área de secção transversa do músculo semimembranoso, foi encontrado que o grupo OA-Idoso teve resultados significativamente diferentes em relação ao Jovem-S. O grupo Jovem-S também teve resultados diferentes quando comparado ao grupo Idoso-S. A área de atenuação muscular do grupo Jovem-S apresentou o maior valor para densidade muscular, enquanto o grupo OA-Idoso obteve o menor.

DISCUSSÃO

Ao conhecimento dos autores, esse é o primeiro estudo investigando a relação entre o infiltrado de gordura intramuscular na presença ou não de OA de joelho em diferentes faixas etárias. Os principais achados se deram entre os grupos Idoso-S e OA-Jovem nos quais não houve diferenças em relação à atenuação muscular entre estes grupos, Idoso-S e OA-Jovem, nos diferentes músculos da coxa.

Os achados do presente estudo evidenciam similaridade entre a quantidade de infiltrado de gordura muscular durante o processo de envelhecimento fisiológico e a presença da OA de joelho precoce. Neste sentido, não houve diferença entre os grupos OA-Jovem e Idoso-S para todos os músculos avaliados. Nesse mesmo sentido, o estudo de AILY et al. (2018),1313 Aily JB, de Noronha M, de Almeida AC, Pedroso MG, Maciel JG, Mattiello-Sverzut AC, et al. Evaluation of vastus lateralis architecture and strength of knee extensors in middle-aged and older individuals with knee osteoarthritis. Clin Rheumatol. 2019;38(9):2603-11. analisou a arquitetura e a força muscular de 80 indivíduos com e sem OA de joelho, sendo estes alocados nos grupos: Meia Idade Saudável (40-50 anos), Meia Idade com OA (40-50 anos), Idoso Saudável (70-80 anos) e Idoso com OA (70-80 anos). Os autores indicaram que não houve diferenças entre os grupos Meia Idade com OA e Idoso Saudável para nenhuma das variáveis descritas (ângulo de penação, comprimento do fascículo, espessura muscular e força isométrica). Dessa forma, os autores sugerem que a presença de OA de joelho pode estar associada às mudanças musculares precoces, semelhantes às observadas no processo de envelhecimento.

O processo de envelhecimento está ligado a alterações acentuadas na composição corporal, caracterizada por um aumento significativo na massa de gordura corporal e uma diminuição da massa muscular esquelética. Estudos prévios relataram que as alterações musculoesqueléticas relacionadas ao processo de envelhecimento podem ser observadas por meio da redução nos valores de atenuação muscular.1818 Ikeda S, Tsumura H, Torisu T. Age-related quadriceps-dominant muscle atrophy and incident radiographic knee osteoarthritis. J Orthop Sci. 2005;10(2):121-6. Desta forma, o presente estudo corrobora com os achados prévios da literatura e demonstra que não somente o envelhecimento, mas a presença de OA de joelho influenciam o sistema musculoesquelético.

Diferenças nos valores de atenuação muscular encontrados entre os grupos OA-Jovem e OA-Idoso foram achados importantes neste estudo, tendo em vista que os resultados foram diferentes nos músculos avaliados. Um estudo de Ikeda et al. de 20051818 Ikeda S, Tsumura H, Torisu T. Age-related quadriceps-dominant muscle atrophy and incident radiographic knee osteoarthritis. J Orthop Sci. 2005;10(2):121-6. analisou tomografias de mulheres de meia idade (≅30 anos) e idosas (acima de 60 anos), comparando os valores obtidos para possíveis alterações morfológicas, e encontraram que o grupo idoso apresentou áreas de secção transversa do quadríceps menores do que o grupo meia idade, além de menores valores de densidade muscular. Sendo assim, o presente estudo corrobora com os achados de Ikeda et al. (2005), que descrevem valores maiores de atenuação muscular em jovens quando comparados aos indivíduos idosos, independentemente da presença de OA de joelho.

Vale destacar as limitações do presente estudo, como a impossibilidade de analisar imagens de tomografia de todos os músculos da coxa, nas quais a qualidade das imagens adquiridas estava reduzida em algumas amostras. A maior dificuldade de mensuração foi encontrada para os músculos adutor curto e cabeça curta do bíceps femoral.

CONCLUSÃO

A OA de joelho pode causar danos na arquitetura dos músculos da coxa semelhantes àqueles encontrados no processo de envelhecimento. A diminuição da área de secção transversa, da atenuação e da densidade muscular são alguns dos exemplos, podendo estes serem observados até mesmo nos indivíduos mais jovens. Visto isso, estudos futuros devem confirmar os achados aqui descritos, assim como, investigar os efeitos de intervenções por meio de exercícios físicos, considerando tais parâmetros.

REFERENCES

  • 1
    Jones RK, Nester CJ, Richards JD, Kim WY, Johnson DS, Jari S, et al. A comparison of the biomechanical effects of valgus knee braces and lateral wedged insoles in patients with knee osteoarthritis. Gait Posture. 2013;37(3):368-72.
  • 2
    Messier SP, Mihalko SL, Beavers DP, Nicklas BJ, DeVita P, Carr JJ, et al. Strength Training for Arthritis Trial (START): design and rationale. BMC Musculoskelet Disord. 2013;14:208.
  • 3
    Scopaz KA, Piva SR, Gil AB, Woollard JD, Oddis CV, Fitzgerald GK. Effect of baseline quadriceps activation on changes in quadriceps strength after exercise therapy in subjects with knee osteoarthritis. Arthritis Rheum. 2009;61(7):951-7.
  • 4
    Marques AP, Kondo A. A fisioterapia na osteoartrose: uma revisão de literatura. Rev Bras Reumatol. 1998;38(2):83-90.
  • 5
    Coimbra IB, Pastor EH, Greve JMD, Puccinelli MLC, Fuller R, Cavalcanti FS, et al. Osteoartrite (artrose): tratamento. Rev Bras Reumatol. 2004;44(6):450-3.
  • 6
    Marcus RL, Addison O, Kidde JP, Dibble LE, Lastayo PC. Skeletal muscle fat infiltration: impact of age, inactivity, and exercise. J Nutr Health Aging. 2010;14(5):362-6. doi:10.1007/s12603-010-0081-2.
    » https://doi.org/10.1007/s12603-010-0081-2
  • 7
    Goodpaster BH, Theriault R, Watkins SC, Kelley DE. Intramuscular lipid content is increased in obesity and decreased by weight loss. Metabolism. 2000;49(4):467-72.
  • 8
    Visser M, Goodpaster BH, Kritchevsky SB, Newman AB, Nevitt M, Rubin SM, et al. Muscle mass, muscle strength, and muscle fat infiltration as predictors of incident mobility limitations in well-functioning older persons. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2005;60(3):324-33.
  • 9
    Roubenoff R. Sarcopenic obesity: does muscle loss cause fat gain? Lessons from rheumatoid arthritis and osteoarthritis. Ann N Y Acad Sci. 2000;904:553-7.
  • 10
    Santos ML, Gomes W, Queiroz B, Rosa N, Pereira D, Dias JM, et al. Desempenho muscular, dor, rigidez e funcionalidade de idosas com osteoartrite de joelho. Acta Ortop Bras. 2011;19(4):193-7.
  • 11
    Silva T, Junior A, Pinheiro M, Szejnfeld V. Sarcopenia associada ao envelhecimento: aspectos etiológicos e opções terapêuticas. Rev Bras Reumatol. 2006;46(6):391-7.
  • 12
    Kellgren JH, Lawrence JS. Radiological assessment of osteo-arthrosis. Ann Rheum Dis. 1957;16(4):494-502.
  • 13
    Aily JB, de Noronha M, de Almeida AC, Pedroso MG, Maciel JG, Mattiello-Sverzut AC, et al. Evaluation of vastus lateralis architecture and strength of knee extensors in middle-aged and older individuals with knee osteoarthritis. Clin Rheumatol. 2019;38(9):2603-11.
  • 14
    Bhattacharya R, Kumar V, Safawi E, Finn P, Hui AC. The knee skyline radiograph: its usefulness in the diagnosis of patello-femoral osteoarthritis. Int Orthop. 2007;31(2):247-52.
  • 15
    Fernandes MI. Tradução e validação do questionário de qualidade de vida específico para osteoartrose WOMAC (Western Ontario Mc Master Universities) para a língua portuguesa [dissertação]. São Paulo: Unifesp/EPM-Reumatologia; 2002.
  • 16
    Eastwood SV, Tillin T, Wright A, Mayet J, Godsland I, Forouhi NG, et al. Thigh fat and muscle each contribute to excess cardiometabolic risk in South Asians, independent of visceral adipose tissue. Obesity (Silver Spring). 2014;22(9):2071-9.
  • 17
    Avila JJ, Gutierres JA, Sheehy ME, Lofgren IE, Delmonico MJ. Effect of moderate intensity resistance training during weight loss on body composition and physical performance in overweight older adults. Eur J Appl Physiol. 2010;109(3):517-25.
  • 18
    Ikeda S, Tsumura H, Torisu T. Age-related quadriceps-dominant muscle atrophy and incident radiographic knee osteoarthritis. J Orthop Sci. 2005;10(2):121-6.

Editado por

Associate Editor responsible for the review process: André Pedrinelli

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    15 Jan 2022
  • Aceito
    15 Dez 2022
Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte Av. Brigadeiro Luís Antônio, 278, 6º and., 01318-901 São Paulo SP, Tel.: +55 11 3106-7544, Fax: +55 11 3106-8611 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: atharbme@uol.com.br