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Psicologia moral e educação: para além de crianças "boazinhas"

Moral psychology and education: moving beyond "nice" children

Resumos

As rápidas mudanças sociais têm pleiteado, nos EUA, o retorno do ensino de valores tradicionais por meio de programas de educação do caráter. Esses esforços visam fomentar virtudes que levam as crianças a se tornarem pessoas "boazinhas", educadas, respeitosas e que tratem os outros com justiça. Ainda que se concorde com esse propósito, dúvidas podem ser levantadas a respeito da suficiência dessa abordagem da socialização no que diz respeito ao desenvolvimento humano numa perspectiva moral crítica. Tal perspectiva é necessária para que uma pessoa possa avaliar, a partir de um ponto de vista moral, seus valores socialmente adquiridos. Na ausência de tal capacidade, não se pode evitar a reincidência da imoralidade entranhada no conjunto existente de normas sociais. Assim sendo, o autor discute pesquisas e teorias atuais sobre o desenvolvimento social infantil que oferecem uma base a partir da qual se possam construir programas educacionais para além da preparação das crianças com vistas ao enquadramento no status quo moral. Este trabalho indica que, em todas as fases do desenvolvimento, as concepções de moralidade são distintas daquelas oriundas de outros valores sociais e convenções não morais. Ao final, são oferecidas sugestões de como construir programas educacionais que levem em conta as complexas interações entre valores morais e não morais e que ultrapassem a mera doutrinação das crianças conforme os valores da sociedade, estimulando os alunos a empregarem seu conhecimento moral na avaliação de situações sociais e guiar seu comportamento a partir de um ponto de vista moral crítico.

Desenvolvimento moral; Teoria dos domínios; Educação do caráter


Rapid changes in society have led to calls within the United States for a return to the teaching of traditional values through programs of character education. These efforts are aimed at instilling virtues that will make children become "nice" people who are polite, respectful, and generally treat others fairly. Without objecting to the notion of raising "nice" children, questions can be raised as to whether this approach to socialization is sufficient to develop people with a critical moral perspective. Such a moral perspective is necessary to evaluate one’s socially acquired values from a moral point of view. In the absence of such a capacity, one cannot avoid recapitulating the immorality imbedded within the existing set of social norms. Therefore, this article discusses recent research and theory on children’s social development that provides a basis from which to construct educational programs that go beyond preparing children to fit within the moral status quo. This developmental research indicates that conceptions of morality are distinct at all points in development from those of other non-moral social values and conventions. On the basis of that work, suggestions are provided for how to construct educational programs that recognize the complex interactions among moral and non-moral values, and that go beyond merely inculcating children within the values of society, to foster students’ abilities to employ their moral knowledge to evaluate social situations and guide their behavior from a critical moral standpoint.

Moral development; Domain theory; Character education


Psicologia moral e educação: para além de crianças "boazinhas" * * Tradução do original em inglês Moral psychology and education: moving beyond "nice" children, por Denise Trento Rebello de Souza e revisão técnica de Ulisses Ferreira Araújo.

Larry Nucci

University of Illinois at Chicago

Correspondência:

Larry Nucci

College of Education M/C 147

University of Illinois at Chicago

1040 West Harrison Street

Chicago, IL, USA 60607

e-mail:lnucci@uic.edu

Resumo

As rápidas mudanças sociais têm pleiteado, nos EUA, o retorno do ensino de valores tradicionais por meio de programas de educação do caráter. Esses esforços visam fomentar virtudes que levam as crianças a se tornarem pessoas "boazinhas", educadas, respeitosas e que tratem os outros com justiça.

Ainda que se concorde com esse propósito, dúvidas podem ser levantadas a respeito da suficiência dessa abordagem da socialização no que diz respeito ao desenvolvimento humano numa perspectiva moral crítica. Tal perspectiva é necessária para que uma pessoa possa avaliar, a partir de um ponto de vista moral, seus valores socialmente adquiridos. Na ausência de tal capacidade, não se pode evitar a reincidência da imoralidade entranhada no conjunto existente de normas sociais.

Assim sendo, o autor discute pesquisas e teorias atuais sobre o desenvolvimento social infantil que oferecem uma base a partir da qual se possam construir programas educacionais para além da preparação das crianças com vistas ao enquadramento no status quo moral. Este trabalho indica que, em todas as fases do desenvolvimento, as concepções de moralidade são distintas daquelas oriundas de outros valores sociais e convenções não morais.

Ao final, são oferecidas sugestões de como construir programas educacionais que levem em conta as complexas interações entre valores morais e não morais e que ultrapassem a mera doutrinação das crianças conforme os valores da sociedade, estimulando os alunos a empregarem seu conhecimento moral na avaliação de situações sociais e guiar seu comportamento a partir de um ponto de vista moral crítico.

Palavras-chave

Desenvolvimento moral – Teoria dos domínios – Educação do caráter.

Moral psychology and education: moving beyond "nice" children

Abstract

Rapid changes in society have led to calls within the United States for a return to the teaching of traditional values through programs of character education. These efforts are aimed at instilling virtues that will make children become "nice" people who are polite, respectful, and generally treat others fairly.

Without objecting to the notion of raising "nice" children, questions can be raised as to whether this approach to socialization is sufficient to develop people with a critical moral perspective. Such a moral perspective is necessary to evaluate one’s socially acquired values from a moral point of view. In the absence of such a capacity, one cannot avoid recapitulating the immorality imbedded within the existing set of social norms.

Therefore, this article discusses recent research and theory on children’s social development that provides a basis from which to construct educational programs that go beyond preparing children to fit within the moral status quo. This developmental research indicates that conceptions of morality are distinct at all points in development from those of other non-moral social values and conventions.

On the basis of that work, suggestions are provided for how to construct educational programs that recognize the complex interactions among moral and non-moral values, and that go beyond merely inculcating children within the values of society, to foster students’ abilities to employ their moral knowledge to evaluate social situations and guide their behavior from a critical moral standpoint.

Keywords

Moral development – Domain theory – Character education.

As preocupações com o desenvolvimento moral de crianças e a educação do caráter ganharam um novo impulso em todo o mundo nos últimos anos. Em parte, isso é resultado de uma influência indevida de políticas norte-americanas no discurso em outros países. Mas, em sentido mais amplo, essa ênfase renovada sobre a moralidade de crianças reflete tanto um desconforto geral, que as pessoas sentem com o ritmo rápido das mudanças durante os últimos cinqüenta anos, quanto a possibilidade de mudanças sociais ainda mais radicais, que podem resultar da revolução da biotecnologia, a qual se encontra em seu estágios de formação inicial. Reações às mudanças sociais rápidas são geralmente acompanhadas pelo receio de que valores básicos não estejam sendo transmitidos aos jovens, e que a nova geração esteja entrando em um período de moralidade reduzida (Helwig, Turiel & Nucci, 1997). Por exemplo, um escritor norte-americano argumenta o seguinte: "Considerando vários critérios, a conduta de juventude esteve em seu ponto mais alto em 1955" (Wynne & Hess, 1987, p. 56). Um outro escritor defende que, por causa do progressivo enfraquecimento de valores tradicionais, sem a afirmação de novos valores, "nós vivemos em um estado de perpétua confusão moral e anarquia social" (Etzioni, 1993, p. 12). Em geral, esses temores são seguidos por soluções que enfatizam a necessidade de retorno ao ensino de valores tradicionais, a fim de instigar o desenvolvimento de virtudes na juventude. O objetivo de tal agenda educacional é possibilitar o desenvolvimento de crianças "boazinhas",1 1 . "Nice" children, no original (N.T.). que respeitem o outro, que se envolvam em ações humanitárias, mantendo assim os valores básicos da sociedade (Ryan, 1996).

Ninguém argumentaria contra a idéia de formar crianças "boazinhas", bem educadas, respeitosas, e que, em geral, tratam as pessoas com justiça. Entretanto, a questão é se é suficiente formar crianças que são "boazinhas" segundo o significado mais habitual desse termo. Se nos voltarmos para a história em busca de orientação, rapidamente veremos que valores tradicionais e pessoas "boazinhas coexistiram com desigualdades estruturais e injustiças. Nós não precisamos nos remeter a atrocidades, como a escravidão, para obter tal evidência. Para nós, basta considerar as pessoas que têm sustentado valores, em qualquer parte do planeta, que sistematicamente privilegiam os direitos de homens em relação aos das mulheres (Okin, 1996). Certamente a maioria de homens e garotos que vivem em tais culturas se ajusta ao perfil de pessoas de bem ou "boas". Ainda assim, sua participação em tais arranjos sociais tradicionais tem conseqüências morais objetivas para as mulheres e meninas dessas sociedades.

De fato, a bondade desses homens e meninos coexiste com seu engajamento em práticas diárias imorais.

Se desejamos ir além de uma educação de crianças "boazinhas", em direção a uma perspectiva moral crítica, nós precisamos responder a algumas perguntas fundamentais e até mesmo problemáticas. O cerne da questão é se nós podemos definir um grupo de valores morais que formem as bases de um consenso, por meio do qual seja possível a construção de abordagens de educação moral que não se limitem a valores locais ou particulares. Sem tais consensos as qualidades incomensuráveis dos valores locais tornariam impossível a constituição de noções comuns a uma comunidade moral. Um tema correlato é se existem características da psicologia individual às quais se poderia recorrer para forjar o desenvolvimento de crianças, que passariam a agir de acordo com tais valores morais, comuns ou transcendentes. Precisamos também levar em conta como a moralidade interage e é influenciada por outros valores sociais e considerações amorais, pois ambos estruturam os sistemas sociais e produzem os julgamentos morais dos indivíduos. Finalmente, precisamos entender o processo de desenvolvimento moral para que possamos construir abordagens educacionais que interajam com o crescimento sociomoral das crianças.

Apesar das controvérsias, as últimas décadas testemunharam um grande progresso em relação à nossa compreensão desses assuntos. Dentre aquilo que tem sido aprendido nas áreas de Psicologia Educacional e Psicologia do Desenvolvimento, este artigo abordará os aspectos que podem auxiliar os educadores a se engajarem em uma educação moral significativa. Tentarei também tratar das fontes de conflito e contradição que contribuem para as atuais controvérsias nessa área da Educação e, em assim fazendo, discutir as origens das inconsistências que testemunhamos nos modos por meio dos quais os indivíduos põem em prática seus valores morais. Finalmente, usarei o que aprendemos sobre o desenvolvimento moral de crianças e sobre o julgamento moral contextualizado das pessoas para tratar dos objetivos da educação moral.

O desenvolvimento das compreensões moral e social

O que entendemos por Moralidade?

Uma parte grande da controvérsia envolvendo a educação moral diz respeito à definição de moralidade. Em sua acepção cotidiana, moralidade refere-se simplesmente às normas de condutas certas e erradas. No entanto, a questão é o que significa o certo e o errado morais e quais critérios serão usados para julgar o erro nas condutas. Conforme pode-se ver, essa diversidade, no nível da opinião pública, tem seu corolário na heterogeneidade subjacente às estruturas dos conceitos sociais do indivíduo. No nível do indivíduo, conceitos de certo e errado sociais não são todos de um só tipo, mas são organizados dentro de referenciais conceituais e de desenvolvimento distintos. Em pesquisas conduzidas durante os últimos vinte e cinco anos, verificou-se que os indivíduos tratam algumas formas de comportamento social como condutas morais universais; outras, como sujeitas a determinações da cultura local ou normas sociais; e outras, ainda, como uma questão de escolha pessoal (Nucci, 2001; Turiel, 1998).

Talvez a melhor forma de iniciar esta discussão seja considerar as seguintes respostas dadas, em entrevista, por uma menina de 4 anos de idade quanto à sua percepção em relação às transgressões que ocorrem espontaneamente na sua pré-escola (Nucci, Turiel & Encarnacion-Gawrych, 1983).

PRIMEIRA QUESTÃO:

Você viu o que aconteceu? Sim. Eles estavam jogando e o John bateu nele muito forte.

Isso é algo que você espera que se faça ou não? Bater tão forte que machuque, não.

Há uma regra sobre isso? Sim.

Qual é a regra? Não se deve bater forte.

E se não houvesse regra alguma sobre bater forte, seria então certo fazer isso? Não.

Por que não? Porque ele poderia se machucar, começar a chorar.

SEGUNDA QUESTÃO:

Você viu o que acabou de acontecer?

Sim. Eles estavam fazendo barulho.

Isso é algo que você espera que se faça ou não?

É para não fazer.

Há uma regra sobre isso? Sim. Nós temos que ficar quietos.

E se não houvesse regra alguma, seria certo então fazer isso? Sim.

Por quê? Porque não há regra alguma.

Vários aspectos estão em jogo nas diferentes respostas fornecidas por essa criança para as duas questões. A questão um envolve uma ação que tem efeitos intrínsecos no bem-estar de outra pessoa. Não há uma forma de bater com força em uma pessoa que não a machuque. Como não houve provocação alguma, o ato de bater é não só lesivo, mas também injusto, já que não houve nenhuma ação anterior recíproca por parte do outro que autorizasse o dano. O que nós vemos nas respostas dessa garotinha à questão é sua habilidade para fazer um julgamento sobre o certo ou errado da ação em termos das características de bem-estar humano e justiça que são inerentes nessa interação social.

Em contraste, suas respostas para questão dois são completamente condicionadas à sua avaliação da presença ou ausência de uma norma social que regularia o comportamento. Na ausência de qualquer norma, a própria ação não tem nenhuma força prescritiva, não é mais uma questão de certo ou errado. Em suma, enquanto um grupo de ações que têm a ver com assuntos interpessoais de justiça e bem-estar é julgado em termos de características não-arbitrárias e básicas da interação social, o status normativo de outro grupo de ações é condicionado à existência de uma regra social. Julgamentos sobre o primeiro grupo de ações abarcam nossa compreensão moral, ao passo que julgamentos sobre o segundo grupo de ações abarcam nossas concepções de convenção social.

Dessa forma, verifica-se que os conceitos de moralidade são estruturados a partir de concepções subjacentes de justiça e bem-estar (Turiel, 1983). Moralidade, então, pode ser definida a partir dos conceitos do indivíduo, de seus raciocínios, e de ações que se referem ao bem-estar, aos direitos e ao tratamento justo das pessoas. Moralidade (definida em termos de justiça, bem-estar, direitos) pode ser distinguida dos conceitos de convenção social, os quais são padrões de conduta consensualmente determinados dentro de um certo grupo social. Convenções estabelecidas por sistemas sociais – tais como as normas ou padrões de vestuário, como as pessoas devem dirigir-se umas às outras, modos à mesa e assim por diante – devem seu status de formas corretas ou incorretas de conduta à sua imersão em um particular sistema compartilhado de significados e interação social. Os atos particulares em si não têm força prescritiva, já que normas diferentes ou até mesmo opostas (por exemplo, vestidos para homens, calças para mulheres) poderiam ser estabelecidas para se obter a mesma função simbólica ou reguladora (por exemplo, distinguir homens de mulheres). A importância das convenções reside em sua função de coordenar a interação social e o discurso dentro de sistemas sociais. Assim é que observamos que os conceitos de convenção social são estruturados pelas concepções subjacentes de organização social (Turiel, 1983).

As distinções que são feitas entre moralidade e convenção social têm sido sustentadas por resultados de mais de cinquenta estudos desenvolvidos desde 1975 (ver Nucci, 2001; Smetana, 1995; Turiel, 1998). Essas pesquisas indicaram que, como ilustrado no exemplo acima, as crianças, adolescentes e adultos tratam violações da moralidade, tais como causar mal a outra pessoa, como erradas independente de haver ou não uma regra estabelecida, e generalizam tais julgamentos para membros de outras culturas ou grupos que podem não ter normas a respeito de tais ações. Convenções, por outro lado, são vistas como eficazes apenas dentro do contexto de uma norma social existente, e só para membros participantes de um determinado grupo social. Embora haja controvérsias se a distinção entre moralidade e convenção é feita por membros de todos os grupos culturais, vários estudos têm demonstrado que sujeitos pertencentes a uma ampla variedade de culturas no mundo de fato diferenciam entre assuntos de moralidade e convenção. Evidência em defesa da distinção moralidade/convenção foi obtida entre sujeitos no Brasil (Nucci, Camino, Sapiro, 1995), assim como na Índia, Israel (sujeitos árabes e israelenses), Coréia, Nigéria, Ilhas Virgens e Zâmbia. Além disso, uma pesquisa recente demonstrou que algo similar à distinção entre moralidade e convenção social opera dentro das concepções morais e normativas de crianças e adolescentes religiosos no que se refere às suas concepções das regras religiosas. Nucci & Turiel (1993) descobriram que crianças e adolescentes de grupos religiosos praticantes (Amish-Menonitas2 2 . No original : ‘Amish-Mennonite’ e judeus ortodoxos) julgaram certas normas religiosas (por exemplo, dia de adoração, trabalho no sábado sagrado, batismo, circuncisão, uso de véus, mulheres conduzindo serviços religiosos, sexo entre adultos antes do casamento, manter-se Kosher) em termos de convenção, uma vez que eles consideraram tais elementos como dependentes da autoridade religiosa ou da palavra de Deus e como específicos de suas religiões. Em contraste, questões morais (por exemplo, roubar, agredir fisicamente, difamar) foram consideradas prescritivas (ou seja, como coisas erradas de se fazer) independente da existência de uma regra estabelecida por uma autoridade religiosa ou pela palavra de Deus e de serem obrigatórias para membros de todos os outros grupos religiosos.

A descoberta dessas distinções psicológicas entre moral e formas convencionais do certo e do errado sociais oferece uma base empírica para começar a abordar algumas das questões definidoras que afligem a educação moral. Diferenciando o que é moral do que é socialmente adequado, esses resultados podem permitir aos educadores focar a discussão da educação moral em questões acerca de como melhor desenvolver nas crianças seu entendimento moral (isto é, conceitos de bem-estar e justiça), e suas tendências para agir em acordo com tais princípios morais, ao invés de ficarem presos em argumentos acalorados sobre qual grupo de convenções locais ou de normas religiosas deve ser incluído no conjunto de valores a serem abordados pelo currículo. Seguindo a ampla generalidade transcultural dessa pesquisa, a identificação da moralidade como centrada em torno de questões de justiça e bem-estar coincide com as explicações de senso comum sobre a tarefa básica da educação de valores: estimular o desenvolvimento de pessoas que não mentem, não trapaceiam, não roubam ou não agridem os demais. Ao mesmo tempo, ao fundamentar as definições do conteúdo de moralidade em pesquisa básicas de desenvolvimento, evita-se cair na armadilha do que Lawrence Kohlberg (1984) tão hábil e pejorativamente denominou de abordagem do saco de virtudes, para se estabelecer os objetivos da educação moral. Essas preocupações morais essenciais de justiça e bem-estar não são virtudes no sentido habitual, mas constituem as questões centrais para julgamentos morais e ações conseqüentes.

Contexto e a inevitabilidade da controvérsia

Enquanto a descoberta de domínios distintos de conhecimento social pode ajudar a focalizar os objetivos da educação moral por meio da identificação do conteúdo essencial da moralidade (Nucci, 2001), a heterogeneidade das compreensões sociais das pessoas e as imbricações contextuais dos componentes normativos morais e não morais na vida cotidiana significam que uma abordagem honesta para a educação moral sempre precisará lidar com a contradição e a controvérsia. Tal imbricação é inevitável dado que todas as interações sociais acontecem dentro de sistemas sociais delimitados por convenções. Assim, embora muitos assuntos cotidianos sejam exemplos diretos de moralidade ou convenção, muitos outros contêm aspectos de mais de um domínio. Em tais casos, as pessoas podem diferir entre si em termos da informação que elas possam trazer para uma situação, ou do peso que elas podem dar a uma ou outra característica de um determinado assunto. Observam-se duas formas básicas de sobreposição entre moralidade e convenção. Em uma delas, denominada mistura de domínios, normas convencionais que sustentam uma estrutura organizacional específica estão em harmonia ou estão em conflito com o que seria visto objetivamente como preocupações com justiça ou direitos. Exemplos de tal imbricação seriam as convenções como a de se fazer fila para comprar ingressos ou as de gênero, que proíbem áreas nas quais homens ou mulheres podem participar. No primeiro caso, a convenção (fazer fila), sendo um modo moralmente neutro e arbitrário de organizar as pessoas, poderia estar a serviço de uma justiça distributiva (cada um aguardando a sua vez), de acordo com a qual furar a fila tornar-se-ia, então, injusto. No segundo caso, a convenção (de gênero) pode estar em conflito com o senso de justiça se a convenção impedir que membros de um gênero possam usufruir de oportunidades disponíveis ao outro. O segundo tipo de sobreposição moral/convenção, denominada de eventos morais de segunda ordem, acontece quando a violação de uma convenção solidamente firmada causa dano psicológico (insulto, sofrimento) para as pessoas que sustentam tal convenção. Em nossa cultura, por exemplo, comparecer a um funeral em trajes de banho seria geralmente visto como uma atitude de desconsideração para com o defunto e a família num momento de sofrimento, e não somente como um exemplo de conduta não convencional.

Em resposta a questões que envolvem elementos de mais de um domínio, indivíduos podem tanto subordinar a questão a uma única dimensão e reduzir um caso de sobreposição a um que é essencialmente moral ou convencional, quanto se esforçarem para coordenar a natureza multifacetada da questão, levando em conta tanto os aspectos morais como os não-morais de uma dada situação ou episódio. Tais respostas à sobreposição, no plano individual, ajudam a explicar as inconsistências que observamos nas pessoas quando elas respondem às situações em diferentes contextos. Elas também ajudam a explicar como grupos ou subgrupos culturais chegam a diferentes leituras de questões sociais que eles consideram ser moralmente neutras ou carregadas de significado moral. Na sociedade ocidental, esses exemplos de sobreposição, nos quais convenção e moralidade estão em harmonia, respondem pelo componente moral do que geralmente é visto como conduta cortês e respeitosa, bem como pelo aspecto moral de normas e procedimentos que sustentam formas participativas de governo. Em grande parte, dentro de sociedades democráticas, essas áreas de sobreposição não são controvertidas, na medida em que representam valores concordantes com a moralidade e o status quo convencional. Por conseguinte, programas de educação em valores que pretendem alimentar tais valores convencionais obtêm amplo apoio junto ao público. No entanto, é provável que surjam controvérsias sempre que as relações entre componentes morais e não morais das questões não estejam em acordo e, portanto, propensas a serem vistas de formas distintas pelas partes envolvidas. No caso de questões de segunda ordem, tais como debates acerca do que se considera pudico no vestir-se (por exemplo, o comprimento da saia das mulheres), a natureza essencialmente convencional de tais assuntos geralmente permite chegar a consensos locais para resolver a questão. Enquanto alguns libertários poderiam protestar contra qualquer restrição à escolha de estudantes por causa desta ou daquela conduta pessoal, alguns religiosos conservadores poderiam considerar como imoral qualquer alteração nas normas de conduta pública. Tais assuntos de segunda ordem são geralmente resolvidos por intermédio de conselhos escolares eleitos ou pela política da escola. Mais problemático para aqueles que definem o currículo e para os mentores das políticas educacionais são os conflitos em potencial entre a moralidade e a convenção que estão embutidos nas normas que sustentam a ordem social existente e, implicitamente, beneficiam os membros das classes sociais privilegiadas.

Um exemplo ilustrativo desse tipo de questão foi bem apreendido em um incidente descrito por Maya Angelou (uma escritora afro-americana contemporânea de grande prestígio) no romance I know why the Caged Bird sings3 3 . Eu uso este exemplo em lugar de um brasileiro porque neste exibem-se contradições entre convenção e moralidade dentro de minha própria cultura. Deixo para um autor brasileiro encontrar tais exemplos dentro do seu contexto histórico-cultural. . A passagem recorda um incidente no qual um juiz local refere-se por engano à avó de Maya Angelou como "Senhora". O uso do título foi um engano porque as convenções em vigor nos estados sulistas dos Estados Unidos, à época da depressão, definiam que tais títulos eram usados para se referir aos brancos, mas não aos negros. Pelo uso discriminatório de títulos, os brancos mantinham simbolicamente sua supremacia social sobre os negros. Na situação descrita por Maya Angelou, sua avó foi intimada a dar testemunho diante do juiz. Ela escreve:

O juiz mandou que a Sra. Henderson fosse intimada, e quando vovó chegou e disse que ela era Sra. Henderson, o juiz, o oficial de justiça e outros brancos na audiência riram. O juiz tinha realmente feito uma gafe ao referir-se a uma mulher negra como "Senhora", mas ele era de Pine Bluff e não se poderia esperar que soubesse que uma mulher que possuía uma loja naquela cidadezinha fosse negra. Os brancos deram boas risadas durante muito tempo com o incidente, e os negros pensaram que ele havia provado o valor e majestade de minha avó. (1971, p.39)

Com o benefício de nosso entendimento atual sobre o preconceito racial e a segregação social, o tratamento dado à avó de Maya Angelou foi claramente injusto e imoral. Isto é, apesar da natureza arbitrária e convencional dos títulos, reconhecemos agora que seu uso discriminatório como descrito nesse contexto serviu ao propósito imoral de simbolicamente subjugar e consequentemente humilhar os membros dos grupos afro-americanos. O interessante, neste exemplo, é analisar como as partes envolvidas viam, naquela época, o emprego dos títulos de Senhor e Senhora. Em situações gerais, esses títulos têm o propósito de transmitir as relações hierárquicas entre adultos e crianças e, em situações formais, demonstrar respeito entre adultos de igual condição. Na situação descrita por Angelou, eles eram usados para estabelecer a posição socialmente inferior dos afro-americanos (negros) em relação aos brancos. Da perspectiva de poder dos brancos, a gafe do juiz foi motivo de riso porque ele não poderia ter pretendido elevar uma mulher negra ao mesmo nível de uma branca. Para aqueles brancos que viam no uso ou não de pronomes de tratamento, ao dirigirem-se a adultos afro-americanos, uma maneira de sustentar o sistema social, e para aqueles afro-americanos que aceitavam o status quo, a questão envolvia uma convenção, sendo a gafe do juiz apenas um equívoco engraçado. Partindo do ponto de referência daquelas pessoas, o juiz, como um homem branco, teria o direito e estaria correto ao referir-se à avó de Maya Angelou chamando-a apenas pelo seu primeiro nome. Por outro lado, para os afro-americanos da comunidade de Maya Angelou que consideravam injusto empregar-se títulos que simbolicamente os mantinham em uma posição social inferior, a questão envolvia moralidade, uma compreensão, portanto, que só poderia ser alcançada a partir da conjugação de preocupações de justiça com conceitos de convenções como elementos constitutivos da ordem social. De seu ponto de referência, o reconhecimento implícito do juiz das realizações sociais da avó de Maya Angelou (sendo dona de loja) a colocou em pé de igualdade com os brancos, e serviu como uma fonte de orgulho e como confirmação de que as práticas sociais discriminatórias que eles sofriam eram artificiais e insustentáveis à luz de uma visão objetiva da situação. Do ponto de vista da comunidade afro-americana, a gafe do juiz inadvertidamente capturou corretamente o direito da avó de Maya Angelou de ser chamada de Senhora.

Embora esse incidente, ocorrido no passado, possa ser examinado sob o olhar sereno da história, tais temas não são facilmente abordados quando eles se referem às práticas contemporâneas. Dois elementos que mostram a dificuldade em lidar com esses assuntos são ilustrados no exemplo anterior. Primeiro, por meio das práticas convencionais (por exemplo, formas de tratamento, modos de vestir-se) que são moralmente neutras e desenvolvem-se no curso da vida cotidiana. Assim, as pessoas, quando impregnadas de um modo particular de vida, podem não ter consciência das implicações morais de seu sistema social específico. O problema aqui, está claro, é que sistemas sociais injustos podem simplesmente se perpetuar e currículos educacionais que visam a transmitir os valores da comunidade podem tornar-se veículos servis da imoralidade. Segundo, como tais assuntos são multifacetados, eles se prestam a mais de uma interpretação, levantando o espectro da controvérsia no sistema educacional. Isto é particularmente problemático para escolas públicas, uma vez que tais controvérsias tendem a ter ramificações políticas. Em geral, pessoas que ocupam posições de poder e privilégio tendem a ver essas questões de uma forma convencional, e serem favoráveis a manutenção do status quo, uma vez que os sistemas convencionais servem aos seus interesses pessoais. Por outro lado, as pessoas desfavorecidas pelo sistema de convenções que sustenta as desigualdades sociais são menos propensas a entender tais questões de sobreposição como uma convenção e mais, seguramente, por seu status moral. O dilema moral que essas questões de sobreposição colocam aos educadores refere-se ao modo pelo qual os estudantes podem abordar as contradições morais colocadas por algumas das convenções de sociedade em áreas como gênero e relações de raça, sem que eles se sujeitem às posições defendidas por grupos políticos, que inevitavelmente se alinham a um ou a outro lado de tais questões.

Diversidade moral e pressupostos informacionais

As variações dos significados morais que as pessoas atribuem a ações particulares não se devem apenas a zonas de sobreposição entre moralidade e convenções do sistema social, mas surgem também como resultado de diferenças nas hipóteses factuais que as pessoas fazem a respeito de certos atos. Dentro da nossa própria cultura, por exemplo, as pessoas têm visões diferentes sobre a validade moral de se bater em crianças como forma de punição. Em sua pesquisa sobre o assunto, Wainryb (1991) descobriu que pais favoráveis a castigos corporais sustentavam a opinião de que esse comportamento era aceitável porque se tratava de um ato altamente efetivo e educativo, e não um ato gratuito de abuso ou dano à criança. Quando esses pais foram informados de que a punição física não é mais efetiva do que outros métodos de disciplinar crianças, um número significativo deles mudou de opinião acerca de castigos corporais e afirmou que não era aceitável que pais aderissem a essa prática. De modo inverso, quando pais que sustentavam que não era aceitável castigar fisicamente crianças foram informados de que, segundo especialistas, a punição corporal era a forma mais eficiente de ensinar crianças pequenas, houve uma tendência desses pais de passar a ver tais punições como aceitáveis.

No exemplo acima, a moralidade de um ato mudou em razão de pressupostos informativos que as pessoas faziam a respeito do ato. Em outros casos, pressupostos informativos podem alterar a visão das pessoas sobre a culpabilidade do sujeito. Muitas pessoas têm a opinião de que a homossexualidade é uma opção de vida imoral (Turiel, Hildebrandt, & Wainryb, 1991). Dessa perspectiva, ser homossexual envolve uma decisão consciente de se entregar a um comportamento que elas consideram ofensivo e indecente. Deixando de lado indagações tais como se a homossexualidade deve ser vista em termos normativos ou como uma questão de conduta privada e pessoal, o aspecto de escolha é fundamental para determinar se um indivíduo pode ser considerado ou não responsável por sua orientação sexual. Informações relevantes nesse tópico (por exemplo, descobertas de substancial componente genético na determinação da orientação sexual) sem dúvida influenciariam a avaliação moral que muitas pessoas fariam de homossexuais, mesmo que não tivesse impacto algum sobre suas visões acerca de atos homossexuais.

Em resumo, os mundos morais dentro dos quais as pessoas conduzem suas vidas são afetados por informações e por variáveis contextuais que se inserem nas avaliações que as pessoas produzem acerca de atitudes particulares. Assim como em casos de sobreposição de domínios o impacto de novas informações a respeito das causas ou efeitos de comportamentos sociais tanto complica quanto enriquece o papel da educação na preparação de estudantes para lidar com questões morais e sociais. Do ponto de vista da política educacional, estamos novamente diante da necessidade de reconhecer que uma educação em valores dentro de uma sociedade democrática, pluralista e rica em informações significa preparar os estudantes para coordenar compreensões morais fundamentais de justiça e bem-estar humano com convenções e pressupostos informativos potencialmente mutáveis.

As inconsistências na conduta individual

A existência de sobreposições de domínios e diferenças em pressupostos informativos ajuda a compreender, não só as discordâncias entre pessoas a respeito do significado moral de questões sociais, mas também auxiliam na explicação de algumas das inconsistências que observamos nos indivíduos. Assim como diferentes grupos de pessoas podem discordar a respeito do significado moral de questões sociais contextualizadas, indivíduos podem diferir em sua atribuição de significado moral a ações dentro de contextos diferentes. Em casos relativamente inequívocos, é razoavelmente simples decidir sobre o rumo de ação moral ou convencionalmente correto. Entretanto, em casos nos quais as expectativas morais ou convencionais estão em conflito, em que a informação a respeito do significado da ação é ambígua ou quando preocupações morais opõem-se a fortes desejos pessoais ou pragmáticos do sujeito, os indivíduos demonstram inconsistência em seu julgamento social e em suas ações subseqüentes. Do ponto de vista da teoria dos domínios, tais inconsistências são conseqüência inevitável da aplicação de um referencial conceitual multifacetado em contextos sociais heterogêneos. Essa não é uma questão de ética situacional. As pessoas não inventam sua moralidade no momento da ação. Entretanto, o lugar da moralidade em um dado contexto dependerá da aplicação que a pessoa fará de toda sua compreensão e das preocupações sociais em relação a uma dada situação.

Reconceituando os objetivos de desenvolvimento da educação moral

Diante do que sabemos atualmente sobre a cognição moral, é sensato propor que o foco central da educação moral recaia sobre as concepções dos estudantes sobre justiça, bem-estar e direitos, bem como sobre a aplicação desses entendimentos morais a questões da vida cotidiana (Nucci, 2001). Pesquisas sobre o desenvolvimento dos entendimentos morais das crianças têm revelado que a moralidade começa na primeira infância com um foco sobre questões de dano a si mesmas e a outrem. Crianças em idade pré-escolar preocupam-se bastante com sua própria segurança e compreendem que é objetivamente errado ferir os outros. Mesmo crianças de 3 anos de idade entendem que é errado bater e ferir alguém, ainda que não haja uma regra para isso, porque "Quando alguém bate em você, isso dói e você começa a chorar". A moralidade de crianças pequenas, entretanto, não é ainda estruturada pela compreensão de justiça como reciprocidade. Justiça para a criança pequena é freqüentemente expressa em termos de necessidades pessoais e do sentimento de que não se está ganhando aquilo que se merece. "Não é justo" muitas vezes significa "Eu não consegui o que eu queria". Ou que as ações de alguém fizeram a criança experimentar algum dano. Por volta dos 10 anos, quase todas as crianças já construíram um entendimento de justiça como reciprocidade (tratar os outros como se gostaria de ser tratado), mas ainda têm dificuldades em coordenar seu sentimento de justiça como igualdade com noções de eqüidade. A tarefa de desenvolvimento da adolescência e idade adulta é expandir o sentimento de justiça para incluir a compaixão – e não apenas a justiça pura – e vincular este sentimento de justiça piedosa com uma obrigação conceitualmente imperiosa (logicamente necessária) para todas as pessoas e não apenas para os membros de sua comunidade.

Uma pesquisa semelhante sobre o desenvolvimento da compreensão de crianças acerca de convenções sociais (Turiel, 1983) indica que a construção do entendimento de que convenções são importantes é um longo processo. Ao contrário do que ocorre com a moralidade, não há nada de intuitivamente óbvio nas funções da convenção. Ainda que a maior parte das crianças tenha assimilado o conteúdo das convenções sociais de suas comunidades no início da escola primária, o propósito dessas regras não é facilmente compreendido. De fato, não é senão dos meados ao final da adolescência que as crianças desenvolvem um entendimento coordenado de convenções como elementos constitutivos de sistemas sociais. Não é de se admirar, portanto, que as crianças pareçam tão freqüentemente desconectadas das regras da sociedade, mesmo que seu conteúdo normativo (por exemplo, "Não fale com a boca cheia") lhes tenha sido apresentado repetidas vezes.

Essa pesquisa sobre esse tipo de desenvolvimento pode ser de enorme valor para educadores interessados em ir além do mero desenvolvimento de crianças "boazinhas". Ela oferece para quem elabora currículos e para professores um referencial a partir do qual é possível direcionar esforços pedagógicos em educação moral que sejam apropriados a alunos em diferentes estágios de seu desenvolvimento. Oferece também uma base a partir da qual esses profissionais possam vir a abordar diferenciadamente tanto a dimensão moral quanto a convencional dos valores sociais. Agindo dessa forma, os educadores contribuirão para o desenvolvimento de uma cidadania moral baseada na justiça e na compaixão, capaz também de tornar compreensível e legítima a necessidade das convenções. No entanto, como vimos há pouco, julgamentos morais contextualizados podem freqüentemente requerer que a pessoa tenha a habilidade de ponderar ou coordenar considerações morais e não morais. Definir os objetivos da educação moral em tais circunstâncias torna-se uma tarefa mais complexa. Apresentando isso de forma simples, o educador moral não só se mostrará interessado em desenvolver a moral do estudante e suas compreensões das convenções sociais em tais contextos, como também estará interessado em saber se o estudante está ou não consciente e se prioriza os elementos morais de tais questões ao decidir-se sobre o curso de sua ação.

No passado, esse tema foi muito bem abordado pela seqüência de seis fases do desenvolvimento moral proposta por Kohlberg (1984). De acordo com a descrição padrão de Kohlberg, o desenvolvimento moral passa das fases iniciais – nas quais compreensões morais de justiça são entrelaçadas a prudentes interesses pessoais e às preocupações concretas com a autoridade social – para compreensões morais baseadas em convenções nas quais a moralidade (justiça) é entrelaçada à preocupação em manter a organização social definida por regulamentações normativas. Finalmente, nos estágios mais altos da moralidade, baseada em princípios, alcançada apenas por uma minoria da população, a moralidade entendida como justiça é completamente diferenciada de considerações não morais de prudência ou considerações convencionais. Assim sendo, a moralidade serve como base por meio da qual o indivíduo, não só orienta suas ações pessoais, como também é capaz de avaliar a moralidade do sistema normativo de convenções da sociedade. Essa progressão tem atraído educadores da área por diversas razões. Primeiramente porque a seqüência de Kohlberg é baseada em trabalho empírico e supostamente descreve uma progressão de desenvolvimento universal, que ofereceu aos educadores uma referência objetiva não-política para que eles trabalhem a educação moral. Segundo, uma vez que os estágios são supostamente desprovidos de conteúdo, já que eles não pertencem a assuntos específicos, mas, em vez disso, referem-se a estruturas de pensamento, os educadores não precisam se preocupar com as posições específicas que os estudantes assumem com respeito aos assuntos abordados. E, por último, a seqüência, ao final, caminha para uma resolução moral de princípios dos tipos de questões complexas de sobreposição discutidas anteriormente neste artigo. Em outras palavras, do ponto de vista do professor, os problemas infindáveis de natureza filosófica e política foram resolvidos pela lógica natural do processo de desenvolvimento.

O que passamos a entender agora é que a seqüência proposta pelo programa paradigmático de pesquisa de Kohlberg não apreende adequadamente os modos pelos quais as pessoas fazem julgamentos sociomorais, e não pode, consequentemente, servir como guia exclusivo para a educação moral. Kohlberg descreveu a seqüência de mudanças que se processam, de acordo com a idade da criança, nos modos pelos quais as preocupações morais e não morais (especialmente relativas a convenção) são tipicamente integradas em contextos de sobreposição. Por exemplo, o Estágio 4 do raciocínio moral (convencional), como descrito no sistema de Kohlberg, reflete o aparecimento, de meados para o final da adolescência, de compreensões no domínio convencional de que as normas sociais são elementos constitutivos de sistemas sociais (Turiel, 1983). Embora essas integrações típicas da idade sejam capturadas pelas descrições dos estágios de Kohlberg, elas não representam a gama total de parâmetros de tomada de decisão sociomorais que os indivíduos apresentam. Por exemplo, no processo amplo e cuidadoso das pesquisas que tinham como objetivo criar uma pontuação para os estágios do desenvolvimento moral, o grupo de Kohlberg descobriu que os indivíduos em todos os momentos de seu desenvolvimento podem responder aos dilemas morais de Kohlberg, argumentando a partir de uma perspectiva tanto de regras e autoridade quanto de justiça e bem-estar (Colby, Kohlberg, Gibbs, & Lieberman, 1983). Considerando nosso entendimento atual sobre a heterogeneidade relativa ao domínio da cognição social das pessoas, tal variação intrafases pode ser atribuída ao reconhecimento de que os dilemas de Kohlberg solicitam um tipo de raciocínio que emprega conhecimentos de mais de um sistema conceitual.

Indo além das pesquisas de Kohlberg sobre o desenvolvimento moral de crianças, educadores são liberados tanto em termos de como eles podem conceitualizar as oportunidades de reflexão sobre a moral e o comportamento propostos aos estudantes, como também são investidos de maior responsabilidade para estimular os alunos a pensar e agir em termos morais. Se, na realidade, as crianças, em todos os momentos de seu desenvolvimento, são capazes de considerar questões morais sob a perspectiva da justiça e do bem-estar, então torna-se importante aumentar as ocasiões em que as crianças compreendam e priorizem o componente moral das questões sociais contextualizadas, ao invés de simplesmente os educadores orientá-las para atingirem um distante estágio de julgamento moral por princípios, cuja orientação se torna uma conseqüência natural. Não se quer dizer com isso que o desenvolvimento não importa. Atingir compreensões morais baseadas em princípios, no sentido pleno da teoria de Kohlberg, pressupõe um entendimento totalmente desenvolvido das sociedades como sistemas sociais e tal compreensão só é atingida de meados para o final da adolescência (Turiel, 1983). Além disso, a habilidade das crianças para ver a moralidade de certas ações requer um nível de sofisticação na área de convenção similar àquele do final da adolescência. Por exemplo, quando nós apresentamos a situação na qual uma pessoa usava maiô em um funeral, muitos adolescentes jovens (entre 12 e 14 anos de idade) não viram problema algum. Na visão deles, uma vez que as convenções (como essas relativas ao modo de vestir-se) não eram em nada diferentes de ordens arbitrárias, não viam nada de mal em alguém ir a um funeral em trajes de banho. Entretanto, adolescentes mais velhos que construíram uma compreensão das convenções como elementos constituintes dos sistemas sociais, puderam ver as implicações morais de segunda ordem que poderiam emergir ao se violar essa convenção social, e tenderam a ver como errado o uso de maiô em um funeral, já que dentro das regras sociais para comparecer a um funeral, o modo de vestir-se está ligado tanto ao respeito pela pessoa morta quanto à sensibilidade em relação ao sofrimento da família naquele momento (Nucci & Weber, 1991).

O que pretendo destacar neste ponto é o seguinte: a atenção ao desenvolvimento dentro da educação moral precisa ser acompanhada pela atenção à leitura dos alunos sobre assuntos sociais em que há sobreposição de domínios. Os educadores, ao focar o desenvolvimento em cada um dos domínios conceituais (moral e convencional), contribuem para desenvolver a capacidade dos alunos de entender e agir em seus mundos sociais e morais. Porém, uma vez que esses sistemas interagem em contexto objetivos, estritamente ligados ao desenvolvimento, eles precisam ser reconsiderados diante da posição Kohlbergiana tradicional. Na medida em que se descobriu que o raciocínio dos alunos sobre esses assuntos complexos não resulta de estruturas de argumentação oriundas de um único sistema, o peso que os alunos conferem a considerações morais e não morais torna-se alvo de interesse e não apenas o seu raciocínio dentro do domínio moral. Por exemplo, se os alunos entenderam a história de Maya Angelou descrita acima em termos morais ou convencionais, poderia muito bem ser tão significativo quanto identificar se os alunos encontravam-se nos estágios iniciais ou avançados de seu desenvolvimento social. Como foi ilustrado no texto de Maya Angelou, não há nenhuma garantia de que o desenvolvimento individual por si só conduzirá a uma tal leitura de sobreposição de questões sociais. Infelizmente até mesmo para os indivíduos que foram julgados dentro do referencial de Kohlberg como estando nos estágios pós-convencionais de raciocínio, descobriu-se que eles eram sensíveis a pressões sociais e contextuais em sua leitura do significado moral das ações (veja a discussão da pesquisa de Milgram em Turiel, 1983).

Uma pesquisa demonstrou que os professores podem influenciar a maneira por meio da qual os alunos entendem as questões sociais bem como as tendências dos alunos ao abordar os aspectos morais e convencionais de questões sociais complexas. Nucci & Weber (1991) dividiram, em seu estudo, os alunos em três grupos de discussão, que se encontraram durante quatro semanas. Os alunos discutiam nos encontros assuntos que eram principalmente morais, convencionais, ou de sobreposição entre moralidade e convenção. Ao longo das discussões semanais, um grupo foi orientado a tratar todos os assuntos em termos de preocupações morais por justiça e bem-estar do ser humano; um segundo grupo foi orientado a abordar todos os assuntos como questões de convenção e ordem social; e o terceiro grupo, a tratar os assuntos morais de uma perspectiva moral, os assuntos convencionais de uma perspectiva convencional, e a coordenar os componentes morais e convencionais de questões multifacetadas. Após essa intervenção, os níveis de raciocínio moral e convencional dos alunos foram avaliados a partir de entrevistas. Estudantes em todos os três grupos foram capazes de responder claramente aos assuntos morais ou convencionais que não eram ambíguos. Porém, quando se pediu aos alunos que escrevessem sobre os valores presentes em um incidente que teve características morais e convencionais, os sujeitos do primeiro grupo (perspectiva moral exclusivamente) subordinaram as questões complexas a preocupações morais, e os sujeitos do segundo grupo (perspectiva convencional exclusiva) subordinaram as questões complexas a assuntos referentes às normas e à organização social. Apenas o terceiro grupo espontaneamente considerou ambas as características das questões discutidas e tentou coordená-las. Como essa experiência breve e relativamente simples ilustra, a educação pode influenciar a maneira pela qual os indivíduos atribuem significado às situações sociais complexas.

Dado que muitos dos assuntos morais da vida cotidiana estão emaranhados em normas e contextos convencionais, urge que sejam oferecidas às crianças as ferramentas intelectuais e atitudinais necessárias para lidarem com essas realidades. Na prática, isso significa que aos alunos não só sejam oferecidas oportunidades para desenvolverem suas compreensões e modos de raciocínio sobre moralidade e convenção, mas também que eles sejam engajados na tarefa mais complexa de avaliar e coordenar a moral e os elementos sociais e organizacionais de questões sociais multifacetadas. Esses processos necessariamente serão diferentes nos diversos pontos do desenvolvimento. Adolescentes com compreensão complexa das sociedades como sistemas abordarão tais temas de um modo mais integrador e complexo do que as crianças. No entanto, um discurso significativo sobre o componente moral de padrões sociais multifacetados pode ser obtido por uma ampla faixa etária. E, mais do que isso, os contextos nos quais moralidade e convenção podem se sobrepor não são confinados ao distante mundo dos adultos, mas surgem também em contextos estruturados pelas normas de crianças e adolescentes. Por exemplo, encorajar as crianças a perceberem as implicações morais que podem decorrer de normas de exclusão tomadas dentro de panelinhas, que excluem um determinado tipo de criança do convívio com o grupo, ou ajudando-as a lidarem com normas masculinas sobre ser ou não durão em situações de disputas no playground, pode ajudá-las a elaborar formas de construir sociedades não-discriminatórias, justas e seguras. Assim, ajudar os alunos a ter condições de lidar com a difícil tarefa de integrar o que é moral com as necessidades de ordem social e as necessidades de organização não precisa ser visto como algo distante da tarefa de criar crianças boazinhas que não mentem, não trapaceiam, não roubam e não machucam os colegas.

Se aprendemos algo nos últimos trinta anos, foi que a educação moral não pode ficar confinada a uma parte do dia escolar, ou a uma situação contextual, mas deve ser integrada à experiência escolar como um todo. Entretanto, a abordagem descrita aqui – com implicações para a totalidade do currículo – pode gerar certo desconforto para alguns. Engajar as crianças em uma reflexão moral crítica sobre temas abordados na literatura, ou sobre padrões sociais atuais ou históricos presentes nos estudos sociais ou em textos de história, pode parecer ameaçador para aqueles que nutrem uma visão conservadora sobre o papel das escolas públicas na promoção da cidadania. Deste ponto de vista, a educação em valores de Wynne & Ryan (1993) serve ao propósito de introduzir os jovens na ordem social existente de forma que a sociedade possa ser preservada e perpetuada. Infelizmente para aquela perspectiva, democracias pluralistas são dinâmicas, e esforços para abafar a crítica vão de encontro à própria natureza da sociedade democrática, que tais pessoas esperam preservar. É uma questão moral e política decidir se desejamos empregar recursos de nossas escolas para desenvolver a habilidade de nossos cidadãos de se engajar em uma crítica moral reflexiva de nossa cultura. Como eu demonstrei, a base de conhecimentos a partir da qual podemos construir tal abordagem para a educação moral e social está disponível.

Implicações para a prática educacional

Para concluir, permitam-me resumir alguns dos pontos principais deste artigo e indicar algumas das implicações das pesquisas recentes sobre as práticas educacionais e políticas voltadas ao desenvolvimento da moral e à formação do caráter. A meta central deste artigo foi demonstrar a inadequação de se definir os objetivos da educação moral simplesmente em termos da socialização de crianças nos valores da sociedade, ou de imbuí-las de virtudes morais tradicionais. Tal abordagem, embora seja atraente ao senso comum, não aborda os modos a partir dos quais as pessoas fazem julgamentos morais contextualizados, nem lida com a necessidade de se equipar os jovens com uma perspectiva moral crítica. Baseando-me em pesquisas sobre o desenvolvimento moral e social de crianças, ofereço as seguintes sugestões de como ir além da educação de crianças boazinhas e em direção ao desenvolvimento de um cidadão coletivamente capaz de desafiar o status quo utilizando-se de um ponto de vista moral crítico. Essas práticas mais ou menos se dividem naquelas que se referem ao conteúdo acadêmico ou intelectual e sua reflexão e às políticas escolares ou práticas que afetam o ambiente escolar ou as atividades dos alunos. Iniciarei com as práticas acadêmicas.

  • A educação moral deveria tomar como foco as preocupações e concepções dos alunos sobre noções de justiça e o bem-estar dos outros

Estes assuntos morais são tratados por crianças e adultos como universalizáveis e independentes das normas e regras específicas de sua cultura. A moralidade é distinta das convenções sociais, que resultam de um acordo sobre normas sociais particulares de grupos sociais ou culturais. Essa definição de moralidade é consistente com a psicologia individual e pode servir como base para um foco de valores comuns e compartilhados para a educação moral.

  • As práticas educacionais devem estar em sintonia com o desenvolvimento dos alunos

Embora as crianças pequenas tenham um senso intuitivo de moralidade, elas não têm plenamente desenvolvida sua compreensão de justiça. Elas não têm, tampouco, uma compreensão da função das convenções na organização dos sistemas sociais. Assim, os educadores precisam adequar as práticas educacionais à fase em que o aluno se encontra a fim de que o trabalho de desenvolvimento social e moral dos mesmos seja efetivo.

  • As práticas educacionais devem levar em conta o fato de que moralidade e convenção desenvolvem-se a partir de tipos qualitativamente diferentes de experiências sociais

Moralidade lida com questões de justiça e bem-estar humano. Assim, os conceitos morais das crianças são promovidos por experiências escolares que se centram em tais preocupações; que solicitam às crianças refletirem sobre tais temas; e que lhes pedem que encontrem soluções para problemas morais genuínos da forma mais justa e adequada possível para todas as partes envolvidas. Por outro lado, questões relativas à convenção lidam com preocupações com a organização social. Assim, as compreensões das crianças sobre o significado e a importância das convenções surgem de esforços para se atingir normas que coordenem as ações dos membros de um dado grupo. Nas experiências escolares cotidianas isso emerge no contexto de conversas sobre os códigos de vestir-se, regras como a de levantar a mão e semelhantes. Esses temas aparecem no currículo à medida que as crianças buscam entender o significado ou a função de diferentes normas convencionais ao longo de história, ou dentro dos diferentes grupos culturais. Sugestões específicas para o que é denominado "educação apropriada a este domínio" são encontradas em Nucci (2001).

  • Desenvolvimento moral é promovido por discussões sobre a moral e pela resolução de problemas

O raciocínio moral desenvolve-se quando os alunos identificam inconsistências e insuficiências em suas posições morais. Um dos modos mais efetivos de se promover isso é por meio de discussões em pequenos grupos, caracterizadas por um discurso negociador (Berkowitz, Gibbs, J., & Broughton, 1985). Em tais discussões, solicita-se aos alunos que cheguem a solução de um problema moral de tal modo que seja o mais justo para todas as partes envolvidas. Nesse processo, os alunos precisam ouvir cuidadosamente o que os membros do grupo têm a dizer e aceitar posições discrepantes das suas. As discussões podem ser estimuladas por leituras, bem como por episódios concretos. Além disso, não são limitadas a um assunto escolar específico.

  • A discussão moral é mais efetiva quando relacionada a comportamentos e temas concretos dos alunos

A atenção e a motivação dos alunos aumentam quando os problemas morais abordados tratam de assuntos da vida real e quando as conseqüências de suas decisões têm impacto real nas ações ou políticas subseqüentes. Essa abordagem também engaja os alunos na representação de papéis relacionados à construção de sua identidade. Assim, essa perspectiva lida com julgamentos de responsabilidade pessoal. Uma abordagem amplamente pesquisada que faz uso dessa técnica é a da "Comunidade Justa" (Power, Higgins, & Kohlberg, 1989).

  • Preocupações morais são geralmente permeadas por práticas baseadas em convenções

Considerando que as ações morais ocorrem dentro de contextos culturais, muitas questões morais são permeadas ou se sobrepõem a questões de moralidade. Esse fato tem algumas implicações educacionais, discutidas a seguir.

Preocupações em promover o desenvolvimento moral devem incluir a sensibilidade moral

Uma vez que os assuntos da moralidade geralmente são permeados por práticas convencionais, o significado moral de tais práticas pode passar despercebido. Estando as escolas comprometidas com a educação moral, uma função de tal educação deveria ser a de ampliar a probabilidade de que os alunos prestem atenção às conseqüências morais de se conformarem às normas da ordem social existente. Um modo de se fazer isso é apresentar aos estudantes questões que envolvam sobreposição entre moralidade e convenção, e pedir-lhes que considerem ambos os aspectos morais e convencionais de tais questões. Exemplos desse tipo de abordagem são encontrados em Nucci (2001).

Os educadores precisam estar preparados para lidar com a controvérsia

Uma vez que questões de sobreposição de domínios envolvem freqüentemente práticas convencionais estabelecidas, a injustiça ou dano em potencial causados por tais práticas podem passar despercebidos para a maioria da sociedade, ou podem ser importantes para a manutenção dos interesses de grupos sociais específicos. Um dilema moral enfrentado por educadores e responsáveis por políticas educacionais é até que ponto devem engajar seus alunos na discussão de tais assuntos controversos. Propor aos alunos a discussão de tais assuntos prepara-os para contribuir para o desenvolvimento moral da sociedade. Entretanto, as escolas que optam por discutir tais temas assumem o risco de alienar sua base constituinte. O cerne do dilema moral com o qual todos educadores se deparam é como equilibrar seu dever moral de capacitar seus alunos a lidar com as contradições inerentes a qualquer sistema de valor complexo, com seu papel enquanto agentes daquela mesma sociedade.

  • Assuntos sobre o ambiente escolar e as atividades dos alunos

O ambiente escolar deveria promover a justiça e o respeito pelos outros

O desenvolvimento moral e a educação de caráter não são limitados a áreas de estudo acadêmico específicas, mas perpassam toda a vida escolar. O ambiente escolar deveria caracterizar-se pelo respeito mútuo. As regras escolares deveriam ser tais que protegessem a segurança do aluno, bem como promovessem o respeito pelo outro. A execução de políticas escolares deveria ser caracterizada por sua firmeza, justiça e flexibilidade. A autoridade escolar não deveria ser caracterizada por severidade ou intolerância.

Proporcionar aos alunos oportunidades para desenvolver habilidades na resolução de problemas sociais

O conhecimento para a resolução de conflitos e para a solução de problemas sociais permite aos alunos uma maior habilidade de se engajarem em interações livres de confronto com seus pares, interações estas que favorecem o diálogo e a construção de orientações morais para com os outros. Isso funciona melhor quando eles são encorajados a usar essas habilidades na resolução de conflitos reais enquanto estão na escola (por exemplo, na hora do recreio).

Deveriam ser dadas aos alunos oportunidades para assumir papéis que requerem responsabilidade moral

Grande parte da vida escolar requer pouco mais dos alunos do que sua obediência passiva. Oportunidades para os alunos construírem um senso de si mesmo como seres morais, tais como participar ativamente no atendimento das necessidades de sua própria escola ou de sua comunidade local, quando conjugadas a oportunidades de uma reflexão significativa, podem fornecer conteúdo para os alunos construírem um senso moral de sua identidade (Colby & Damon, 1992).

Recebido em 03.05.01

Aprovado em 07.06.01

Larry Nucci é professor de Educação e Psicologia na Universidade de Illinois em Chicago. É também diretor do Office for Studies in Moral Development and Character Formation. Atualmente preside a Jean Piaget Society, nos Estados Unidos. Sua mais recente publicação é Education in the moral domain (Cambridge University Press).

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  • 1
    . "Nice" children, no original (N.T.).
  • 2
    . No original : ‘Amish-Mennonite’
  • 3
    . Eu uso este exemplo em lugar de um brasileiro porque neste exibem-se contradições entre convenção e moralidade dentro de minha própria cultura. Deixo para um autor brasileiro encontrar tais exemplos dentro do seu contexto histórico-cultural.
  • *
    Tradução do original em inglês
    Moral psychology and education: moving beyond "nice" children, por Denise Trento Rebello de Souza e revisão técnica de Ulisses Ferreira Araújo.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Nov 2001
    • Data do Fascículo
      Dez 2000

    Histórico

    • Recebido
      03 Maio 2001
    • Aceito
      07 Jun 2001
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