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Apresentação

Em Foco: violência e escola

Apresentação

O tema da violência na sociedade brasileira alcança maior visibilidade e desperta o interesse da academia no decorrer do processo de democratização. Não só a herança do regime autoritário se faz presente até os dias atuais, sensibilizando vários atores sociais na luta pela democratização institucional e pela realização dos direitos da cidadania, como a disseminação das várias formas da criminalidade, delinqüência e prática de justiça extra-legal nas regiões urbanas ocorre, paradoxalmente, com o próprio advento da democracia.

Em suas múltiplas faces, as relações entre os processos de violência e a instituição escolar começam, também, a ocupar o debate público desde o início dos anos 1980. Sensibilizando vários atores sociais, os episódios violentos, muitas vezes registrados de modo exagerado pela mídia, tendem a ser compreendidos sob ângulos diversos, suscitam respostas muitas vezes pontuais e fragmentadas do Poder Público e algumas iniciativas de movimentos sociais e organizações da sociedade civil.

Mas o estudo sistemático da violência em suas relações com a escola constitui, ainda, um amplo desafio aos investigadores. Os trabalhos são escassos e não há, ainda, grupos de pesquisadores que busquem traçar um programa conjunto de investigações, abrangendo cidades e situações socio-culturais diferentes em todo o país. No entanto, os poucos dados disponíveis indicam a violência em meio escolar como um fenômeno que ocorre em âmbito nacional. Sua manifestação é variada e bastante suscetível ao modo como os próprios atores a compreendem. Muitas vezes trata-se da porosidade que a escola mantém com o meio social, ele mesmo violento, e, em outras, ficam evidentes as práticas cotidianas de agressões e ameaças envolvendo alunos e professores, entendidas como incivilidades. Embora vislumbradas como violentas, algumas das ações, na verdade, dizem respeito aos mecanismos da indisciplina e da transgressão bastante freqüentes nos ambientes escolares, mas que, em nossos dias, chegam a atemorizar educadores, pais e demais profissionais da área da educação.

Por essas razões, continua bastante oportuna a publicação de pesquisas que tratem do tema. O conjunto de artigos aqui reunidos inclui dois textos que exprimem estudos de natureza qualitativa, realizados em cidades diferentes, Belo Horizonte e Vitória, e voltados para segmentos sociais diversos. Carla Araújo, em seu estudo, privilegia os processos mediante os quais os jovens alunos, moradores de bairros periféricos de Belo Horizonte, com altos índices de violência e homicídios, constituem sua identidade no interior de um ambiente inseguro e marcado pelo estigma. O universo escolar investigado por Luiza Camacho em Vitória incide sobre a realidade das classes médias e segmentos de elites que, também, sofrem os efeitos de práticas onde, muitas vezes, a violência ocorre, mas de modo dissimulado. O artigo de José Vicente Tavares traz importante contribuição para a compreensão do fenômeno, tendo por base a realidade da cidade de Porto Alegre que vem empreendendo, há alguns anos, no âmbito municipal, estudo sistemáticos, propondo, ao mesmo tempo algumas ações de prevenção da violência escolar.

Um primeiro balanço da pesquisa realizada no Brasil consta, também, do conjunto de artigos apresentados neste número de EDUCAÇÃO E PESQUISA, que fica enriquecido com as contribuições de Eric Débarbieux, em sua síntese sobre a produção do conhecimento sobre o tema na França.

Trata-se, assim, de mais um passo na compreensão de um fenômeno que aflige vários países ocidentais e que exprime, em grande parte, aspectos da crise e da mutação das formas como se desenvolve a sociabilidade e os processos de socialização no mundo contemporâneo.

Marilia Pontes Sposito

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Nov 2001
  • Data do Fascículo
    Jun 2001
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