Acessibilidade / Reportar erro

Formação de professores de licenciatura a distância: o caso do curso de pedagogia da UAB/UECE

Distance education of licentiateship teachers: the case of the pedagogy course at UAB/UECE

Resumos

Este trabalho parte da consideração de que a educação a distância (EaD), por seu caráter flexível, tem alcançado paulatinamente espaço no panorama educacional brasileiro. Um exemplo da expansão desse modo de ensino foi a criação, em 2006, pelo governo federal, do sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) como resposta a, no mínimo, dois graves problemas do país: a falta de qualificação de professores e a dificuldade de acesso da população à educação superior. Tendo em vista essas duas necessidades da educação brasileira, realizou-se uma pesquisa que procurou responder à seguinte pergunta: em EaD nos cursos de licenciatura em pedagogia do sistema UAB da Universidade Estadual do Ceará (UAB/UECE), como a formação dos professores contribui para o exercício da docência? O trabalho tem como objetivo identificar qual a formação dos professores atuantes no curso de licenciatura em pedagogia da UAB/UECE. Para tanto, na metodologia, adotou-se o survey como método de pesquisa. O instrumento utilizado foi um questionário on-line, enviado por correio eletrônico e criado com o apoio do software livre LimeSurvey. A amostra da pesquisa foi tomada aleatoriamente e composta por 47 docentes, de uma população de 90 professores. Os resultados evidenciam que ainda há um grande número de docentes sem formação específica em EaD para atuar no curso. Por outro lado, a formação para a EaD oferecida pela UAB/UECE não atende plenamente as necessidades formativas dos docentes.

Educação a distância; Formação de professores; Sistema Universidade Aberta do Brasil


This work starts from the consideration that distance education (DE), in view of its flexible nature, has gained increasing space within the Brazilian educational scenario. An example of the expansion of this mode of teaching is the creation in 2006 by the federal government of the Open University of Brazil (Universidade Aberta do Brasil - UAB) system in response to at least two serious problems faced by the country: low teacher qualification, and the difficulties faced by the population to gain access to higher education. Having these two needs of Brazilian education in mind, a research was carried out seeking to answer the following question: considering the DE in the pedagogy licentiateship courses at the UAB system of the State University of Ceará (UAB/UECE), how does teacher education contribute to the exercise of the teaching profession? The work has as an objective to identify what is the education background of teachers working at the pedagogy licentiateship at UAB/UECE. For that, the methodology adopted the survey as a research method. The instrument used was an online questionnaire sent by electronic mail and created through the use of a free piece of software called LimeSurvey. The research sample was taken randomly and was composed of 47 teachers out of a population of 90 teachers. The results show that there is a still a large number of teachers without specific training in DE to work in the course. Also, the DE training offered by UAB/UECE does not cater fully for the formative needs of the teachers.

Distance education; Teacher education; Open University of Brazil system


ARTIGO

João Batista Carvalho Nunes; Viviani Maria Barbosa Sales

Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, CE, Brazil. Contacts: joao.nunes@uece.br; vivimbs@gmail.com

RESUMO

Este trabalho parte da consideração de que a educação a distância (EaD), por seu caráter flexível, tem alcançado paulatinamente espaço no panorama educacional brasileiro. Um exemplo da expansão desse modo de ensino foi a criação, em 2006, pelo governo federal, do sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB) como resposta a, no mínimo, dois graves problemas do país: a falta de qualificação de professores e a dificuldade de acesso da população à educação superior. Tendo em vista essas duas necessidades da educação brasileira, realizou-se uma pesquisa que procurou responder à seguinte pergunta: em EaD nos cursos de licenciatura em pedagogia do sistema UAB da Universidade Estadual do Ceará (UAB/UECE), como a formação dos professores contribui para o exercício da docência? O trabalho tem como objetivo identificar qual a formação dos professores atuantes no curso de licenciatura em pedagogia da UAB/UECE. Para tanto, na metodologia, adotou-se o survey como método de pesquisa. O instrumento utilizado foi um questionário on-line, enviado por correio eletrônico e criado com o apoio do software livre LimeSurvey. A amostra da pesquisa foi tomada aleatoriamente e composta por 47 docentes, de uma população de 90 professores. Os resultados evidenciam que ainda há um grande número de docentes sem formação específica em EaD para atuar no curso. Por outro lado, a formação para a EaD oferecida pela UAB/UECE não atende plenamente as necessidades formativas dos docentes.

Palavras-chave : Educação a distância - Formação de professores - Sistema Universidade Aberta do Brasil.

ABSTRACT

This work starts from the consideration that distance education (DE), in view of its flexible nature, has gained increasing space within the Brazilian educational scenario. An example of the expansion of this mode of teaching is the creation in 2006 by the federal government of the Open University of Brazil (Universidade Aberta do Brasil - UAB) system in response to at least two serious problems faced by the country: low teacher qualification, and the difficulties faced by the population to gain access to higher education. Having these two needs of Brazilian education in mind, a research was carried out seeking to answer the following question: considering the DE in the pedagogy licentiateship courses at the UAB system of the State University of Ceará (UAB/UECE), how does teacher education contribute to the exercise of the teaching profession? The work has as an objective to identify what is the education background of teachers working at the pedagogy licentiateship at UAB/UECE. For that, the methodology adopted the survey as a research method. The instrument used was an online questionnaire sent by electronic mail and created through the use of a free piece of software called LimeSurvey. The research sample was taken randomly and was composed of 47 teachers out of a population of 90 teachers. The results show that there is a still a large number of teachers without specific training in DE to work in the course. Also, the DE training offered by UAB/UECE does not cater fully for the formative needs of the teachers.

Keywords: Distance education - Teacher education - Open University of Brazil system.

Nosso ponto de partida é a compreensão de que, atualmente, com os avanços tecnológicos, um dos maiores desafios a ser enfrentado pelos sistemas educacionais é estabelecer uma nova cultura educacional, que trace perfis de aluno e de professor diferentes daqueles que se tinha. Faz-se necessário definir uma relação de aprendizagem que possibilite transformar informação em conhecimento, pois uma cultura educacional na qual se trabalha com verdades absolutas e informações intactas/inertes está fadada a sucumbir ante o avanço da ciência e da tecnologia.

Estamos diante de uma sociedade que exige que todos aprendam cada vez mais, como uma via indispensável para o nosso desenvolvimento pessoal, cultural e profissional (POZO, 2002). Inseridos no contexto de uma suposta sociedade do conhecimento, além da exigência de que as pessoas aprendam cada vez mais, devem fazê-lo de maneira diferente da convencional. No âmbito de uma nova cultura da aprendizagem, é necessária a criação de outra forma de conceber e gerir o conhecimento, seja em uma perspectiva cognitiva ou social.

Associa-se a essa demanda educacional, a exigência do mercado de trabalho por um renovado modelo de profissional, capaz de lidar com as mais diversas situações, de modo a poder atuar em situações nas quais haja mudanças constantes, e a conseguir interagir com pessoas e tecnologias.

Hoje, a demanda por educação se mantém e tenciona mudanças nas escolas e universidades no que se refere à sua função e estrutura. Nesse âmbito, é indiscutível o papel cada vez mais significativo que as tecnologias assumem na socialização dos indivíduos nas sociedades modernas. No intuito de assimilar as mudanças de seu tempo, a educação tende a se transformar para refletir as novas perspectivas que configuram o quadro atual.

Tendo em vista a necessidade de maior flexibilidade no acesso à educação, a educação a distância (EaD) apresenta-se como uma proposta que ganha cada vez mais espaço no Brasil. A EaD da qual se fala hoje, no entanto, é diferente nas suas características e objetivos daquela do início de sua constituição. A EaD que se encontra atualmente em franca expansão, aquela a que fazemos referência neste artigo, exige dos professores a detenção de saberes específicos dessa modalidade de ensino diretamente associados ao domínio do uso das tecnologias.

O governo federal, por meio de decretos, regulamentou a EaD. Por intermédio do Ministério da Educação (MEC), implementou ações e criou projetos na perspectiva de consolidá-la. Em 2006, foi instituído o sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), no âmbito do fórum das estatais pela educação, com o propósito prioritário de formar professores da educação básica. Essa iniciativa mostrou-se como resposta a, no mínimo, dois graves problemas em nosso país: a falta de qualificação de professores e a dificuldade de acesso da população à educação superior. De acordo com o art. 1º, parágrafo único, do Decreto nº 5.800/2006, são objetivos da UAB:

I - oferecer, prioritariamente, cursos de licenciatura e de formação inicial e continuada de professores da educação básica; II - oferecer cursos superiores para capacitação de dirigentes, gestores e trabalhadores em educação básica dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; III - oferecer cursos superiores nas diferentes áreas do conhecimento; IV - ampliar o acesso à educação superior pública; V - reduzir as desigualdades de oferta de ensino superior entre as diferentes regiões do País; VI - estabelecer amplo sistema nacional de educação superior a distância; e VII - fomentar o desenvolvimento institucional para a modalidade de educação a distância, bem como a pesquisa em metodologias inovadoras de ensino superior apoiadas em tecnologias de informação e comunicação. (BRASIL, 2006).

Para dar conta de tamanho desafio, a UAB adotou a internet como principal tecnologia de mediação do processo educativo. Os cursos acontecem por meio de ambientes virtuais de aprendizagem adotados pelas instituições universitárias participantes do sistema UAB.

No campo da EaD, vivenciamos, segundo Moore e Kearsley (2007), a geração de classes virtuais com base na internet. Esta registra alto índice de interesse, com a utilização de métodos construtivistas de aprendizagem colaborativa. Além disso, possibilita a integração de várias mídias (texto, áudio, imagem estática, vídeo) em uma única plataforma de comunicação. Favorece-se, assim, a ampliação da interação dos distintos participantes do processo educativo, quais sejam: professores, alunos, administração e pessoal de apoio. Trata-se de um dos grandes diferenciais que a atual tecnologia digital oferece à EaD e um dos fatores que possibilitou a grande expansão da EaD nos últimos tempos.

Pelo fato de a EaD estar diretamente relacionada a inovações tecnológicas e à aprendizagem autônoma, Formiga (2009, p. 39) apontou que "a EaD está intrinsecamente ligada as TICs por se constituir setor altamente dinâmico e pródigo em inovação". Desse modo, a formação para atuar na EaD deve preparar os professores para esses aspectos e suas consequências pedagógicas.

Devemos considerar, no entanto, que muitos professores não receberam formação para integrar as novas tecnologias de informação e comunicação ao seu trabalho pedagógico. De acordo com Belloni (2006, p. 79):

[...] uma das questões centrais na análise da EaD, e talvez a mais polêmica, refere-se ao papel do professor nesta modalidade de ensino, chamado a desempenhar múltiplas funções, para muitas das quais não foi preparado.

Essa é uma situação não restrita ao Brasil. Simone (2006) chama a atenção para a pouca ou nenhuma formação dos professores para a EaD antes de sua atuação nessa modalidade de ensino. A pesquisa desenvolvida por Schifter (2009), em uma universidade dos Estados Unidos, encontrou a falta de formação em EaD proporcionada pela instituição como o terceiro fator que mais inibe a participação dos docentes nessa modalidade de ensino.

A formação dos professores para a EaD é importante para seu ingresso nessa modalidade, assim como para sua continuidade. Os resultados de um survey, aplicado a 135 professores de 23 diferentes universidades que oferecem EaD nos Estados Unidos, apontam a oferta de formação continuada pela instituição como o principal fator que os encorajaria a permanecer ensinando nessa modalidade de ensino (GREEN; ALEJANDRO; BROWN, 2009).

A oferta de formação para os docentes que atuarão na EaD precisa ser mais frequente, não podendo ocorrer apenas uma vez. Deve considerar as necessidades profissionais dos participantes (DIMRI; MISRA, 2006), abrangendo dimensões de natureza pedagógica que não se limitem ao uso da tecnologia (HOWELL et al., 2004).

Um dos primeiros passos da formação do professor de EaD consiste em tomar consciência das especificidades e diversidades dessa modalidade de ensino e se preparar para exercer essas funções de maneira colaborativa. Além disso, é preciso considerar que a experiência no ensino presencial não é garantia de sucesso na EaD (TAYLOR; MCQUIGGAN, 2008). Em um sistema de EaD, todos os envolvidos no processo educativo são responsáveis pela aprendizagem. O papel e as tarefas do professor diferem das do ensino convencional, pois, segundo Belloni (2006, p. 79) o:

[...] uso mais intenso dos meios de comunicação e informação torna o ensino mais complexo e exige a segmentação do ato de ensinar em múltiplas tarefas, sendo esta segmentação a característica principal do ensino à distância.

O estudante de EaD nos cursos de graduação a distância, ao longo da aprendizagem, terá contato com professores distintos em cada disciplina (autor/especialista no conteúdo, formador, tutor), que orientarão sua formação. Nesse caso, o aluno relaciona-se, por meio de vários expedientes e recursos, com diferentes sujeitos que buscam colaborar com sua aprendizagem.

Na EaD, a equipe docente é constituída por diversos profissionais. Segundo Aretio (2002), são eles: planejadores, especialistas nos conteúdos (também denominados autores ou conteudistas), pedagogos, especialistas na produção de materiais didáticos (editores, designers gráficos, webdesigners etc.), formadores, tutores e avaliadores. Essa distribuição de funções e sua denominação variam conforme o porte da instituição e como ela organizou seu programa de EaD (MOORE; KEARSLEY, 2007).

Mais especificamente relacionados ao processo de ensino-aprendizagem, conforme Aretio (2002) afirma, estão o formador e o tutor, considerando que a função de avaliador também é desenvolvida por eles. O formador é o responsável por guiar o processo de aprendizagem, ou seja, dado um conteúdo previamente elaborado, é ele quem define o nível de exigência da disciplina, seleciona os aspectos a avaliar e coordena os tutores da disciplina. Ao tutor cabe a tarefa de acompanhar os estudantes, orientando-os, motivando-os e ajudando-os na superação de suas dificuldades. Acrescentamos que esse profissional deve ser capaz de produzir ou adaptar o conteúdo para o perfil/nível dos estudantes sob sua responsabilidade e contribuir na definição da avaliação da aprendizagem (MATTAR, 2012).

Em muitas instituições, o especialista no conteúdo ou conteudista também exerce o papel de formador. Ele é responsável pela elaboração do conteúdo, definição da metodologia e dos procedimentos avaliativos da disciplina (TEPERINO et al., 2006).

Entendemos que, em função da experiência educacional tradicional que vivenciamos, na qual muitas vezes existe a figura de apenas um professor responsável por uma disciplina ou conjunto de disciplinas, isso pode, no primeiro momento, causar confusão e desconforto, tanto para docentes como para estudantes.

Quando assume a função de formador em curso superior a distância, o professor poderá deparar-se com uma série de dúvidas e, até mesmo, receios, o que possivelmente o levará a repensar seu papel e suas competências. Mesmo que tenha anos de experiência como profissional do magistério presencial, estará vivenciando uma modalidade até então nova para ele. Será um professor principiante na EaD1 1 - Sugerimos a leitura de Nunes (2001) para maior compreensão a respeito dos professores principiantes. . Em um movimento característico da ação docente, precisará desenvolver conhecimentos, habilidades e valores para lidar com essa nova situação e com outras que surgem no decorrer de sua prática.

Há, na EaD, uma real necessidade de profissionais com formação na área. Sendo assim, caberia indagar: será que os professores que estão atuando nesses cursos receberam formação adequada? Como ocorre essa formação específica para atuar na EaD? Para responder a esses questionamentos, tomamos por base a análise da formação dos professores do curso de pedagogia a distância atuantes no sistema UAB da Universidade Estadual do Ceará - UECE. Para tanto, o problema de pesquisa foi assim definido: em EaD, nos cursos de licenciatura em pedagogia do sistema UAB da Universidade Estadual do Ceará (UAB/UECE), como a formação dos professores contribui para o exercício da docência? No âmbito de um estudo mais amplo, o problema desdobrou-se em vários objetivos. Contudo, em função do espaço disponível neste artigo, serão focalizados os resultados obtidos em resposta ao seguinte objetivo: identificar qual a formação dos professores atuantes no curso de licenciatura em pedagogia da UAB/UECE.

Para este texto, fizemos um recorte da pesquisa no que se refere, especificamente, à trajetória de formação dos docentes investigados e à formação específica para atuar na EaD. A seguir, sintetizaremos os procedimentos metodológicos utilizados e os principis resultados alcançados por meio dessa investigação.

Percurso metodológico

Os pesquisadores sociais podem usar diferentes métodos de pesquisa para observar e entender um fenômeno que queiram investigar. Supomos, de começo, que não existe método infalível, verdadeiro ou falso. Existem aqueles que respondem melhor a um problema e que, portanto, se harmonizam aos objetivos estabelecidos pelo pesquisador. Para nossa pesquisa, adotamos o survey como método investigativo.

A escolha do survey foi feita por se tratar de um método de investigação empregado por pesquisadores sociais para examinar uma amostra da população, permitindo a verificação empírica de determinado fenômeno. Ele possibilita obter dados ou informações sobre opiniões e ações de um grupo de pessoas por meio de um instrumento de pesquisa que, normalmente, é um questionário (BABBIE, 2003; MOREIRA et al., 2011).

Em nossa pesquisa, utilizamos o método como forma de nos permitir obter, dentro da população que pretendíamos investigar, dados sobre quem são os professores da UECE/UAB que atuam na EaD e sua formação. Nosso interesse em fazer um survey privilegiou aspectos descritivos, desde a perspectiva dos sujeitos investigados.

O campo da pesquisa

O campo escolhido para nossa investigação foi a Universidade Estadual do Ceará (UECE), instituição de ensino superior criada pelo Decreto Estadual nº 11.233, de 10 de março de 1975, constituída em forma de fundação. Composta por uma rede multicampi, compreende dois campi na capital e seis unidades no restante do estado (Crateús, Iguatu, Itapipoca, Limoeiro do Norte, Quixadá e Tauá). Trata-se da maior universidade pública estadual do Ceará.

Os processos de universalização e municipalização do ensino no Ceará aconteceram simultaneamente, segundo Vidal e Branco (2009), requerendo a contratação imediata de grande número de docentes, fato que ensejou a demanda por formação de professores para atuar na educação básica. Essa demanda se dirigiu para as instituições de ensino superior (IES), especialmente as públicas, localizadas fora da capital, Fortaleza. Nesse âmbito, surgiram, na UECE, programas emergenciais para formação de professores como o Magister2 2 - O Programa Magister teve como objetivo qualificar professores das redes públicas estadual e municipal que atuavam no ensino fundamental para exercerem docência nas séries terminais do ensino fundamental e ensino médio. Habilitava professores por área de conhecimento. e outros.

Considerando a necessidade de formação existente no estado, principalmente à referente a cursos de licenciatura, e a impossibilidade geográfica de atender a esse contingente, a UECE buscou implantar ações que visassem a suprir essa demanda nos municípios onde não existem instituições de ensino superior, por meio da implementação de cursos oferecidos na modalidade semipresencial e a distância.

Em 2000, a UECE passou a realizar iniciativas de oferta de cursos de graduação utilizando EaD, no Núcleo de Educação Continuada e a Distância (NECAD), do Centro de Educação. Essa oferta se circunscrevia a cursos de licenciatura para as séries iniciais do ensino fundamental, formação pedagógica para bacharéis (denominado anteriormente como esquema II) e algumas experiências de formação continuada, a exemplo do Progestão - Programa de Capacitação a Distância para Gestores Escolares (VIDAL, BRANCO, 2009).

Essas ações se consolidaram com os convênios estabelecidos entre MEC/UAB e a UECE, por meio do Edital nº 0001/2006. Os cursos definidos foram os de licenciatura, direcionados para o atendimento de professores leigos e alunos egressos do ensino médio de alguns municípios do estado que não tinham graduação na modalidade presencial (VIDAL; BRANCO, 2009).

Para conseguir implantar esses cursos, a UECE oficializou a criação da Secretaria de Educação a Distância (SEAD) em 2007, com o objetivo de:

[...] desenvolver um ensino público, associado a pesquisa e a extensão, considerando as demandas da sociedade brasileira por maiores oportunidades de acesso a um ensino superior de qualidade e com ingresso mais acessível por meio da EaD.

A SEAD é vinculada institucionalmente à Reitoria e está a serviço de toda a universidade. A partir de dezembro/2011, esse órgão passou a denominar-se Secretaria de Apoio às Tecnologias Educacionais (SATE) (FUNECE, 2011).

Os sujeitos da pesquisa

Os cursos de licenciatura em pedagogia da UAB/UECE são ofertados na modalidade EaD por meio do ambiente virtual moodle. A equipe docente dos cursos é constituída por um coordenador de curso e de tutoria, professores formadores, professores autores, tutores a distância e tutores presenciais, com os seguintes papéis:

1. Coordenador de curso - responsável pela coordenação do curso, acompanha e avalia todo o processo de execução do curso;

2. Coordenador de tutoria - responsável pela coordenação dos professores e tutores, acompanha e orienta o desenvolvimento das atividades pedagógicas;

3. Professores formadores - responsáveis pelas disciplinas do curso, ministram aulas presenciais;

4. Professor autor - responsável pela elaboração do material impresso que será trabalhado com os alunos nas disciplinas (as funções de professor formador e professor autor podem ser exercidas pelo mesmo sujeito);

5. Tutor a distância - atua junto ao professor formador da disciplina, como mediador e orientador das atividades realizadas a distância, acompanhando o desenvolvimento de cada aluno e turma. Deve ser um especialista na área de conhecimento em que atuará e ter domínio no uso dos recursos computacionais e internet;

6. Tutor presencial - faz o acompanhamento dos estudantes nos polos regionais, permitindo acesso à infraestrutura, esclarecendo dúvidas técnicas sobre o ambiente de aprendizagem e motivando os alunos. Ocupa papel importante de elo entre os estudantes e a instituição. Deve possuir, no mínimo, graduação na área em que atuará e domínio no uso dos recursos computacionais e internet.

Para efeito de nosso estudo, tomamos como objeto o perfil dos professores formadores/autores, tutores a distância e tutores presenciais como docentes do curso de pedagogia a distância da UAB/UECE, pois todos estão envolvidos mais diretamente com a prática da docência em EaD3 3 - Embora alguns autores e instituições defendam a ideia de que tutor não é professor, temos a certeza de que ele o é, corroborando argumentos de Mattar (2012). .

Estabelecemos como referência para nosso estudo o 1º semestre de 2009, o 2º semestre de 2009 e o 1º semestre de 2010, período que compreende início do primeiro curso de pedagogia da UAB/UECE e a conclusão da coleta desta pesquisa. Foi abarcada uma população de 90 professores, conforme mostra tabela 1.

Considerando os dados, optamos pela realização de uma amostragem aleatória simples. Para efeito do cálculo da amostra, adotamos o intervalo de confiança de 95%, estimativa da proporção populacional de 0,5 e erro amostral tolerado de 0,1. Com base nesses valores, o cálculo da amostra resultou em 47 docentes de uma população de 90 professores.

Coleta e análise dos dados

Utilizamos, como instrumento para coleta de dados, questionários autoadministrados: survey por correio, empregando o correio eletrônico. O survey eletrônico foi útil também como forma de perceber a disposição dos entrevistados em utilizar uma ferramenta que é importante em sua prática pedagógica, a internet, para responder às perguntas.

Realizamos o survey com apoio do software livre LimeSurvey, um programa para aplicação de questionários eletrônicos on-line. O programa permite aos usuários, mesmo sem conhecimento sobre desenvolvimento de software, criar, publicar e coletar respostas de questionários que podem ser enviados para várias pessoas. Sendo assim, após elaborarmos o questionário no LimeSurvey, enviamos um e-mail para a população de 90 docentes, informando sobre a pesquisa e solicitando que respondessem ao questionário on-line, disponível no link fornecido. Ao final, obtivemos 47 questionários respondidos.

Para a análise dos dados do questionário, utilizamos o software de análise de dados estatísticos SPSS (Statistical Package for the Social Sciences). Trata-se de um dos programas estatísticos mais utilizados nas ciências sociais. Inicialmente, realizamos uma descrição geral das variáveis, com base na distribuição de suas frequências absoluta e percentual. De acordo com Bisquerra, Sarriera e Martínez (2004, p. 40-41), "uma distribuição de frequência é um instrumento útil para resumir grandes quantidades de dados".

De posse dos dados, o programa nos possibilitou a criação de gráficos e tabelas, considerando que "As representações gráficas são de grande ajuda para compreender e interpretar os resultados". (BISQUERRA; SARRIERA; MARTÍNEZ, 2004, p. 58). São muitas as possibilidades de representações gráficas em estatística. Procuramos selecionar as que melhor expressassem os resultados de nossa pesquisa e incluímos, neste artigo, algumas delas, o que poderá ser visualizado adiante, na discussão da análise dos dados.

Professores do curso de pedagogia da UAB/UECE: trajetória formativa e profissional

A amostra que analisamos é constituída por 47 dos 90 docentes que atuaram no curso de pedagogia da UAB/UECE, do primeiro semestre de 2009 ao primeiro semestre de 2010, conforme consta no tópico anterior. Desse total, 80,9% são docentes do sexo feminino e 19,1%, do masculino.

Essas informações reforçam importantes pesquisas realizadas no Brasil e no mundo, as quais sugerem um processo histórico de feminilização do magistério. Segundo Sá e Rosa (2004), desde início do século XX até os dias atuais, assistimos à presença cada vez menor de homens no exercício da profissão docente. A pesquisa bibliográfica realizada pelos autores revela que a evasão de docentes do sexo masculino está associada ao crescente desprestígio social e econômico do magistério.

A média de idade dos docentes investigados é de 42,7 anos, com desvio-padrão de nove anos. A mediana é de 42 anos, o que significa dizer que 50% dos docentes têm até 42 anos. O professor mais jovem tem 25 anos e o de maior idade, 62 anos. De tal modo, podemos assinalar que a população investigada é composta por adultos experientes.

A experiência na educação a distância dos docentes entrevistados, conforme apresentado na tabela 2, é expressa da seguinte forma: 83,0% já exerceram atividades de professor formador; 31,9% desenvolveram ações de tutores a distância; 31,9% atuaram como professores conteudistas; 25,5% trabalharam como tutores presenciais; e 6,4% desempenharam outras atividades, como coordenador, professor pesquisador, supervisor de estágio e orientador de trabalho de conclusão de curso - TCC.

No momento da coleta de dados, cujo período foi entre janeiro a março de 2011, mais de um terço (38,3%) dos docentes pesquisados não estavam exercendo nenhuma função em EaD, enquanto os demais desempenhavam as funções de professor formador (29,8%), tutor a distância (21,3%), professor conteudista (10,6%), tutor presencial (6,4%) e coordenador do curso de pedagogia da Universidade Federal do Ceará (2,1%).

Pode-se observar que a atuação na EaD acontece de forma descontínua. Os profissionais atuantes na EaD exercem diversas funções, algumas vezes ao mesmo tempo, e não constituem vínculos com a modalidade a distância. Isso se torna claro se compararmos as duas tabelas reproduzidas acima. Enquanto, por exemplo, 83% dos respondentes afirmaram já ter atuado como professores formadores (tabela 2), apenas 29,8% relataram estar exercendo essa função no momento da coleta dos dados (tabela 3); além disso, é preciso considerar pouco mais de 1/3 dos docentes disseram não estar atuando na EaD nesse momento.

O fato de os docentes não constituírem vínculo com a modalidade influencia em sua formação: como não mantêm uma relação contínua com a EaD, não se especializam na área, motivo que tende a implicar um ensino menos qualificado.

Para que se tenha um parâmetro, cabe ressaltar que o tempo médio de atuação dos docentes na EaD é de 23,6 meses, com desvio-padrão de 26,5 meses. Metade dos entrevistados possui tempo de atuação de até 19 meses. O docente com menor experiência em EaD registrou somente um mês de atuação na área, enquanto o de maior enfatizou atuar há 120 meses na área.

A partir dos dados analisados, podemos asseverar que os professores do curso de pedagogia da UAB/UECE têm, em média, pouca experiência na EaD. Se compararmos o maior e o menor tempo de experiência, assim como o valor do desvio-padrão, veremos que há uma variabilidade muito acentuada. Isso revela não haver critérios definidos para seleção dos docentes em relação ao tempo de experiência nessa modalidade de ensino.

Com relação à formação geral dos docentes investigados, os dados revelaram que um pequeno número deles possui apenas graduação (8,5%). A maioria (91,5%) é portadora de diplomas em programas de pós-graduação, assim distribuídos: especialização, com 34%; mestrado, com 36,2%; doutorado, com 19,1%; e pós-doutorado, com 2,1% (gráfico 1).


Como não existe legislação específica sobre a formação de professores para a educação a distância, em tese, valem para a EaD as mesmas exigências feitas a docentes para atuação no ensino presencial. Segundo o artigo 66 da LDB 9.394/96, "a preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado". (BRASIL, 1996). Nota-se que essa exigência não está sendo cumprida integralmente.

Dos docentes investigados, quatro tinham, na época de sua atuação na UAB/UECE, apenas graduação, sendo que, desses, um exerceu a função de tutor presencial, um de tutor a distância e dois de professor formador. Observa-se, ainda, que, na fase preliminar da pesquisa, durante entrevista com o coordenador geral da SEAD na UECE, recebemos a informação de que, para atuar na UAB/UECE, seria necessário estar legalmente habilitado para ser professor do ensino superior. Vê-se, portanto, que, no caso do curso de pedagogia da UAB/UECE, foram abertas exceções sem amparo legal, permitindo o exercício da docência sem a habilitação mínima necessária.

Observamos que ainda há um grande número de docentes sem formação específica para atuar em EaD. Isso pode ser percebido com base nos dados, segundo os quais 40,4% (19) dos docentes investigados informaram não possuir formação específica para EaD (gráfico 2).


Os dados analisados até aqui nos fazem refletir a respeito da qualidade do ensino a distância e das necessidades dos docentes. O primeiro desafio a ser transposto refere-se à formação dos professores. Os profissionais que se tornam docentes do curso de pedagogia a distância oferecido pela UAB/UECE desempenham suas funções com pouca ou nenhuma orientação.

Dos que possuem formação específica para a EaD, 60,7% a obtiveram em cursos de extensão promovidos pela UAB/UECE; 39,3% adquiriram essa formação em disciplinas de cursos de pós-graduação; 28,6% em cursos de extensão não promovidos pela UAB/UECE; 28,6% em cursos realizados por iniciativa própria; 14,3% em disciplinas da graduação. Já 7,1% afirmaram ter tido outros tipos de formação, por meio de grupos de estudo e pesquisa. Note-se que um mesmo docente pode ter assinalado mais de um tipo de formação realizada.

Dos 28 docentes (59,6% do total) que cursaram formação em EaD, a quantidade dos cursos realizados variou de um a seis, tendo uma média aritmética de 2,5 cursos por docente e desvio-padrão de 1,5 curso. Metade dos docentes fez até dois cursos.

A tabela 4 descreve os conteúdos que foram ministrados nos cursos de EaD realizados pelos docentes que obtiveram formação específica para atuar nessa modalidade de ensino. Desses, quase todos (96,4%) estudaram o conceito de EaD. Também foi bem expressivo o estudo dos conteúdos: contextualização e histórico da EaD; características e modelos de EaD; competências e habilidades necessárias à EaD.

Nota-se que os cursos realizados pelos docentes deram ênfase à parte conceitual (histórico, conceito, contexto e características). Também são enfatizadas nos cursos as competências e habilidades necessárias à EaD (embora para 25% dos docentes os cursos não tenham tratado disso). É fato que, para atuar nessa modalidade, o profissional deve conhecer as peculiaridades da EaD e entender sua constituição, a fim de reconhecer suas características e necessidades, as quais são distintas daquelas do ensino presencial.

Seguidas dessa contextualização da EaD, as ferramentas interativas, os ambientes virtuais de aprendizagens (a parte prática referente ao ambiente virtual) e a avaliação em EaD também foram explorados nos cursos realizados, com percentuais de presença acima de 65%.

Como no modelo UAB/UECE, geralmente quem atua diretamente no ambiente virtual são os tutores, parece-nos que os cursos possuem foco nesses docentes, ficando em segundo plano a formação para outros aspectos igualmente importantes, como, por exemplo, a elaboração de material didático (35,7%). Essa constatação é ainda mais preocupante se observarmos que 69 dos 90 docentes constituintes da população pesquisada (76,7% do total) são professores formadores/autores, responsáveis pelas disciplinas do curso e/ou pela elaboração do material impresso a ser distribuído aos estudantes. Por outro lado, não podemos deixar de registrar o fato de que os tutores também são vistos atualmente como autores de conteúdo (MATTAR, 2012) e, por conseguinte, necessitariam de formação sobre esse tema.

É preciso considerar que a EaD possui formas e organizações específicas. Nela, por exemplo, falar e ouvir são, muitas vezes, substituídos por escrever e ler. A interação educacional precisa ser planejada, constituída, testada e avaliada com base nos objetivos pedagógicos que consideram essa modalidade de educação. De efeito, a formação dos professores deve levar em conta novos saberes que precisam ser mobilizados pelos docentes. Esses novos saberes estão estritamente relacionados, dentre outros, com o aprendizado de novas formas de interação com os alunos (mediada pela tecnologia) e de produção de materiais com linguagem apropriada.

A compreensão das dificuldades dos alunos no momento em que eles têm acesso aos materiais didáticos requer do professor envolvido em EaD um cuidado maior na elaboração desses materiais com o objetivo de compensar a distância física entre ele e os estudantes. Tal compensação não se realiza disponibilizando uma grande quantidade de textos para os alunos lerem, nem tampouco enfeitando o ambiente das aulas com cores, imagens e animações. Esses recursos podem e devem compor uma aula a distância, porém o produto final precisa traduzir equilíbrio e bom senso. (CASTRO FILHO et al., 2009, p. 50).

Em cursos de formação para atuar na EaD, os conteúdos a serem trabalhados devem preparar os docentes para lidar com essa nova forma de ensinar e aprender, tanto no que diz respeito a aspectos teóricos como práticos. É fundamental que o docente esteja preparado para lidar com uma educação mediada.

Considerando como cursos de curta duração aqueles com carga didática de até 60 horas, média duração de 61 a 120 horas e longa duração acima de 121 horas, notamos que, dos 25 profissionais que participaram de cursos promovidos pela UAB/UECE, por outras instituições ou por iniciativa própria, 56% fizeram cursos de média duração, enquanto 28% foram de curta duração e somente 16% participaram de cursos de longa duração.

Quando avaliada a contribuição dos cursos de extensão promovidos pela UAB/UECE para sua atuação em EaD, dos 17 docentes que realizaram esse curso, a maioria (64,7%) relatou que o curso atendeu parcialmente as suas necessidades formativas na área; 29,4% - menos de 1/3 - disseram que atenderam totalmente essas necessidades; e 5,9% consideraram o curso indiferente (não teve nenhuma influência quanto às suas necessidades de formação). Dos dados anteriormente expressos, conclui-se que os cursos de formação promovidos pela UAB/UECE não estão atendendo plenamente às necessidades formativas demandadas pela área. Cabe à UAB/UECE, portanto, repensar o processo formativo implementado.

Mais uma vez, notamos que os docentes atuantes no curso de Pedagogia da UAB/UECE carecem de melhor formação na área. Se compararmos os dados obtidos nesta pesquisa, observamos que, dos 28 docentes (59,6% de 47) com formação específica para atuar na EaD, 17 alcançaram essa formação em cursos promovidos pela UAB/UECE e, desses, 12 relataram que o curso não atendeu todas suas necessidades formativas (atendimento parcial ou indiferente). Esses dados nos possibilitam asseverar que a maioria dos docentes atuantes no curso de Pedagogia da UAB/UECE (19 que não cursaram nenhuma formação específica mais os 12 anteriormente citados, totalizando 31, ou 66,0% do total) exerce sua função com formação limitada quanto à EaD.

Os docentes que participaram de formação específica para atuar na EaD realizaram seus cursos, pela última vez, principalmente nos anos de 2009 e 2010 (19 ou 67,9% do total). Essa informação pode ser observada no gráfico 3.


A formação continuada de professores é inerente à própria atividade docente. Com a presença cada vez mais generalizada das tecnologias de informação e comunicação (TICs) em toda a sociedade, e devido seu caráter de inovação permanente, a necessidade de formação nessa área se torna cada vez mais significativa. O uso das TICs na educação, mesmo que de forma instrumental, constitui demanda constante de formação para a atuação profissional do docente. (PRETTO; RICCIO, 2010). Belloni (2006, p. 82) reforça esse pensamento, ao acentuar que:

para fazer frente a essa nova situação, o professor terá necessidade muito acentuada de atualização constante, tanto em sua disciplina específica, quanto em relação às metodologias de ensino e novas tecnologias.

Dada essa necessidade, uma formação que se pretenda continuada deveria ocorrer de forma sistemática, no mínimo, anualmente. Observa-se, no entanto, que, no curso de pedagogia da UAB/UECE, isso não ocorre.

Ressaltemos que a Resolução CD/FNDE nº 24 (BRASIL, 2008) estabelece orientações e diretrizes para o apoio financeiro às instituições de ensino participantes do sistema UAB. Sendo assim, as instituições têm como obrigação, dentre outras, estruturar cursos destinados à formação continuada.

A Resolução prevê, ainda, financiamento para projetos de capacitação de gestores para a EaD, produção de material didático, capacitação dos professores conteudistas, desenvolvimento do design institucional do material didático para a EaD etc.

Do que foi percebido na trajetória de formação dos docentes pesquisados, reiteramos o caráter esporádico da atuação desses no ensino superior a distância. Esse fato é enfatizado, mais uma vez, ao constatarmos que 36,2% dos docentes não estão atualmente inseridos em atividades em EaD.

Talvez, também, resida no aspecto da feição esporádica de atuação na EaD, o fato de parte significativa dos docentes (40,4%) não ter realizado cursos de formação em EaD. Ademais, ao fazermos uma análise dos cursos realizados, observamos que esses mantêm relação estreita com a atuação docente na UAB/UECE, pois se observa que os cursos foram, em sua maioria, promovidos pela própria UAB/UECE. A maioria dos docentes participou de apenas um ou dois cursos com carga horária média (de 61 a 120 horas). Além disso, em alguns casos, um curso de formação de 80 horas fazia parte do processo seletivo para ingressar no curso de pedagogia da universidade tomada como objeto de pesquisa.

Ficou evidente, também, que os cursos realizados pelos docentes e promovidos pela UAB/UECE não contribuíram efetivamente com suas necessidades de formação. Isso ocorreu não só pelo fato de 64,7% terem afirmado que o curso atendeu apenas parcialmente às suas necessidades de formação, mas também por seus relatos ante as dificuldades, conhecimentos e habilidades para o uso das tecnologias empregadas no curso4 4 - Essa constatação da pesquisa não poderá ser detalhada aqui, em função do espaço disponível, mas está presente no relatório completo da investigação. .

Considerações finais

Neste artigo, optamos por analisar a formação dos professores para o exercício da docência em EaD. Nossa investigação se ateve aos cursos de licenciatura em pedagogia da UAB/UECE. O caminho percorrido deu ênfase à abordagem quantitativa, por meio da utilização do método de pesquisa survey. Os sujeitos investigados foram os docentes do curso de pedagogia a distância da referida universidade, compostos por professores formadores, docentes autores/conteudistas e tutores presenciais e a distância.

Confrontando os indicadores recolhidos com o objetivo deste estudo, conseguimos chegar a algumas conclusões no que se refere a identificar a formação dos professores atuantes no curso analisado. Observamos que um pequeno número de docentes tem apenas graduação (8,5%); o restante possui, no mínimo, pós-graduação lato sensu. Ressalte-se que, no curso de pedagogia da UAB/UECE, foram abertas exceções sem amparo legal, permitindo o exercício da docência sem a habilitação mínima necessária.

Sobre a formação específica para a EaD, ficou evidente que ainda há um grande número de docentes no curso sem essa formação, carecendo de preparo na área. Esses docentes exercem ou exerceram sua função com uma formação limitada em EaD, seja por sua incipiência de oferta, seja por não atender plenamente suas necessidades formativas nessa área. Ao atuarem na EaD, ademais, exercem diversas funções, algumas vezes ao mesmo tempo, e não constituem vínculos com a modalidade a distância, fato que tende a acarretar influências negativas em sua formação e, por consequência, na qualidade do ensino ministrado.

Os dados obtidos em nossa pesquisa também revelaram que não há critérios de fato para seleção dos docentes no curso de pedagogia da UAB/UECE no concernente à formação exigida, uma vez que quase a metade dos docentes (40,4%) não passou por nenhum tipo de formação para atuar na EaD.

Percebemos que parte significativa dos docentes do curso não atende os critérios mínimos para atuação na modalidade de educação a distância, o que pode comprometer a formação dos alunos participantes desse curso, uma vez que a docência nessa modalidade requer conhecimentos e habilidades distintos da docência no ensino presencial.

As análises relatadas apontam para a necessidade de se repensar os currículos dos cursos de formação de professores e os programas de pós-graduação, com o intuito de implementar ações de valorização e incentivo à formação didático-pedagógica dos docentes, com foco no uso das TICs e na perspectiva da educação a distância.

Também devemos considerar a possibilidade de, no futuro, haver uma convergência entre os ambientes virtuais e presenciais. Corroboramos com a seguinte afirmação de que Tori (2010, p. 121):

Dos ambientes de aprendizagem que historicamente se desenvolveram de maneira separada, a tradicional sala de aula presencial e o moderno ambiente virtual de aprendizagem, vem se descobrindo mutuamente complementares.

Essa previsão reforça ainda mais a necessidade de implementar ações formativas que favoreçam a apropriação didático-pedagógica para o uso das TICs por parte dos docentes, sob pena de mais uma vez estes se encontrarem em situações de atraso e desvantagem em relação às ações desenvolvidas.

As observações suscitadas neste estudo evidenciam que o cuidado com a formação pedagógica, para o uso da TICs e para a EaD, praticamente inexiste. Há suposição quanto ao fato de o professor que domina o conteúdo específico a ensinar encontrar naturalmente os meios para fazê-lo, tanto no que se refere à transmissão do corpo de conhecimentos desse campo, como no desenvolvimento de formas de pensamento e de habilidades técnicas essenciais à atuação na EaD.

As situações trazidas até aqui nos remetem a outro aspecto da EaD em nosso país: essa modalidade de ensino se reveste ainda de caráter de novidade, principalmente no modelo UAB, revelando, assim, dificuldades na sua constituição. Para todo o processo em estruturação, tende-se a esperar a ocorrência de alguns equívocos, inerentes a esse caráter de elaboração. Por outro lado, é indispensável que, desde o início, sejam corrigidos os equívocos. É preciso estar alerta para, ao inserir em sua proposta de trabalho um projeto novo, como é o caso da UAB/UECE, a universidade estabeleça critérios e esteja atenta às eventuais falhas, objetivando corrigi-las, sob pena de se criar um modelo de EaD com erros que podem comprometer a credibilidade dessa modalidade e da própria universidade.

Recebido em: 12.06.2012

Aprovado em: 24.04.2013

João Batista Carvalho Nunes é doutor em Ciências da Educação pela Universidade de Santiago de Compostela (Espanha). É professor do Programa de Pós-graduação em Educação e do Mestrado em Computação Aplicada da Universidade Estadual do Ceará

Viviani Maria Barbosa Sales é mestre e doutoranda em Educação pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). É docente da educação básica na rede pública municipal de Fortaleza

  • ARETIO, Lorenzo García. La educación a distancia: de la teoría a la práctica. Barcelona: Ariel, 2002.
  • BABBIE, Earl. Métodos de pesquisas de survey Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.
  • BELLONI, Maria Luiza. Educação a distância 4 ed. Campinas: Autores Associados. 2006.
  • BISQUERRA, Rafael; SARRIERA, Jorge Castellá; MARTÍNEZ, Francesc. Introdução à estatística: enfoque informático com o pacote estatístico SPSS. Porto Alegre: Artmed, 2004.
  • BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm>. Acesso em: 10 dez. 2010.
  • ______. Decreto nº 5.800, de 8 de junho de 2006. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 9 jun. 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Decreto/D5800.htm>. Acesso em: 12 jan. 2011.
  • ______. Ministério da Educação. Resolução CD/FNDE nº 24, de 4 de junho de 2008. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 jun. 2008. Disponível em: <http://uab.capes.gov.br/images/stories/downloads/legislacao/resolucao24.pdf>. Acesso em: 12 jan. 2011.
  • CASTRO FILHO, José Aires de et al. Linguagens midiáticas e comunicação em EaD. Em Aberto, Brasília, v. 22, n. 79, p. 47-58, jan. 2009.
  • DIMRI, Anil K.; MISRA, Anil Kumar. Training programmes for distance education professionals: an analytical assessment. Turkish Online Journal of Distance Education, v. 7, n. 4, p. 61-77, jul. 2006.
  • FORMIGA, Marcos. A terminologia da EAD. In: LITTO; Fredric M.; FORMIGA, Marcos (Orgs.). Educação a distância: o estado da arte. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2009. p. 39-46.
  • FUNECE - Fundação Universidade Estadual do Ceará. Resolução nº 443/2011 - CD, de 28 de dezembro de 2011. Disponível em: <http://www.sate.uece.br/downloads/category/12-documentos-sate?download=153%3Aresolucao-sate>. Acesso em: 2 jun. 2012.
  • GREEN, Tim; ALEJANDRO, Jeffery; BROWN, Abbie H. The retention of experienced faculty in online distance education programs: understanding factors that impact their involvement. International Review of Research in Open and Distance Learning, v. 10, n. 3, p. 1-15, 2009.
  • HOWELL, Scott L. et al. Seven strategies for enabling faculty success in distance education. Internet and Higher Education, v. 7, p. 33 - 49, 2004.
  • MATTAR, João. Tutoria e interação em educação a distância São Paulo: Cengage Learning, 2012.
  • MOORE, Michael; KEARSLEY, Greg. Educação a distância: uma visão integrada. São Paulo: Thomson Learning, 2007.
  • MOREIRA, Antonio Nilson Gomes et al. Método survey: fundamentos, desenvolvimento e procedimentos mais recorrentes. In: NUNES, João Batista Carvalho; NÓBREGA-THERRIEN, Silvia Maria; FARIAS, Isabel Maria Sabino de. Pesquisa científica para iniciantes: caminhando no labirinto - métodos de pesquisa. Fortaleza: EdUECE, 2011, p. 35-43.
  • NUNES, João Batista Carvalho. A socialização do professor: as influências no processo de aprender a ensinar. 2001. 835 f. Tese (Doutorado em Filosofia e Ciências da Educação) - Faculdade de Ciências da Educação, Universidade de Santiago de Compostela, Santiago de Compostela, 2001.
  • POZO, Juan Ignacio. Aprendizes e mestres: a nova cultura da aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2002.
  • PRETTO, Nelson De Luca; RICCIO, Nicia Cristina Rocha. A formação continuada de professores universitários e as tecnologias digitais. Educar, Curitiba, n. 37, p. 153-169, maio/ago. 2010.
  • SÁ, Carolina Mafra de; ROSA, Walquíria Miranda. A história da feminilização do magistério no Brasil: uma revisão bibliográfica. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO, 3, 2004, Curitiba. Anais do III Congresso Brasileiro de História da Educação Vitória: Sociedade Brasileira de História da Educação, 2004. p. 1-8. Disponível em: <http://www.sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe3/Documentos/Coord/Eixo5/477.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2011.
  • SCHIFTER, Catherine. Perception differences about participating in distance education. Journal of Asynchronous Learning Networks, v. 13, n. 2, p. 71-83, 2009.
  • SIMONE, Christina de. Preparing our teachers for distance education. College Teaching, v. 54, n. 1, p. 183-184, 2006.
  • TAYLOR, Ann; MCQUIGGAN, Carol. Faculty development programming: if we build it, will they come? Educause Quarterly, n. 3, p. 29-37, 2008.
  • TEPERINO, Adriana Silveira et al. Educação a distância em organizações públicas: mesa-redonda de pesquisa-ação. Brasília: ENAP, 2006.
  • TORI, Romero. Educação sem distância: as tecnologias interativas na redução de distâncias em ensino e aprendizagem. São Paulo: SENAC, 2010.
  • VIDAL, Eloisa Maia; BRANCO, Francisco Fábio Castelo. A educação a distância na Universidade Estadual do Ceará: conquistas e desafios. Fortaleza: UECE, 2009. p.11.
  • Formação de professores de licenciatura a distância: o caso do curso de pedagogia da UAB/UECE

    Distance education of licentiateship teachers: the case of the pedagogy course at UAB/UECE
  • 1
    - Sugerimos a leitura de Nunes (2001) para maior compreensão a respeito dos professores principiantes.
  • 2
    - O Programa Magister teve como objetivo qualificar professores das redes públicas estadual e municipal que atuavam no ensino fundamental para exercerem docência nas séries terminais do ensino fundamental e ensino médio. Habilitava professores por área de conhecimento.
  • 3
    - Embora alguns autores e instituições defendam a ideia de que tutor não é professor, temos a certeza de que ele o é, corroborando argumentos de Mattar (2012).
  • 4
    - Essa constatação da pesquisa não poderá ser detalhada aqui, em função do espaço disponível, mas está presente no relatório completo da investigação.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Set 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2013

    Histórico

    • Recebido
      12 Jun 2012
    • Aceito
      24 Abr 2013
    Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo Av. da Universidade, 308 - Biblioteca, 1º andar 05508-040 - São Paulo SP Brasil, Tel./Fax.: (55 11) 30913520 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revedu@usp.br