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A MEDIAÇÃO CULTURAL E OS REFERENCIAIS DE MEMÓRIA E IDENTIDADE EVIDENCIADOS NAS PERFORMANCES E COMPOSIÇÕES MUSICAIS DE ARNALDO ALMEIDA

Cultural mediation and the references of memory and identity evidenced in the performances and musical compositions of Arnaldo Almeida

RESUMO

Objetivo:

evidenciar vestígios de memória e identidade nas narrativas e produções musicais do compositor baiano, Arnaldo Almeida, que transparecem contribuições no processo de mediação cultural.

Método:

Esta pesquisa se caracteriza como descritiva, tendo como método o estudo de caso, sendo investigados documentos produzidos pelo músico e compositor Arnaldo Almeida, bem como sua narrativa, por meio da técnica de entrevista, a possibilidade de verificar as relações identitárias e memorialísticas na ação mediadora.

Resultado:

Entre os resultados, identificou-se que Arnaldo Almeida possui, além da prática, percepções sobre a música, e sua representatividade, que lhe confere uma possibilidade de realizar uma mediação cultural consciente. Também é possível relacionar e compreender que a produção artística de Arnaldo Almeida possui entrelace da memória e da identidade que se expressa por meio da música, que resultam em ações de mediação cultural.

Conclusões:

Conclui-se que, através da evocação de vestígios memorialísticos e identitários, considera-se a música um dispositivo informacional representativo da cultura que, de maneira integral, favorece o processo de constituição identitária dos sujeitos e preservação dos traços de memória.

PALAVRAS-CHAVE:
Informação musical; Mediação Cultural; Memória; Identidade

ABSTRACT

Objective:

to evidence traces of memory and identity in the narratives and musical productions of the bahian composer, Arnaldo Almeida, which show contributions in the process of cultural mediation.

Methods:

As for the methodology, this research is characterized as descriptive, whose method adopted was the case study, being investigated documents produced by musician and composer Arnaldo Almeida, as well as its narrative, through the interview technique, the possibility of verifying the identity and memorialistic relations in the mediating action.

Results:

Among the results, it was identified that Arnaldo Almeida has, in addition to the practice, perceptions about music, and its representativeness, which gives it a possibility to perform a conscious cultural mediation. It is also possible to relate and understand that Arnaldo Almeida's artistic production has an interlace of memory and identity expressed through music, which result in cultural mediation actions.

Conclusions:

It is concluded that, through the evocation of memorialistic and identity remains, music is considered a representative device of culture that, in an integral way, favors the process of identity constitution of the subjects and preservation of memory traces.

KEYWORDS:
Music information; Cultural Mediation; Memor; Identity

1 INTRODUÇÃO

A percepção da música como produto das práticas culturais de um povo tem seu lugar no senso comum. Contudo, analisá-la a partir do seu potencial informativo, cujo documento proveniente da prática musical a torna capaz de manifestar os aspectos memorialísticos e identitários dos seus produtores, lhe assegura como um dispositivo de mediação cultural. A documentação que registra a produção musical, tais como os escritos do compositor, a partitura, documentos que retratam compartilhamento de informações entre músicos, além de outros registros, ajudam a materializar a trajetória da produção musical, como também transparecer o contexto histórico, temporal e cultural em que o produtor e o documento estão inseridos. Dessa maneira, essas informações e documentos são dispositivos de mediação que interferem na construção do conhecimento e transparecem traços de memória e identidade dos produtores e do contexto sociocultural, portanto, interessam aos pesquisadores da Ciência da Informação.

As memórias influenciam na construção identitária e, consequentemente, nas práticas culturais dos sujeitos que resultam na produção de dispositivos informacionais, dentre eles a música. Tais dispositivos podem ser representativos das dinâmicas socioculturais e integrar as ações mediadoras. Quando essas ações se tornam conscientes, podem pautar-se no viés da alteridade, através das identificações das particularidades e dos contextos sociais inerentes a cada indivíduo. Assim, as práticas musicais apresentam dispositivos informacionais que são resultados de sua dinâmica e espelham as relações socioculturais dos sujeitos inseridos na produção de tais documentos, que podem ser utilizados em atividades mediadoras, visando apoiar os usuários na compreensão das estruturas socioculturais em que os produtores desses dispositivos estavam inseridos, como também favorecer um processo de construção e ressignificação das ações desses sujeitos.

Diante disso, esta pesquisa de caráter descritivo teve por objetivo evidenciar vestígios de memória e identidade nas narrativas e produções musicais do compositor baiano Arnaldo Almeida, que transparecem contribuições no processo de mediação cultural. Para tanto, foi utilizado o método de estudo de caso e para a coleta de dados adotou-se a entrevista estruturada junto ao compositor Arnaldo Almeida, como também a análise documental nos dispositivos de comunicação da web social desse músico.

Quanto ao escopo teórico, ao tratar sobre a temática memória e identidade buscou-se analisar os estudos realizados por Polli e Molina (2018POLLI, Caroline Teixeira da Silva; MOLINA, Letícia Gorri. As questões de memória e os direitos humanos. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 19., 2018, Londrina. Anais eletrônicos[…] Londrina: Universidade Estadual de Londrina, 2018. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/124727. Acesso em: 24 mar. 2022.
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); Silva e Loureiro (2017SILVA, Tahis Virginia Gomes da; LOUREIRO, José Mauro Matheus. Casa-Museu: a memória do universo privado ao espaço público. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 18., 2017, São Paulo. Anais eletrônicos […] São Paulo: UNESP, 2017. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/124937. Acesso em: 24 mar. 2022.
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) e Melo Filho (2016MELO FILHO, Edilson Targino. Relações teórico-conceituais entre identidade e memória na perspectiva da ciência da informação. Informação em Pauta, v. 1, n. 2, p. 116-130, 2016. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/41286. Acesso em: 25 mar. 2022.
http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapc...
); no que tange a informação musical fundamentou-se nas reflexões apresentadas por Barros (2020BARROS, Camila Monteiro de. Representação da informação musical: emoções expressas pelos usuários. Informação & Informação, Londrina, v. 25, n. 3, p. 306-331, jul./set. 2020. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/149493. Acesso em: 17 out. 2021.
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); sobre mediação cultural adotou-se as pesquisas de Santos e Sousa (2020SANTOS, Raquel do Rosário; SOUSA, Ana Claudia Medeiros de. Aspectos memorialísticos e identitários presentes nos enunciados das Ganhadeiras de Itapuã: ressignificação de mediação cultural no dispositivo de comunicação web. Inf. Inf., Londrina, v. 25, n. 4. p. 306-326, out./dez. 2020. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/152174. Acesso em: 04 set. 2021.
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) e Oliveira (2018OLIVEIRA, Amanda Leal de. A construção de uma ordem cultural negociada: considerações sobre o conflito e a atenção na mediação da informação. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 19., 2018, Londrina. Anais eletrônicos [...] Londrina: Universidade Estadual de Londrina, 2018. Disponível em: http://enancib.marilia.unesp.br/index.php/XIX_ENANCIB/xixenancib/paper/view/1215/151. Acesso em: 23 mar. 2022.
http://enancib.marilia.unesp.br/index.ph...
).

Espera-se com esta pesquisa contribuir com a compreensão de que a música, em seu potencial informativo, favorece as representações dos aspectos memorialísticos e identitários dos sujeitos e identificar quais elementos a torna um significativo dispositivo das ações de mediação cultural, permitindo sua ampla utilização, tanto por músicos quanto por profissionais da informação.

2 MEMÓRIA, IDENTIDADE E SEUS ENTRELACES

Os sujeitos sociais produzem vestígios em meio às suas práticas cotidianas que resultam, em alguns casos, na produção de documentos que transparecem os traços culturais de seus produtores. Tais documentos podem ser compreendidos como dispositivos que colaboram com a preservação e compartilhamento de informações que constituem e evocam indícios de memória de indivíduos e grupos. Partindo dessa concepção Polli e Molina (2018POLLI, Caroline Teixeira da Silva; MOLINA, Letícia Gorri. As questões de memória e os direitos humanos. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 19., 2018, Londrina. Anais eletrônicos[…] Londrina: Universidade Estadual de Londrina, 2018. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/124727. Acesso em: 24 mar. 2022.
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, p. 6582) ressaltam que

[…] a memória é algo vivo e pode ter diversas definições, pois ela é a percepção do indivíduo, ou de um grupo, sobre algum acontecimento, coisa, lugar ou instituição. Tal percepção, longe de ser uma releitura fiel dos acontecimentos, também considera as emoções, os sentidos, o momento histórico e outros fatores sociais.

A memória é movente, desperta nos indivíduos sentidos que podem resultar na ressignificação de fatos e emoções, ela pode ser evocada de maneira individual ou coletiva. Esse processo se dá a partir do convívio com o outro - que pode configurar a interação tanto entre sujeitos quanto com o contexto social e dispositivos - através do compartilhamento de acontecimentos, vivências e fenômenos, em que os sujeitos interagem, produzem e/ou se apropriam de traços de memória. Nesse movimento, a memória é construída e ressignificada.

Silva e Loureiro (2017SILVA, Tahis Virginia Gomes da; LOUREIRO, José Mauro Matheus. Casa-Museu: a memória do universo privado ao espaço público. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 18., 2017, São Paulo. Anais eletrônicos […] São Paulo: UNESP, 2017. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/124937. Acesso em: 24 mar. 2022.
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, p.14) reiteram o que foi exposto anteriormente quando apontam que “[...] a memória é constituída por meio das experiências do vivenciado individualmente e socialmente. Vivências construídas através do convívio e da interação social”. Desta forma, a memória é constituída não só no individual, uma vez que, o outro faz parte da construção memorialística e, consequentemente, contribui no delineamento identitário de indivíduos e grupos sociais, já que a memória e a identidade são indissociáveis.

Partindo deste pensamento, a identidade é uma instância que compõe o sujeito em sua relação consigo e com o mundo. Para Silva e Loureiro (2017SILVA, Tahis Virginia Gomes da; LOUREIRO, José Mauro Matheus. Casa-Museu: a memória do universo privado ao espaço público. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 18., 2017, São Paulo. Anais eletrônicos […] São Paulo: UNESP, 2017. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/124937. Acesso em: 24 mar. 2022.
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, p.7) a “[...] identidade é um processo de reconhecimento de si através da construção da relação com o outro e, portanto, que se dá no contexto da interação social”. Desta forma, a identidade ocorre em processo, podendo ser modificada com o tempo e, a partir das experiências e convívio social, do mesmo modo se faz necessária a participação do outro para o desenvolvimento deste processo construtivo.

Britto, Mokarzel e Corradi (2017BRITTO, A. C. L.; MOKARZEL, M. O.; CORRADI, A. O arquivo enquanto lugar de memória e sua relação com a identidade. Ágora, v. 27, n. 54, p. 158-182, 2017. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/12023. Acesso em: 25 mar. 2022.
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, p. 170) ressaltam que

A identidade do indivíduo, na visão multidimensional, é constantemente moldada de acordo com os processos de aproximação e distanciamento de elementos constitutivos que o define e é por esse motivo que não se pode afirmar que as identidades são fenômenos fechados e estáveis.

Diante desta explanação é possível observar que a identidade não é estática, posto que ela é moldada mediante acontecimentos e processos que servirão como subsídios para essa construção identitária. Segundo Melo Filho (2016MELO FILHO, Edilson Targino. Relações teórico-conceituais entre identidade e memória na perspectiva da ciência da informação. Informação em Pauta, v. 1, n. 2, p. 116-130, 2016. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/41286. Acesso em: 25 mar. 2022.
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, p. 124) “[...] não há identidade sem que nesta estejam impregnados traços da memória, seja individual ou coletiva”. Assim, memória pode ser entendida como as percepções vivenciadas ou compartilhadas por um sujeito ou um grupo, que subsidiam a construção de quem esse ser é no mundo, sua relação e seu modo de estar no meio, portanto as memórias delineiam o ser enquanto a identidade transparece quem esse ser é, em dado momento de sua existência.

Ainda nesta perspectiva, Melo Filho (2016MELO FILHO, Edilson Targino. Relações teórico-conceituais entre identidade e memória na perspectiva da ciência da informação. Informação em Pauta, v. 1, n. 2, p. 116-130, 2016. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/41286. Acesso em: 25 mar. 2022.
http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapc...
, p. 124) destaca que “[...] a construção da identidade intercepta a memória coletiva, tendo em vista que, para a construção identitária, seja dos indivíduos, seja das coletividades, é necessário um resgate histórico da memória.” Tais construções identitárias e memorialísticas estão munidas de traços históricos e culturais que fazem parte de manifestações e tradições de um povo, o que reforça a importância da vivência coletiva atrelada à cultura. Partindo deste entrelace da memória e da identidade, Melo Filho (2016, p. 121) defende que

[...] a memória coletiva é partícipe da memória individual, que se configura como importante fator determinante da identidade dos sujeitos e, portanto, entendendo a memória como um estado de consciência, visto que as lembranças são permanentemente evocadas em um conjunto de representações que formam a identidade.

Desta forma, a memória e a identidade são entrelaçadas, visto que, ambas são fatores importantes para um indivíduo como interagente de um meio social, bem como as lembranças evocadas pelo mesmo, que mediante suas representações constituem a identidade e lhe conferem pertencimento a determinado contexto e/ou grupo social. Neste sentido, vale ressaltar que essas construções memorialísticas e identitárias favorecem e fortalecem a história e a cultura de um local e de um povo, interligando o passado, o presente e o futuro, e tem nas representações base para sua continuidade. Representação essa que pode estar materializada nos dispositivos, sendo esses imagéticos, textuais, entre outros, que possibilitam a identificação de traços representativos de seus produtores. Entre tais dispositivos, aqueles provenientes das práticas musicais são expressões do sujeito em sua tentativa de representar seu contexto sociocultural, como também materializar percepções de mundo, que sofrem interferências como também interferem na vida de outros sujeitos, conforme discutido na próxima seção.

3 A MÚSICA E A CULTURA EM AÇÕES MEDIADORAS

A música, enquanto fenômeno cultural, pode ser um dispositivo representativo de um povo, ao carregar consigo informações concernentes às práticas sociais dos sujeitos e grupos. Ao considerar tanto o seu potencial cultural quanto o informativo, a mediação apresenta-se como elemento essencial no tocante à apropriação da informação musical. Para tanto, compreender o aspecto fenomenológico da música, a partir do qual os significados individuais e/ou coletivos das manifestações musicais são diversos e representam, sobretudo, os traços memorialísticos e identitários, mostra-se fundamental para ações conscientes de mediação cultural.

Ao agir de maneira consciente o mediador considera a busca por informações que respondam às demandas advindas de práticas, por exemplo, de atividade profissional, ou mesmo uma curiosidade que ensejou uma pesquisa. Mas, para além dela, uma busca que deseja compreender os traços identitários que constituem um sujeito e seu povo, que visa entender os aspectos culturais que estão latentes em sua memória, e nos fragmentos que transcendem dos dispositivos que se interligam a outros, provocando o agente mediador a realizar uma interferência planejada, que relacione a informação ao contexto, tanto da produção do documento quanto do sujeito que a busca. Portanto, tecer caminhos de encontros que foram desvinculados, essa prática vincula o que, em alguns casos, não está explícito, mas enunciado, provoca e motiva, desse modo, busca oferecer informações que são simbólicas para os sujeitos, pois tratam sobre esses e sua constituição identitária, objetivando a apropriação da informação.

Ao entender que hábitos e costumes geram estabilidade e pertencimento a grupos sociais, a análise dos fenômenos culturais revela aspectos inerentes à memória coletiva de uma determinada organização social, pois, como defendem Sobral, Campos e Souza (2021SOBRAL, Fabrícia Carla F.; CAMPOS, Maria Luiza de A.; SOUZA, Elisabete Gonçalves de. As oficinas de percussão popular e a cultura musical percussiva: uma reflexão entre memória, informação e descoberta de conhecimento. In: TOUTAIN, Lídia Maria B. B. (org.). A Ciência da Informação em movimento: memória, esquecimento e preservação digital. Salvador: EDUFBA, 2021, p. 85-108., p. 97) “[...] a memória individual só existe a partir de uma memória coletiva, pois é por meio da recordação, das relações mantidas pelo sujeito junto a um determinado grupo que as lembranças são construídas.” Essas lembranças são produzidas em meio às práticas sociais, tais como tradições e crenças, e a este conjunto de relações, recorrentes, de interesse mútuo e promotora de comportamentos, estruturas e formas de pensar em comum, dá-se o nome de cultura. Cuche (1999CUCHE, Denys. A noção de cultura nas Ciências Sociais. Bauru: EDUSC, 1999., p.45) ressalta que

Cada cultura é dotada de um ‘estilo’ particular que se exprime através da língua, das crenças, dos costumes, também da arte, mas não apenas desta maneira. Este estilo, este ‘espírito’ próprio a cada cultura influi sobre o comportamento dos indivíduos.

Enquanto Blacking (2007BLACKING, John. Música, cultura e experiência. Tradução de André-Kees de Moraes Schouten. Cadernos de Campo, São Paulo, n. 16, p. 201-218, 2007. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/cadernosdecampo/article/view/50064. Acesso em: 09 mar. 2022.
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, p. 204) realça que,

O conceito de cultura é uma abstração esboçada para descrever todos os padrões de pensamento e interação [...] que persiste nas comunidades ao longo do tempo [...] Não podemos ‘ver’ uma cultura: somente podemos inferi-la das regularidades na forma e na distribuição das coisas que observamos.

Mediante tais percepções, os traços culturais sinalizam os aspectos identitários dos sujeitos e nisto inclui-se a forma de produção e uso das práticas musicais. Portanto, nota-se que a música compõe o substrato cultural humano, pois, “[...] por estar inserida em quase todas as esferas da vida humana é um fenômeno social e carrega consigo os elementos de simbologia, contextualização social, cultural, de significação e significante, em suma, potencial informativo.” (MOURA; ALMEIDA, 2019MOURA, Jozuel Vitorino de; ALMEIDA, Carlos Cândido de. Semiótica, música e organização do conhecimento. Ciência da Informação em Revista, Maceió, v. 6, n. 1, p. 20-36, jan./abr. 2019. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/114194. Acesso em: 02 out. 2021.
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, p. 31-32). Percebe-se que a música se articula a outros elementos, para além daqueles exclusivamente sonoros, que estão materializados, por exemplo, nas vestimentas, nas fotografias, que transparecem as práticas culturais que fundamentam suas produções. Além disto, observa-se que ao representar o meio em que o sujeito está inserido, torna-se perceptível a força da experiência pessoal - subjetiva e contextualizada socioculturalmente - na apropriação da informação musical.

Desse modo, pautado nas concepções fenomenológicas da música, ela pode ser compreendida, também, como um fenômeno informacional, no qual o alcance de sentido e significado apresenta-se através de experiências humanas, estas ligadas às memórias dos indivíduos. Em virtude disto, há de se observar que vieses interpretativos da informação musical são alusivos a uma escuta contextualizada socialmente. (BARROS, 2020BARROS, Camila Monteiro de. Representação da informação musical: emoções expressas pelos usuários. Informação & Informação, Londrina, v. 25, n. 3, p. 306-331, jul./set. 2020. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/149493. Acesso em: 17 out. 2021.
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). A partir desse entendimento, verifica-se a existência de subjetividades no processo de significação e apropriação do conteúdo musical, uma vez que os elementos característicos do som (altura, duração, intensidade, timbre), o gênero musical, as vivências dos indivíduos, seus traços culturais, interferem, singularmente, na apreciação musical. Assim, compreende-se que a interpretação dos indícios concernentes ao envolvimento emocional com a música tem natureza multifatorial e, portanto, é dotada de parcialidade.

Neste ponto é válido destacar a relevância da realização de ações mediadoras que possibilitem os sujeitos ampliarem seus repertórios de informação e cultura. Cabe ao mediador cultural “[...] conhecer o cenário em que os sujeitos estão inseridos e suas necessidades distintas no processo singular de apropriação da informação.” (SANTOS; SOUSA; ALMEIDA JÚNIOR, 2021SANTOS, Raquel do Rosário; SOUSA, Ana Claudia Medeiros de; ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. Os valores pragmático, afetivo e simbólico no processo de mediação consciente da informação. Inf. Inf., Londrina, v. 26, n. 1. P. 343-368, jan./ mar. 2021. Disponível em: https://www.uel.br/revistas/uel/index.php/informacao/article/view/40808/pdf. Acesso em: 06 set. 2021.
https://www.uel.br/revistas/uel/index.ph...
, p. 345), posto que o mediador realiza ações de interferência utilizando os dispositivos culturais - como a música - que materializam traços que podem, em alguns casos, evocar nos sujeitos o sentimento de identificação.

Portanto, ao considerar que a mediação cultural deva ser uma ação intencional e planejada, visto que ela “[...] contribui para fortalecer os traços de memória e identidade” (SANTOS; SOUSA, 2020SANTOS, Raquel do Rosário; SOUSA, Ana Claudia Medeiros de. Aspectos memorialísticos e identitários presentes nos enunciados das Ganhadeiras de Itapuã: ressignificação de mediação cultural no dispositivo de comunicação web. Inf. Inf., Londrina, v. 25, n. 4. p. 306-326, out./dez. 2020. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/152174. Acesso em: 04 set. 2021.
https://brapci.inf.br/index.php/res/down...
, p. 312) entende-se como essencial nas características do mediador: o reconhecimento do contexto social em que estão inseridos os sujeitos da ação e a promoção do diálogo das diferentes manifestações culturais, possibilitando assim a construção de sentido e de pertencimento por parte dos grupos no que tange às suas práticas socioculturais. (SANTOS; SOUSA, 2020).

Vale salientar que as ações de mediação devem observar as múltiplas facetas da sociedade, tornando-se parte ativa no processo de construção e apropriação cultural, dando e recebendo na medida em que estabelece, deste modo, um processo de negociação entre os interagentes, assim como reforça Oliveira (2018OLIVEIRA, Amanda Leal de. A construção de uma ordem cultural negociada: considerações sobre o conflito e a atenção na mediação da informação. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 19., 2018, Londrina. Anais eletrônicos [...] Londrina: Universidade Estadual de Londrina, 2018. Disponível em: http://enancib.marilia.unesp.br/index.php/XIX_ENANCIB/xixenancib/paper/view/1215/151. Acesso em: 23 mar. 2022.
http://enancib.marilia.unesp.br/index.ph...
, p. 1377 - 1378)

O mediador negociador, nesse sentido, é também autor, intérprete e reinventor da cultura. É um nó essencial das tramas que possibilitam a invenção, a criação e recriação de si e do outro, quando, através de seu olhar, de sua atenção aos sujeitos e aos recursos que possui, traz informações, transmite, ouve, cria e promove a emergência de novos significados.

A verificação das características, acima citadas, no ato da mediação revelam uma ação consciente e transformadora. Nesse sentido, o mediador atua a partir de uma conduta protagonista que, de acordo com Gomes (2019GOMES, Henriette Ferreira. Protagonismo social e mediação da informação. Logeion: Filosofia da informação, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, p. 10-21, mar./ago. 2019. Disponível em: http://revista.ibict.br/fiinf/article/view/4644. Acesso em: 17 mar. 2022.
http://revista.ibict.br/fiinf/article/vi...
, p. 12),

[...] é uma conduta, uma postura, um modo de existência que envolve todas as esferas da vida humana, nas suas diversas dimensões, incluindo a dimensão cultural, compreendendo-se cultura como produção humana, na qual se inclui o objeto informação.

Sendo assim, compreende-se que as práticas musicais e os dispositivos informacionais carregam histórias dos sujeitos e do coletivo, contribuindo no reconhecimento e fortalecimento identitário destes. Portanto, o mediador cultural deve reconhecer, entre outros dispositivos, a música como favorável ao desenvolvimento crítico de todos os envolvidos na ação mediadora, apoiando que sejam observados os contextos existentes, como também agir pautado na alteridade, que entende e se reconhece na singularidade do outro.

Compositores produzem suas obras alinhadas ao contexto sociocultural que integram; os músicos performatizam composições buscando transparecer a intenção do compositor, entretanto, não são sujeitos neutros, são leitores de um dispositivo e mesmo evidenciando a intenção produtora do compositor existem elementos próprios, do contexto cultural desses músicos que serão evidenciados. Portanto, a música se configura como um significativo dispositivo que pode ser utilizado nas ações mediadoras, buscando interpretações, como também expressões dos sujeitos e como esses se reconhecem no mundo.

Por entender que, neste caso, tanto os profissionais da informação quanto os músicos podem ser considerados mediadores culturais, ao adotarem a música como um dispositivo de valoração da cultura, este estudo se debruça sobre a obra de um compositor com o propósito de identificar na prática musical a materialização da memória e identidade que compõem o contexto cultural do produtor.

4 METODOLOGIA

Esta pesquisa de caráter descritiva, teve por objetivo evidenciar vestígios de memória e identidade nas narrativas e produções musicais do compositor baiano Arnaldo Almeida, que transparecem contribuições no processo de mediação cultural.

Para isso, o percurso metodológico adotado foi o estudo de caso, por tratar especificamente da atuação desse compositor e intérprete musical. Desse modo, Gil (2010GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010.) afirma que o estudo de caso consiste em aprofundar exaustivamente os objetos, visando conhecê-los ampla e detalhadamente.

A partir do delineamento da pesquisa, passou-se à definição das técnicas e instrumentos para realizar os procedimentos de coleta das informações. Visando o alcance do objetivo traçado, considerou-se como mais adequada a adoção de duas técnicas: sendo a primeira a análise documental e a segunda a aplicação da entrevista estruturada. Essa escolha se justifica por compreender os documentos advindos da prática musical de Arnaldo Almeida como essenciais para identificar indícios de memória e identidade, bem como, a entrevista que possibilitou a análise da narrativa desse compositor quanto aos esclarecimentos sobre seu processo de criação, ou seja, a intencionalidade que permeia seu processo criador.

Quanto à análise documental, foi desenvolvida a partir do acesso à documentação pertencente a Arnaldo Almeida, especificamente documentos que registram as letras de canções e informações biográficas do músico, visando identificar vestígios de memória e identidade que se entrelaçam com seu contexto cultural. Além disso, a análise documental também foi composta por informações contidas nos dispositivos de comunicação da web social do músico que favoreceram o reconhecimento das práticas musicais e o seu fazer como mediador cultural.

Dos dispositivos de comunicação da web social de Arnaldo Almeida foram analisadas as plataformas online de publicação de áudio Soundcloud que possui 59 seguidores e 39 faixas publicadas e Reverbnation com 19 publicações musicais e 2 fotos postadas, além do perfil no Instagram do músico que até o momento, abril de 2022, possui 54 publicações e 1010 seguidores.

Já o roteiro estruturado, conteve no total dez questões, visando coletar informações de maneira objetiva, de modo a esclarecer indícios que não ficaram compreensíveis na análise documental, bem como transparecer o processo criador do compositor. Essa entrevista foi realizada por meio da plataforma de comunicação Google Meet. Para isso, sua estrutura foi dividida em dois eixos, os quais tinham por objetivos: conhecer os referenciais que formaram o alicerce musical de Arnaldo e verificar como a música, no processo de aproximação cultural, possibilitou a constituição identitária do compositor. Após o cumprimento das duas etapas referentes à coleta dos dados, estes foram analisados à luz da literatura científica, tomando como base a abordagem qualitativa.

5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Arnaldo Almeida se insere no cenário artístico-musical baiano como cantor, compositor e produtor cultural. O músico iniciou a sua carreira ainda na adolescência participando ativamente de festivais de música e, em consequência das amizades feitas no período, criou a banda Confraria da Bazófia, no início dos anos de 1990. O grupo esteve em atuação durante 12 anos, de 1993 à 2005. Mediante sua atuação na banda, Arnaldo Almeida passou a ser reconhecido e requisitado por inúmeras intérpretes do cenário da música baiana, entre elas: Vânia Abreu, Clécia Queiroz, Marilda Santana, Márcia Castro, Illy Gouveia e Mônica Albuquerque, além da Banda Metáfora. O músico ainda teve composições selecionadas e premiadas em festivais da TV Bahia, Rádio Educadora e TV Cultura, além do convite e participação no programa Sr. Brasil apresentado por Rolando Boldrin. Desde 2010 atua como produtor cultural e vem realizando encontros com compositores populares na cidade de Salvador-BA, além de ter produzido o seu próprio show solo intitulado No Vão das Horas.

Ao analisar a trajetória de vida de Arnaldo Almeida, percebe-se que além de sua vivência como músico, esse também passa a representar outros músicos, favorecendo o reconhecimento da música brasileira, especificamente o repertório musical baiano. Desse modo, Arnaldo Almeida possui além da prática musical, percepções sobre a música, e sua representatividade, que evidencia uma postura de mediador cultural, visto que sua trajetória artística e seu discurso transparecem seu desejo de alcançar outros sujeitos e fazê-los (re)conhecer os traços culturais de seu lugar de pertencimento. Essa postura de Arnaldo Almeida se aproxima do entendimento de Oliveira (2018OLIVEIRA, Amanda Leal de. A construção de uma ordem cultural negociada: considerações sobre o conflito e a atenção na mediação da informação. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 19., 2018, Londrina. Anais eletrônicos [...] Londrina: Universidade Estadual de Londrina, 2018. Disponível em: http://enancib.marilia.unesp.br/index.php/XIX_ENANCIB/xixenancib/paper/view/1215/151. Acesso em: 23 mar. 2022.
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), sobre o mediador cultural que em seu agir possibilita a criação e recriação de si e do outro, a partir de seu olhar para o contexto sociocultural e demais sujeitos, com isso, transmite e promove a criação de novos significados.

Ao compreender que as referências socioculturais e os aspectos memorialísticos podem influenciar na performance musical dos sujeitos, a presente pesquisa investigou quais fatores poderiam ter contribuído para o despertar musical de Arnaldo Almeida e, nesse aspecto, ele afirma que a infância foi determinante, como declarado no trecho abaixo:

A infância, [...] nós morávamos em Amaralina quando eu nasci, essa família era meio que uma oca de índio, todo mundo foi criado muito dentro de casa com os mais velhos cuidando dos mais novos, então desde pequeno as brincadeiras, as cirandas, as brincadeiras de roda, isso tudo era como a gente se divertia [...] além disso, o fato de meu pai ser um cara que gostava muito de escutar música, então eu cresci escutando, meu pai ouvia muito música nos finais de semana, ele começava o domingo logo cedo, 8h da manhã, ele começava ouvindo música e só parava de ouvir música quando anoitecia [...]

O resgate das memórias da infância, a relação com os pais e o quanto estas vivências foram significativas para a formação do músico também são evidenciadas na canção Teima, que retrata poeticamente os movimentos e as parlendas típicas das brincadeiras de roda infantis.

Teima (Arnaldo Almeida/ Ray Gouveia) De marré de si, de marré de si É menina, meu destino De papel crepom, de batom carmim É menino, minha sina Foi a minha mãe que me deu a luz Foi a luz de Deus, a luz de Deus que me guiou Pelo lado bom, pelo lado som Onde a vida sempre teima em duvidar de mim Qual será o fim? Vida, por que não? Meia volta, volta e meia, outra direção. Fonte: https://soundcloud.com/arnaldoalmeida/sets/vozviolao

A partir da análise da resposta dada pelo músico e da letra da canção supracitada, percebe-se que a musicalidade de Arnaldo Almeida teve início em experiências vivenciadas em sua infância. Desse modo, Arnaldo Almeida evidencia que sua construção como músico e compositor são assentadas em suas memórias afetivas, como as experienciadas enquanto criança, o que encontra respaldo quando Polli e Molina (2018POLLI, Caroline Teixeira da Silva; MOLINA, Letícia Gorri. As questões de memória e os direitos humanos. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 19., 2018, Londrina. Anais eletrônicos[…] Londrina: Universidade Estadual de Londrina, 2018. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/124727. Acesso em: 24 mar. 2022.
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) afirmam que a memória vivida pode ter diferentes definições por ser uma compreensão do sujeito ou grupo de algum fato ocorrido.

Portanto, pode-se inferir que as memórias sofrem alterações por meio dos acontecimentos vividos pelos indivíduos, principalmente quando estas experiências são compartilhadas. Para tal, se estabelecem “pontos de contato”, ou, por assim dizer, interações necessárias entre as pessoas que despertarão as memórias individuais, conforme afirmam Sobral, Campos e Souza (2021SOBRAL, Fabrícia Carla F.; CAMPOS, Maria Luiza de A.; SOUZA, Elisabete Gonçalves de. As oficinas de percussão popular e a cultura musical percussiva: uma reflexão entre memória, informação e descoberta de conhecimento. In: TOUTAIN, Lídia Maria B. B. (org.). A Ciência da Informação em movimento: memória, esquecimento e preservação digital. Salvador: EDUFBA, 2021, p. 85-108.). Ou seja, a memória é movente e influenciada pelo coletivo em um processo recíproco e constante de ressignificações.

Durante a entrevista, também foi questionado a Arnaldo Almeida como se desenvolveu a sua carreira musical, buscando perceber quais as influências que motivaram sua formação musical. Sobre isso, o músico relatou.

Eu comecei a estudar violão com 13 anos, só tocava, só tocava e quando eu conheci João aos 16 foi que eu comecei a compor, porque João e Ray [amigos da adolescência que fundaram juntamente a Arnaldo a Confraria da Bazófia] trouxeram pra mim a Bossa Nova, Milton Nascimento, Elis Regina, Clube da Esquina, um outro universo musical que eu desconhecia, inclusive Chico [Buarque], eu conhecia um pouquinho de Gil e um pouquinho de Caetano mas não conhecia esses outros artistas e um primo meu chamado Wilson, que também tocava violão, me trouxe, me fez conhecer Zé Ramalho, Ednardo, já outra galera, então assim foi um momento muito rico aqueles 16 anos, aqueles 15, 16 anos foi um momento muito rico de conhecer essas coisas e que influenciou também a minha escrita, [...] esse relacionamento com Ray e com João terminou influenciando não só o violão mas, também, a poesia, as coisas que eu passei a escrever.

Através deste relato, o músico destaca a participação de outros companheiros no processo de incentivo nos primeiros passos da sua carreira musical. Nesse sentido, o outro corroborou de maneira significativa na construção da identidade tanto artística quanto pessoal de Arnaldo Almeida. Relembrando Silva e Loureiro (2017SILVA, Tahis Virginia Gomes da; LOUREIRO, José Mauro Matheus. Casa-Museu: a memória do universo privado ao espaço público. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 18., 2017, São Paulo. Anais eletrônicos […] São Paulo: UNESP, 2017. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/124937. Acesso em: 24 mar. 2022.
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), ao defenderem que a identidade é um estado de auto-identificação mediante o vínculo com o outro e, como tal, ocorre no contexto da interação, é possível afirmar que o relacionamento com outros sujeitos faz parte do desenvolvimento do indivíduo no meio social, através dessas interações os sujeitos se reconhecem e se ressignificam.

Observa-se que a maior parte do percurso musical de Arnaldo Almeida se deu por meio de suas vivências, impactando a sua produção. Dito isto, os aspectos memorialísticos e identitários emergiram no músico emoções traduzidas em suas canções. Melo Filho (2016MELO FILHO, Edilson Targino. Relações teórico-conceituais entre identidade e memória na perspectiva da ciência da informação. Informação em Pauta, v. 1, n. 2, p. 116-130, 2016. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/41286. Acesso em: 25 mar. 2022.
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) justifica que a construção identitária, seja ela do indivíduo ou do coletivo, necessita do resgate da memória para se consolidar.

Outro aspecto apontado pela pesquisa foi a indeterminada classificação que o músico tem a respeito de sua própria produção musical, o que condiz com o ambiente eclético e de múltiplas relações construídas na infância e na juventude. Sobre isso o músico expõe:

[...] eu procuro não me prender a uma expressão, a um gênero, assim as músicas quando elas surgem, quando elas se desenvolvem, eu não penso que ela vai ser um samba, vai ser um reggae, vai ser uma balada, ela é que define como é que ela vai ser, e é por isso que quando você ouve minha obra você percebe que tem todo tipo de coisa ali. Então, se fosse pra tentar classificar, é uma música que ela é muito parecida com a influência de eu ter escutado tanta coisa naquela minha infância.

Mais uma vez, Arnaldo Almeida remete à infância em uma tentativa de explicar a heterogeneidade de sua obra, fato este representativo do meio social no qual ele foi criado. Posto que, a memória afeta os sujeitos e constitui a identidade destes, assim como afirmam Santos e Sousa (2020SANTOS, Raquel do Rosário; SOUSA, Ana Claudia Medeiros de. Aspectos memorialísticos e identitários presentes nos enunciados das Ganhadeiras de Itapuã: ressignificação de mediação cultural no dispositivo de comunicação web. Inf. Inf., Londrina, v. 25, n. 4. p. 306-326, out./dez. 2020. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/152174. Acesso em: 04 set. 2021.
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), pode-se compreender porque o compositor mescla diversos elementos sonoros e gêneros musicais distintos nas suas composições e, apontam que suas memórias reveladas nas produções musicais estão entrelaçadas em um meio cultural que não se revela estático e sim, movente, sendo capaz de transparecer traços característicos da interação de Arnaldo Almeida com o mundo.

Das questões do segundo eixo, referente à verificação de como a música no processo de aproximação cultural possibilitou a constituição identitária de Arnaldo Almeida, foi perguntado ao compositor se era de maneira consciente que ele colocava determinados termos representativos de seus traços culturais na sua produção musical, a exemplo dos relacionados à Bahia e a Salvador. O músico declarou que:

Sim, sempre, sempre. O primeiro show da Confraria intitulava-se “Salvador Meu Amor, Tsc, Ai Ai”, esse “tsc” é um muxoxo. Nesse show a gente só falava de Salvador, o show todo a referência era a cidade de Salvador, eram 14 músicas falando coisas sobre soteropolitanidade, e isso me influenciou muito porque daí nasceu meio que um pouco de cronista também, por isso “Jaime Figura” virou uma música, por isso “Mulher de Roxo” virou uma música [...]

A resposta acima revela que Arnaldo Almeida atua como um mediador cultural e que está consciente do seu papel social, uma vez que o mesmo se reconhece como um cronista da sua própria cidade. Canções em homenagem a Jaime Figura e Mulher de Roxo - pessoas que se tornaram ilustres e viraram personagens culturais de Salvador por causa de comportamentos públicos excêntricos aos olhos da população - ou em temas como Ela, Pelo Pelô e Na Estrada - a primeira canção dedicada a um afeto, metaforizado em aspectos e lugares da cidade, a segunda uma crítica bem humorada sobre o monopólio do mercado fonográfico da Axé Music sucedido entre as décadas de 1990 e os anos 2000 na Bahia e a terceira uma homenagem ao poeta, compositor e jornalista baiano Béu Machado, logo do seu falecimento - reforçam a tese deste olhar atento, tanto aos acontecimentos quanto aos aspectos culturais que Arnaldo Almeida sempre esteve envolvido e que constituiu a sua identidade. Seguem trechos das canções abaixo.

Ela (Arnaldo Almeida) Ela percebe muitos movimentos Mas prefere ser discreta Quando se permite, faz um vendaval Varrer de Humaitá a Itapuã E é por isso mesmo que ela quer se comportar Assim, contida [...] Fonte: https://www.reverbnation.com/confrariadabaz%C3%B3fia/songs Pelo Pelô (Arnaldo Almeida/ Gerson Silva) A tecnocultura é delirante A gente bem que poderia resgatar O gosto pela liberdade de fazer Aquela letra um pouco mais pensante Transformar o verso, conjugar o sou Cantar um funk-hippie-rap pelo Pelô [...] Fonte: https://www.reverbnation.com/confrariadabaz%C3%B3fia/songs Na Estrada (Arnaldo Almeida) Silencia uma voz, o poeta partiu Navegando num barco de luz A Bahia, de todos os santos Lhe mostra um caminho que ao Todo conduz A Baía de Todos os Santos lhe acolhe num manto de águas azuis [...] Fonte: https://www.reverbnation.com/confrariadabaz%C3%B3fia/songs

Os destaques culturais recorrentes nas composições de Arnaldo Almeida revelam que ele tem um sentimento de pertença e afeto com os lugares, além das práticas e pessoas, retratados em suas canções e que estes sinalizam o quanto o músico está envolvido conscientemente no processo de mediação, pois, assim como enfatizam Santos, Sousa e Almeida Júnior (2021SANTOS, Raquel do Rosário; SOUSA, Ana Claudia Medeiros de; ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. Os valores pragmático, afetivo e simbólico no processo de mediação consciente da informação. Inf. Inf., Londrina, v. 26, n. 1. P. 343-368, jan./ mar. 2021. Disponível em: https://www.uel.br/revistas/uel/index.php/informacao/article/view/40808/pdf. Acesso em: 06 set. 2021.
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, p. 347), “[...] quando o mediador e o usuário se envolvem consciente e inteiramente no processo de mediação da informação, alcançam o potencial sensorial ao evocar emoções e ressignificar o sentimento de pertencimento.”

Também, convém ressaltar, o encontro deste realce cultural nas melodias e arranjos das canções as quais, geralmente, passeiam entre inúmeros gêneros musicais, entre eles: samba, bossa, xote, funk americano, balada, reggae e outros. Sobre o aspecto cultural mais frequente e materializado na obra de Arnaldo, o músico respondeu:

Tem um humanista, socialista, libertário, anarquista, soteropolitano que transitou pela cidade toda e que percebe, eu percebo, o quanto a gente precisa se desenvolver enquanto sociedade pra que nós sejamos mais humanista [...] elas [as canções] encerram uma crítica social, elas encerram um olhar crítico sobre algo, seja sobre um político, seja sobre uma postura de um governo, seja sobre um costume, uma questão de costume, então assim, eu percebo que o aspecto cultural que mais tá ressaltado naquilo que eu escrevo é a crítica mesmo [...]

Desse modo, a atuação de Arnaldo Almeida como mediador cultural, consciente de suas ações, evidencia com proeminência a dimensão política, haja vista, a capacidade de transformação social pertinente ao ato da mediação, assim como evidencia Gomes (2019GOMES, Henriette Ferreira. Protagonismo social e mediação da informação. Logeion: Filosofia da informação, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, p. 10-21, mar./ago. 2019. Disponível em: http://revista.ibict.br/fiinf/article/view/4644. Acesso em: 17 mar. 2022.
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), a partir de ações de interesses coletivos que ao final contribuirão para uma atuação protagonista. Isto pode ser percebido na intenção de alerta do “samba-raivoso” - denominação dada pelos próprios compositores da canção - Contragolpe, ao tratar, satiricamente, os meandros do impeachment ocorrido com a então presidente Dilma Rousseff no ano de 2016.

Contragolpe (Arnaldo Almeida/ Tito Bahiense) Em nome do Pai Em nome do Estado que me deu direito Em nome da Mãe Em nome da certeza do futuro pleito Em nome de Deus Em nome da Bíblia, da bala, do boi Em nome dos meus Em nome da minha conduta Astuta Sou filho da justa medida De quem me escolheu Pra me dar boa vida Na toga, no terno No inferno de Dantas No inferno de Dantas O inferno de Dantas Pro inferno! Fonte: @arnaldoalmeida_musico

Verifica-se em Arnaldo Almeida a compreensão de que a sua prática musical pode contribuir para mudanças sociais, pois o protagonismo é social, como indica Gomes (2019GOMES, Henriette Ferreira. Protagonismo social e mediação da informação. Logeion: Filosofia da informação, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, p. 10-21, mar./ago. 2019. Disponível em: http://revista.ibict.br/fiinf/article/view/4644. Acesso em: 17 mar. 2022.
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). Consciente disto, a sua ação mediadora sustenta-se na base das cinco dimensões da mediação da informação propostas por Gomes (2019); dialógica quando comunica e interage com os ouvintes através da música; estética, a partir do prazer proporcionado pela fruição artística; ética, ao procurar em sua produção o encontro com a diversidade tanto em questões pertinentes ao seu meio quanto a contextos diversos; formativa, quando potencializa o seu público a partir das reflexões propostas nas canções; política, ao agir conscientemente buscando a transformação social e a promoção da criticidade.

No intuito de reforçar as questões abordadas anteriormente, foi perguntado ao compositor se para ele a música poderia ser considerada um dispositivo de mediação cultural. Resolutamente, o compositor respondeu:

Um dispositivo importantíssimo, sem dúvida a música pra mim tem esse significado, essa representatividade ou essa possibilidade, e não necessariamente a música cantada e a música sem letra. A música só. [...] isso aqui me conecta com um lugar, me conecta com um tempo, me conecta [ininteligível] ao que eu penso ou ao que eu já vivi em algum lugar, me conecta com a memória, com as minhas próprias memórias e com as memórias daquilo que me foi relatado, enfim [...] Um lugar dentro de mim, um lugar fora de mim, as minhas memórias, e se ela tem esse poder de fazer com que eu me desloque tanto, com que eu saia, com que eu perca essa…, às vezes até a minha própria centralidade e me transporte para tantas possibilidades, só a música [...]

A partir deste relato manifestado pelo músico, é possível relacionar e compreender na sua produção artística o entrelace entre a memória e a música, de modo que lhe trazem sentimentos e emoções provenientes de suas vivências, contexto social, e são, portanto, pertinentes para a conexão consigo e com todo o seu entorno, lhe conferindo o sentimento de pertencimento. Pensando nestes aspectos, a música se configura como um dispositivo cultural, memorialístico e identitário capaz de gerar no indivíduo o sentimento de representatividade e pertencimento, tornando-o, mais uma vez, um protagonista do seu meio.

Dessa forma, cabe destacar as observações de Barros (2020BARROS, Camila Monteiro de. Representação da informação musical: emoções expressas pelos usuários. Informação & Informação, Londrina, v. 25, n. 3, p. 306-331, jul./set. 2020. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/149493. Acesso em: 17 out. 2021.
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) ao compreender que a emoção despertada em uma experiência musical, seja passiva ou ativa, é particular e tem raízes por vezes ocultas. Para tanto, determinar o porquê que uma música deixa uma pessoa triste e outra nem tanto ou, então, remete a memórias antigas e evocativas de um sentimento, a uma fuga no espaço-tempo, parece exigir uma análise global do fenômeno musical, portanto, um terreno propício para a ação mediadora.

Ao retomar Moura e Almeida (2019MOURA, Jozuel Vitorino de; ALMEIDA, Carlos Cândido de. Semiótica, música e organização do conhecimento. Ciência da Informação em Revista, Maceió, v. 6, n. 1, p. 20-36, jan./abr. 2019. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/114194. Acesso em: 02 out. 2021.
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) que a partir de uma compreensão semiótica entendem a música como fenômeno social, dotada de potencial informativo, e que esta força está estabelecida na relação significante-significado, apresenta-se no horizonte de possibilidades a figura da música dispositivo; carregada de informações, reveladora de sentido. E, por isso, dependente da experiência pessoal, subjetiva e contextualizada socialmente por cada indivíduo para a apreensão e tradução emotiva das informações inerentes a ela. Se Arnaldo Almeida é transmutado em uma determinada escuta ou prática musical, a razão se dá, de alguma forma, porque a música evoca nele memórias que estão ligadas a afetos, fatos e contextos culturais e estes são significativos a ele e a quem se identifica com suas músicas, seu público.

Ainda foi perguntado a respeito da percepção que Arnaldo Almeida tem do quanto a sua produção musical alcança culturalmente o seu público. Segue trecho da resposta do compositor sobre o questionamento.

O que eu posso falar do meu público? Quando eu fiz o meu show solo[...] fiz um show solo, e o Espaço Xisto estava repleto de pessoas [...] ao longo do show eu percebia em cada música que eu tinha escolhido pra o show [inaudível] os olhares de felicidade das pessoas. Depois do final do show muita gente veio me abraçar e dizer que aquele show ficaria guardado na memória a vida toda [...] tava muita gente assistindo, pessoas que eram muito próximas que eu sabia que não faltariam àquele show porque eram muito próximas mas elas eram ¼ da platéia e o restante da platéia eram pessoas que eu não imaginaria que fossem ver meu show e estavam lá e [estávamos] todos chorando por causa da música, por exemplo muita gente na platéia emocionada com uma música. Aí, nesse sentido eu posso dizer pra você, em algum momento eu pude perceber o alcance, a possibilidade de provocar nas pessoas sentimentos a partir daquilo que eu tava propondo com a letra de uma música.

A partir da resposta, o quanto a percepção de Arnaldo Almeida está atrelada ao envolvimento emotivo e a atribuição de sentido que seu público tem com a sua obra. Dessa forma, as emoções comunicam ao músico uma resposta recíproca à intenção inicial do compositor ao produzir e performar artisticamente - no caso, ser um dispositivo de informação e comunicação, por meio da interação com as pessoas através da música. Nesse sentido, aproxima-se mais uma vez à questão da memória ao entender que o público de Arnaldo Almeida se conecta através de suas próprias memórias com as músicas do compositor, de tal modo que é influenciado pelas suas respostas emotivas. Neste caso, ao ouvir uma música não precisa estar necessariamente relacionado a um aspecto musical, mas compreendidos na vivência de cada indivíduo e de caráter inconsciente, como declara Barros (2020BARROS, Camila Monteiro de. Representação da informação musical: emoções expressas pelos usuários. Informação & Informação, Londrina, v. 25, n. 3, p. 306-331, jul./set. 2020. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/149493. Acesso em: 17 out. 2021.
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, p. 308) ao afirmar que “[...] nesse viés fenomenológico da percepção, a construção de significado recai sobre a experiência do ouvinte, ou seja, a mesma música pode causar ou evocar diferentes compreensões do mesmo fenômeno [...]” e, portanto, diferentes respostas emotivas.

Arnaldo Almeida, enquanto mediador cultural, percebe isto e utiliza dos dispositivos necessários para criar esta íntima relação com seu público. A Figura 1 representa este aspecto ao apresentar um projeto virtual de arrecadação de recursos, no qual o referido músico foi convidado a participar, para contribuir com artistas impedidos de atuar durante a pandemia da COVID-19, em 2020, e ajudar, com a doação de cestas básicas, instituições de caridade. Observa-se que a resposta do seu público foi imediata.

Figura 1
Publicação de projeto musical com a participação de Arnaldo

Deste modo, verifica-se que trajetória artística de Arnaldo Almeida foi permeada dos aspectos memorialísticos e identitários, tendo como elemento norteador e disseminador a música, dispositivo este que lhe proporcionou inúmeras vivências, sendo determinante para a sua constituição identitária. Ao se apresentar como um fenômeno cultural, a música expressa a identidade de um grupo social, e, através deste aspecto, pode-se inferir que a sua representação memorialística também é coletiva, tendo em vista que Arnaldo Almeida exerce na sua prática musical um resgate daquilo que lhe é culturalmente pertencente e, consciente disso, dialoga com as memórias, os sentimentos e sentidos culturalmente constituídos por seu público. Assim, a mediação cultural exercida pelo músico se dá a partir de uma conduta protagonista, pois favorece o encontro, o despertar emotivo e a transformação social daqueles que admiram a sua obra.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados da pesquisa apontam que a música se configura como um importante dispositivo de mediação cultural e sua relevância está observada nas evidências que ela oferece dos aspectos memorialísticos e identitários dos seus produtores. Neste sentido, foi possível verificar que as memórias de Arnaldo Almeida, constituídas pelo o convívio social, influências da infância, dentre outros fatores que também podem ter sido preponderante, contribuíram na sua formação musical, de tal forma que o seu repertório tem como base indícios de sua memória e identidade, pois fatos, pessoas e contextos sociais vivenciados pelo compositor são retratados em suas produções musicais

Arnaldo Almeida atua como mediador cultural por meio de ações conscientes, ao favorecer as trocas simbólicas com seu público, através de composições significativas a estes e que despertam um sentimento de pertença no seu ouvinte, ou seja, uma identificação com as temáticas e a musicalidade envolvidas nas canções. Arnaldo Almeida, como mediador cultural, tem plena consciência disso a partir das respostas emotivas do seu público que coadunam com a própria intenção proposta pelo músico em cada composição.

Em virtude deste processo, pode-se dizer que é através da evocação de vestígios memorialísticos e identitários que a música pode ser considerada um dispositivo representativo da cultura que, de maneira integral, favorece o processo de constituição identitária dos sujeitos e preservação dos traços de memória.

Diante disso, compreende-se que a mediação cultural contribui para o fortalecimento dos grupos sociais e a música, em seu potencial informativo, ao evidenciar os aspectos memorialísticos e identitários dos seus produtores, poderá ser utilizada tanto por músicos quanto por profissionais da informação nas ações de mediação.

REFERÊNCIAS

  • BARROS, Camila Monteiro de. Representação da informação musical: emoções expressas pelos usuários. Informação & Informação, Londrina, v. 25, n. 3, p. 306-331, jul./set. 2020. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/149493 Acesso em: 17 out. 2021.
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  • BLACKING, John. Música, cultura e experiência. Tradução de André-Kees de Moraes Schouten. Cadernos de Campo, São Paulo, n. 16, p. 201-218, 2007. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/cadernosdecampo/article/view/50064 Acesso em: 09 mar. 2022.
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  • BRITTO, A. C. L.; MOKARZEL, M. O.; CORRADI, A. O arquivo enquanto lugar de memória e sua relação com a identidade. Ágora, v. 27, n. 54, p. 158-182, 2017. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/12023 Acesso em: 25 mar. 2022.
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  • CUCHE, Denys. A noção de cultura nas Ciências Sociais. Bauru: EDUSC, 1999.
  • GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
  • GOMES, Henriette Ferreira. Protagonismo social e mediação da informação. Logeion: Filosofia da informação, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, p. 10-21, mar./ago. 2019. Disponível em: http://revista.ibict.br/fiinf/article/view/4644 Acesso em: 17 mar. 2022.
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  • MELO FILHO, Edilson Targino. Relações teórico-conceituais entre identidade e memória na perspectiva da ciência da informação. Informação em Pauta, v. 1, n. 2, p. 116-130, 2016. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/41286 Acesso em: 25 mar. 2022.
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  • MOURA, Jozuel Vitorino de; ALMEIDA, Carlos Cândido de. Semiótica, música e organização do conhecimento. Ciência da Informação em Revista, Maceió, v. 6, n. 1, p. 20-36, jan./abr. 2019. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/114194 Acesso em: 02 out. 2021.
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    Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação. Publicação no Portal de Periódicos UFSC . As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade.

Editado por

EDITORES

Edgar Bisset Alvarez, Ana Clara Cândido, Patrícia Neubert e Genilson Geraldo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    27 Maio 2022
  • Aceito
    16 Dez 2022
  • Publicado
    02 Jan 2023
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