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DADOS ABERTOS ANTROPOLÓGICOS: O QUE SÃO E QUAIS SUAS PROBLEMÁTICAS?

Open anthropological data: what are they and what are their problems?

RESUMO

Objetivo:

Refletir sobre a especificidade dos dados antropológicos e mapear o que existe de discussão na literatura científica sobre os desafios de abertura desse tipo de documento.

Método:

Primeiramente, realiza uma discussão teórica para compreender as especificidades da área dos dados abertos de pesquisa e dos dados de pesquisas antropológicas. Por fim, realiza uma revisão sistemática de literatura com a intenção de verificar o estado da arte das publicações sobre dos dados de pesquisas antropológicas.

Resultado:

Os resultados encontrados na revisão sistemática foram analisados e agrupados em cinco grupos de convergência temática: 1) problema da eticidade na abertura de dados na internet; 2) questões específicas entre Ciência da Informação e Antropologia; 3) demandas comunicacionais e relacionais de repositórios digitais para dados antropológicos; 4) especificidade dos dados multimídia da subárea chamada Antropologia Visual; 5) repositórios digitais para museus antropológicos que abrigam dados de pesquisa.

Conclusões:

A literatura sobre o tema ainda é pequena, mas vem crescendo desde 2015, principalmente na língua inglesa. Conclui-se que há vários desafios específicos para concretização de repositórios digitais para esse tipo de dado e que as relações interdisciplinares entre Ciência da Informação e Antropologia, Comunicação e Museologia são desejadas para superar essas adversidades.

PALAVRAS-CHAVE:
Ciência Aberta; Dados Abertos de Pesquisa; Repositório Digital; Antropologia Social

ABSTRACT

Objective:

Reflect on the specificity of anthropological data and map what is discussed in the scientific literature about the challenges of opening this type of document.

Methods:

First, it carries out a theoretical discussion to understand the specificities of the field of open research data and anthropological research data. Finally, it performs a systematic literature review with the intention of verifying the state of the art of publications on anthropological research data.

Results:

The results found were analyzed and grouped into five groups of thematic convergence: 1) problem of ethics in opening data on the internet; 2) specific issues between Information Science and Anthropology; 3) communicational and relational demands of the repositories' platforms; 4) specificity of the multimedia data of the subfield called Visual Anthropology; 5) digital repositories for anthropological museums that house research data.

Conclusions:

The literature on the subject is still small, but it has been growing since 2015, mainly in the English language. It is concluded that there are several specific challenges for the realization of digital repositories for this type of data and that interdisciplinary relationships between Information Science and Anthropology, Communication and Museology are desired to overcome these adversities.

KEYWORDS:
Open Science; Open Research Data; Digital Repository; Social Anthropology

1 INTRODUÇÃO

Muitos(as) pesquisadores(as) estão estudando o tema da ciência aberta a partir de diferentes tipos de perspectivas para entender como os dados científicos podem ser publicados para reuso sem impedimentos. Ainda que os profissionais acadêmicos entendam que os dados científicos pertencem a uma comunidade inteira, existem vários movimentos de fechamento a partir de plataformas que precificam os dados ou os restringem a partir de determinados tipos de direitos autorais (MURRAY-RUST, 2008MURRAY-RUST, Peter. Open data in science. Nature Precedings, [S.l.], 1-1, 2008. Disponível em: https://doi.org/10.1038/npre.2008.1526.1. Acesso em: 12 de dez. 2022.
https://doi.org/10.1038/npre.2008.1526.1...
).

Por isso, a ciência aberta se constitui enquanto uma pluralidade de estudos aplicados à resolução desse problema através de tecnologias digitais colaborativas e de ferramentas de propriedade intelectuais alternativas. Dentro desse grande “guarda-chuva”, há uma subárea de pesquisa que investiga a abertura gratuita de dados de pesquisas universitárias através da internet como meio de comunicação científica. Apesar de ser um campo um tanto novo - tanto no cenário nacional quanto no internacional -, há um número crescente de publicações sobre esse tema, como mostram artigos publicados recentemente (SILVEIRA et al., 2021SILVEIRA, Lúcia da; RIBEIRO, Nivaldo Calixto; SANTOS, Sarah Rúbia de Oliveira; SILVA, Fernanda Mirelle de Almeida; SILVA, Fabiano Couto Corrêa da; CAREGNATO, Sônia Elisa; OLIVEIRA, Adriana Carla Silva de; OLIVEIRA, Dalgiza Andrade; GARCIA, Joana Coeli Ribeiro; ARAUJO, Ronaldo Ferreira. Ciência aberta na perspectiva de especialistas brasileiros: proposta de taxonomia: propuesta de taxonomía. Encontros Bibli: revista eletrônica de biblioteconomia e ciência da informação, Florianópolis, v. 26, p. 1-27, 2021. Disponível em: https://doi.org/10.5007/1518-2924.2021.e79646. Acesso em: 08 de dez. 2021.
https://doi.org/10.5007/1518-2924.2021.e...
) e relatórios produzidos sobre esse assunto (PAVÃO et al., 2018PAVÃO, Caterina Marta Groposo; GABRIEL JUNIOR, Rene Faustino; ROCHA, Rafael Port da. Proposta de criação de uma rede de dados abertos da pesquisa brasileira. Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da Informação, Campinas, v. 16, n. 2, p. 329-343, 2018.; VANZ et al., 2018VANZ, Samile Andrea de Souza; PASSOS, Paula Caroline Schifino Jardim; CAREGNATO, Sônia Elisa; PAVÃO, Caterina Groposo; BORGES, Nunes Borges; ROCHA, Rafael Port da; GABRIEL JUNIOR, Rene Faustino; AZAMBUJA, Luís Alberto Barbosa. Acesso aberto a dados de pesquisa no Brasil: práticas e percepções dos pesquisadores: relatório 2018. Porto Alegre: UFRGS, 2018. Disponível em: http://hdl.handle.net/10183/185195. Acesso em: 02 de dez. 2021.
http://hdl.handle.net/10183/185195...
).

Nessa perspectiva específica, não se estuda a abertura gratuita dos conhecimentos universitários através de periódicos científicos ou de plataformas para documentos bibliográficos (como teses e dissertações). O que se tem como objeto são os dados em processos intermediários da comunicação científica, ou seja, os registros que são coletados durante a pesquisa e que nem sempre são abertos integralmente em publicações acadêmicas. Por esse motivo, estão sendo construídos repositórios digitais para publicação aberta desses dados, uma forma de instigar movimentos mais colaborativos entre acadêmicos, em geral através do compartilhamento e do reuso de seus materiais.

Todavia, fica evidente aos leitores da bibliografia desta área que existe uma grande lacuna acerca da discussão sobre repositórios digitais aos dados abertos oriundos das humanidades. Como premissa inicial de investigação, entende-se que as áreas das humanas possuem intenções na abertura dos seus documentos que diferem das necessidades das ciências naturais e das exatas.

Em vista disso, este artigo contribui para preencher essa lacuna. Como é impossível compreender a especificidade de todos os tipos de dados oriundos de diferentes campos das humanidades (como a Psicologia, a Geografia Humana, a História, a Sociologia, a Ciência Política, a Filosofia), delimitou-se apenas uma área para investigação: a Antropologia Social.1 1 Existem outros campos como a Antropologia Física (também chamada de Antropologia Biológica ou Bioantropologia) e a Paleoantropologia (área da Arqueologia que estuda a evolução da espécie humana) que possuem outras abordagens teórico-metodológicas. Esses campos não foram considerados. Os registros dessa disciplina possuem uma ontologia específica que acarreta em inúmeros problemas de sensibilidade na abertura dos seus dados, gerando a necessidade de reflexão em torno de como podem ser construídos repositórios digitais para esses documentos. Assim sendo, o objetivo do artigo é refletir sobre a especificidade dos dados antropológicos e mapear o que existe de discussão na literatura científica sobre os desafios de abertura desse tipo de documento específico.

Por isso, a primeira seção deste artigo traz uma discussão teórica em torno do campo dos dados abertos de pesquisa e das peculiaridades da investigação antropológica. Em um primeiro momento, discute-se teoricamente o que é o movimento da ciência aberta e como se compreende o campo de atuação em torno dos dados abertos de pesquisa em repositórios digitais. Nesta reflexão, são trazidos os princípios basilares que norteiam o desenvolvimento dessa área para, então, contextualizar a lacuna em relação ao campo das humanidades. Para realizar a discussão almejada dentro dessa brecha, abriga-se uma gênese breve da Antropologia Social enquanto campo do saber contemporâneo, definindo o que são dados de pesquisas antropológicas ou dados antropológicos em sua dimensão material e imaterial.

Após essa seção onde se definem os conceitos centrais do trabalho, expõe-se uma revisão sistemática de literatura sobre dados antropológicos (JESSON; MATHESON; LACEY, 2011JESSON, Jill; MATHESON, Lydia; LACEY, Fiona. Doing Your Literature review: traditional and systematic techniques. London: Sage, 2011.). A intenção desta revisão foi compreender qualitativamente o que existe de discussão na literatura acadêmica acerca das especificidades de abertura desses dados em contraposição aos outros tipos de documentos comumente estudados. Assim, os resultados formaram conjuntos de discussões dentro desse tema de investigação, mostrando questões específicas que evidenciam a complexidade dos dados oriundos de etnografias na Antropologia e os tipos de cuidados que se pode ter em políticas voltadas à área de trabalho.

Por fim, conclui-se realizando uma síntese dos desafios mapeados na revisão de literatura, mostrando que ainda há uma necessidade de estudos específicos para criação de políticas na área da Antropologia Social dentro do campo da ciência aberta.

2 DOS DADOS ABERTOS DE PESQUISA AOS DADOS ABERTOS ANTROPOLÓGICOS

O campo da ciência aberta tem como pilar a pressuposição de que todo conhecimento científico é um patrimônio da humanidade. Dessa forma, compreende-se que o acesso ao saber é um direito basilar de todas as pessoas em uma determinada sociedade (sejam elas pesquisadoras ou não), possibilitando o uso e a distribuição desses materiais sem constrangimentos de ordem social, legal, econômica ou tecnológica (SAYÃO; SALES, 2014SAYÃO, Luís Fernando; SALES, Luana Farias. Dados abertos de pesquisa: ampliando o conceito de acesso livre. Revista Eletrônica De Comunicação, Informação & Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 8, n. 2, p. 76-92, 2014. Disponível em: https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/611. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://www.reciis.icict.fiocruz.br/inde...
).

Por conseguinte, entende-se que qualquer empreendimento dentro dessa área promove ações de acessibilidade, transparência, colaboração, controle de qualidade, validação, inovação, entre outras características de ordem democrática (NIELSEN, 2012NIELSEN, Michael. Reinventing discovery: the new era of networked science. Princeton: Princeton University Press, 2012.). Por isso, existe um acrônimo chamado FAIR (Findable, Accessible, Interoperable e Reusable) que sintetiza os principais objetivos dessas políticas de acesso, descrevendo questões relacionadas com a organização da informação em plataformas específicas para dados científicos (WILKINSON et al., 2016WILKINSON, Mark D. et al. The FAIR Guiding Principles for scientific data management and stewardship. Scientific data, v. 3, n. 1, p. 1-9, 2016. Disponível em: https://www.nature.com/articles/sdata201618?ref=https://githubhelp.com. Acesso em: 16 de dez. 2022.
https://www.nature.com/articles/sdata201...
).

Ainda assim, é evidente que as possibilidades de aplicações dos princípios da ciência aberta são vastas e bem diferentes entre si, como a abertura irrestrita de teses e dissertações e a transparência dos processos de avaliação por pares em revistas científicas. Em 2003, a Declaração de Berlim sobre o Acesso Aberto ao Conhecimento em Ciências e Humanidades se tornou um marco que adicionou os dados de pesquisa como outra possibilidade de trabalho dentro dessa área. Para definir o que seriam dados de pesquisa, o documento declara que são “resultados de pesquisas científicas originais, dados brutos [dados não processados] e metadados, fontes originais, representações digitais de materiais pictóricos e gráficos, além de material acadêmico multimídia” (SAYÃO; SALES, 2014SAYÃO, Luís Fernando; SALES, Luana Farias. Dados abertos de pesquisa: ampliando o conceito de acesso livre. Revista Eletrônica De Comunicação, Informação & Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 8, n. 2, p. 76-92, 2014. Disponível em: https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/611. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://www.reciis.icict.fiocruz.br/inde...
, p. 77).

Em 2007, foi lançado um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que os descreve como “registros de fatos usados como fontes primárias na investigação científica e que geralmente são aceitos [...] como necessários para a validade dos dados de pesquisa” (OCDE, 2007 apud. PINHEIRO, 2014PINHEIRO, Lena Vania Ribeiro. Do acesso livre à ciência aberta: conceitos e implicações na comunicação científica. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 8, n. 2, p.153-165, 2014. Disponível em: https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/629/0. Acesso em: 03 dez. 2021.
https://www.reciis.icict.fiocruz.br/inde...
, p.162). Em outras palavras, tratam-se de dados que dão base a todas publicações escritas, sendo sua abertura condizente com o novo modelo de ciência que está paulatinamente surgindo: o denominado “quarto paradigma científico” ou “e-Science” (SAYÃO; SALES, 2014SAYÃO, Luís Fernando; SALES, Luana Farias. Dados abertos de pesquisa: ampliando o conceito de acesso livre. Revista Eletrônica De Comunicação, Informação & Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 8, n. 2, p. 76-92, 2014. Disponível em: https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/611. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://www.reciis.icict.fiocruz.br/inde...
).

Esse novo paradigma entende que esses dados são a base da nova ciência, uma vez que a habilidade dos cientistas para compartilhar e mesclar conjuntos de dados significativos é a base na qual novas abordagens podem ser criadas (BERMAN; WILKINSON; WOOD, 2014BERMAN Francine; WILKINSON, Ross Gordon; WOOD John. Buiding global infrastructure for data sharing and exchange through the research data alliance. D-Lib Magazine, [S.l.], n.1-2, v. 14, 2014. Disponível em: http://www.dlib.org/dlib/january14/01guest_editorial.html. Acesso em: 04 dez. 2022.
http://www.dlib.org/dlib/january14/01gue...
). Dessa forma, surgem políticas específicas para conseguir construir plataformas que compreendam a especificidade dos dados em si, como repositórios digitais que auxiliam na permanência e durabilidade das informações a partir de ações de preservação digital (PINHEIRO, 2014PINHEIRO, Lena Vania Ribeiro. Do acesso livre à ciência aberta: conceitos e implicações na comunicação científica. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação e Inovação em Saúde, Rio de Janeiro, v. 8, n. 2, p.153-165, 2014. Disponível em: https://www.reciis.icict.fiocruz.br/index.php/reciis/article/view/629/0. Acesso em: 03 dez. 2021.
https://www.reciis.icict.fiocruz.br/inde...
, p. 162).

Claramente, a área dos dados abertos de pesquisa está crescendo no Brasil onde se tem formado redes de pessoas em torno do tema (PAVÃO; GABRIEL JUNIOR; ROCHA, 2018PAVÃO, Caterina Marta Groposo; GABRIEL JUNIOR, Rene Faustino; ROCHA, Rafael Port da. Proposta de criação de uma rede de dados abertos da pesquisa brasileira. Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da Informação, Campinas, v. 16, n. 2, p. 329-343, 2018.), mas é notável que ainda existe uma tendência de generalização do que se entende como pesquisa científica. Como existe uma tendência em assimilar o termo “científico” ao campo das ciências exatas, ainda há uma dificuldade de acrescentar ao debate a especificidade dos dados de pesquisa em humanidades, evitando a antiga separação entre as denominadas hard sciences e as soft sciences.

Como embasamento dessa reflexão, pode-se mencionar o relatório da RDP Brasil (VANZ et al., 2018VANZ, Samile Andrea de Souza; PASSOS, Paula Caroline Schifino Jardim; CAREGNATO, Sônia Elisa; PAVÃO, Caterina Groposo; BORGES, Nunes Borges; ROCHA, Rafael Port da; GABRIEL JUNIOR, Rene Faustino; AZAMBUJA, Luís Alberto Barbosa. Acesso aberto a dados de pesquisa no Brasil: práticas e percepções dos pesquisadores: relatório 2018. Porto Alegre: UFRGS, 2018. Disponível em: http://hdl.handle.net/10183/185195. Acesso em: 02 de dez. 2021.
http://hdl.handle.net/10183/185195...
) que foi feito a partir de um questionário aplicado a todas as áreas científicas em que apenas 21% dos respondentes são oriundos das Ciências Humanas (sendo que somente 5,35% desses pertencem à Antropologia). Em outro relatório publicado pela mesma rede (PAVÃO et al., 2018PAVÃO, Caterina Marta Groposo; GABRIEL JUNIOR, Rene Faustino; ROCHA, Rafael Port da. Proposta de criação de uma rede de dados abertos da pesquisa brasileira. Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da Informação, Campinas, v. 16, n. 2, p. 329-343, 2018.), existe um mapeamento de repositórios brasileiros especificamente para dados abertos de pesquisa que foram encontrados no Re3Data e em buscas facetadas na internet, o que permitiu a observação de que predominam as temáticas voltadas às Ciências Agrárias, às Ciências Exatas e da Terra, às Ciências Biológicas e à Engenharia.2 2 É importante salientar que o relatório mapeou três repositórios de dados das Ciências Sociais de forma geral. Contudo, pode-se perceber que, majoritariamente, os repositórios mencionados possuem mais dados quantitativos (que são minoritários em vários campos de humanas) ou não possuem quantidade suficiente de dados dos processos intermediários das pesquisas (como o Ibict Dataverse Network e a Base de Dados Científicos da Universidade Federal do Paraná).

Assim, esse artigo traz como reflexão o caso dos dados oriundos da Antropologia Social como ponto específico dentro da lacuna mencionada, evitando o entendimento do campo das humanidades como uma massa homogênea. Contudo, entende-se que, para chegar em definições sintéticas sobre o que são os dados antropológicos, é necessário fazer uma breve gênese da área para que, então, possamos trazer o que há de particular nesses documentos em contraposição a outras áreas do saber.

É muito importante salientar que o campo da pesquisa antropológica surge fortemente vinculado à formação dos grandes impérios coloniais no final do século XIX. Com isso, estudava-se a alteridade e/ou a diferença de outras civilizações a partir do contato imperial dos europeus em terras que estavam em plena “descoberta”. É a partir destes constrangimentos sociais que vão surgir as diversas escolas de pensamento do campo, distribuídas segundo certas matrizes e paradigmas que interpretavam esses encontros com a diferença.

Dito isso, é possível notar que a Antropologia foi paulatinamente se consolidando enquanto campo de ensino e pesquisa a partir das universidades europeias e americanas ao longo do século XX. Foi somente décadas posteriores que ela se instalou nos “países do sul”, carregando neste percurso muitas das marcas de uma revisão crítica dos postulados teóricos e conceituais trazidos por seus pais fundadores - os evolucionistas.

Influenciada pela visão romântica do século XVIII sobre os “povos exóticos”, a disciplina almejava compreender as diferenças culturais e sociais entre “nós” e “eles” para atingir a mesma objetividade e cientificidade propagada pelos postulados positivistas das ciências biológicas ou naturais. Obviamente, esse período foi marcado pelo impacto do trabalho de Charles Darwin, publicado em 1859DARWIN, Charles. On the origin of species. Londres: John Murray‎, 1859., “A Origem das Espécies”, que inspirou os primeiros antropólogos “científicos” a construir um conhecimento acerca da diversidade sociocultural da humanidade a partir do conceito central de “evolução”, separando hierarquicamente as sociedades entre selvagens, bárbaros e civilizados (CARNEIRO, 2018CARNEIRO, Robert L. Evolutionism in cultural anthropology: a critical history. [S.l.]: Routledge, 2018.). Muitas dessas hipóteses possuíam as marcas do seu tempo: como todo movimento iluminista, acreditava-se na possibilidade de alcançar princípios gerais que regem a natureza humana, o que possibilitaria a utilização de leis para entender como a humanidade poderia atingir um constante progresso (EVANS-PRITCHARD; PERRONE-MOISÉS, 2021EVANS-PRITCHARD, Edward E.; PERRONE-MOISÉS, Beatriz. Antropologia social: passado e presente. Cadernos de Campo, São Paulo, v. 30, n. 2, 2021. Disponível em: https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133.v30i2pe191852. Acesso em: 26 de abr. 2022.
https://doi.org/10.11606/issn.2316-9133....
).

Vulgarmente chamados de “antropólogos de gabinete”, estes acadêmicos reuniram obras de viajantes, missionários e aventureiros dos séculos anteriores que retratavam o seu encontro com o “outro”. Por meio do estudo do conteúdo de tais obras, procuravam desenhar os cenários culturais que explicariam as diferenças entre as sociedades, sendo que as dimensões do parentesco e da religião foram pontos importantes para a produção deste conhecimento.

No final do século XIX, estavam sendo coletadas enormes quantidades de informação sobre diferentes tipos de sociedades não europeias, gerando vastos repositórios de fontes etnológicas, como o sobre magia e religião em The Golden Bough (O Ramo de Ouro) coordenado por James Frazer, em 1890FRAZER, James George. The Golden Bough: a study in comparative religion. Nova York: Macmillan Publishers, 1890. v.2. Muitas dessas tentativas estavam aliadas ao método da história comparativa em que se intentava contrastar diferentes expressões humanas para entender a base única do anthropos. Não é trivial lembrar que tudo isso estava sendo feito nas universidades do norte global enquanto os processos coloniais se consolidavam cada vez mais em todo o planeta junto das revoluções industriais, o que arrastava diversas sociedades tradicionais não caucasianas ao extermínio e à escravidão.

Diferentemente dos antropólogos modernos que vão suceder aos evolucionistas dessa época, tratava-se de um procedimento de pesquisa documental com base em especulações sobre essas sociedades que, na época, eram chamadas de primitivas. São os antropólogos fundadores da Antropologia Moderna, nascida nos primórdios do século XX, que vão fazer a crítica à Escola Evolucionista, precisamente selecionando o método etnográfico como chave de explicação das diferenças culturais das sociedades. Esse tipo de pesquisa advogava a obrigatoriedade da permanência do etnógrafo durante um longo período de trabalho de campo junto à população por ele investigada. Consequentemente, o método etnográfico postulava a aprendizagem da língua do “nativo”, a realização da observação participante com a escrita do diário de campo, a montagem de redes de parentesco, o registro visual da vida cotidiana, entre outros processos feitos junto a essas sociedades não-europeias (MAUSS, 2007MAUSS, Marcel. Manual of ethnography. [S.l.]: Berghahn Books, 2007.).

Assim, surgiram diferentes propostas contrárias ao Evolucionismo - como a Escola Histórica com Franz Boas, em 1938BOAS, Franz. The Mind of the Primitive Man. New York: Macmillan, 1938. Disponível em: https://archive.org/details/mindofprimitive00boas. Acesso em: 05 de jun. 2022.
https://archive.org/details/mindofprimit...
, e a Escola Funcionalista de Bronislaw Malinowski, 1922MALINOWSKI, Bronisław. Argonautas do pacífico ocidental. São Paulo: Ubu Editora 1922. 3 3 Um dos atos fundadores desse tipo de pesquisa foi o trabalho de Bronisław Malinowski (1922) sobre os grupos que viviam nas Ilhas Trobriand, um arquipélago próximo à Nova Guiné, em que ele relatou longamente como funcionava a economia dessas comunidades. , e, com elas, foram feitos os primeiros registros e coletas de material em campos etnográficos. Essa mudança drástica afetou permanentemente o que se entendeu como dados antropológicos, uma vez que não se podia mais desenvolver essa área de conhecimento a partir de especulações em gabinete.

Isso se deve à formação dos conceitos de etnocentrismo e de relativização (ou relativismo cultural) que surgiram contra o período evolucionista que perpetuava uma série de racismos produzidos por escolásticos europeus. O etnocentrismo foi um conceito criado contra a tendência do(a) antropólogo(a) em interpretar a cultura do “outro” a partir da perspectiva particular da sua própria - muitas vezes considerando a sua como melhor e mais avançada. O relativismo cultural se pautava por prescrever a inexistência de uma cultura ou raça superior às outras, entendendo a existência de pluralidade social não hierárquica.4 4 Pode-se aprofundar essa discussão através de textos brasileiros como “A Antropologia como Ciência Social no Brasil” de Mariza Peirano (2000).

Logo, anunciou-se o campo da Antropologia Social como uma área dentro das humanidades que seria singularizada pela pesquisa etnográfica voltada para compreensão de “alteridades radicais” (PEIRANO, 1995PEIRANO, Mariza. A favor da etnografia. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995.).5 5 Alteridades radicais é um conceito que se refere a comunidades que possuem uma forma de vida e de conhecimento radicalmente diferente dos pesquisadores hegemônicos das universidades ocidentais. A etnografia foi elencada como principal forma de produção de conteúdo por inúmeros motivos, mas o principal deles foi a possibilidade de evitar o etnocentrismo a partir do longo período de desconstrução do(a) pesquisador(a) em campo. Assim, a Antropologia se tornou uma área extremamente empírica após sua fase especulativa, sendo baseada em dados de campo que foram sempre produzidos em complexas teias de relações sociais.

Ao longo das últimas décadas do século XX, houve muitas transformações da área tendo em vista a criação de outros centros de produção do conhecimento com o surgimento das universidades nos países do sul. Muitos temas novos para além das populações originárias ganharam destaque, como aqueles sobre as metrópoles contemporâneas (VELHO, 2013VELHO, Gilberto. Um antropólogo na cidade: ensaios de antropologia urbana. Rio de Janeiro: Editora Schwarcz-Companhia das Letras, 2013.) e aqueles sobre as redes de produção científica (LATOUR, 1990LATOUR, Bruno. Postmodern? No, simply amodern! Steps towards an anthropology of science. Studies in History and Philosophy of Science, v. 21, n. 1, p. 145-171, 1990.). Logo, deixou-se de focar apenas no campo do “exótico” em relação aos nativos de diversas localidades do globo para produzir pesquisas etnográficas que incluem alteridades próximas ou mínimas (PEIRANO, 2006PEIRANO, Mariza. A teoria vivida: e outros ensaios. Zahar, 2006.).6 6 Para Mariza Peirano, alteridades próximas são grupos que podem ser estudados e que estão muito perto do pesquisador, mas onde ainda há certa diferença cultural. Um exemplo é o próprio caso do antropólogo Gilberto Velho que estudava diferentes grupos urbanos da sua própria cidade, o Rio de Janeiro. Claramente, a questão de ser próximo ou não depende de quem o pesquisador é e de quais as suas origens antes de entrar no setor de pesquisa. Por outro lado, alteridades mínimas são grupos sociais que estão colados no pesquisador ou que fazem parte da sua formação enquanto pessoa. Nesse sentido, esse grupo abriga pesquisadores estudando sua própria disciplina acadêmica, seu próprio grupo de pesquisa ou sua comunidade de origem antes de entrar na academia

Mesmo assim, os axiomas básicos da produção dos dados dessa disciplina não se modificaram tão drasticamente depois da implementação da etnografia como base metodológica principal na Antropologia Moderna. Em todos os tipos de pesquisa na Antropologia, os dados majoritários que são produzidos provêm de etnografias, sendo que o registro mais comum é o diário de campo onde existem inúmeras anotações qualitativas, descritivas e observacionais feitas pelos profissionais da área. Ainda assim, é bem comum que dados antropológicos também se refiram às produções multimídia feitas em trabalho de campo - como no caso de ensaios fotográficos, registros fílmicos e documentos sonoros (ECKERT; ROCHA, 2016ECKERT, Cornelia; ROCHA, Ana Luiza Carvalho da. Antropologia da Imagem no Brasil: experiências fundacionais para a construção de uma comunidade interpretativa. Revista Iluminuras, Porto Alegre, v. 17, n. 41, 2016. Disponível em: http://hdl.handle.net/10183/143517. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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) e aos artefatos coletados quando se há uma relação com a Museologia (ABREU; LIMA FILHO, 2012ABREU, Regina; LIMA FILHO, Manuel Ferreira. A trajetória do GT de Patrimônios e Museus da Associação Brasileira de Antropologia. In: TAMASO, Izabela Maria; LIMA FILHO, Manuel Ferreira. Antropologia e patrimônio cultural: trajetórias e conceitos. Brasília, DF: Associação Brasileira de Antropologia, 2012. p. 25-57).

Ainda que possamos definir de forma clara quais são esses documentos primários da produção antropológica, a gênese da área foi trazida para mostrar que a abertura desses dados deve possuir outras preocupações não mapeadas de forma sistemática no campo dos dados abertos de pesquisa. Aqui, claramente, a discussão sobre o “quarto paradigma científico” não se aplica completamente, uma vez que a intenção de abertura não é o reuso dos materiais para atingir descobertas laboratoriais ainda mais profundas. Caso isso fosse a intenção, a Antropologia estaria voltando ao seu período evolucionista onde os profissionais trabalhavam em gabinetes, produzindo discussões especulativas sobre como funcionam as populações “exóticas” que estão distantes dos centros de produção científica.

Em contraposição a essa noção de documento como mero objeto de troca, o dado de pesquisa antropológica foi sempre acompanhado de reflexões para evitar o etnocentrismo característico das escolas iniciais da Antropologia. Diante disso, deve-se entender que esse tipo de dado existe sempre em uma interrelação complexa entre pesquisadores(as) acadêmicos(as) e grupos sociais estudados, havendo uma grande preocupação mais contemporânea em não falar sobre os outros com uma autoridade irrestrita (ROCHA; ECKERT, 1998ROCHA, Ana Luiza Carvalho da; ECKERT, Cornelia. A interioridade da experiência temporal do antropólogo como condição da produção etnográfica. Revista de Antropologia, v. 41, p. 107-136, 1998. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0034-77011998000200004. Acesso em: 16 mar. 2022.
https://doi.org/10.1590/S0034-7701199800...
). Ao contrário, deve-se criar coleções etnográficas onde existe uma curadoria que pensa na sensibilidade de determinados documentos e nas possibilidades de comunicação para e com as alteridades estudadas.

Logo, existe uma necessidade de mapear o que já existe na literatura científica sobre os problemas específicos de armazenamento, compartilhamento, uso e reuso no caso dos dados antropológicos - o que gera discussões sobre que tipo de repositórios digitais poderia ser criado para preservação digital desses documentos específicos. Para isso, foi realizada uma pesquisa documental que será exposta a seguir.

3 METODOLOGIA

Para compreender mais profundamente o estado da arte da discussão em torno da abertura dos dados antropológicos, realizou-se uma revisão sistemática de literatura (JESSON; MATHESON; LACEY, 2011JESSON, Jill; MATHESON, Lydia; LACEY, Fiona. Doing Your Literature review: traditional and systematic techniques. London: Sage, 2011.). Esse tipo de revisão possui um caráter qualitativo e exploratório-descritivo, posto que a coleta de literatura da área é seguida de uma análise crítica sobre o conhecimento produzido no tempo delimitado. Por ser uma revisão que demanda sistematicidade, ela foi feita a partir de uma metodologia prescrita inicialmente com a intenção de atingir um objetivo específico.

Aqui, utilizou-se o mesmo protocolo usado por Moisés Rockembach (2018ROCKEMBACH, Moises. Avaliação arquivistica: uma análise baseada em revisão sistemática de literatura. Encontros Bibli: revista eletrônica de biblioteconomia e ciência da informação, Florianópolis, v. 23, n. 1, p. 90-98, 2018. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/eb/article/view/1518-2924.2018v23nespp90/36931. Acesso em: 04 jul. 2022.
https://periodicos.ufsc.br/index.php/eb/...
). Os procedimentos são descritos detalhadamente logo abaixo no Quadro 1.

Quadro 1
Procedimentos metodológicos adotados na revisão sistemática de literatura

Antes da coleta sistemática de bibliografias, foi realizada uma revisão exploratória, o que possibilitou constatar que existem poucas publicações sobre o tema delimitado. Ainda assim, essas publicações não são inexistentes e possuem contribuições importantes. Logo, foram buscadas publicações dos últimos 20 anos, pois foi nas últimas décadas que esses estudos começaram a existir de forma mais proeminente devido às mudanças tecnológicas.

Almejava-se coletar produções a partir de outros termos como “dados antropológicos”, “coleções etnográficas”, “registro antropológico”, “digitalização e antropologia”, assim como seus equivalentes em inglês. Porém, essa busca recuperou muitos trabalhos que versavam sobre a questão da comunicação e difusão científica de etnografias feitas na internet em geral. Assim, muitas se referiam a ações de abertura feita em sites comuns ou em redes sociais, o que não gera as ações de preservação digital dos dados a longo prazo. Logo, esses termos foram excluídos da busca da revisão sistemática a fim de recuperar bibliografias que falem especificamente sobre a questão do open data nos repositórios digitais.

4 RESULTADOS ENCONTRADOS

Na revisão sistemática de literatura, encontrou-se vinte e cinco produções bibliográficas, existindo temas variados que são trabalhados nessas obras coletadas. Os resultados encontrados foram analisados e agrupados em cinco grupos de convergência temática: 1) problema da eticidade na abertura de dados na internet; 2) questões específicas entre Ciência da Informação e Antropologia; 3) demandas comunicacionais e relacionais das plataformas dos repositórios; 4) especificidade dos dados multimídia da subárea chamada Antropologia Visual; 5) repositórios digitais para museus antropológicos.

4.1 Problema da eticidade na abertura de dados na internet

Esse grupo traz uma série de questões relacionadas com a eticidade da abertura de dados antropológicos ou etnográficos na internet em repositórios digitais, uma vez que muitos registros da área são sensíveis e precisam de um cuidado especial na sua disponibilização.

Há dois artigos que argumentam que a demanda por abertura dos dados antropológicos não está considerando adequadamente a epistemologia dos registros etnográficos (CARVALHO, 2019CARVALHO, Érika Rayanne Silva de. Diferenças na produção, no compartilhamento e no (re)uso de dados de pesquisa: a percepção de pesquisadores de Química, Antropologia e Educação. Em Questão, Porto Alegre, v. 25, n. 3, p. 321-347, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.19132/1808-5245253.321-347. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://doi.org/10.19132/1808-5245253.32...
; PELS et al., 2018). Os(as) autores(as) refletem que esses dados estão sempre envolvidos em relações sociais complexas e não são simplesmente objetos para serem trocados entre pesquisadores e instituições, visto que o registro é coproduzido em uma parceria de pesquisa. Explica-se que a observação participante envolve a intimidade da vida de pessoas e de conhecimentos que muitas vezes foram subalternizados pelos sistemas coloniais. Mesmo assim, os(as) pesquisadores(as) não abdicam da importância da abertura desses dados, apenas insistem em pensar em outras metodologias e formas de propriedades intelectuais que sustentem a complexidade da etnografia.

Como pesquisa empírica, foi encontrado um estudo sobre a digitalização e o acesso na internet de documentos que envolvem os Cherokee feita em uma parceria entre o Museum of the Cherokee Indian (Museu do Índio Cherokee) e o Smithsonian Institution nos Estados Unidos (LEOPOLD, 2013LEOPOLD, Robert. Articulating Culturally Sensitive Knowledge Online: a cherokee case study. Museum Anthropology Review, [S.l.], v. 7, n. 1-2, p. 85-104, 2013. Disponível em: https://scholarworks.iu.edu/journals/index.php/mar/article/view/2051. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://scholarworks.iu.edu/journals/ind...
). Esse estudo faz um detalhado relato de como aconteceu a restituição de uma coleção do século XIX-XX de documentos escritos relacionados à medicina dos Cherokees.

Essa coleção contém dados que falam sobre conhecimentos ancestrais dessa população que sofreu genocídio no contexto norte-americano, sendo que, por causa disso, muitas gerações futuras perderam contato com várias de suas tradições. Assim, houve uma grande polêmica entre a abertura dos dados feita de forma institucional e as comunidades Cherokees do presente, visto que a maioria nunca tinha visto os documentos e não conhecia alguns dos rituais que estavam documentados ali. Por isso, é argumentado que a noção de propriedade coletiva não é tão simples e que os processos de repatriação digital são mais complexos do que se espera inicialmente.

Ainda sobre o tema da disponibilização de materiais sensíveis, foi publicado um trabalho sobre os arquivos resultantes de pesquisas relacionadas com o Native Title Act, uma lei que foi promulgada em 1993, na Austrália (LOURIE et al., 2019LOURIE, Amanda; KOJOVIC, Nina; HODSON, Katrina; ALIMARDANIAN, Mahnaz. Native Title Archives: traditional owner community owned and controlled repositories. Journal of Colonialism and Colonial History, [S.l.], v. 20, n. 2, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.1353/cch.2019.0020. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://doi.org/10.1353/cch.2019.0020...
). Ela foi introduzida após a decisão histórica de reconhecer os direitos detidos pelas populações originárias das terras e águas do país, algo que se assemelha à demarcação de terras indígenas e quilombolas no Brasil.

O problema central colocado é a restituição desses dados de pesquisa, uma vez que, muitas vezes, eles ficam sob custódia de determinadas instituições e não permitem que as populações originárias ajam por si próprias com os arquivos que se referem a suas vidas. Por isso, coloca o problema de como construir repositórios digitais que não só permitam essa abertura dos documentos, mas que respeitem a soberania dos dados indígenas para que eles sejam utilizados sem a custódia de uma instituição que, historicamente, faz parte do sistema colonial britânico implementado na Austrália.7 7 Atualmente, o Native Title Research and Access Service possui um site em parceria com o Instituto Australiano dos Estudos Aborígenes e das Ilhas de Torres (AIATSIS) onde comunica quais são os serviços prestados e quais arquivos eles possuem. O site pode ser acessado em: https://aiatsis.gov.au/research/native-title-research-and-access-service.

4.2 Questões específicas entre Ciência da Informação e Antropologia

Nesse grupo, foram reunidas bibliografias que falam sobre a necessidade de pensar formas inter ou transdisciplinares de construção dessas bases de dados abertos de pesquisa. Os argumentos aqui reunidos vão além da questão ética mencionada na seção anterior, adentrando no tema da construção de metainformação específica para os dados antropológicos e procedimentos para gerenciamento de dados sensíveis.

Recentemente, foi publicado um capítulo de livro sobre a construção da Platform for Experimental Collaborative Ethnography (PECE) (Plataforma para Etnografia Experimental Colaborativa) que é uma tentativa de desenvolvimento de uma base de dados na web para compartilhar dados etnográficos (POIRIER, 2019POIRIER, Lindsay. Metadata, digital infrastructure, and the data ideologies of cultural anthropology. In: CROWDER, Jerome W.; FORTUN, Mike; BESARA, Rachel; POIRIER, Lindsay. Anthropological data in the digital age: new possibilities - new challenges. California: Palgrave Macmillan, 2019, p. 209-237.). Essa experiência está ligada com a Research Data Alliance (RDA)8 8 Para saber mais, acesse: https://rd-alliance.org/ (Aliança para Dados de Pesquisa), uma organização internacional que tem como objetivo o compartilhamento aberto de dados de várias disciplinas, ainda que seja composta principalmente pelas ciências exatas.

A partir da experiência na rede, os antropólogos relatam que as culturas epistemológicas plurais são vistas como um problema na prática, porque são consideradas como impedimentos à cientificidade universal alcançada através da reprodutibilidade das pesquisas laboratoriais (KNORR-CETINA, 1999KNORR-CETINA, Karin. Epistemic Cultures: how the sciences make knowledge. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1999.). Como essa diversidade de epistèmes geram tratamentos documentais diferentes, muitos membros da RDA lutam para que essas linguagens sejam reconciliadas em vocabulários amplos que transcendem os campos do saber, o que os autores chamam de data ideologies que não permitem pensar a especificidade de dados das humanidades e, consequentemente, dos dados antropológicos.

Além disso, foi encontrado um artigo que contribui à identificação de soluções para a questão da segurança dos dados etnográficos, principalmente no que se refere às questões dos dados sensíveis (MURILLO, 2018MURILLO, Luis Felipe Rosado. What does “open data” mean for ethnographic research? American Anthropologist, [S.l.], v. 120, n. 3, p. 577-582, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1111/aman.13088. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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). Afinal, como podemos abrir dados de pesquisas que lidam com temas como extermínio de certas populações, destruição de determinados ecossistemas humanos e não-humanos, investigações em torno de empresas ou mesmo de ações estatais que atingem determinadas comunidades? Por essa razão, o autor entende que uma abertura verdadeiramente democrática aos dados etnográficos só pode acontecer com o delineamento de planos específicos de gerenciamento para maior proteção e privacidade, incluindo o anonimato quando necessário. Como uma das principais contribuições, Murillo (2018MURILLO, Luis Felipe Rosado. What does “open data” mean for ethnographic research? American Anthropologist, [S.l.], v. 120, n. 3, p. 577-582, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1111/aman.13088. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://doi.org/10.1111/aman.13088...
) sugere uma série de parâmetros para esse gerenciamento dos dados como uma possibilidade para futuros projetos.

Outro trabalho abordou a organização do conhecimento do arquivo Galiwin'ku Indigenous Knowledge Centre (Centro de Conhecimento Indígena Galiwin'ku), um projeto na Austrália com a população originária Yolngu (HEALY, 2004HEALY, Jessica de Largy. Do trabalho de campo ao arquivo digital: performance, interação e Terra de Arnhem, Austrália. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, v. 10, p. 67-95, 2004. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ha/a/gzTF8N3BjYQr8cfYZ3sNLKw/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://www.scielo.br/j/ha/a/gzTF8N3BjYQ...
). Os organizadores não almejavam só criar uma base de dados sobre os Yolngus, mas um projeto que fosse um centro de atuação dos próprios indígenas para que o banco online se tornasse um local de aprendizagem e de transmissão dos conhecimentos tradicionais. Assim sendo, a ideia era fazer com que as estruturas de classificação e de acesso à informação refletissem a organização dos saberes dos Yolngus, entendendo que não há uma forma universal de classificar determinados acervos. Por isso, a autora salienta que, nesse caso, o bom resultado só seria atingido quando a própria arquitetura informacional fosse feita junto das comunidades, o que difere da simples criação de um banco com informações sobre aquela população.

Foram publicados também dois artigos referentes ao Council for the Preservation of Anthropological Records (CoPAR) (Conselho de Preservação de Registros Antropológicos), um conselho de antropólogos(as) norte-americanos(as) que se dedicou à preservação digital de dados da disciplina (MARSH; PUNZALAN; JOHNSTON, 2019MARSH, Diana E.; PUNZALAN, Ricardo L.; JOHNSTON, Jesse A. Preserving Anthropology’s digital record: CoPAR in the Age of electronic fieldnotes, data curation, and community sovereignty. American Archivist, [S.l.], v. 82, n. 2, p. 268 - 302, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.17723/aarc-82-02-01. Acesso em: 03 de dez. 2021
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; PAREZO; FOWLER; SILVERMAN, 2003PAREZO, Nancy J.; FOWLER, Don D.; SILVERMAN, Sydel. Preserving the anthropological record: A decade of CoPAR initiatives. Current anthropology, [S.l.], v. 44, n. 1, p. 111-116, 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1086/345687. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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). Trata-se de pesquisas sobre essa organização sem fins lucrativos que foi criada, em meados da década de 1990, para suprimir a falta de recursos da American Anthropological Association (AAA) (Associação Americana de Antropologia) para trabalhar com preservação de dados antropológicos. Especificamente, relata os anos de trabalho que foram feitos na área da educação interdisciplinar entre antropólogos(as) e profissionais da área da informação para concretização de projetos.9 9 Com apoio da Wenner-Gren Foundation, a CoPAR realizou workshops para: 1) instituir um programa educacional; 2) desenvolver uma padronização para descrição dos registros antropológicos. Interessante perceber que, aqui, a intenção é educar, já que os antropólogos não sabiam dos problemas de preservação e acesso.

Em 2014, Emmelhainz propôs um vocabulário controlado padronizado para base de dados qualitativos, especificamente da Antropologia Cultural.10 10 A Antropologia Cultural é uma área da Antropologia que é próxima da Antropologia Social, diferente da Antropologia Biológica, por exemplo. Por isso, esse estudo foi mantido na revisão de literatura. A justificativa para criação desse escrito foi a constatação de que há um exponencial reconhecimento da existência dessas bases de dados específicas, sendo que a autora afirma que esses arquivos são difíceis de serem organizados com eficácia por bibliotecários e arquivistas. É um trabalho que possui semelhanças com o artigo que expõe o processo de criação de um framework chamado TEG-LOD feito para possibilitar a criação e a distribuição de trabalhos escritos na área da Antropologia (e dos estudos culturais em geral) relacionados com grupos étnicos da Tailândia (CHANSANAM; TUAMSUK; CHAIKHAMBUNG, 2020CHANSANAM, Wirapong; TUAMSUK, Kulthida; CHAIKHAMBUNG, Juthatip. Linked open data framework for ethnic groups in thailand learning. International Journal of Emerging Technologies in Learning (iJET), [S.l.], v. 15, n. 10, p. 140-156, 2020. Disponível em: https://www.learntechlib.org/p/217053/. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://www.learntechlib.org/p/217053...
).

4.3 Demandas comunicacionais e relacionais dos repositórios digitais para dados antropológicos

No grupo três, foram reunidas literaturas que versam sobre o que se chamou de questões comunicacionais e relacionais dos repositórios digitais que abrigam os dados de pesquisas antropológicas. Aqui, pode-se ver que a questão das plataformas neste caso vai além do simples acesso aos dados, posto que há um problema comunicacional envolvido, principalmente para e com as comunidades estudadas nas etnografias.

Foi publicada uma pesquisa que buscou compreender como poderia ser criado um repositório digital que auxiliasse algumas comunidades indígenas a retomar suas práticas ancestrais em torno do uso da terra e da alimentação, o que foi chamado de Repositório de Sabedoria Alimentar (JENNINGS; JOHNSON-JENNINGS; LITTLE, 2020JENNINGS, Derek; JOHNSON-JENNINGS, Michelle; LITTLE, Meg. Utilizing webs to share ancestral and intergenerational teachings: the process of co-building an online digital repository in partnership with Indigenous communities. Genealogy, [S.l.], v. 4, n. 3, p. 70, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.3390/genealogy4030070. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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). Trata-se de uma pesquisa qualitativa feita através de entrevistas e de grupos-focais para que se percebesse formas de utilizar o digital para estimular a memória e a troca dessas comunidades, melhorando a saúde desses grupos a partir dos seus próprios costumes. Nesse sentido, o projeto falou bem menos sobre a questão da classificação dos documentos e da construção estruturada de uma base de dados, mas abordou temas comunicacionais importantes, como a possibilidade de criar um repositório que tivesse características de uma rede social (ou fosse integrado às redes sociais mais usadas atualmente).

Além dessa obra, foram encontradas duas publicações que versam sobre o problema da mensuração do impacto de coleções etnográficas disponibilizadas em plataformas na web em termos comunicacionais. Uma delas se refere a um estudo feito com entrevistas semi-estruturadas e grupos focais em oito instituições da costa leste dos Estados Unidos que possuem coleções etnográficas online (MARSH; PUNZALAN; LEOPOLD, 2015MARSH, Diana E.; PUNZALAN, Ricardo L.; LEOPOLD, Robert. Studying the Impact of Digitized Ethnographic Collections: Implications for Practitioners. Practicing Anthropology, [S.l.], v.37, n.3, 26-31, 2015. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/i24782219. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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). Argumenta que métricas quantitativas de impacto não avaliam adequadamente a questão comunicacional dos repositórios digitais para esse tipo de dados, uma vez que alguns documentos são de alto interesse de uma pequena parcela da população (como os sobre idiomas tradicionais). Posto isso, a segunda publicação sugere métricas qualitativas alternativas para mensuração de impacto e difusão (PUNZALAN; MARSH; COOLS, 2017). Essas publicações dialogam com o entendimento de Rockembach (2015ROCKEMBACH, Moises. Difusão em arquivos: uma função arquivística, informacional e comunicacional. Informação Arquivística, Rio de Janeiro, v. 4, n. 1, p. 98-118, 2015. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/41739. Acesso em: 04 jul. 2022.
http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapc...
) acerca da difusão dos arquivos como um ponto interdisciplinar entre áreas, especialmente a Ciência da Informação e a Comunicação, para refletir criticamente sobre os paradigmas e promover a disseminação e acesso à informação.

Há outros assuntos na bibliografia, como é o caso da publicação que versa sobre a construção de um museu digital11 11 Muitos projetos de abertura de dados na internet de grupos de pesquisa da Antropologia são chamados de museus virtuais ou museus digitais. Essa é uma apuração importante para a revisão de pesquisa feita com as delimitações escolhidas, porque, às vezes, não se utiliza termos como “base de dados” ou “repositórios digitais”. sobre o patrimônio imaterial africano e afro-brasileiro, projeto que começou em 1998, no antigo Centro de Estudos Afro-Asiáticos da Universidade Cândido Mendes no Rio de Janeiro a partir de um projeto chamado Fábrica de Ideias (SANSONE, 2013SANSONE, Livio. Challenges to digital patrimonialization: heritage. org/digital museum of african and Afro-Brazilian memory. Vibrant: Virtual Brazilian Anthropology, [S.l.], v. 10, n. 1, p. 343-386, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1809-43412013000100015. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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).12 12 Posteriormente, em 2002, a Fábrica de Ideias se tornou um Programa Permanente de Extensão em Pós-Graduação no Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia (UFBA). O site do projeto pode ser acessado em: www.museuafrodigital.ufba.br

Esse artigo recupera o histórico do projeto universitário que intentava acumular e comunicar documentos sobre as memórias negras no nosso país. Isso foi feito porque se constatou que instituições importantes, como o Arquivo Nacional do Brasil, não supriam a necessidade de permitir um acesso mais facilitado a documentos importantes para a memória dos negros no país e raramente criava ações de comunicação da existência desses acervos. Consequentemente, é uma pesquisa que complexifica a questão da custódia e da abertura de dados somente de instituições que possuem os direitos autorais das imagens, posto que propõe uma plataforma na web que misture dados oriundos de múltiplas regiões do Brasil para versar sobre o tema de estudo.

Não é trivial constatar que há uma conexão importante desse trabalho com uma publicação sobre o museu Afro-Digital (MAIA, 2018MAIA, Moacir Rodrigo de Castro. Museus brasileiros e a hiperconectividade: a experiência com a plataforma Tainacan no acesso ao patrimônio Afro-Digital. Revista Museu, [S.l.], 2018. Disponível em: https://www.revistamuseu.com.br/site/br/artigos/18-de-maio/18-maio-2018/4751- museus-brasileiros-ea-hiperconectividade-a-experiencia-com-a-plataforma-tainacan-noacesso-ao-patrimonio-afro-digital.html. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://www.revistamuseu.com.br/site/br/...
). Ela fala de um repositório sobre a cultura afro-brasileira que foi criado a partir de uma parceria com o Ministério da Cultura (MinC), a Universidade Federal de Goiás (UFG) e a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).13 13 O projeto pode ser acessado em: http://afro.culturadigital.br/ Assim como no caso anterior, o projeto reúne uma série de coleções de proveniências muito variadas para criar um repositório temático para fins de comunicação para pessoas interessadas nesse tema.

Isso também se assemelha às bibliografias criadas pelo grupo de pesquisa BIEV UFRGS (ECKERT; ROCHA, 2015ECKERT, Cornelia; ROCHA, Ana Luiza Carvalho da. A preeminência da imagem e do imaginário nos jogos da memória coletiva em coleções etnográficas. Brasília: ABA, 2015. v. 1; ROCHA; ECKERT, 2016) que trabalha com a criação de um repositório digital multimídia sobre Antropologia Urbana. Esse banco de imagens foi originado pela vontade de reunir e comunicar na internet documentos multimídia diversos sobre Porto Alegre, porquanto esses dados estavam fragmentados em diversas instituições e não estavam facilmente acessíveis. Paulatinamente, o grupo foi criando as suas próprias coleções feitas a partir de etnografias realizadas por muitos(as) pesquisadores(as), mas essa vontade de reunir documentos de diferentes lugares em uma plataforma digital sempre esteve presente.

De certa forma, essa discussão tem relação com um artigo sobre o projeto Language and Popular Culture in Africa (LPCA) (Língua e Cultura Popular na África) que possuía a intenção de criar um arquivo de textos das expressões populares da cultura africana (FABIAN, 2002FABIAN, Johannes. Virtual archives and ethnographic writing: commentary as a new genre? Current Anthropology, [S.l.], v. 43, n. 5, p. 775-786, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1086/342640. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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).14 14 O site pode ser visitado em: http://lpca.socsci.uva.nl/aps/index.html Basicamente, argumenta acerca de outras formas de escrita possíveis a partir da comunicação permitida por plataformas criadas na internet. Ele mostra alguns exemplos do que aconteceu com o arquivo que colocou em rede, mostrando como houve modificações na sua produção do conhecimento por causa dessa abertura do saber.

4.4 Especificidade dos dados multimídia da Antropologia Visual

Alguns dos materiais bibliográficos coletados abordaram a questão da Antropologia Visual, uma área que utiliza formas de registro visuais em pesquisas etnográficas realizadas com comunidades diversas, como recursos audiovisuais (ROUCH, 1974ROUCH, Jean. The camera and man. In: HOCKINGS, Paul (org.). Principles of visual anthropology. [S.l.]: Walter de Gruyter, [1974].), fotográficos (ACHUTTI, 1997ACHUTTI, Luiz Eduardo Robson. Fotoetnografia: um estudo antropológico visual sobre cotidiano, lixo e trabalho. Porto Alegre: Tomo Editorial, 1997.), sonoros (VEDANA, 2010VEDANA, Viviane. Territórios sonoros e ambiências: etnografia sonora e antropologia urbana. Revista Iluminuras, Porto Alegre, v. 11, n. 25, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.22456/1984-1191.15537. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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) e outros. É uma área em que profissionais da área da Antropologia e da Comunicação comumente trabalham juntos, criando produtos comunicacionais visuais sobre comunidades diversas de forma etnográfica.

Existe uma publicação feita por Macfarlane (2020MACFARLANE, Alan. Anthropology and the third information revolution. Visual Anthropology, [S.l.], v. 33, n. 3, p. 197-211, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.1080/08949468.2020.1746615. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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), um pesquisador sênior que tem 79 anos de idade no momento desta escrita. A idade dele é salientada porque o autor trabalhou com recursos digitais desde seus 18 anos na Universidade de Oxford, no ano de 1964, memória que ele traz na sua escrita para contar sobre como ele presenciou toda transformação dos recursos tecnológicos digitais.

Ele relembra toda transformação que foi acontecendo com o uso das tecnologias no campo da Antropologia Visual, mostrando a enorme dificuldade que era fazer e manter um acervo de etnografia audiovisual em campos como o Nepal, país onde ele trabalhou por muitos anos. Por isso, ele argumenta sobre a importância de manter o debate sobre as tecnologias nessa subárea, visto que a “Terceira Revolução da Informação” ainda está em curso, afetando a forma como se disponibilizam os materiais da Antropologia Visual. Dentro dessa revolução, Macfarlane (2020MACFARLANE, Alan. Anthropology and the third information revolution. Visual Anthropology, [S.l.], v. 33, n. 3, p. 197-211, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.1080/08949468.2020.1746615. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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) cita os repositórios digitais como uma das mais importantes questões contemporâneas para se debater.

Nesse sentido, foram encontrados dois textos de José da Silva Ribeiro (2007RIBEIRO, José da Silva; BAIRON, Sérgio. Antropologia visual e hipermedia. [S.l.: s.n.], 2007.; 2005) um pouco mais antigos do que o texto anteriormente citado. Esses textos da primeira década dos anos 2000, também tocam na questão dos repositórios digitais para dados de pesquisa da Antropologia Visual, utilizando muitas vezes o termo hipermídia para falar sobre essa questão. Não são obras que falam especificamente sobre repositórios digitais, uma vez que elas abordam questões generalizantes sobre a emergência do digital como algo propulsor para grandes modificações na produção nessa subárea de pesquisa.

4.5 Repositórios digitais para museus antropológicos

Algumas pesquisas falam especificamente sobre a criação de repositórios digitais para museus que possuem objetos de comunidades com as quais se faz pesquisa na Antropologia. Nesse sentido, as ações de abertura de dados se referem à preservação digital de metadados referentes a esses objetos, fotografias digitais dos mesmos ou representações feitas com escaneamento tridimensional. Nessa situação, debate-se as dimensões materiais e imateriais de trabalho desses documentos museológicos, uma vez que a curadoria e a contextualização dos objetos digitalizados são tão importantes quanto sua abertura irrestrita.

Isso pode ser visto em um artigo publicado por França (2019FRANÇA, Bianca. Acervos etnográficos do Museu Nacional: preservação digital como sugestão pós incêndio. Cadernos de Sociomuseologia, Lisboa, v. 58, n. 14, p. 107-128, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.36572/csm.2019.vol.58.05. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://doi.org/10.36572/csm.2019.vol.58...
) que se refere às políticas de preservação digital que já estavam sendo feitas antes do grande incêndio do Museu Nacional, em 2018, e que continuaram sendo realizadas apesar das grandes perdas que ocorreram. A autora detalha o que ela e outros profissionais estão fazendo nessa instituição nos últimos anos, mostrando como a questão da preservação digital também está aliada à qualificação dos acervos antropológicos que envolvem populações originárias do Brasil. Essa qualificação se refere a um processo de curadoria compartilhada entre indígenas e não-indígenas, incluindo, agora, os processos digitais (FRANÇA, 2019FRANÇA, Bianca. Acervos etnográficos do Museu Nacional: preservação digital como sugestão pós incêndio. Cadernos de Sociomuseologia, Lisboa, v. 58, n. 14, p. 107-128, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.36572/csm.2019.vol.58.05. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://doi.org/10.36572/csm.2019.vol.58...
), um ponto que foi trazido inúmeras vezes em outros grupos.

Outro trabalho se refere ao Museu do Índio (MARTINS; CARMO; GERMANI, 2018MARTINS, Dalton Lopes; CARMO, Danielle; GERMANI, Leonardo Barbosa. Museu do Índio: Estudo de caso do processo de migração e abertura dos dados ligados semânticos do acervo museológico com o software livre Tainacan. Informação & Tecnologia, [S.l.], v. 5, n. 2, p. 142-162, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.22478/ufpb.2358- 3908.2018v5n2.44590. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://doi.org/10.22478/ufpb.2358- 3908...
). Foi publicado por profissionais que trabalharam com a criação do Tainacan, um software livre feito para criação de repositórios digitais na internet que oferece uma solução brasileira para instituições culturais ou grupos em geral que possuem coleções multimídia. Essa publicação analisa e reporta a migração da documentação do acervo museológico do Museu do Índio para o Tainacan após a realização de um diagnóstico dos problemas informacionais existentes nas bases de dados trabalhadas.

Não se trata de uma obra que aborda questões interdisciplinares mais profundas, mas não deixa de ter uma importância muito grande, dado que foram encontrados muitos problemas técnicos sintáticos que precisavam de normalização, de reconciliação e de desambiguação. Além disso, utilizou-se a plataforma Wikidata para registrar as nomenclaturas indígenas que existem nessa base de dados, uma vez que muitas não possuíam um registro específico para que fossem utilizadas de forma interoperável no futuro. Como se pode ver nesta revisão, são poucas as bibliografias que realmente fazem um diagnóstico das bases de dados e oferecem soluções, um dos grandes problemas da produção nessa área.

5 ANÁLISE DOS RESULTADOS

Após essa exposição sumária dos materiais bibliográficos coletados, é possível perceber algumas conclusões referentes ao estado da arte da produção acadêmica escrita acerca dos dados abertos antropológicos e dos repositórios digitais para esse tipo de informação.

Primeiramente, é importante notar que a maioria das produções se situam na década de 2010, principalmente nos últimos cinco anos. Apenas quatro produções foram localizadas na primeira década dos anos 2000 e somente seis bibliografias foram publicadas entre 2010 e 2015, o que mostra que quinze publicações foram localizadas entre 2016 e 2020. Isso explicita que o número de publicações sobre essa área temática vem crescendo, o que é compatível com o aumento do número de produções bibliográficas na área dos dados abertos de pesquisa (SILVEIRA et al., 2021SILVEIRA, Lúcia da; RIBEIRO, Nivaldo Calixto; SANTOS, Sarah Rúbia de Oliveira; SILVA, Fernanda Mirelle de Almeida; SILVA, Fabiano Couto Corrêa da; CAREGNATO, Sônia Elisa; OLIVEIRA, Adriana Carla Silva de; OLIVEIRA, Dalgiza Andrade; GARCIA, Joana Coeli Ribeiro; ARAUJO, Ronaldo Ferreira. Ciência aberta na perspectiva de especialistas brasileiros: proposta de taxonomia: propuesta de taxonomía. Encontros Bibli: revista eletrônica de biblioteconomia e ciência da informação, Florianópolis, v. 26, p. 1-27, 2021. Disponível em: https://doi.org/10.5007/1518-2924.2021.e79646. Acesso em: 08 de dez. 2021.
https://doi.org/10.5007/1518-2924.2021.e...
).

Contudo, a análise demonstrou que existem projetos que não foram mapeados na revisão. A publicação de Murillo (2018MURILLO, Luis Felipe Rosado. What does “open data” mean for ethnographic research? American Anthropologist, [S.l.], v. 120, n. 3, p. 577-582, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1111/aman.13088. Acesso em: 03 de dez. 2021.
https://doi.org/10.1111/aman.13088...
) menciona alguns projetos bem importantes no cenário internacional como o Digital Himalaya, da Universidade de Cambridge, o Murkurtu, da Universidade Estadual de Washington e o ArchEthno, do Observatoire des Humanités Numérique da França.15 15 Esse é um caso específico pelo fato de existirem escritas em francês sobre esse projeto. Pesquisou-se sobre esses projetos e foi possível constatar que, em alguns casos, existem trabalhos sobre essas bases de dados, mas eles não usam os termos “dados abertos” e “repositórios digitais” - o que mostra que a Antropologia vem abrindo os seus dados por outras vias, com pouco diálogo com os profissionais da área da ciência aberta.

Healy (2004HEALY, Jessica de Largy. Do trabalho de campo ao arquivo digital: performance, interação e Terra de Arnhem, Austrália. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, v. 10, p. 67-95, 2004. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ha/a/gzTF8N3BjYQr8cfYZ3sNLKw/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 03 de dez. 2021.
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) também menciona várias pessoas que estavam trabalhando com isso entre 1990-2010, como a antropóloga Bárbara Glowczewski que foi uma das grandes referências em torno da construção de arquivos na web sobre e com as populações originárias da Austrália. Existem muitas publicações dessa antropóloga acerca da restituição de coleções etnográficas multimídia na internet, mas nenhum trabalho dessa autora utiliza os termos empregados nesta revisão. Aqui, deve-se atentar que são produções relevantes, mas situadas em um tempo em que a discussão era outra.

Essas produções precisam ser consideradas principalmente por se referirem a dados multimídia ligados à área da Antropologia Visual e da Imagem, o que complexifica a construção de ações para abertura dessa ciência. Como exemplo de projetos importantes no Brasil que não foram mapeados, pode-se mencionar o projeto Vídeo nas Aldeias (VNA)16 16 O VNA é um projeto que foi iniciado em 1986 através de uma ONG chamada Centro de Trabalho Indigenista e tinha como atividade principal a formação de diretores cinematográficos indígenas para que eles próprios retratassem a sua realidade. Atualmente, o VNA possui um site que contém os audiovisuais que produziram ao longo de todos esses anos (http://www.videonasaldeias.org.br/ ) e está produzindo um acervo virtual com o software livre Tainacan (https://tainacan.org/blog/casos-de-uso/acervo-video-nas-aldeias/ ). e o repositório digital do Laboratório de Imagem e Som em Antropologia (LISA) da Universidade de São Paulo (USP).17 17 O Lisa é um grupo de pesquisa histórico na área da Antropologia Visual brasileira. Seu repositório possui quase dois mil documentos audiovisuais, vinte e quatro mil e quinhentas imagens e em torno de 700 horas de registros sonoros. Não é trivial notar que há poucos estudos mapeados da Antropologia Visual no grupo 04 e, ao mesmo tempo, várias tentativas de abertura de dados antropológicos brasileiros nesse campo.

Além disso, verificou-se que alguns desses projetos não utilizam o termo “anthropology” ou “antropologia” na sua escrita, visto que se tratam de bases de dados feitas por pesquisadores de outras áreas, como os Religious Studies (Ciência da Religião) ou os Cultural Studies (Estudos Culturais). Aqui, interpreta-se que esse é um problema da fragmentação dos saberes no campo acadêmico (MORIN, 2007MORIN, Edgar; LISBOA, Eliane. Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Sulina, 2007.), dado que conexões inerentes existem entre as disciplinas mencionadas e a Antropologia. Essa é outra constatação encontrada acerca dos desafios de se fazer revisão de literatura sobre essa temática de estudo, porque deve haver uma reflexão mais ampla sobre o que pode ser considerado como dados antropológicos.

Ainda, algo que consta na maioria das produções é um grande receio dos(as) pesquisadores(as) da área em aderir às políticas e modelos atuais para dados abertos de pesquisa. Os únicos escritos que não possuem esse receio são feitos de forma mais disciplinar, principalmente por profissionais da área da informação. Nesses casos mais disciplinares, há uma preocupação na especificidade temática desse tipo de dado, o que geraria pesquisas sobre a construção de metainformação específica, por exemplo. Contudo, os autores desses trabalhos se mostram pouco preocupados com a dimensão comunicacional e relacional inerente aos dados etnográficos, assim como não consideram a necessidade de processos de gerenciamento específicos no caso de dados sensíveis.

Logo, é possível constatar que a grande maioria das produções que foram feitas junto de antropólogos(as) mostra essa consternação. Não é possível discutir políticas de ciência aberta nesta área sem que se considere a eticidade da abertura e os impactos sociais possíveis às comunidades envolvidas nas etnografias realizadas - o que pode ser visto principalmente no grupo 1 e no grupo 3 desta revisão.

Além disso, foi possível perceber que a literatura dessa área temática é ainda pouco desenvolvida em português. Somente oito das vinte e cinco obras foram produzidas na nossa língua, o que mostra que esse aprofundamento do debate sobre os dados antropológicos tem sido feito mais no cenário internacional do que no nacional. Essa é uma observação que está correlacionada com o avanço ainda lento na consolidação de repositórios digitais para dados de pesquisas brasileiras, fenômeno que foi visto de forma geral pelo relatório do RDP Brasil (PAVÃO et al., 2018PAVÃO, Caterina Marta Groposo; GABRIEL JUNIOR, Rene Faustino; ROCHA, Rafael Port da. Proposta de criação de uma rede de dados abertos da pesquisa brasileira. Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da Informação, Campinas, v. 16, n. 2, p. 329-343, 2018.; VANZ et al., 2018VANZ, Samile Andrea de Souza; PASSOS, Paula Caroline Schifino Jardim; CAREGNATO, Sônia Elisa; PAVÃO, Caterina Groposo; BORGES, Nunes Borges; ROCHA, Rafael Port da; GABRIEL JUNIOR, Rene Faustino; AZAMBUJA, Luís Alberto Barbosa. Acesso aberto a dados de pesquisa no Brasil: práticas e percepções dos pesquisadores: relatório 2018. Porto Alegre: UFRGS, 2018. Disponível em: http://hdl.handle.net/10183/185195. Acesso em: 02 de dez. 2021.
http://hdl.handle.net/10183/185195...
).

6 CONCLUSÃO

Após essa exposição sumária dos trabalhos e da análise feita a partir do material coletado, fica claro que existe uma lacuna importante de pesquisa dentro do campo de estudos da ciência aberta em relação às humanas. Devido à existência de diferentes áreas no grande guarda-chuva que são as humanidades, ou as chamadas Ciências Sociais, foi feita uma revisão específica sobre a Antropologia e, como visto ao longo do artigo, fica claro que existem problemas importantes para desenvolvimento de políticas em torno dos seus dados brutos.

Uma das principais conclusões é que existe uma questão ética extremamente importante que deve ser considerada, dimensão relacional que não existe em dados de pesquisa que não envolvem diretamente a vida de pessoas e comunidades. Há décadas, várias pessoas importantes da Antropologia se debruçaram sobre o tema da eticidade da pesquisa acadêmica e da necessidade de restituir o conhecimento produzido de alguma forma aos colaboradores(as) das etnografias. Como visto na recuperação histórica da disciplina, existe uma resignação muito grande em relação ao período dos “antropólogos de gabinete” que falavam sobre as alteridades estudadas de forma verticalizada e pouco dialogada, muitas vezes através de dados de terceiros sem nenhum trabalho de campo para e com essas comunidades.

A partir da revisão de literatura, fica evidente que essa consternação aparece de diferentes formas nas produções encontradas. Uma delas se mostra claramente no grupo dois em uma interface profícua entre o campo da Ciência da Informação e a Antropologia, uma vez que o próprio tratamento informacional dos dados de pesquisa pode ser pensado em interfaces mais relacionais com as comunidades com as quais se trabalha. Se alguns escritos enfatizam a necessidade de metadados específicos para dar conta da diversidade cultural existente, outros vão mais a fundo na discussão e percebem que a própria descrição documental poderia ser feita em colaboração com esses agrupamentos - o que tornaria o trabalho mais transdisciplinar.

Por outro lado, essa preocupação também se mostra pelo lado da comunicação dos dados de pesquisa no sentido de perceber como esses documentos podem ser reutilizados. Nesse sentido, percebe-se que a comunicação dos dados antropológicos nem sempre almeja alcançar o maior número possível de pessoas em uma missão educacional em torno de algum tema, mas também pode servir como uma forma de alcançar um público muito específico que está altamente interessado nessas pesquisas. Essa conclusão ficou clara em inúmeras publicações relatadas, como sobre os dados relacionados com questões linguísticas de povos originários e sobre o repositório indígena de plantas e alimentos ancestrais.

Por fim, e talvez a conclusão mais importante do artigo, percebe-se que existem inúmeras publicações sobre a questão de abertura de dados etnográficos e antropológicos, mas muitas delas ainda não se relacionam com o campo da ciência aberta, o que fica evidente a partir do grupo quatro e do grupo cinco da revisão. Isso mostra que o diálogo entre os diferentes profissionais da área ainda é estreito de ambos os lados: do lado da Antropologia, há uma dificuldade muito grande de entender as questões de preservação e abertura de documentos; do lado da Ciência da Informação, existem barreiras em relação à particularidade de certos dados de pesquisa das humanidades. Ainda nos falta a possibilidade de encontrar um caminho do meio que seja mais inter ou transdisciplinar.

Dessa forma, conclui-se que é necessário desenvolvimento e inovação tecnológica em relação a repositórios digitais específicos à Antropologia Social. Existem inúmeros desafios éticos a serem solucionados, como a questão da preservação de coleções “culturalmente sensíveis” e a abertura do conhecimento feita de forma colaborativa para e com as pessoas etnografadas. Além disso, deve-se considerar que esses dados são inúmeras vezes pertencentes a um tipo de “produção cultural” em diálogo com as áreas da Comunicação, como documentários audiovisuais, ensaios fotográficos e registros sonoros, ou com a Museologia no caso de artefatos que podem ser digitalizados para abertura do saber. Logo, existe uma complexidade de formatos de dados que também deve ser levada em consideração.

Uma das maiores conclusões se refere à necessidade de pensar a partir da complexidade, o que pode ser alcançado através de relações entre profissionais de diferentes áreas, como a Antropologia, a Ciência da Informação, a Comunicação e a Museologia. Desta forma, diversos saberes podem colaborar conjuntamente para solucionar esses inúmeros problemas e, assim, ter-se políticas públicas efetivas que gerem uma abertura do conhecimento mais ética e duradoura.

AGRADECIMENTOS

Agradecimentos especiais ao Banco de Imagens e Efeitos Visuais (BIEV) e ao Núcleo de Pesquisa em Arquivamento da Web e Preservação Digital (NUAWEB) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul por terem acolhido uma proposta interdisciplinar de produção do conhecimento.

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  • VELHO, Gilberto. Um antropólogo na cidade: ensaios de antropologia urbana. Rio de Janeiro: Editora Schwarcz-Companhia das Letras, 2013.
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    » https://www.nature.com/articles/sdata201618?ref=https://githubhelp.com
  • CONJUNTO DE DADOS DE PESQUISA

    Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
  • FINANCIAMENTO

    A pesquisa foi feita a partir de uma bolsa de mestrado concedida pela CAPES ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
  • LICENÇA DE USO

    Os autores cedem à Encontros Bibli os direitos exclusivos de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Licença Creative Commons Attribution (CC BY) 4.0 International. Estra licença permite que terceiros remixem, adaptem e criem a partir do trabalho publicado, atribuindo o devido crédito de autoria e publicação inicial neste periódico. Os autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada neste periódico (ex.: publicar em repositório institucional, em site pessoal, publicar uma tradução, ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial neste periódico.
  • PUBLISHER

    Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação. Publicação no Portal de Periódicos UFSC . As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade.
  • 1
    Existem outros campos como a Antropologia Física (também chamada de Antropologia Biológica ou Bioantropologia) e a Paleoantropologia (área da Arqueologia que estuda a evolução da espécie humana) que possuem outras abordagens teórico-metodológicas. Esses campos não foram considerados.
  • 2
    É importante salientar que o relatório mapeou três repositórios de dados das Ciências Sociais de forma geral. Contudo, pode-se perceber que, majoritariamente, os repositórios mencionados possuem mais dados quantitativos (que são minoritários em vários campos de humanas) ou não possuem quantidade suficiente de dados dos processos intermediários das pesquisas (como o Ibict Dataverse Network e a Base de Dados Científicos da Universidade Federal do Paraná).
  • 3
    Um dos atos fundadores desse tipo de pesquisa foi o trabalho de Bronisław Malinowski (1922) sobre os grupos que viviam nas Ilhas Trobriand, um arquipélago próximo à Nova Guiné, em que ele relatou longamente como funcionava a economia dessas comunidades.
  • 4
    Pode-se aprofundar essa discussão através de textos brasileiros como “A Antropologia como Ciência Social no Brasil” de Mariza Peirano (2000).
  • 5
    Alteridades radicais é um conceito que se refere a comunidades que possuem uma forma de vida e de conhecimento radicalmente diferente dos pesquisadores hegemônicos das universidades ocidentais.
  • 6
    Para Mariza Peirano, alteridades próximas são grupos que podem ser estudados e que estão muito perto do pesquisador, mas onde ainda há certa diferença cultural. Um exemplo é o próprio caso do antropólogo Gilberto Velho que estudava diferentes grupos urbanos da sua própria cidade, o Rio de Janeiro. Claramente, a questão de ser próximo ou não depende de quem o pesquisador é e de quais as suas origens antes de entrar no setor de pesquisa. Por outro lado, alteridades mínimas são grupos sociais que estão colados no pesquisador ou que fazem parte da sua formação enquanto pessoa. Nesse sentido, esse grupo abriga pesquisadores estudando sua própria disciplina acadêmica, seu próprio grupo de pesquisa ou sua comunidade de origem antes de entrar na academia
  • 7
    Atualmente, o Native Title Research and Access Service possui um site em parceria com o Instituto Australiano dos Estudos Aborígenes e das Ilhas de Torres (AIATSIS) onde comunica quais são os serviços prestados e quais arquivos eles possuem. O site pode ser acessado em: https://aiatsis.gov.au/research/native-title-research-and-access-service.
  • 8
    Para saber mais, acesse: https://rd-alliance.org/
  • 9
    Com apoio da Wenner-Gren Foundation, a CoPAR realizou workshops para: 1) instituir um programa educacional; 2) desenvolver uma padronização para descrição dos registros antropológicos. Interessante perceber que, aqui, a intenção é educar, já que os antropólogos não sabiam dos problemas de preservação e acesso.
  • 10
    A Antropologia Cultural é uma área da Antropologia que é próxima da Antropologia Social, diferente da Antropologia Biológica, por exemplo. Por isso, esse estudo foi mantido na revisão de literatura.
  • 11
    Muitos projetos de abertura de dados na internet de grupos de pesquisa da Antropologia são chamados de museus virtuais ou museus digitais. Essa é uma apuração importante para a revisão de pesquisa feita com as delimitações escolhidas, porque, às vezes, não se utiliza termos como “base de dados” ou “repositórios digitais”.
  • 12
    Posteriormente, em 2002, a Fábrica de Ideias se tornou um Programa Permanente de Extensão em Pós-Graduação no Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia (UFBA). O site do projeto pode ser acessado em: www.museuafrodigital.ufba.br
  • 13
    O projeto pode ser acessado em: http://afro.culturadigital.br/
  • 14
    O site pode ser visitado em: http://lpca.socsci.uva.nl/aps/index.html
  • 15
    Esse é um caso específico pelo fato de existirem escritas em francês sobre esse projeto.
  • 16
    O VNA é um projeto que foi iniciado em 1986 através de uma ONG chamada Centro de Trabalho Indigenista e tinha como atividade principal a formação de diretores cinematográficos indígenas para que eles próprios retratassem a sua realidade. Atualmente, o VNA possui um site que contém os audiovisuais que produziram ao longo de todos esses anos (http://www.videonasaldeias.org.br/ ) e está produzindo um acervo virtual com o software livre Tainacan (https://tainacan.org/blog/casos-de-uso/acervo-video-nas-aldeias/ ).
  • 17
    O Lisa é um grupo de pesquisa histórico na área da Antropologia Visual brasileira. Seu repositório possui quase dois mil documentos audiovisuais, vinte e quatro mil e quinhentas imagens e em torno de 700 horas de registros sonoros.

EDITORES

Edgar Bisset Alvarez, Ana Clara Cândido, Patrícia Neubert, Genilson Geraldo, Mayara Madeira Trevisol, Jônatas Edison da Silva, Camila Letícia Melo Furtado e Beatriz Tarré Alonso.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    11 Jul 2022
  • Aceito
    20 Mar 2023
  • Publicado
    10 Abr 2023
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