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AS FORMAS DE RESISTÊNCIA À CENSURA AOS LIVROS NA ATUALIDADE

Current forms of resistance to book censorship

RESUMO

Objetivo:

Este texto tem como objetivo apresentar e refletir sobre os movimentos de censura aos livros nos últimos anos e as ações de resistências, nacionais e internacionais, com vistas a alertar a comunidade bibliotecária não apenas para as ações de censura, mas também de resistência e enfrentamento necessárias, sobretudo nos últimos anos.

Método:

Adotamos um estudo exploratório e de abordagem qualitativa, alicerçado na perspectiva teórico-metodológica de Michel Foucault, observando os enunciados de reportagens com a temática de censura relacionadas aos livros e às bibliotecas. O corpus de análise abrangeu notícias vinculadas na mídia nacional e internacional no período de 2020 a 2022.

Resultado:

Com o levantamento, apresentamos os casos de censuras que ocorreram no Kuwait, Estados Unidos e Brasil. Observamos a existência tanto de censura prévia aos livros quanto de ações que envolvem a retirada de obras já disponíveis em bibliotecas, em especial, escolares e públicas, por exigência de parte de suas comunidades. Diante do que compilamos e refletimos, listamos dez formas de resistência à censura aos livros e às demais produções bibliográficas na atualidade.

Conclusões:

Apesar de constantes ataques à liberdade de expressão e de pensamento, como ao livro que se deseja ler, diferentes ações de resistência e enfrentamentos podem ser vistas, seja por meio das comunidades locais que se unem para proteger as obras e as bibliotecas, seja de profissionais e organizações ligadas à comunidade bibliotecária que tem sido incansáveis na luta e na preservação de direitos. Ressaltamos a importância da imprensa livre e independente como pilar da democracia e a necessidade de união e fortalecimento dos vínculos entre bibliotecas, suas comunidades e a área da Biblioteconomia para que ações de censura sejam denunciadas e combatidas.

PALAVRAS-CHAVE:
Resistência; Kuwait; Estados Unidos; Brasil

ABSTRACT

Objective:

This study reflects on recent movements for book censorship and on acts of resistance both at home and abroad with a view to raise awareness in the librarian community not only to acts of censorship but also to necessary action to confront and resist them.

Method:

This is an exploratory study with a qualitative approach based on Michel Foucault's theoretical-methodological perspective. It focuses on statements found in reports on book and library-related censorship. The analyzed corpus consists of news articles from national and international media from the years 2020 through 2022.

Result:

Our survey presents cases of censorship from Kuwait, the United States, and Brazil. We noticed censorship both prior to a book launch as well as the banning of books already available in libraries, particularly school and public libraries, as demanded by a segment of the local community. In view of the accounts we gathered and reflected on, we list ten forms of resistance to the current censorship of books and other bibliographic productions.

Conclusions:

Despite constant attacks on freedom of expression and thought, such as on books one might wish to read, different acts of resistance and confrontation can be observed. Either by local communities that unite to protect libraries and the books therein, or by professionals and organizations linked to the librarian community that have been tireless in the fight for the preservation of rights. We highlight the importance of a free and independent press as a pillar of democracy as well as the need for unity and for a strengthening of the bonds between libraries, their communities, and the field of Library Science so that acts of censorship be denounced and fought against.

KEYWORDS:
Censorship; Resistance; Kuwait; United States; Brazil

1 INTRODUÇÃO

Les livres ont les mêmes ennemis que l'homme : le feu, l'humide, les bêtes, le temps, et leur propre contenu.

Paul Valery in "Tel Quel" (1941)

Na Library Bill of Rights, da American Library Association (1939)AMERICAN LIBRARY ASSOCIATION (ALA). Library Bill of Rights. Chicago, 1939. Disponível em: https://www.ala.org/advocacy/intfreedom/librarybill. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://www.ala.org/advocacy/intfreedom/...
, já se afirmava que “as bibliotecas devem desafiar a censura no cumprimento de sua responsabilidade de fornecer informação e esclarecimento.” Desde então, esse ideal foi ratificado pela International Federation of Library Associations and Institutions (IFLA) no IFLA Statement on Libraries and Intellectual Freedom (1999)INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA). Statement on Libraries and Intellectual Freedom. 1999. Disponível em: https://repository.ifla.org/bitstream/123456789/1424/1/ifla-statement-on-libraries-and-intellectual-freedom-en.pdf. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://repository.ifla.org/bitstream/12...
e recentemente com o IFLA Statement on Censorship (2019aINTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA). IFLA Statement on Censorship. Haia: IFLA, 2019a. Disponível em: https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/files/assets/faife/statements/ifla_statement_on_censorship.pdf. Acesso em: 31 jul. 2022.
https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/...
), inclusive no Código de Ética e Deontologia do Bibliotecário brasileiro, do Conselho Federal de Biblioteconomia (2018)CONSELHO FEDERAL DE BIBLIOTECONOMIA (CFB). Resolução CFB n. 2007 de 2018. Aprova o Código de Ética e Deontologia do Bibliotecário brasileiro, que fixa as normas orientadoras de conduta no exercício de suas atividades profissionais. Disponível em: http://repositorio.cfb.org.br/handle/123456789/1330. Acesso em: 21 jul. 2022.
http://repositorio.cfb.org.br/handle/123...
. O repúdio à censura, a garantia de acesso aos livros e às demais produções bibliográficas e a liberdade intelectual são valores da classe bibliotecária que devem ser defendidos, tão mais em tempos que grupos conservadores e reacionários passam a ocupar espaços de poder e forçam iniciativas contrárias ao interesse público, ou ainda em desfavor de grupos minoritariamente representados politicamente.

Considerando a questão: “como a sociedade tem sofrido e atuado em relação ao movimento de censura aos livros?” Este ensaio tem como objetivo apresentar e refletir sobre os movimentos de censura aos livros nos últimos anos e as ações de resistências, nacionais e internacionais. Nossa expectativa é chamar a atenção da comunidade bibliotecária para as ações de censura atuais e mostrar caminhos de resistência e enfrentamento em tempos de agenciamentos religiosos, políticos e ideológicos que prezam pelo descaso e pela destruição de instituições culturais promotoras da inclusão, do pensamento crítico e da cidadania. Assim, ratificamos a compressão de Manguel (2006MANGUEL, A. The Library at night. Yale: Yale University Press, 2006., p. 108, tradução nossa), ao pontuar que “o ato de ler corre sempre em paralelo com o da censura”, onde há um, tende a ter o outro.

Nesses termos, consideramos os livros como dispositivos capazes de transformar subjetividades, educar, promover cidadania e compreensão do mundo, e não apenas um meio de armazenamento, transmissão e circulação de textos. Objetos cuja produção e circulação possibilitam disseminar conhecimentos, impelir seus leitores para ação e transformação social e cultural. Nesse contexto, Chartier (1998CHARTIER, R. A aventura do livro: do leitor ao navegador. Tradução Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo: Editora UNESP, 1998., p.23) já indicava que “a cultura escrita é inseparável dos gestos violentos que a reprimem. Antes mesmo que fosse reconhecido o direito do autor sobre sua obra, a primeira afirmação de sua identidade esteve ligada à censura e à interdição dos textos tidos como subversivos pelas autoridades religiosas ou políticas”. Ademais, o historiador pondera que “o direito de exercer a censura e a definição daquilo sobre o que ela deve ser exercida são sempre objeto de rivalidades agudas, muito reveladoras das tensões sócio-políticas que marcam uma sociedade em um momento dado de sua história” (CHARTIER, 1998CHARTIER, R. A aventura do livro: do leitor ao navegador. Tradução Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo: Editora UNESP, 1998., p. 36). Portanto, alteram-se com o tempo e nas mãos de quem detém o poder.

A seguir, apresentamos uma breve contextualização de pesquisas brasileiras sobre a censura desenvolvidas no contexto da Biblioteconomia. Em seguida, em “A forma da pesquisa e a compreensão de resistência”, especificamos a nossa abordagem para analisar as formas de resistência à censura aos livros. Depois, em “As formas da censura na contemporaneidade”, descrevemos alguns casos de censura em âmbito nacional e internacional, noticiados recentemente; já em “As formas de resistir”, trazemos alguns recursos que podem orientar os profissionais bibliotecários na resistência à censura e enumeramos dez formas de resistência à censura aos livros, abordadas no decorrer deste ensaio. E, por fim, reforçamos a importância de lutarmos contra a censura e suas novas formas, possibilitadas pela internet e pelos algoritmos.

2 A CENSURA NO CONTEXTO DA BIBLIOTECONOMIA

Tema tão antigo quanto pouco abordado na Biblioteconomia brasileira, por vezes relegado ou mesmo silenciado, a censura aos livros e aos demais itens bibliográficos, volta a chamar atenção nas pesquisas científicas e no debate público nos últimos anos. Sobre isso, Briquet de Lemos já indicava em 1979 que, no Brasil, a censura no contexto das bibliotecas é tão antiga que se confunde com a história da censura em Portugal, como podemos observar no "Estatuto da Real Biblioteca do Rio de Janeiro" de 1821.

No levantamento na Base de Dados em Ciência da Informação (BRAPCI), empreendido por Cavalcanti, Pajeú e Bufrem (2022CAVALCANTI, M. M.; PAJEÚ, H. M.; BUFREM, L. S. Produção científica brasileira em ciência da informação acerca do tema censura: uma aproximação temática. Informação & Informação, Londrina, v. 27, n. 1, p. 301-319, 2022. Disponível em: https://www.uel.br/revistas/uel/index.php/informacao/article/view/44825. Acesso em: 28 jun. 2022.
https://www.uel.br/revistas/uel/index.ph...
), entre 1972 e 2019, apenas 36 artigos foram publicados sobre o tema, relacionando questões ligadas à ditadura militar, ao cerceamento e à repressão a objetos, sujeitos e instituições, e temas como desinformação, gênero e sexualidade, com destaque para a última década.

Para Briquet de Lemos (1979),

[...] censura não é apenas aquela ideia vulgar que se tem sobre a proibição de circulação de determinadas obras. Censura é também discriminar leitores seja pela idade, seja pelo grau de escolaridade, seja porque não traz um documento que comprove a residência ou de que existe como cidadão fichado e numerado (BRIQUET DE LEMOS, 1979BRIQUET DE LEMOS, A. A. Qual a importância da censura nas bibliotecas brasileiras. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAÇÃO, 10., 1979, Curitiba. Anais [...]. FEBAB: Curitiba, 1979. Disponível em: http://repositorio.febab.org.br/items/show/2038. Acesso em 20 jul. 2022.
http://repositorio.febab.org.br/items/sh...
, p. 1160).

As formas da censura são abordadas por Oliveira e Castro (2017OLIVEIRA, A. N.; CASTRO, J. L. Entre a censura e a disseminação: uma análise crítica sobre a prática profissional bibliotecária fundada na emancipação de informação e dignidade humana. Páginas A&B, Arquivos e Bibliotecas, Porto, n. 7, p. 31-50, 2017. Disponível em: https://ojs.letras.up.pt/index.php/paginasaeb/article/view/2837. Acesso em: 28 jun. 2022.
https://ojs.letras.up.pt/index.php/pagin...
) que mapeiam: a censura prévia, a censura punitiva, a autocensura ou censura interna e a censura burocrática. Já no apêndice da IFLA Statement on Censorship (2019b)INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA). ANNEX 2: Censorship in Practice. In: IFLA Statement on Censorship. Haia: IFLA, 2019b. Disponível em: https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/files/assets/faife/statements/ifla_statement_on_censorship_annex_1_sources.pdf. Acesso em: 31 jul. 2022.
https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/...
, são listados alguns exemplos de censura:

  • A queima de livros ou a colocação de seus títulos em uma lista “proibida”, na medida em que tais práticas resultam em acesso reduzido a tais obras

  • A prisão, o assassinato ou o silenciamento de jornalistas, na medida em que os jornalistas são imediatamente associados aos fatos que relatam ou comentam

  • A proibição de “notícias falsas” como pretexto para a supressão da dissidência política

  • O uso de zero-rating ou outras formas de não neutralidade da Internet, na medida em que reduz o acesso a conteúdo não privilegiado

  • A proibição da apresentação de certas peças em teatros ou filmes em cinemas, ou a transmissão de determinados programas na televisão por motivos políticos

  • A filtragem ampla ou de longo prazo dos resultados de pesquisa na Internet ou o bloqueio ativo de outra forma de acesso a conteúdo da Internet ou ferramentas de pesquisa por motivos políticos

  • Apreensão de conteúdo politicamente contestável em um posto alfandegário de fronteira

  • A remoção de livros moralmente, religiosamente ou politicamente contestáveis das coleções da biblioteca

  • A remoção de passagens ou ilustrações de livros publicados por motivos políticos ou religiosos

  • A remoção de artigos de conjuntos de revistas científicas ou acadêmicas que seriam inconvenientes para um governo em um determinado mercado

  • O abuso de direitos autorais para evitar críticas negativas. IFLA 2019bINTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA). ANNEX 2: Censorship in Practice. In: IFLA Statement on Censorship. Haia: IFLA, 2019b. Disponível em: https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/files/assets/faife/statements/ifla_statement_on_censorship_annex_1_sources.pdf. Acesso em: 31 jul. 2022.
    https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/...
    , p. 3, tradução nossa).

Além desses exemplos, é pontuado, pela IFLA (2019a)INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA). IFLA Statement on Censorship. Haia: IFLA, 2019a. Disponível em: https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/files/assets/faife/statements/ifla_statement_on_censorship.pdf. Acesso em: 31 jul. 2022.
https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/...
, um caso ambíguo de censura na contemporaneidade, o “direito ao esquecimento”, que tanto é uma filtragem de informações quanto um direito legítimo: o da privacidade. Sobre isso, recentemente uma decisão da Terceira Turma do Supremo Tribunal de Justiça (STF)1 1 Disponível em: STF conclui que direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal.TJRJ, Rio de Janeiro, 12 fev. 2021. Disponível em: https://www.tjrj.jus.br/web/portal-conhecimento/noticias/noticia/-/visualizar-conteudo/5736540/7874238. Acesso em 01 out. 2022. , no Brasil, estabeleceu que o direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal, sendo que cada caso deve ser analisado individualmente pelas instâncias jurídicas competentes.

A problematização da censura e a seleção de materiais em bibliotecas foi objeto de questionamento de Vergueiro (1987VERGUEIRO, W. C. S. Censura e seleção de materiais em bibliotecas: o despreparo dos bibliotecários brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 16, n. 1, 1987. Disponível em: https://revista.ibict.br/ciinf/article/view/266. Acesso em: 28 jun. 2022.
https://revista.ibict.br/ciinf/article/v...
), que indicava as dificuldades dos bibliotecários em agir contra as pressões governamentais, de associações, ou indivíduos, quando exigem a retirada da coleção ou de circulação de obras cujos conceitos discordam; ou até do próprio profissional de refrear sua tendência de formar as coleções com obras que corroboram com sua visão de mundo. Para o autor, a censura pode ser exercida em termos políticos, religiosos ou morais, definindo a censura nas bibliotecas como

[...] a rejeição por uma autoridade bibliotecária de um livro (ou outro material) sobre o qual o bibliotecário, a Comissão de Biblioteca ou alguma outra pessoa (pessoas) exercendo pressão sobre eles afirma ser obsceno, perigosamente radical, subversivo ou muito crítico aos costumes (VERGUEIRO, 1987VERGUEIRO, W. C. S. Censura e seleção de materiais em bibliotecas: o despreparo dos bibliotecários brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 16, n. 1, 1987. Disponível em: https://revista.ibict.br/ciinf/article/view/266. Acesso em: 28 jun. 2022.
https://revista.ibict.br/ciinf/article/v...
, p. 22).

Pereira (2020PEREIRA, L. K. O index de Rondônia e o que nós, bibliotecárias(os), temos a ver com isso. Biblioo, 27 fev.2020. Disponível em: https://biblioo.info/o-index-de-rondonia-e-o-que-nos-bibliotecariasos-temos-a-ver-com-isso/. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://biblioo.info/o-index-de-rondonia...
) retoma alguns episódios contemporâneos de censura nas bibliotecas brasileiras afirmando que

seja na ficção, seja na história, a censura segue um mesmo modus operandi: o censor tem seus motivos e explicações, sempre imbuído da posição de salvador e protetor. Ora é a religião que se sente ameaçada, ora é a moral. E quanto mais se cultua a se admira a atividade do censor, mais a censura se propaga e se manifesta em diferentes escalas (PEREIRA, 2020PEREIRA, L. K. O index de Rondônia e o que nós, bibliotecárias(os), temos a ver com isso. Biblioo, 27 fev.2020. Disponível em: https://biblioo.info/o-index-de-rondonia-e-o-que-nos-bibliotecariasos-temos-a-ver-com-isso/. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://biblioo.info/o-index-de-rondonia...
, p. 1).

O posicionamento de Delfini (2017DELFINI, E. Censura às bibliotecas ou um conto de fadas à brasileira. Biblioo, 22 nov. 2017. Disponível em: https://biblioo.info/um-conto-de-fadas/. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://biblioo.info/um-conto-de-fadas...
), Pereira (2020PEREIRA, L. K. O index de Rondônia e o que nós, bibliotecárias(os), temos a ver com isso. Biblioo, 27 fev.2020. Disponível em: https://biblioo.info/o-index-de-rondonia-e-o-que-nos-bibliotecariasos-temos-a-ver-com-isso/. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://biblioo.info/o-index-de-rondonia...
) e Paula (2021PAULA, C. Negacismo biblioteconômico? Biblioo, 15 jun., 2021. Disponível em: https://biblioo.info/negacionismo-biblioteconomico/. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://biblioo.info/negacionismo-biblio...
), bem como os relatos de outros/as bibliotecários/as que estão atuando, descrevem e fazem frente às recentes investidas políticas de censura. Esses relatos parecem indicar que a comunidade bibliotecária não está tão despreparada para enfrentar censores, práticas de censura e autocensura, tal como apontava Vergueiro (1987VERGUEIRO, W. C. S. Censura e seleção de materiais em bibliotecas: o despreparo dos bibliotecários brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 16, n. 1, 1987. Disponível em: https://revista.ibict.br/ciinf/article/view/266. Acesso em: 28 jun. 2022.
https://revista.ibict.br/ciinf/article/v...
). Para o autor, em sua época, justificava até então esse comportamento mais tímido da classe, em função da formação acadêmica e de antecedentes históricos. Nos tempos atuais, podemos notar a emergência, ou ainda, a institucionalização de um perfil bibliotecário progressista e crítico, orientados às ações de transformação social, ao combate à desigualdade, a preconceitos, e resistentes às formas de censura e autocensura (TANUS, 2021TANUS, G. F. S. C. Institucionalização da Biblioteconomia Progressista e Crítica. Em Questão, Porto Alegre, v. 28, n. 1, p. 432-457, 2021. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/EmQuestao/article/view/109063. Acesso em: 28 jun. 2022.
https://seer.ufrgs.br/EmQuestao/article/...
).

Em face a essas primeiras aproximações com o tema, nos aprofundamos, a seguir, na forma da pesquisa e na compreensão de resistência.

3 A FORMA DA PESQUISA E A COMPREENSÃO DE RESISTÊNCIA

Neste ensaio, procuramos refletir sobre os movimentos de censura aos livros nos últimos anos e as ações de resistências nacionais e internacionais. Para tanto, empreendemos uma descrição das formas de censura na contemporaneidade inspirada na perspectiva teórico-metodológica de Michel Foucault (1999FOUCAULT, M. História da sexualidade I: A vontade de saber. 13. ed. Rio de Janeiro, Edições Graal, 1999., 2001, 2008FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008., 2014), observando o arquivo e os enunciados que circularam na mídia nacional e internacional nos últimos três anos.

Nesse contexto, para composição do arquivo, buscamos notícias, matérias e reportagens relacionadas a ações de censura aos livros entre os anos de 2020 a 2022 que circularam na mídia nacional e internacional2 2 Para escolha dos itens que consideramos mais representativos para a análise e apresentação utilizamos do conceito da serendipidade, do encontro fortuito, proporcionado pela prática de leitura diária das notícias nacionais e internacionais com o projeto Informe-CI - Curadoria de Conteúdo em Ciência da Informação, promovido pelo Departamento Acadêmico de Ciência da Informação, da Universidade Federal de Rondônia. Ademais, recordamos o prefácio do primeiro livro da coleção “La vie des hommes infâmes”, no qual Foucault (2006, p. 202), ao tratar sobre a seleção da sua antologia de “poemas-vidas”, declara: “a escolha que nele se encontrará não seguiu outra regra mais importante do que meu gosto, meu prazer, uma emoção, o riso, a surpresa, um certo assombro ou qualquer outro sentimento, do qual teria dificuldades, talvez, em justificar a intensidade, agora que o primeiro momento da descoberta passou”; para reforçar o caráter tão assombroso, quanto positivo, das notícias, ao darem visibilidade sobre as práticas de censura. . A partir desses textos e documentos, descrevemos os enunciados de censura, as injunções que os possibilitam e as diferentes formas de resistências.

Por resistência, tomamos a concepção de Michel Foucault (1999FOUCAULT, M. História da sexualidade I: A vontade de saber. 13. ed. Rio de Janeiro, Edições Graal, 1999.), ao tratar sobre o “método” em sua análise acerca do “dispositivo da sexualidade”. Nessa compreensão, a resistência é inseparável das relações de poder, sendo que a resistência se dá, necessariamente, onde há relações de poder. Isto é, toda forma de poder pressupõe resistência.

[...] onde há poder há resistência e, no entanto (ou melhor, por isso mesmo) esta nunca se encontra em posição de exterioridade em relação ao poder. [...] portanto, não existe, com respeito ao poder, um lugar da grande Recusa - alma da revolta, foco de todas as rebeliões, lei pura do revolucionário. Mas sim resistências, no plural, que são casos únicos: possíveis, necessárias, improváveis, espontâneas, selvagens, solitárias, planejadas, arrastadas, violentas, irreconciliáveis, prontas ao compromisso, interessadas ou fadadas ao sacrifício; por definição, não podem existir a não ser no campo estratégico das relações de poder (FOUCAULT, 1999FOUCAULT, M. História da sexualidade I: A vontade de saber. 13. ed. Rio de Janeiro, Edições Graal, 1999., p. 90-91).

Não há poder sem recusa, sem revolta em potencial, uma vez que a resistência não é exterior ao poder, ela se faz dentro da própria relação de poder. Veiga-Neto (2003VEIGA-NETO, A. Foucault & a educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2003., p. 151) propõe, no que diz respeito ao poder, resistência e exterioridade, na concepção foucaultiana, que “[...] a resistência ao poder não é a antítese do poder, não é o outro do poder, mas é o outro numa relação de poder - e não de uma relação de poder [...]”.

Nesse sentido, conforme verificamos, para se entender as relações de poder e de resistência em Foucault (2014FOUCAULT, M. Genealogia da ética, subjetividade e sexualidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014., 2001) é preciso entender que a resistência “não é anterior ao poder que ela enfrenta. Ela é coexistência a ele e absolutamente contemporânea” (FOUCAULT, 2001FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 16. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 2001., p. 241). A resistência deve apresentar as mesmas características do poder, “[...] para resistir, é preciso que a resistência seja como o poder. Tão inventiva, tão móvel, tão produtiva quanto ele. Que, como ele, venha de ‘baixo’ e se distribua estrategicamente” (FOUCAULT, 2001, p. 241). A resistência pode estabelecer novas relações de poder e, por conseguinte, novas formas de resistência “[...] entre relações de poder e estratégias de luta, há apelo recíproco, encadeamento indefinido e inversão perpétua” (FOUCAULT, 2001, p. 241).

Ainda sobre o poder, Foucault (2006FOUCAULT, M. Estratégia, poder-saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006., p. 253) aponta que ele “[...] é alguma coisa que opera através do discurso, já que o próprio discurso é um elemento em um dispositivo estratégico de relações de poder”. O poder não é uma “pista de mão única” de tal forma que nas relações de poder não há apenas “um ponto” de resistência. As resistências funcionam como contrapartida nas relações de poder e se apresentam como um interlocutor irredutível.

As resistências ocorrem de maneira irregular. É fácil identificar os pontos de resistência nas grandes revoltas, que provocam rupturas definitivas na história. No entanto, não apenas nesse tipo de relação de poder há resistência. Como dissemos, a resistência é inerente ao poder. Por isso, os grandes pontos de resistência são mais raros; os mais comuns são os “móveis” e “transitórios” (PANIAGO, 2005PANIAGO, M. L. F. S. Práticas discursivas de subjetivação em contexto escolar. 2005. Tese (Doutorado em Linguística e Língua Portuguesa) - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Araraquara, 2022., p. 184).

Se por um lado, o poder está em toda parte, como uma rede que permeia toda a sociedade, por outro, a resistência pode ser compreendida como pontos móveis e transitórios distribuídos por toda a rede social. Assim, as relações de poder possibilitam e suscitam a resistência em uma “luta perpétua e multiforme” (FOUCAULT, 2006FOUCAULT, M. Estratégia, poder-saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.). O poder, na perspectiva foucaultiana, não é onipresente e onisciente. De tal forma que uma sociedade “disciplinar” não deve ser compreendida como uma “sociedade disciplinada”. Os mecanismos de disciplina submetem a todos, no entanto, não implicam na “obediência” dos que estão a ela submetidos.

Dessa forma, como assevera Foucault (2001FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 16. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 2001., p. 183) “o poder deve ser analisado como algo que circula, ou melhor, como algo que só funciona em cadeia. Nunca está localizado aqui ou ali, nunca está nas mãos de alguns, nunca é apropriado como uma riqueza ou um bem. O poder funciona e se exerce em rede”. Rede onde o poder pode circundar e se modificar, inclusive entre os atores que o detém e/ou podem sofrer suas ações, os transpassando e os usando como centro de transmissão e ampliação de seus contextos de atuação. As relações entre poder e resistência se realizam em meio a estratégias e táticas, sendo que cada movimento serve de ponto de apoio ou ofensiva do outro. A resistência, portanto, é a possibilidade de abrir espaços de lutas e transformações, sobre isso, Castro (2004CASTRO, Edgardo. El vocabulario de Michel Foucault. Buenos Aires: Prometeo, 2004.) pontua que na compreensão foucaultiana essa possibilidade não é essencialmente da ordem da denúncia moral ou reinvindicação de direitos, mas estratégica e de luta.

A seguir, apresentamos as formas de censura na contemporaneidade e alguns gestos de resistências em prol da defesa da circulação e acesso ao livro e às demais produções bibliográficas.

4 AS FORMAS DE CENSURA NA CONTEMPORANEIDADE

Para melhor organização, os casos de censura aos livros e às produções bibliográficas estão dispostos em ordem geográfica e por data de ocorrência, dos mais distantes aos mais próximos. Deste modo, apresentaremos inicialmente a ação no Kuwait noticiada em 2020, depois alguns casos dos Estados Unidos entre 2021 e 2022 e, por fim, no Brasil, entre 2020 e 2021.

4.1 No Kuwait

No Kuwait, assim como em outros países do Oriente Médio, a censura é uma prática frequente. Exemplo disso, filmes lançados recentemente como “Dois Irmãos: Uma Jornada Fantástica”, da Pixar, “Eternos”, do Estúdio Marvel, ou ainda, “Lightyear”, da Disney, foram proibidos nos cinemas tanto do Kuwait quanto de outros países do Oriente Médio, por conterem pequenos diálogos que indicam personagens como gays ou lésbicas. Apesar disso, a censura aos livros parece acenar para uma trégua.

A censura prévia aos livros no Kuwait começou em 2006, por meio de uma lei que atribuía a um Comitê, subordinado ao “Ministério da Informação”, a proibição a qualquer livro que pudesse ser prejudicial de alguma forma ao Islã, à justiça e à segurança nacional. Em 2020, o jornal The Guardian (2020), noticiou o relaxamento da censura prévia de livros nacionais e estrangeiros: “as novas regras significam que importadores e editores terão apenas que fornecer ao Ministério da Informação os títulos dos livros e os nomes dos autores, cabendo apenas ao importador a responsabilidade pelo conteúdo do livro” (FLOOD, 2020FLOOD, A. Kuwait relaxes book censorship laws after banning thousands of titles. The Guardian, Reino Unido, 25 aug. 2020. Disponível em: https://www.theguardian.com/books/2020/aug/25/kuwait-relaxes-book-censorship-laws-after-banning-thousands-of-titles. Acesso em: 26 jul. 2022.
https://www.theguardian.com/books/2020/a...
, não paginado, tradução nossa).

Conforme relatos, desde o início da censura prévia, cerca de 5 mil obras foram censuradas com motivações que vão de insultos ao Islã a conteúdos considerados “imorais”. Entre os autores censurados estavam Victor Hugo, Gabriel García Márquez, Fiódor Dostoiévski e até histórias infantis como da “A pequena Sereia”.

Os gestos de resistência à censura no Kuwait ganharam força em 2018 com uma série de protestos nas redes sociais, a exemplo do Twitter, com a hashtag #Banned_In_Kuwait, bem como a instalação, na Feira do Livro do Kuwait, do artista visual Mohammed Sharaf. A ação trazia aproximadamente 200 lápides que se assemelhavam ao formato de livros, onde se liam os nomes de livros proibidos e o “selo”: “proibido no Kuwait”. Ela durou poucas horas, no entanto, foi suficiente para ser registrada e circular na web, conforme Figura 1.

Figura 1
Cemitério de livros proibidos no Kuwait (2018)

A despeito da empolgação de autores e editores kuwaitianos, parte da comunidade ainda está cautelosa, uma vez que a nova lei revoga a censura do Comitê, transferindo o poder de “veto” para o Poder Judiciário que pode ser acionado para revisão das obras, caso haja pedido oficial do público. Ademais, apesar de dar maior autonomia e liberdade intelectual aos leitores, a nova legislação, pode, em alguma medida, promover a autocensura por parte de editores e livreiros.

4.2 Nos Estados Unidos

Nos Estados Unidos, apesar da Liberdade ser um valor nacional ratificado pela Primeira Emenda Constitucional, a onda conservadora, que ganhou voz com a eleição de Donald Trump e força ao lado do movimento pró-armas, não parece se importar com a promoção da censura. Contudo, mesmo com as ações, por vezes materiais e simbolicamente violentas, a resistência em prol da defesa do diferente e da liberdade intelectual seguem atuantes.

Conforme noticiou o jornal The Texas Tribune em reportagem escrita por Waller e Reynolds (2021WALLER, A.; REYNOLDS, K. The push to ban books in Texas schools spreads to public libraries. Texas Tribune, Texas, 20 dez. 2021. Disponível em: https://www.texastribune.org/2021/12/20/texas-library-books/. Acesso em: 22 jun. 2022.
https://www.texastribune.org/2021/12/20/...
), em cidades como Llano, Victoria, Irving e Tyler, as comunidades locais têm se unido para indicar e proibir livros que consideram inadequados, especialmente às crianças e aos adolescentes. Esses casos têm chegado ao judiciário, e a exemplo do que aconteceu em Llano, em que um juiz determinou o fechamento da biblioteca para revisão das coleções.

Apesar das pressões, as bibliotecas públicas de Victoria e Irving têm resistido às investidas e estão mantendo em seus acervos as obras cujos conteúdos incomodam parte da população e foram alvo de reclamações. Além disso, como fora noticiado, há um movimento de resistência com o apoio de associações profissionais e bibliotecários mais experientes:

à medida que mais residentes começaram a voltar suas atenções para as bibliotecas locais, a associação estadual de bibliotecas criou uma linha de ajuda de “aconselhamento de pares” para que bibliotecários obtenham apoio de outros mais familiarizados com as censuras de livro (WALLER; REYNOLDS, 2021WALLER, A.; REYNOLDS, K. The push to ban books in Texas schools spreads to public libraries. Texas Tribune, Texas, 20 dez. 2021. Disponível em: https://www.texastribune.org/2021/12/20/texas-library-books/. Acesso em: 22 jun. 2022.
https://www.texastribune.org/2021/12/20/...
, não paginado, tradução nossa).

Outro caso, reportado pelo jornal The Guardian, através do jornalista Yang (2022YANG, M. This article is more than 5 months old Tennessee pastor leads burning of Harry Potter and Twilight novels. The Guardian, Reino Unido, 4 fev. 2022. Disponível em: https://www.theguardian.com/us-news/2022/feb/04/book-burning-harry-potter-twilight-us-pastor-tennessee. Acesso em: 23 jul. 2022.
https://www.theguardian.com/us-news/2022...
), aborda a queima de livros no estado norte-americano do Tennessee, no qual ações em torno da censura têm se avolumado ao ponto de um pastor, Greg Locke, também teórico da conspiração pró-Trump, reunir uma multidão para a queima obras como “Harry Potter” e “Crepúsculo”, tentando parar as “influências demoníacas” que possam assombrar as “famílias tradicionais”. O evento contou com um grande público e foi transmitido ao vivo pelo Facebook, conforme Figura 2:

Figura 2
Reunião para queima de livros no Tennessee (2020)

No vídeo da transmissão ao vivo, vemos uma multidão em um culto, e em seguida, ao redor da fogueira, lançando livros e outros pertences. Selecionamos na Figura 2, a participação do pastor, na qual em sua blusa se lê, na frente, “Forever Free” (Para Sempre Livre) e, no verso, “Freedom” (Liberdade). À direita, observamos as reações aos comentários: curtidas, corações e risadas. As risadas aos comentários, são ao nosso entender, uma forma de resistência, de registrar a desaprovação e “comicidade” da crença ali expostas. De acordo com a reportagem houve no evento também outra forma de resistência:

de acordo com Tyler Salinas, um fotógrafo que estava presente na fogueira, havia um contra manifestante, que segurou cópias de Fahrenheit 451 e A Origem das Espécies, e jogou um livro no fogo, que ele disse ser a Bíblia (YANG, 2022YANG, M. This article is more than 5 months old Tennessee pastor leads burning of Harry Potter and Twilight novels. The Guardian, Reino Unido, 4 fev. 2022. Disponível em: https://www.theguardian.com/us-news/2022/feb/04/book-burning-harry-potter-twilight-us-pastor-tennessee. Acesso em: 23 jul. 2022.
https://www.theguardian.com/us-news/2022...
, não paginado, tradução nossa).

Além dessas ações, a censura aos livros nos Estados Unidos tem crescido também nas bibliotecas. Segundo dados da American Library Association (2021)AMERICAN LIBRARY ASSOCIATION (ALA). Top 10 Most Challenged Books Lists. Chicago, 2021. Disponível em: https://www.ala.org/advocacy/bbooks/frequentlychallengedbooks/top10. Acesso em: 08 mar. 2023.
https://www.ala.org/advocacy/bbooks/freq...
, o número de denúncias de bibliotecários que vivenciaram censura de livros chegou a 729. Destas, 44% vieram de bibliotecas escolares e 37% de bibliotecas públicas, sendo que, de modo geral, os pedidos de censura foram requisitados por pais e responsáveis 34% e por chefia 24%, mas também por grupos religiosos 10% e por políticos 2%, entre outros atores, inclusive bibliotecários e professores.

Algumas dessas ações de censura em bibliotecas escolares foi relatada pelo jornal The Washington Post (2021), que divulgou a situação de Fairfax, estado da Virgínia nos Estados Unidos, cujo sistema público educacional da cidade retirou e devolveu às estantes duas obras, “Lawn boy”, de Jonathan Evison e “Gender Queer: a memoir”, de Maia Kobabe (ASBURY, 2021ASBURY, N. Fairfax schools will return 2 books to shelves after reviewing complaints over content. The Washington Post, Washington, 23 nov. 2021. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/education/2021/11/23/fairfax-schools-gender-queer-lawn-boy/. Acesso em: 25 jul. 2022.
https://www.washingtonpost.com/education...
). A motivação para a censura e retirada dos livros foi a alegação de familiares de estudantes sobre suposta linguagem sexualmente explícita, inadequada para jovens. Segundo a reportagem,

os livros têm sido o centro de um debate público no distrito de Fairfax. Em uma reunião do conselho escolar em setembro, dois palestrantes - um pai e outro uma mulher que se identificou como ex-professora - disseram que os livros eram inadequados para o público do ensino médio por causa de seu conteúdo sexual e alegaram que continham representações de pedofilia (ASBURY, 2021ASBURY, N. Fairfax schools will return 2 books to shelves after reviewing complaints over content. The Washington Post, Washington, 23 nov. 2021. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/education/2021/11/23/fairfax-schools-gender-queer-lawn-boy/. Acesso em: 25 jul. 2022.
https://www.washingtonpost.com/education...
, não páginado, tradução nossa).

Cabe destacar que os livros “Gender Queer: a memoir” e “Lawn boy” foram os com mais denúncias e tentativas de censura em 2021, nos Estados Unidos, de acordo com Office for Intellectual Freedom da American Library Association, sendo que das dez primeiras posições, cinco continham a comunidade LGBTQIA+ em seus enredos. Os dois títulos foram homenageados em 2020 pela própria American Library Association, com o prêmio Alex Awards, como parte das 10 melhores obras do ano voltadas ao público infanto-juvenil, com idades entre 12 a 18 anos. Esses dois livros foram devolvidos às estantes das bibliotecas do sistema educacional de Fairfax depois que um comitê para a “reconsideração dos livros” avaliou os títulos. O comitê era formado por pais, professores, além de um gestor da escola e de um membro da “secretaria” de Equidade e Cultura, previsto na política de coleções do sistema educacional da cidade.

Em outra escola no Tennessee, o Conselho Escolar decidiu por tirar do Currículo de Artes, a graphic novel, “Maus” de Art Spiegelman, sem ao menos passar por um comitê de reconsideração. Esse caso, repercutiu em vários jornais, em 2022, e chamou a atenção pelo fato de que a obra trata sobre o nazismo, sendo o único graphic novel a ganhar um Pulitzer. A censura ocorreu pelo fato de conter oito “palavrões” e “uma mulher nua ser desenhada como um rato” e, portanto, inadequado para adolescentes do oitavo ano. Cabe destacar que o artista é filho de judeus que sobreviveram ao holocausto e “Maus” retrata esse acontecimento, usando como recurso visual a imagem dos ratos como judeus e dos nazistas como gatos.

Os gestos de resistência, neste caso, podem ser notados na ata do conselho que mostram pais e professores alertando para a decisão contraditória que estavam tomando em que um diz: “então, se banirmos o livro inteiro com base nas palavras, quais outros livros atualmente em uso teremos que banir?” e alguém responde: “isso cai em outra pauta, para outro dia”3 3 Omitimos aqui o nome dos envolvidos. A transcrição completa pode ser lida em “The Comic Journal”. TRANSCRIPT of the McMinn County Board of Education’s Removal of Maus. The Comics Journal. 03 feb. 2022. Disponível em: https://www.tcj.com/transcript-of-the-mcminn-county-board-of-educations-removal-of-maus/. Acesso em: 29 jul. 2022. .

Ou ainda, na iniciativa da National Coalition Against Censorship que procurou em carta aberta dissuadir a escola da ação. Intransigente, a escola manteve a censura. Em resposta a esse e outros acontecimentos envolvendo a censura em livros, Margaret Renkl (2022RENKL, M. In Tennessee, the ‘Maus’ Controversy Is the Least of Our Worries. The New York Times, Nova York, 07 fev. 2022. Disponível em: https://www.nytimes.com/2022/02/07/opinion/culture/maus-tennessee-book-bans.html. Acesso em: 28 jul. 2022.
https://www.nytimes.com/2022/02/07/opini...
) lançou um ensaio no The New York Times no qual pondera:

aqui no Tennessee, as proibições de livros são apenas uma parte pequena, mas altamente visível, de um esforço muito maior para privatizar as escolas públicas e transformá-las em centros de propaganda conservadoras. Essa cruzada está se desenrolando de maneiras que transcendem as decisões do conselho escolar local e, na verdade, são projetadas para arrancar o controle deles por completo (RENKL, 2022RENKL, M. In Tennessee, the ‘Maus’ Controversy Is the Least of Our Worries. The New York Times, Nova York, 07 fev. 2022. Disponível em: https://www.nytimes.com/2022/02/07/opinion/culture/maus-tennessee-book-bans.html. Acesso em: 28 jul. 2022.
https://www.nytimes.com/2022/02/07/opini...
, não paginado, tradução nossa).

4.3 No Brasil

No Brasil, o movimento conservador e de extrema direita ganhou força com a eleição e com o governo do presidente Jair Bolsonaro. Com um discurso em defesa da “família, moral e bons costumes”, da “segurança do cidadão de bem” e “anticomunista”, este governo, por meio da desinformação, fanatismo religioso e político, tem atuado de modo autoritário e instigado políticos, que querem ou quiseram aliar à sua imagem, a promover ações que inibam a liberdade intelectual e promovam a desinformação. As ações contra jornalistas, educadores, professores e bibliotecas, foram de várias ordens, mas a resistência de populares e instituições públicas, ainda não emparelhadas, mostram-se engajadas na defesa do direito à livre cidadania e à democracia.

Um caso de censura recente, de grande repercussão na mídia nacional, foi do Governo do Estado de Rondônia que em 2020 divulgou internamente na Secretaria de Educação uma lista com 43 obras consideradas inadequadas para crianças e adolescentes, dentre elas clássicos, como Machado de Assis, Franz Kafka e todas as obras de Rubem Alves, conforme apontou o jornal El País (2020). A intenção de censura do Secretário de Educação do Estado, foi desvelada e “acuada”, com o vazamento de documentos oficiais e áudios. Após a repercussão do caso, o secretário de Educação tentou acalmar e abafar o caso, negando a censura, no entanto, determinou o sigilo do documento que listava as referidas obras.

Após a repercussão, o Estado decretou sigilo sobre os documentos da Secretaria de Educação. “A inserção de sigilo na documentação não pode ser interpretada como um mero erro. É um exemplo claro do ódio à transparência e de uma tentativa de ocultamento da prática de censura”, afirma Miguel (OLIVEIRA, 2020OLIVEIRA, R. Censura de livros expõe “laboratório do conservadorismo” em Rondônia. El País, Madrid, 07 fev. 2020. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2020-02-08/censura-de-livros-expoe-laboratorio-do-conservadorismo-em-rondonia.html. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://brasil.elpais.com/brasil/2020-02...
, não paginado).

Na reportagem, são ainda apresentados outros casos de censura orientados por uma ideologia conservadora em cidades rondonienses, como a tentativa de proibir um livro de ciência do nono ano do ensino fundamental que continha a imagem um pênis, ou ainda “suprimir” dos livros didáticos páginas que falassem da diversidade sexual.

Ainda em 2020, o jornal Folha de São Paulo (2020) divulgou as ações do Governo do Estado de São Paulo para o recolhimento de 12 títulos de 240 exemplares doados pelas editoras Record, Planeta, Todavia e Boitempo ao projeto Remição em Rede, por considerarem que alguns títulos não estariam de acordo com o esperado ao público participante. O projeto iniciado em 2018, nos presídios paulistas, tem como finalidade a remição de pena por meio da leitura e elaboração de resenhas, sendo que o acervo doado continha nomes consagrados como Gabriel García Márquez, Albert Camus e Harper Lee. A educadora Janine Durand, articuladora do projeto, que não tem custo para o poder público, afirma que “nos avisaram ali que a lista de livros havia sido riscada na íntegra pelo diretor executivo da instituição, o coronel Henrique Pereira de Souza Neto” (GENTILE; SETO, 2020PEREIRA, L. K. O index de Rondônia e o que nós, bibliotecárias(os), temos a ver com isso. Biblioo, 27 fev.2020. Disponível em: https://biblioo.info/o-index-de-rondonia-e-o-que-nos-bibliotecariasos-temos-a-ver-com-isso/. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://biblioo.info/o-index-de-rondonia...
, não paginado).

Cabe destacar que o Conselho Nacional de Justiça e o Departamento Penitenciário Nacional lançaram em 2021 uma resolução para apoiar a magistratura e as gestões dos sistemas prisionais a operacionalizar a remição de penas via práticas, sociais e educativas. A Resolução Nº 391 de 10/05/2021 estabelece procedimentos e diretrizes a serem observados pelo Poder Judiciário para o reconhecimento do direito à remição de pena por meio de práticas sociais educativas de leitura em unidades de privação de liberdade, destaca:

Art. 5o Terão direito à remição de pena pela leitura as pessoas privadas de liberdade que comprovarem a leitura de qualquer obra literária, independentemente de participação em projetos ou de lista prévia de títulos autorizados [...].

II - o acervo bibliográfico poderá ser renovado por meio de doações de visitantes ou organizações da sociedade civil, sendo vedada toda e qualquer censura a obras literárias, religiosas, filosóficas ou científicas, nos termos dos art. 5o, IX, e 220, § 2o, da Constituição Federal (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2021CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (Brasil). Resolução Nº 391 de 10/05/2021: Estabelece procedimentos e diretrizes a serem observados pelo Poder Judiciário para o reconhecimento do direito à remição de pena por meio de práticas sociais educativas em unidades de privação de liberdade. Diário da Justiça - Conselho Nacional de Justiça, Brasília, nº 120/2021, de 11 de maio de 2021, p. 2-5. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3918 Acesso em: 01 ago. 2022.
https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/39...
, não paginado).

A rigor, a partir dessa resolução, não cabe a censura nas práticas na formação de coleções das bibliotecas prisionais, tão pouco a possibilidade de recusa do relatório de leitura do apenado pelo Juízo competente ou pela Comissão de Validação. Há ainda de se reconhecer a necessidade de bibliotecários atuantes em bibliotecas prisionais, para conhecer as comunidades a serem atendidas e poderem a partir de um posicionamento técnico desenvolverem as coleções e avaliarem as doações realizadas ao projeto.

No Rio de Janeiro, o deputado estadual Danniel Librelon apresentou à Assembleia Legislativa de seu estado (ALERJ) o projeto de Lei 3690/2021RIO DE JANEIRO. Projeto de Lei nº 3690/2021. Determina que livros que tenham eixos temáticos sobre sexo, sexualidade, erotismo ou nudez, devem conter selo com classificação indicativa correspondente, na capa ou contracapa. Rio de Janeiro, 24 fev. 2021. Disponível em: http://www3.alerj.rj.gov.br/lotus_notes/default.asp?id=144&url=L3NjcHJvMTkyMy5uc2YvMThjMWRkNjhmTZiZTNlNzgzMjU2NmVjMDAxOGQ4MzMvZDU5MmNjYmVlYTI5ZDM5MDAzMjU4Njg1MDA1OTFlODU/T3BlbkRvY3VtZW50JlN0YXJ0PTEuMS4xLjE=. Acesso em 22 jul. 2022.
http://www3.alerj.rj.gov.br/lotus_notes/...
4 4 Fonte: http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/contlei.nsf/f25edae7e64db53b032564fe005262ef/222d58fbf04ab6c803256af4005508e2?OpenDocument&ExpandSection=-3 que “[...] determina que livros que tenham eixos temáticos sobre sexo, sexualidade, erotismo ou nudez, devem conter selo com classificação indicativa correspondente, na capa ou contracapa” (RIO DE JANEIRO, 2021). O projeto aguarda relatoria da Comissão de Constituição e Justiça, enquanto é questionado pela mídia. A exemplo,Freire (2021FREIRE, Q. G. Deputado quer que livros tenham classificação indicativa devido a erotismo. Diário o Rio, Rio de Janeiro, 24 fev. 2021. Disponível em: https://diariodorio.com/deputado-quer-que-livros-tenham-classificacao-indicativa-devido-a-erotismo/. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://diariodorio.com/deputado-quer-qu...
), no jornal Diário do Rio (2021), é ponderado:

mas quem será que fará o papel de censurador das obras literárias? Como será definido Machado de Assis? Ou mesmo O Cortiço de Aluísio de Azevedo? E a Bíblia, vai ter selo indicativo? Afinal tem trechos eróticos, especialmente em o Cântico dos Cânticos, com trechos como: “Os seus seios parecem duas crias, crias gêmeas de uma gazela, pastando entre os lírios.”, no mínimo uns 16 anos pelo erotismo. Isso sem contar os trechos violentos (FREIRE, 2021FREIRE, Q. G. Deputado quer que livros tenham classificação indicativa devido a erotismo. Diário o Rio, Rio de Janeiro, 24 fev. 2021. Disponível em: https://diariodorio.com/deputado-quer-que-livros-tenham-classificacao-indicativa-devido-a-erotismo/. Acesso em: 22 jul. 2022.
https://diariodorio.com/deputado-quer-qu...
, não paginado).

Essa iniciativa de “criar um uma classificação indicativa” para livros, vale dizer, não é muito diferente da exigida pela organização “Filhos da Revolução Americana”, que conforme indica Vergueiro (1987VERGUEIRO, W. C. S. Censura e seleção de materiais em bibliotecas: o despreparo dos bibliotecários brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 16, n. 1, 1987. Disponível em: https://revista.ibict.br/ciinf/article/view/266. Acesso em: 28 jun. 2022.
https://revista.ibict.br/ciinf/article/v...
, p. 24) “[...] procurou obrigar os bibliotecários a rotular os materiais da biblioteca com avisos a leitores potenciais”, em 1951.

Por fim, em julho de 2021, a Fundação Cultural Palmares, instituição que visa preservar e promover a afro-brasilidade, elaborou e publicou o relatório “Retrato do acervo: três décadas de dominação marxista na Fundação Palmares”, no qual o presidente da Fundação, indicava que

todas as pessoas de bem ficarão chocadas ao descobrir que uma Instituição mantida com o dinheiro dos impostos, sob o pretexto de defender o negro, abriga, protege e louva um conjunto de obras pautadas pela revolução sexual, pela sexualização de crianças, pela bandidolatria e por um amplo material de estudo das revoluções marxistas e das técnicas de guerrilha (FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES, 2021FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES. Retrato do acervo: três décadas de dominação marxista na Fundação Palmares. 11 jun. 2021. Disponível em: https://www.palmares.gov.br/wp-content/uploads/2021/06/cnirc-01-gab-10-06-21.pdf. Acesso em: 26 jul. 2022.
https://www.palmares.gov.br/wp-content/u...
, p. 8).

No relatório, há indicação de que dos 9.565 títulos, entre livros, folhetos, folders e catálogos, apenas 46% abordavam a temática negra, sendo que dessas, apenas 5% (478 títulos) eram de cunho pedagógico, educacional e cultural dentro da missão institucional. A vontade do presidente da Fundação era o expurgo de 54% do acervo da instituição, compreendida como de cunho marxista e, portanto, inapropriado à missão da fundação e deveria ser retirado, conforme Figura 3.

Figura 3
Capa e “Apresentação” do “Retrato do acervo”

Com a pressão social e de instituições como o Conselho Federal de Biblioteconomia, do Coletivo Bibliotecárias(os) Negros(as), de parlamentares e bibliotecários e da judicialização, o acervo não foi doado, uma vez que a Justiça proibiu o descarte das obras, segundo relato do Jornal Folha de São Paulo.

Conforme o Ministério Público Federal já tinha declarado, a conduta de Camargo "apresenta-se atentatória ao patrimônio cultural", e a decisão definitiva proferida na sexta complementa que o presidente quer "destruir algo com valor patrimonial está associado a um ideal político, religioso ou mesmo cultural" (FOLHA DE SÃO PAULO, 2022FOLHA DE SÃO PAULO. Justiça proíbe Palmares de doar livros e Camargo cria 'acervo da vergonha'. São Paulo, 08 fev. 2022. Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2022/01/justica-proibe-palmares-de-doar-livros-e-camargo-cria-acervo-da-vergonha.shtml. Acesso em: 19 jul. 2022.
https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/...
, não paginado).

Sem alternativa, senão a multa, o presidente da Fundação Palmares lançou uma contra tentativa de retaliação à coleção, anunciando que os livros com os quais discorda, seriam postos em uma sala com o título “Acervo da vergonha”.

5 AS FORMAS DE RESISTIR

Conforme vimos, a censura está intrinsecamente ligada às relações entre saber e poder. Para Foucault (2001FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 16. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 2001., p. 142), “o exercício do poder cria perpetuamente o saber e, inversamente, o saber acarreta efeitos de poder. [...] não é possível que o poder se exerça sem saber, não é possível que saber não engendre poder”. As formas de censura são formas de expressão de poder, de afirmação de um saber, operadas por diferentes agentes, entre eles, o Estado. Para exemplificar isso, recorremos a casos de censura no Kuwait, Estados Unidos e Brasil, indicando também que onde há formas de poder que busquem criar a censura, há também formas de resistências.

Os livros e as demais produções bibliográficas são materializações de saberes e, portanto, objetos perigosos ao poder. Na literatura, vemos exemplos disso em obras, como “O Nome da Rosa”, de Umberto Eco e “Fahrenheit 451”, de Ray Bradbury, ou ainda em títulos “recentes” como a “A Bibliotecária de Auschwitz”, de Antonio G. Iturbe e “Um general na biblioteca”, de Ítalo Calvino.

No domínio da História, Manguel (2006MANGUEL, A. The Library at night. Yale: Yale University Press, 2006.) comenta sobre as bibliotecas enquanto formas diversas, como mito, ordem, espaço, poder, sombra e tantas outras. Sobre isso, o autor pontua o poder e a resistência dos livros e bibliotecas em contextos de ameaça,

como repositórios de história ou fontes para o futuro, como guias ou manuais para tempos difíceis, como símbolos de autoridade passada ou presente, os livros de uma biblioteca representam mais do que seu conteúdo coletivo e, desde o início da escrita, foi considerada uma ameaça. Pouco importa por que uma biblioteca é destruída: cada banimento, restrição, fragmentação, pilhagem ou saque, dá origem (pelo menos como uma presença fantasmagórica) a uma biblioteca mais alta, mais clara e mais durável do banido, saqueado, saqueado, retalhado ou reduzido. (MANGUEL, 2006MANGUEL, A. The Library at night. Yale: Yale University Press, 2006., p. 123, tradução nossa).

Ademais, outro exemplo bem antigo e emblemático, que julgamos pertinente para perceber as injunções ideológicas, políticas, religiosas atuantes sobre a censura e suas motivações, é a crítica, sob forma de sátira, de Louis Leroy em “Une bibliothèque populaire modèle5 5 Disponível em: LEROY, L. Une bibliothèque populaire modèle. Le Charivari, 5 août 1867. Disponível em: https://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k30664118/f2.item. Acesso em: 21 jul. 2022. . Cabe dizer que essas obras citadas são exemplos de resistência à censura dos livros, recordação e avisos de como governos autoritários buscam alienar a sociedade, limitar sua liberdade intelectual e, deste modo, manterem-se no poder.

É emblemático que, ao abordarmos casos de censura e resistência no Kuwait, Estados Unidos e Brasil, deparamos com governos que flertaram e flertam com o negacionismo científico, movimentos conservadores, autoritarismo e projetos antidemocráticos. Em tempos de censura, em que grupos religiosos e políticos conservadores exigem “neutralidade” (silenciamento) de educadores, bibliotecários e pesquisadores, é preciso que nos posicionemos.

O bibliotecário, enquanto mediador da informação, precisa estar atento aos avanços da censura apoiados pelo conservadorismo e tem a responsabilidade social de garantir a liberdade de investigação científica isenta de qualquer censura ideológica, política ou religiosa, cumprindo sua missão profissional (LIMA; GALINDO, 2018LIMA, A. K. A.; GALINDO, M. L. Tempos de censura: reflexões sobre o posicionamento crítico e político do bibliotecário. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO (ENANCIB), 19., 2018, Londrina. Anais [...]. Londrina: Universidade Estadual de Londrina. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/103057. Acesso em: 28 jun. 2022.
http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapc...
, p. 4178).

Se a onda conservadora e o autoritarismo tentam a tudo censurar, a resistência mostra sua força. Nesses termos, mostramos anteriormente várias formas de censura, como na região norte americana do Tennesse, onde temos em Nashville uma ação firme de resistência na Biblioteca Pública, que tem adquirido e mantido os livros censurados em outras bibliotecas à disposição do público e mais que isso, elaborou uma campanha para “Freedom to Read” (Liberdade para Ler), lançando “carteirinhas” personalizadas.

Figura 4
Cartões da Biblioteca de Nashville: “I read banned books” (Eu leio livros banidos)

É importante destacar que nos Estados Unidos, a American Library Association, tem histórico de luta pela liberdade intelectual e seus esforços resultaram em uma página permanente de advocacy, para tratar sobre os livros proibidos e censurados6 6 ALA. Banned & Challenged Books. Disponível em: https://www.ala.org/advocacy/bbooks . Apesar disso, a comunidade bibliotecária estadunidense está se sentindo ameaçada e surpresa com os ataques frequentes7 7 Sobre isso, indicamos: HARRIS, E. A.; ALTER, A. With Rising Book Bans, Librarians Have Come Under Attack. New York Times, 06 jul. 2022. Disponível em: https://www.nytimes.com/2022/07/06/books/book-ban-librarians.html . Acesso em 04 ago. 2022. ELIE, M et al. To Fight Book Banning, Support Librarians. New York Times, 13 jul. 2022. Disponível em: https://www.nytimes.com/2022/07/13/opinion/letters/book-bans-librarians.html. Acesso em 04 ago. 2022. HIGGINS, M. The right in the US has a new bogeyman: libraries. The Guardian, 27 jul. 2022. Disponível em: https://www.theguardian.com/commentisfree/2022/jul/27/right-wing-proud-boys-libraries-book-bans. Acesso em 04 ago. 2022. .

No Brasil, em uma iniciativa assinada por mais de 80 entidades relacionadas à Educação e aos Direitos Humanos, lançaram o “Manual de Defesa Contra a Censura nas Escolas”8 8 Disponível em: https://www.manualdedefesadasescolas.org.br/index.html . Nele há casos e desdobramentos de censura em instituições de ensino, formas de defesa político-pedagógicas, bases jurídicas e contatos com instituições parceiras, além de decisões recentes do STF que afirmam a inconstitucionalidade de movimentos inspirados no projeto conservador e de fundamentalismo religioso “Escola sem partido”, reafirmando o compromisso e o dever do Estado e das instituições escolares em abordar temas como gênero e sexualidade, como forma de prevenir a violência doméstica e o abuso sexual de crianças e adolescentes. Outra iniciativa nacional, no âmbito da Biblioteconomia, foi lançada pela Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários, Cientistas de Informação e Instituições Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários, Cientistas de Informação e Instituições (FEBAB), intitulada “Bibliotecas que não se calam”9 9 Disponível em: http://febab.org.br/censurado/ , em 2020, disponibilizando materiais da campanha, relatos de censura e bibliografias.

Ainda no contexto brasileiro, vale recordar também as pesquisas de Reimão (2014REIMÃO, S. "Proíbo a publicação e circulação." - censura a livros na ditadura militar. Estudos Avançados, São Paulo, v. 28, n. 80, p. 75-90, 2014. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/eav/article/view/79684. Acesso em 14 dez. 2022.
https://www.revistas.usp.br/eav/article/...
, 2019) que levantam e sistematizam as obras censuradas e a atuação da censória do governo militar, a partir de fontes bibliográficas e pareceres do Departamento de Censura de Diversões Públicas (DCDP). Por meio desses levantamentos, a pesquisadora lança três constatações sobre as ações de censura aos livros na ditadura brasileira:

A primeira é a do limite de qualquer ato de coação censória: toda coação é temporária e limitada - “pode-se reprimir o espírito por um curto espaço de tempo, mas, no final, o espírito sempre vence” -, frase dita pelo bibliófilo José Mindlin em entrevista a nós concedida em novembro de 2008.

A segunda observação geral a que o estudo realizado nos conduz é a de que o estabelecimento de um esquema censório é uma violência à cidadania. Concebemos a censura como parte de um aparelho de coerção e repressão que, muito mais do que afetar a circulação de alguns bens culturais, restringia a produção e circulação da cultura, implicando uma profunda mudança no exercício da cidadania e da cultura.

O estudo conduziu-nos, por fim, à verificação da existência de grande número de ações de resistência à opressão. (REIMÃO, 2014REIMÃO, S. "Proíbo a publicação e circulação." - censura a livros na ditadura militar. Estudos Avançados, São Paulo, v. 28, n. 80, p. 75-90, 2014. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/eav/article/view/79684. Acesso em 14 dez. 2022.
https://www.revistas.usp.br/eav/article/...
, p. 88).

A IFLA, em seu recente IFLA Statement on Censorship (2019aINTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA). IFLA Statement on Censorship. Haia: IFLA, 2019a. Disponível em: https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/files/assets/faife/statements/ifla_statement_on_censorship.pdf. Acesso em: 31 jul. 2022.
https://cdn.ifla.org/wp-content/uploads/...
, p. 2), lançou algumas recomendações para Bibliotecas e Serviços de Informação e Associações de Bibliotecas:

  • Conheça e promova a conscientização sobre os documentos que dizem respeito tanto aos direitos humanos relevantes à informação quanto à responsabilidade do setor bibliotecário em promovê-los e defendê-los;

  • Tanto quanto possível, construa coleções de bibliotecas e forneça serviços de biblioteca livres de censura intencional;

  • No desenvolvimento de coleções especificamente, tente refletir toda a gama de opiniões sobre temas controversos ou toda a gama de diversidade no contexto nacional, baseando as decisões sobre o que comprar ou licenciar em considerações profissionais em vez de limitada por considerações políticas ou religiosas ou preconceito cultural;

  • Eduque os usuários da biblioteca sobre questões de censura e incentivá-los a favorecer e praticar a liberdade de expressão e liberdade de acesso à informação em suas vidas pessoais e profissionais;

  • Na medida do possível, garanta que as bibliotecas sejam capazes de usar a tecnologia para preservar a liberdade de acesso à informação e expressão e a capacidade de se comunicar livremente na Internet;

  • Defenda a remoção das restrições de censura que afetam os serviços de biblioteca e informação e a sociedade em geral, quando necessário, levando em consideração as circunstâncias locais;

  • Apoie bibliotecas e serviços de informação (e seus funcionários) que estão sendo desafiados em questões de censura;

  • Informe a IFLA sobre instâncias ou práticas contínuas de censura em um estado, para que a IFLA possa apoiar uma associação de bibliotecas que esteja lidando com questões de censura no estado;

  • Construa a compreensão dos riscos da autocensura.

Em tempos de defesa contra a censura e apoio à liberdade intelectual, algumas iniciativas foram criadas nesses últimos anos, tais como:

  • Na Suécia, na cidade de Malmö, foi inaugurada em meados de 2020, a Dawit Isaak-biblioteket10 10 Conheça a Dawit Isaak-biblioteket, acesse: https://malmo.se/Uppleva-och-gora/Arkitektur-och-kulturarv/Malmo-Stadsarkiv/Stadsarkivets-bibliotek/Dawit-Isaak-biblioteket.html. que é uma biblioteca especializada em livros censurados ao redor do mundo e cujos autores tenham sido ameaçados, perseguidos e/ou exilados. Não se restringe ao acervo bibliográfico, mantendo também coleções musicais e peças de teatro, além de obras sobre censura, democracia e liberdade de expressão.

  • Na Estónia, na cidade de Tallinn, foi inaugurado também em meados de 2020, o Banned Book Museum11 11 Conheça o Banned Book Museum, acesse: https://bannedbooksmuseum.com/support-us/. , dedicado a preservar os livros proibidos, censurados e queimados em todo o mundo, para além de educar sobre história da censura e os desafios contemporâneos da livre troca de ideias.

  • No mundo virtual, no Minecraft, foi lançado também em 2020, o The Uncensored Library12 12 Conheça a The Uncensored Library, acesse: https://www.uncensoredlibrary.com/en. , pelo Reporters Without Borders, um espaço voltado ao acesso de artigos de notícias censurados por governos, como Egito, México, Rússia, Arábia Saudita e Vietnã.

Diante do que compilamos e refletimos, listamos, sem esgotar as possibilidades, dez formas de resistência à censura aos livros e às demais produções bibliográficas, na atualidade:

  1. Pela participação individual e coletiva em protestos e reinvindicações de liberdade intelectual, tal como de Mohammed Sharaf e demais kuwaitianos;

  2. Pela ação contra manifestantes em eventos de promoção de censura, tal como do anônimo na fogueira do Tennessee e outros tantos que deixaram seus comentários e reações nas mídias sociais;

  3. Pela mobilização de Associações e Grupos de Bibliotecários, tal como visto nas ações do Texas e Fundação Palmares;

  4. Pela ação de garantias institucionais prévias por meio de Política de Formação de coleções e regulamentos oficiais, tal como do Sistema de Bibliotecas de Fairfax e resolução do Conselho Nacional de Justiça e o Departamento Penitenciário Nacional;

  5. Pela ação da mídia livre e da liberdade de expressão de profissionais da leitura e dos textos, como escritores, jornalistas, professores e bibliotecários que indicam as absurdas e abusivas ações e tentativas de censura, tal como ocorreu no caso da Fundação Palmares, do Projeto de Lei do Rio de Janeiro e da edição de Maus;

  6. Pela ação e participação de agentes civis e públicos, que “vazam” informações para a mídia da tentativa de censura, tal como ocorreu na Secretária de Educação do Governo do Estado de Rondônia e nas bibliotecas prisionais de São Paulo;

  7. Pelas campanhas em Bibliotecas e demais Instituições voltadas à promoção da leitura e da liberdade intelectual, tal como a “Freedom to Read”;

  8. Pela educação e informação dos profissionais que lidam diretamente com as intenções de censura e que devem se apropriar de instrumentos como Manuais, Manifestos e Diretrizes que defendem a liberdade intelectual;

  9. Pela criação e difusão de espaços livres de censura e próprios para a discussão e aprendizagem de seus mecanismos e efeitos, em ambientes “não tradicionais” e virtuais, tal como Dawit Isaak-biblioteket, Banned Book Museum e The Uncensored Library;

  10. Pela pesquisa, ensino e divulgação científica das práticas de censura e resistência, tal como vem sendo feita, de maneira ainda tímida, pela comunidade em Biblioteconomia e Ciência da Informação, e que aqui, demos continuidade.

Salientamos que, conforme analisa Foucault (2001FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 16. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 2001., p. 241), “[…] a partir do momento em que há uma relação de poder, há uma possibilidade de resistência. Jamais somos aprisionados pelo poder: podemos sempre modificar sua dominação em condições determinadas e segundo uma estratégia precisa”.

Sigamos para nossas considerações finais.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste ensaio, nosso objetivo foi de apresentar e refletir sobre os movimentos de censura aos livros e as ações de resistência, nacionais e internacionais. Para tanto, trouxemos em nossos resultados exemplos de ações de censura e resistências em defesa ao acesso e à circulação dos livros, que, apesar de numerosas, restringiram-se a acontecimentos dos últimos três anos, o que não esgotam as tantas tentativas e sucessos de (contra)intervenções, por vezes silenciosas ou, prontamente, silenciadas.

Ressaltamos que em nossa abordagem do tema, utilizamos como exemplos notícias que circularam por diferentes canais de imprensa e que a manutenção da imprensa livre é condição sine qua non de uma sociedade informada, justa, democrática, igualitária e inclusiva. O acesso à informação de forma livre e equitativa deve ser uma luta e um compromisso de toda a sociedade, bem como a vigilância, para que os veículos de comunicação, dos tradicionais às redes sociais, divulguem notícias verídicas e não direcionadas a um ou outro governo, por exemplo.

Nesses termos, recordamos o trabalho de Seelaender (1991SEELAENDER, A C. L. Surgimento da idéia de liberdades essenciais relativas à informação - "areopagitica" de Milton. Revista da Faculdade de Direito - Universidade de São Paulo, São Paulo, v. 86, 1991. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67163. Acesso em: 16 nov. 2022.
https://www.revistas.usp.br/rfdusp/artic...
) que analisa a “Areopagítica” do parlamentar inglês John Milton, publicada em 1644, sendo um marco no questionamento da legitimidade dos governantes de cercear a divulgação de informações e de opiniões contrárias aos seus interesses, e na afirmação da “liberdade de informação” e o “direito à informação”. Seelaender (1991) pontua cinco alegações contra a censura:

  1. A censura prévia é expressão do desprezo pelos governados e da superestima da capacidade das autoridades e seus agentes;

  2. A censura é essencialmente liberticida (mata a liberdade);

  3. É a intolerância e não a pluralidade de opinião que enfraquece o Estado;

  4. A censura prévia é ineficaz, considerados os fins a que se propõe;

  5. A censura prévia constitui um obstáculo ao avanço do conhecimento e à renovação das mentalidades.

Ademais, alertamos para o estudo e entendimento das novas formas de censura proporcionadas pela informática, internet e aprimoramento da inteligência artificial. Exemplos disso, são as diferentes formas de bloqueio e sanções contra mídias sociais e fontes de informação, como Wikipedia, Tiktok, Google News e YouTube na Rússia em função da “Invasão na Ucrânia”, do apagamento “na nuvem” de um livro ainda em redação pelo governo chinês, ou ainda da “censura algorítmica”, que não proíbe, mas define o quê e como poderá ser visto.

Velhas e novas formas de censura se impõe em nossa sociedade em todos os cantos do mundo. Enquanto finalizamos este ensaio, fomos surpreendidos com a censura, não aos livros e às produções bibliográficas, mas aos funcionários, quando da prestação de informação e auxílio à pesquisa sobre “aborto” nas bibliotecas de Oklahoma, nos Estados Unidos, uma vez que o estado acolheu integralmente a decisão da Suprema Corte Americana que suspendeu o direito constitucional ao aborto no país.

A resistência na censura aos livros, como qualquer outra (a exemplo, às artes, ao ensino, às sexualidades e a qualquer ação política) está em todos os espaços, sob as mais diversas formas, por vezes, como micro práticas, pulverizadas. A resistência assume assim forma na palavra, no silêncio, no gesto, na imobilidade, nas ações individuais, coletivas, síncronas, assíncronas, presentes e remotas.

Talvez, no contexto brasileiro, os bibliotecários não estejam ainda em meio a “uma guerra cultural”, como se percebe pelos relatos de bibliotecários estadunidenses, mas à medida que as disputas políticas e eleitorais se acirram, as diferenças ideológicas se impõem, e nos exigem, enquanto bibliotecários e educadores, que tomemos posição! Tão mais em tempos de frequentes cortes na educação e na pesquisa, fechamentos de bibliotecas, emparelhamento e sufocamento de instituições voltadas à promoção da cultura, à diversidade, à igualdade, à segurança social e à preservação do patrimônio cultural.

Diante do que apresentamos e inseridos na “outra biblioteconomia”, progressista e crítica, ratificamos a fala de Luiz Mazza (1979MAZZA, L. G. Apresentação de Luiz Geraldo Mazza no Painel Censura. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE BIBLIOTECONOMIA E DOCUMENTAÇÃO, 10.,1979, Curitiba. Anais [...]. Curitiba: FEBAB, 1979. Disponível em: http://repositorio.febab.org.br/items/show/2037. Acesso em: 20 jul. 2022.
http://repositorio.febab.org.br/items/sh...
, p. 1157), ao tratar da censura: “[...] o papel de todos é sustentar uma postura clara de resistência, já que se trata de questão inegociável.”. E, portanto, resistimos!

REFERÊNCIAS

  • CONJUNTO DE DADOS DE PESQUISA

    Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
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  • PUBLISHER

    Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação. Publicação no Portal de Periódicos UFSC. As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade.

EDITORES

Franciéle Garcês, Natalia Duque Cardona, Edgar Bisset Alvarez, Ana Clara Cândido, Genilson Geraldo.

Disponibilidade de dados

Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    09 Mar 2022
  • Aceito
    01 Mar 2023
  • Publicado
    05 Maio 2023
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