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NOVOS DESAFIOS EPISTÊMICOS E SOCIAIS DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO

New epistemic and social challenges for the Information Science

RESUMO

Objetivo:

Discutir as novas fronteiras de pensamentos para a Ciência da Informação, considerando as mudanças sociais, políticas, econômicas e ambientais que vêm ocorrendo na contemporaneidade e seus potenciais reflexos em termos epistemológicos e metodológicos para o campo, apontando possibilidades de renovação nessa perspectiva.

Método:

Utiliza como método a pesquisa bibliográfica e documental, subsidiando uma discussão teórica-ensaística com abordagem praxiológica.

Resultado:

Como resultados, de um lado o ensaio levanta alguns dos principais tópicos de mudança social contemporânea em sua relação com o campo da Ciência da Informação, e, de outro lado, aponta experiências empíricas inovadoras no âmbito das políticas e ações culturais e sociais sinalizadoras de novas práticas informacionais. Estas práticas podem trazer subsídios para a formulação de questões e abordagens mais atualizadas, contribuindo para tornar mais assertivo o escopo teórico-metodológico do campo da Ciência da Informação.

Conclusões:

Destaca-se a necessidade de uma renovada troca entre teoria e prática, buscando uma abordagem praxiológica que incorpore, em seus procedimentos, formas de diálogo e colaboração com os sujeitos de pesquisa. Aponta a necessidade de uma metodologia efetivamente interdisciplinar e interseccional para a análise destes fenômenos, com um olhar comprometido com os contextos sociais locais, podendo ter como inspiração o conjunto de reflexões de diversos autores identificadas genericamente como “Epistemologias do Sul”.

PALAVRAS-CHAVE:
Ciência da Informação; Práxis; Epistemologias do Sul; Cultura; Práticas Informacionais

ABSTRACT

Objective:

To discuss the new horizons of thinking for the Information Science, considering the context changes on society, politics, economy, and environment that have been occurring and its potential reflection in epistemological and methodological terms for the field, pointing towards renewal possibilities under this perspective.

Methods:

Makes use of bibliography and documents research methodology, supporting a theoretical-essay discussion with a praxiological approach.

Results:

As results, on one hand, the essay raises some of the contemporary main social change topics related to the field of Information Science; on the other hand, points towards empirical experiences that are innovative on the subject of political, cultural and social action that brings new informational practices. Such practices can bring inputs for formulating updated research questions and methods, contributing to sharp the IS field theoretical-methodological scope.

Conclusions:

It is highlighted the necessity of a renewed exchange between theory and practice, aiming into a praxiological approach that incorporates dialogical forms and collaboration with the research subjects in its procedures. Also, the need for developing an effective interdisciplinary and intersectional methodology for the analysis of these phenomena, with a look committed to local social contexts, which may be inspired by the set of reflections by several authors generically identified as “Epistemologies of the South”.

KEYWORDS:
Information Science; Praxis; Epistemologies of the South; Culture; Informational Practices

1 INTRODUÇÃO

A inserção da Ciência da Informação como Ciência Social, ainda que “aplicada”, permanece uma questão não plenamente resolvida. Soluções como a identificação da Ciência da Informação como uma ciência “pós-moderna” ou mesmo a identificação de um paradigma “social” em seu interior não foram suficientes para responder satisfatoriamente aos desafios epistemológicos da contemporaneidade - desafios decorrentes de mudanças internas ao mundo científico, mas também fruto de mudanças sociais e políticas mais amplas.

Vivemos hoje um período de reposicionamento do Capitalismo e de suas características, que envolvem, entre outras: 1) o conhecimento e a tecnologia como fatores centrais da produção, a importância da conectividade e as transformações dos espaços e territórios; 2) as transformações no acesso ao conhecimento e as tentativas de cerceamento desse processo por parte do Capital; 3) a reconfiguração da oposição Estado-Mercado e o papel estratégico reservado às políticas sociais; 4) a crise sistêmica a qual a economia especulativa e o consumismo desenfreado provocaram nos inúmeros países, em diferentes graus de impacto (DOWBOR, 2020DOWBOR, Ladislau. O Capitalismo se desloca: Novas arquiteturas sociais. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2020).

Esse poderia ser o diagnóstico resultante de uma análise global pensada em termos econômicos “clássicos”, que revê alguns paradigmas e desenha um cenário complexo e ainda pouco definido. Por outro lado, pensar em qualquer forma ou maneira de refletir e problematizar acerca da sociedade atual necessita avançar para além do território mais estritamente econômico, em virtude, sobretudo, da evidência de diversas crises sistêmicas interrelacionadas (incluindo a mencionada no item 4 acima) dentro do regime capitalista as quais transbordam esse critério. Como exemplo, cabe apontar o agravamento das limitações da democracia liberal representativa na garantia do bem-estar coletivo, impulsionando mudanças de imaginários políticos largamente movidas por dinâmicas recentes na virtualidade digital, impactando, inclusive, processos eleitorais como os de Donald Trump nos Estados Unidos, em 2016, e Jair Bolsonaro no Brasil, em 2018, dois componentes de uma onda global autoritária e fora-deste-mundo (CANCLINI, 2019CANCLINI, Néstor García. Ciudadanos reemplazados por algoritmos. Guadalajara (MX): Universidad de Guadalajara/CALAS, 2019.; LATOUR, 2020LATOUR, Bruno. Onde aterrar? Como se orientar politicamente no Antropoceno. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020.).

Essa crise da democracia liberal enquanto horizonte de organização política e processo decisório “coletivo” do Capitalismo ocorre no mesmo contexto de agravamento da crise climática, numa aceleração dos impactos ambientais causados pela atividade (sobretudo produtiva) antrópica na Terra. O mais recente relatório do Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC) aponta a necessidade absolutamente urgente de reversão total das tendências de aquecimento do planeta antes da metade do século XXI (OBSERVATÓRIO DO CLIMA, [2022?]). E a incapacidade dos países em cumprir metas periodicamente acordadas para amenizá-las em diversos acordos e tratados internacionais evidencia uma dificuldade latente do sistema internacional, em sua configuração atual, de tecer mecanismos de respostas globais para essas questões globais.

Esses dois exemplos apontam para a diversidade de territórios presentes nos paradigmas sociais contemporâneos do momento de reconfiguração do Capitalismo, para além do econômico. Há nele dimensões políticas, de processos institucionais de tomadas de decisão, de seus imaginários e, portanto, de seus aspectos simbólicos, culturais, informacionais. Dimensões da relação humanidade-meio ambiente, da noção de Natureza e natural. E há também uma dimensão igualmente econômica, não separada pela “objetividade das leis de mercado” em uma categoria de análise mais precisa, mas profundamente contagiada por aspectos simbólicos, imaginários, políticos, ambientais etc.

Porém, tamanha multidimensionalidade de fatores não impediu o surgimento de agendas de pesquisas interessadas em reconfigurar paradigmas teóricos, práticos e metodológicos do fazer científico, buscando experimentar outras ferramentas de análise dos fenômenos do nosso tempo à luz dessa perspectiva multidimensional. Talvez pelo agravamento dessa crise sistêmica do regime do Capitalismo, há uma emergência de novas identificações políticas, sociais e coletivas, mutuamente influenciando e sendo influenciada por tendências do Conhecimento “legitimado” (CANCLINI, 2019CANCLINI, Néstor García. Ciudadanos reemplazados por algoritmos. Guadalajara (MX): Universidad de Guadalajara/CALAS, 2019.; LATOUR, 2020LATOUR, Bruno. Onde aterrar? Como se orientar politicamente no Antropoceno. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020.; TSING, 2015TSING, Anna L. The Mushroom of the End of the world: on the possibility of life in the Capitalism ruin. Princeton: Princeton University Press, 2015.).

Essas novas configurações identitárias, pode-se dizer, são fundamentadas na crítica à perspectiva monolítica do mundo na Cultura do Capitalismo. Por exemplo, Anna Tsing (2015TSING, Anna L. The Mushroom of the End of the world: on the possibility of life in the Capitalism ruin. Princeton: Princeton University Press, 2015.) explica como os estudos decoloniais asiáticos partem de uma inversão de perspectiva, do colonizador para o (território) colonizado: ao invés de traduzir a realidade da colônia através da ontologia hegemônica da metrópole, é reconhecida a existência de toda uma ontologia e epistemologia anterior própria àquele lugar, sufocadas, reprimidas e substituídas pelas do colonizador. A partir desse reconhecimento, então, é possível traçar a história da colonização não como uma consolidação de um único tipo de mundo, mas como uma invasão alienígena deste a outros tantos existentes, bem como a continuidade dessa invasão na contemporaneidade. Em um caso particular, por exemplo, essa inversão de perspectiva é ecoada por escritos de pesquisadores e lideranças indígenas brasileiras como Ailton Krenak (2019KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. Companhia das Letras, 2019.) e Davi Kopenawa (2015KOPENAWA, Davi; ALLBERT, Bruce. A queda do céu: palavras de um xamã Yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.), em suas análises do “mundo dos brancos” a partir de suas respectivas cosmologias.

Esse processo histórico, uma convergência de questionamentos produzidos por movimentos sociais, tendências estéticas, críticas no âmbito acadêmico etc., tem sido entendido pela literatura como uma “virada ontológica” (PICKERING, 2017PICKERING, Andrew. The Ontological Turn: Taking Different Worlds Seriously. Social Analysis, [s.l.], v. 61, n. 2, 1 jan. 2017.). Em outras palavras, a ideia de um mundo relativamente homogêneo no Capitalismo tem dado lugar não somente à crítica aos mecanismos de normalização da sua evidente hegemonia, mas também à constatação da existência de outros mundos com cosmovisões diversas, inclusive dentro das diferentes periferias, físicas e não físicas, desse regime. É a partir disso que pesquisadoras como Isabelle Stengers (2017STENGERS, Isabelle. Reativar o Animismo. Caderno de Leituras, n.62, p. 1-15, 2017.) propõem uma reativação do animismo, elemento ontológico colocado no campo do “fantástico” pela racionalidade moderna, como instrumento de análise, inclusive, para a própria Cultura do capital. Também Donna Haraway (2016HARAWAY, Donna. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. Duke: Duke University Press, 2016., p.165) afirma a importância para a Ciência, no contexto descrito até aqui, das perguntas: “quais mundos fabricam outros mundos?” ou “que pensamentos pensam pensamentos?” (HARAWAY, 2016HARAWAY, Donna. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. Duke: Duke University Press, 2016., p. 39). Este realinhamento das perspectivas ontológicas também se reflete em questões epistemológicas e metodológicas, convidando a repensar a tradicional dicotomia ocidental sujeito-objeto e configurando novas formas de produção do conhecimento que envolvem aproximações aos conhecimentos ditos “tradicionais”, que resultam em parcerias e construções coletivas (CORONA-BERKIN, 2019CORONA-BERKIN, Sarah. Producción horizontal del conocimiento. Guadalajara (MX): Universidad de Guadalajara/CALAS, 2019.).

Nesse sentido, urge uma atenção da Ciência da Informação para esse duplo processo, de reposicionamento do Capitalismo referente ao agravamento de suas crises sistêmicas, e do surgimento de novos horizontes do pensamento, do Conhecimento e da Informação buscando romper as limitações ontológicas e epistemológicas do próprio Capitalismo e traçar caminhos para um mundo (ou alguns mundos) fora dele. A problemática da construção do conhecimento e sua apropriação social tem que responder a essas novas configurações do tempo presente. E tendo isso em mente, essa introdução ao tema será seguida por um aprofundamento no processo de interação entre as dinâmicas sociais mais gerais do atual contexto e os caminhos alternativos para repensar coordenadas conceituais/epistemológicas e o fazer científico.

2 CIÊNCIA, SOCIEDADE E (DES)CONSTRUÇÕES EPISTEMOLÓGICAS

Para refletir acerca das aproximações entre epistemologias, produção do conhecimento e sua apropriação social, podemos tomar como ponto de partida algumas considerações de Boaventura de Souza Santos. Ele propõe uma abordagem para enfatizar os aspectos positivos do senso comum, apontando suas possíveis contribuições para um projeto de emancipação social e cultural. Mesmo num plano ainda teórico, ele salienta que a condição para o desenvolvimento dessa positividade só pode se dar no interior de uma configuração cognitiva na qual tanto o senso comum como as ciências modernas procurem se superar para gerar uma nova forma de conhecimento, apontando “a necessidade da dupla ruptura epistemológica que permita destruir a hegemonia da ciência moderna sem perder as expectativas que ela gera” (SANTOS, 1989SANTOS, Boaventura de Sousa. Introdução a uma ciência pós-moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989., p. 42). Nesse sentido, propõe um novo tipo de ruptura epistemológica, buscando atenuar o desnivelamento entre os discursos, para criar ao mesmo tempo um senso comum esclarecido e uma ciência socialmente responsável, gerando assim uma configuração de conhecimentos democraticamente distribuídos. Essa perspectiva poderia soar utópica há algum tempo, mas hoje ganha factibilidade graças ao desenvolvimento das tecnologias de comunicação e informação produzidos pela própria ciência.

Nesse sentido, nos alinhando a uma perspectiva semelhante à de Foucault em “As Palavras e as Coisas” (2007FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas. São Paulo: Martins Fontes, 2007.), podemos pensar a episteme da sociedade contemporânea como sendo perpassada por pelo menos três eixos “transversais”, na medida em que estão presentes como subtexto, ou contexto mais profundo, de qualquer análise. Seriam os eixos ecológico/ambiental, o “identitário” e o propriamente epistemológico-hermenêutico. Todos os três conectam-se e influenciam-se mutuamente, então a separação é um artifício, possuindo um sentido mais propriamente heurístico, de facilitar a exposição do argumento de base.

O primeiro eixo envolve a relação entre Natureza e Cultura (e, nos desenvolvimentos históricos posteriores, entre Natureza e Capital), compreendendo tanto a oposição como a complementaridade entre os termos. De modo geral, o que ocorreu historicamente foi uma subordinação do primeiro eixo (Natureza) em relação ao segundo (Cultura), consolidando a base da formação do pensamento social e da análise marxista da produção no século XIX. Por outro lado, nesse mesmo período, o Movimento Romântico propõe uma postulação de outra relação com a natureza, numa perspectiva que antecipa e prenuncia a Ecologia do século XX. Situadas em outro território epistêmico, essas distintas visões de natureza, como a contribuição incontornável do pensamento de Darwin, irão “re-alocar” o homem no mundo natural. Foi Ernst Haeckel, um darwinista, quem cunhou o termo Ecologia, a partir de duas palavras gregas: oikos (casa ou lugar) e logos (estudo ou conhecimento), significando originalmente a relação de um animal com seus ambientes orgânico e inorgânico. Na segunda metade do século XIX surgem as primeiras associações ambientalistas, de caráter conservacionista (TSING, 2015TSING, Anna L. The Mushroom of the End of the world: on the possibility of life in the Capitalism ruin. Princeton: Princeton University Press, 2015.).

Ao final das duas grandes guerras do século XX, o modelo de civilização baseado no Capitalismo havia triunfado em escala quase mundial, mas paralelamente crescia também a percepção de seus princípios estarem equivocados, e que o progresso cobrava um preço elevado demais, tanto na questão do ambiente como em aspectos sociais e culturais. Na onda de contestação contracultural, surge o ambientalismo propriamente dito. Um dos marcos do movimento foi a publicação do livro Silent Spring (Primavera Silenciosa), de Rachel Carson, em 1962, o qual, embora tratando mais especialmente dos problemas do uso do DDT (diclorodifeniltricloretano, um agrotóxico) na agricultura, deixou um legado influente ao combater o materialismo da ciência e as ideias de controle tecnológico da natureza. Mesmo seu conteúdo tendo gerado muita controvérsia, Silent Spring pode ter sido o livro mais importante para a formação do movimento ambientalista nos anos 60 (BELTRÁN, 2019BELTRÁN, Elizabeth Peredo. Ecofeminismo. In: SOLÓN, Pablo (org.). Alternativas sistêmicas: bem viver, decrescimento, comuns, ecofeminismo, direitos da Mãe Terra e desglobalização. São Paulo: Elefante, 2019, p. 113-143.).

A própria noção do mundo com uma "aldeia global" favoreceu uma compreensão da vida na Terra como uma realidade unificada e do meio ambiente como um patrimônio da humanidade, acima de todos os territorialismos, de toda a política e de todas as culturas particulares. A vigorosa emergência do movimento ambientalista surpreendeu os sociólogos, que de modo geral defendiam o modelo civilizatório tradicional, e não dispunham de um corpo teórico consistente para lidar com o assunto. Certamente havia críticos ao paradigma desenvolvimentista, como os sociólogos marxistas, mas, mesmo assim, tendiam a ver a temática ambiental como um desvio das questões mais cruciais do humanismo1 1 O paradigma do crescimento/desenvolvimentismo teve seu auge nas 3 décadas que se sucederam ao pós-guerra, encerrando-se com a crise de petróleo de 1973. A partir daí passa-se a falar no “desenvolvimento sustentável”, a partir do relatório Brundtlant de 1987 e das discussões da ECO-92, que logo se revela também inviável. Com a imposição das diretrizes neoliberais via globalização os termos mais empregados passam a ser economia e/ou crescimento “verde”, incorporando a natureza ao grande ciclo de produção, fabricação e valorização do mercado (DANOWSKI; VIVEIROS DE CASTRO, 2017) .

Hoje a questão ambiental está na ordem do dia, em termos políticos, sociais e científicos-epistemológicos. Nesse último aspecto, adiantando um pouco o terceiro bloco, um conceito científico recente que está se tornando conhecido pelo grande público é o de “Antropoceno”, nomeador de uma nova era geológica, na qual a ação humana é responsável por alterar o funcionamento e os fluxos naturais do planeta ao promover intensas mudanças globais.

Autores como Bruno Latour (2020LATOUR, Bruno. Onde aterrar? Como se orientar politicamente no Antropoceno. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020.) falam em desastre ecológico, apontando a explosão das desigualdades e o negacionismo climático como um mesmo e único fenômeno, na medida em que a contradição entre o sistema de produção e o sistema de geração se acirra. Latour, particularmente, vai chamar a atenção para como a história das ciências permite compreender como uma certa ideia de “natureza” congelou as posições políticas, e hoje é necessário ir além de polarizações como local-global, progresso-conservação, e compreender a transformação da luta de classes em uma luta de lugares geo-sociais.

Para Pablo Solón (2019SOLÓN, Pablo (org.). Alternativas sistêmicas: bem viver, decrescimento, comuns, ecofeminismo, direitos da Mãe Terra e desglobalização. São Paulo: Ed. Elefante, 2019.), ativista ambiental, ex-diplomata e político boliviano, do ponto de vista das perspectivas do “Sul”, temos a recuperação e valorização dos saberes tradicionais, das visões ameríndias, referências para a construção de novos conceitos como o de “Bem Viver” e de “Mãe-Terra” (Pacha Mama), que se tornam operadores conceituais e de ação política - incorporando-se, por exemplo, às constituições do Equador (governo Rafael Correa, 2008) e da Bolívia (governo Evo Morales, 2009). Também temos o desenvolvimento de experiências norteadas pelo conceito de Bens Comuns, as quais geraram referências para a ação política e para a reflexão acadêmica (voltaremos a mencionar este tema na quarta seção deste texto).

Um segundo eixo, bastante complexo para ser discutido a fundo aqui, é o que poderíamos denominar de “identitário”. Envolve tanto uma perspectiva teórica de análise como uma perspectiva política de ação, conectadas a identificações identitárias para além da tradicional identidade de classe proposta pela análise marxista. E aqui já podemos identificar um primeiro elemento de polêmica: quem nomeia esses movimentos? Estas denominações, e suas polarizações, envolvem disputas de legitimidade em torno de valores, referências e práticas. Em uma vertente, lutas anti-escravistas, relacionadas à diáspora africana, aos movimentos anticoloniais e ao movimento norte-americano pelos direitos civis (CARNEIRO, 2023CARNEIRO, Sueli. Dispositivo de racialidade: A construção do outro como não ser como fundamento do ser. Rio de Janeiro: Zahar, 2023.; HALL, 2003HALL, Stuart. Da diáspora: Identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Ed. UFMG; Brasília: Representação da Unesco no Brasil, 2003.; KILOMBA, 2019KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. São Paulo: Cobogó, 2019.). Em outra vertente, lutas pelo sufrágio universal/ lutas pelos direitos femininos e até lutas dos movimentos de saúde - contracepção, aborto, creches etc. (GONZALEZ, 2020GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afro-latino-americano: ensaios, intervenções e diálogos. Rio de Janeiro: Zahar, 2020.; HOOKS, 2022HOOKS, Bell. O feminismo é para todo mundo: políticas arrebatadoras. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2022.). Somam-se a estas vertentes as lutas pelos direitos LGBTQIA+ - mais recente, pelo menos nessa denominação, mas precedido historicamente pela discussão dos direitos dos homossexuais (PRECIADO, 2019PRECIADO, Paul B. Um apartamento em Urano: Crônicas da travessia. Rio de Janeiro: Zahar, 2019.; TREVISAN, 2021TREVISAN, João Silvério. Seis balas num buraco só: A crise do masculino. São Paulo: Objetiva, 2021.).

São movimentos políticos e perspectivas de análise que possuem um histórico “político”, um histórico onde as ideias e ações caminham juntas e se retroalimentam, gerando esferas de práticas e esferas semânticas, muitas vezes quebrando o modelo político tradicional da luta de classes centrada na visão das dicotomias clássicas Trabalho X Capital, Proletariado X Burguesia, Esquerda X Direita. Contemporaneamente é possível perceber uma reconfiguração da própria história desse movimento numa perspectiva de “longa duração”. Exemplos desse tipo de abordagem são os trabalhos de Silvia Federici (2017FEDERICI, Silvia. Calibã e a bruxa: mulheres, corpos e acumulação primitiva. São Paulo: Elefante, 2017.), relendo as origens do Capitalismo na perspectiva de gênero, ou de Paul Gilroy (2012GILROY, Paul. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. São Paulo: Editora 34, 2012.), relendo a constituição da Modernidade a partir da diáspora africana. Queremos destacar aqui, no âmbito deste segundo eixo, o tensionamento da ação política e seus reflexos sobre o pensamento social. O acentuamento das crises do Capitalismo, processo catalisador de novas formas de agências de contestação do poder, evidenciou a necessidade de buscar horizontes de análise (do pensamento social) e resposta (na ação política) multidimensionais, emaranhados entre si. Nesse sentido, por exemplo, a perspectiva da interseccionalidade busca dar conta da multiplicidade posicional conflitiva que envolve os atores e os contextos sociais, tentando construir conhecimentos e constatando a necessidade de articulá-los (AKOTIRENE, 2019AKOTIRENE, Carla. Interseccionalidade. São Paulo: Jandaíra, 2019.).

Finalmente, um terceiro eixo, que pode ser denominado epistemológico-hermenêutico, envolve a maneira como pensamos e falamos acerca de objetos, sujeitos e questões. E desde logo lembramos que, diferentemente da perspectiva científica “tradicional”, entendemos essas falas e pensamentos não como “neutros”, porque a ciência não é “neutra”: envolve ideologias, envolve imaginários, envolve tomadas de posição. Quando mencionamos ideologia, nos referimos ao sentido mais abrangente do termo - de conjunto ou sistema de crenças. O importante aqui é não confundir ideologia da ciência com ciência ideológica; a ideologia da ciência é o sistema de crenças envolvendo procedimentos, questionamentos e princípios éticos para aperfeiçoar cada vez mais o conhecimento. Desse modo, compreendemos o conhecimento científico não como sinônimo de verdade absoluta ou um dogma: é uma construção coletiva em permanente aperfeiçoamento e atualização.

Por outro lado, é importante relativizar esse tipo de crítica ao pensamento ocidental, considerando certos antecedentes e diálogos no que diz respeito às oposições entre conhecimento prático e conhecimento acadêmico, para não incorrer em generalizações simplificadoras construtoras da imagem de uma academia “afastada” das verdadeiras questões e/ou das questões socialmente relevantes (retomando em outros termos a velha oposição ciência “pura” X ciência “aplicada”). Assim, a generalização da concepção de ciência positivista como a única existente na academia deixa de lado seu débito com posturas científicas antecipadoras desse tipo de crítica dentro da própria academia ou do universo intelectual. Como observaria Bourdieu, na perspectiva da autonomia dos campos sociais pensadas em relação ao campo científico, não se trata de estabelecer uma distinção específica entre saber neutro ou engajado, mas considerar as condições de produção de um saber verdadeiramente científico - ou seja, a expressão de uma autonomia relativa de determinado campo de produção cultural, subordinado em maior ou menor grau aos campos dominantes da sociedade (BOURDIEU, 2004BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: Por uma sociologia clínica do campo científico. São Paulo: Ed. Unesp, 2004.). Assim, é importante salientar o desafio, sempre presente, de articular os sujeitos produtores do conhecimento e seus distintos espaços e legitimidades. Autores como Gramsci e seu conceito de intelectual orgânico, o próprio Pierre Bourdieu e a concepção de intelectual engajado, de intelectual público e mesmo Michel Foucault e sua noção de intelectual específico são provas disso, bem como boa parte do pensamento antropológico pós-colonial das décadas de 1970/80 em diante.

Mas, de fato, o tipo de conhecimento científico predominante na era moderna, até recentemente, é o de aplicação técnica, geralmente feito por quem está fora da situação existencial na qual incide a aplicação, sem mediações e escamoteando conflitos e definições/propostas alternativas. O modo de racionalidade da comunidade científica acaba se sobrepondo ao de racionalidade das comunidades de saber local (CORONA-BERKIN, 2019CORONA-BERKIN, Sarah. Producción horizontal del conocimiento. Guadalajara (MX): Universidad de Guadalajara/CALAS, 2019.; SANTOS, 1989SANTOS, Boaventura de Sousa. Introdução a uma ciência pós-moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989.). Constitui-se, portanto, como um tópico problemático da discussão contemporânea acerca da relação entre a pesquisa, a sociedade e o “social”. Santos (1989SANTOS, Boaventura de Sousa. Introdução a uma ciência pós-moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989.), por exemplo, irá propor uma aproximação entre ciência e cotidiano, entre a ciência e o que denomina de “senso comum esclarecido”. Nesse sentido, vislumbra uma ciência “pós-moderna” estabelecendo uma relação com outros saberes, reconhecendo que a ciência, especialmente em sua vertente positivista, como promotora da desqualificação de outras formas de conhecimento durante muito tempo. Já Alberto Melucci (2001MELUCCI, Alberto. A invenção do presente: movimentos sociais nas sociedades complexas. Petrópolis (RJ): Vozes, 2001.) aponta a necessidade de os movimentos sociais ou antagônicos produzirem e/ou se apropriarem de conhecimentos socialmente legitimados para debaterem suas demandas no espaço público (inclusive em embates que buscam legitimar esses conhecimentos).

3 REPENSANDO TECNOLOGIA, CONHECIMENTO E SOCIEDADE: PARADOXOS E POSSIBILIDADES

Assim, uma questão incontornável é a de qual é a autonomia e a legitimidade simbólica do conhecimento produzido a partir de parâmetros que buscam conectar-se tanto aos conhecimentos ditos tradicionais, bem como à práxis de movimentos sociais diversos. Sarah Corona-Berkin (2019) propõe uma abordagem a qual denomina de PHC (Produção Horizontal do Conhecimento), sustentada em três pilares: 1) Conflito gerador; 2) Igualdade discursiva e 3) Autonomia do olhar próprio. A PHC opta pelo conflito como condição geradora: os diferentes discursos se expõem um a frente do outro e se prestam a construir algo novo - que os sujeitos se conheçam e se entendam ou cheguem a um consenso, refere-se ao fato de aceitar o estado de pesquisa compartilhada para produzir um estudo diferente, híbrido e subversivo, uma nova pesquisa a serviço da interpretação horizontal do mundo social. Dado o conflito gerador não ter a ver com formas harmônicas de incorporar a voz alheia sem comprometer os princípios hegemônicos da investigação, construir o conhecimento mútuo tem a ver com estabelecer condições de equidade para traçar um caminho para a autonomia das próprias visões, constituindo os pesquisadores, acadêmicos e não-acadêmicos, em pesquisadores pares. A autonomia, como Berkin entende, não é uma essência a ser resgatada, mas é definida por linguagens e contextos. A autonomia buscada a partir da PHC é construída na troca intersubjetiva, onde se espera a expressão da voz de cada um de acordo com suas próprias linguagens e contextos, para explorar novas formas de conhecimento na comunicação.

Regina Marteleto, Leila Ribeiro e Cátia Guimarães (2007MARTELETO, Regina M.; RIBEIRO, Leila B.; GUIMARÃES, Cátia. Informação em movimento: produção e organização do conhecimento. Civitas: Revista De Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 2, n. 1, p. 69-80, 2007.) já antecipavam em grande medida esta perspectiva, ao refletir acerca da recuperação do conhecimento produzido no âmbito dos movimentos sociais, velhos e novos, e sua ação em rede como desafio aos modelos de ciência positivista. Desse modo, respondem à questão de como produzir novos conhecimentos e responder aos problemas sociais invocando a concepção de “terceiro texto” ou “terceiro conhecimento”, resultante de uma produção realizada em diálogo, mas que não seria um produto híbrido ou meramente combinatório: sua condição seria própria do novo, das múltiplas linguagens humanas, cuja convivência conflitiva geradora pode ser produtora de novas respostas a perguntas sociais. Trata-se, portanto, muito mais de “um construto de ordem prática e simbólica que permite aos agentes uma destreza técnica para lidar com questões práticas do cotidiano e, ainda mais, um meio de valorização e de fortalecimento dos elos de apoio social e das suas capacidades inventivas” (MARTELETO; RIBEIRO; GUIMARÃES, 2007MARTELETO, Regina M.; RIBEIRO, Leila B.; GUIMARÃES, Cátia. Informação em movimento: produção e organização do conhecimento. Civitas: Revista De Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 2, n. 1, p. 69-80, 2007., p. 78). Nesse sentido, seria também um recurso para se repensar uma outra epistemologia social, focada no lugar ético e político do conhecimento científico.

Outro tópico importante a ser considerado a essa altura da discussão é o da tecnologia, e de como ela modifica as formas de pesquisa, de produção do conhecimento e sua relação com a sociedade. As “novas” tecnologias ampliaram o conceito de “pesquisa” - tanto a pesquisa científica, como atividades que passaram a ser correlatas, como curadoria, desintermediação, escolha e/ou indicação por algoritmos, indicando novas formas de entender a relação com os “dados” e a pesquisa, tanto como resposta por demandas como também por busca de padrões.

Particularmente no território das Ciências Sociais, a expansão do codificável, promovida pela informatização e pela convergência digital sobre inúmeras atividades humanas tecnicamente mediadas, cria novas tensões entre dinâmicas que convivem lado a lado: o surgimento de novas formas de produção de conhecimento, graças ao amplo acesso a informações, produzido através das interações em redes cibernéticas, simultaneamente à modulação de nossas vidas, ao aprofundamento da sociedade de controle e à expansão do Capitalismo informacional. Nosso crescente uso de tecnologias digitais de comunicação gera uma infinidade de dados, rastros e indícios sobre nossa existência mediada por esses dispositivos. Consciente ou inconscientemente, transformamos cada ação, cada interação, cada pensamento expresso na rede, em uma nova informação registrável e quantificável.

Isso é possível porque a interatividade/o feedback entre entidades comunicantes é um imperativo do desenho sociotécnico da rede, uma característica fundamental para o funcionamento das tecnologias cibernéticas. Ela está na base dos processos colaborativos em redes digitais, nas formas ampliadas da produção científica, nas diversas expressões da ciberpolítica e do ativismo digital, mas também é uma das condições possibilitadoras da expansão da produção e da extração de valor sobre nossas interações na rede, ao mesmo tempo modificando as formas de exercício do poder nas sociedades contemporâneas.

Há todo um conjunto de metáforas relacionadas à explosão dos dados, o Big Data, buscando traduzir as consequências desse fenômeno para a cultura, a economia e a política contemporâneas. Uma dessas metáforas é a dos “reservatórios de dados”, estoques de informação dos usuários, que, semelhante ao que ocorre com os recursos naturais, estariam abertos à “mineração”. Aparentemente são recursos infinitos, dados que possibilitariam às empresas de tecnologia construir um universo de “compartilhamento” - por meio da concessão voluntária dessas informações por parte dos usuários. Constrói-se, desse modo, uma ideologia em torno de uma utopia comunitária de melhores serviços, de construção de conhecimentos e de partilha de “experiências”. (BEZERRA; ALMEIDA, 2020BEZERRA, Arthur Coimbra; ALMEIDA, Marco Antônio de. Rage against the machine learning: a critical approach to the algorithmic mediation of information. Marília (SP). Brazilian Journal of Information Science, [s.l.], v. 14, p. 06-23, 2020.). Ao analisar esse fenômeno do “extrativismo de dados”, Evgeny Morozov (2018MOROZOV, Evgeny. Big Tech: a ascensão dos dados e a morte da política. São Paulo: Ubu Editora, 2018.) aponta as implicações de suas consequências econômicas e políticas: o acúmulo de imensa riqueza - e poder - por um punhado de investidores e gigantes empresariais, a precarização das formas de regulamentação do trabalho e dos serviços (a “flexibilização”, como preferem os ideólogos do empreendedorismo). Uma alegada economia de recursos justificou a reforma dos sistemas de saúde, educação e previdência públicos com a introdução dos provedores de serviços digitais, implicando, entretanto, na perda de controle político e de governabilidade sobre decisões, pois estas passaram a serem exercidas “tecnicamente” pelos algoritmos.

Dentro deste contexto, faz bastante sentido retornar a Melucci e a sua constatação de que “sair da ideologia e produzir conhecimento (conhecimento, capacidade de análise, capacidade de comunicação, auto-reflexibilidade) torna-se um recurso-chave para a ação coletiva” (MELUCCI, 2001MELUCCI, Alberto. A invenção do presente: movimentos sociais nas sociedades complexas. Petrópolis (RJ): Vozes, 2001., p. 142). Os movimentos sociais, os coletivos em geral, podem constituir-se em espaços de produção do conhecimento, reconfigurando espaços políticos para onde convergem demandas sociais, espaços produtores, transformadores e difusores das informações. São espaços que, para preservarem sua natureza pública, devem garantir o debate e a negociação dos diversos interesses. Desse modo, vale lembrar os campos da vida social e política estarem sendo reconstituídos pelas interações e visibilidades proporcionadas pelas tecnologias, influenciando as formas pelas quais o poder político é exercido. O universo digital abre a possibilidade de compreender as práticas como um grande texto palimpsesto e polifônico, no qual diversas vozes e escrituras se entrecruzam, remetendo ao pensamento de Michel de Certeau (2014CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: Artes de fazer. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.), especialmente quando este ressalta os modos de fazer dos indivíduos, suas estratégias e táticas constituídas a partir dos lugares e contextos que ocupam. Desse modo, não há sistema de dominação totalmente impedidor de formas de apropriação distanciadas ou subversivas - assim como não há táticas exclusivamente alternativas, imunes a se enfrentarem com condições desiguais de possibilidades, visto estarmos em sociedades cujos recursos são desigualmente distribuídos.

Nessa perspectiva de questionamento paradigmático, é praticamente impossível imaginar propostas de superação tanto da modernidade como da pós-modernidade não se defrontando com a tecnologia como um tema central. Nesse sentido, Yuk Hui (2020HUI, Yuk. Tecnodiversidade. São Paulo: Ubu Editora, 2020.) e sua concepção de “tecnodiversidade” propõe ir além da crítica ao eurocentrismo e ao colonialismo, sinalizando estarem materializadas nas tecnologias as perspectivas ontológicas e epistemológicas alvos dessas críticas (nas arquiteturas de bancos de dados e de algoritmos, nas definições de usuários e nos modos de acesso). O Capitalismo evoluiu atualizando-se com os avanços tecnológicos, investindo em máquinas e obtendo lucro na criação de novos dispositivos. Mas a concepção de tecnodiversidade proposta por ele não se relaciona com a produção das mesmas tecnologias com atributos levemente diferentes ao redor do mundo, sob marcas distintas. A tecnodiversidade “se refere a uma multiplicidade de cosmotécnicas que difiram uma das outras em seus valores, epistemologias e formas de existência” (HUI, 2020HUI, Yuk. Tecnodiversidade. São Paulo: Ubu Editora, 2020., p. 201).

Trata-se, portanto de uma forma de pensamento não-europeu, relacionado às culturas tradicionais, em busca de responder os dilemas deste contexto tecnológico ao mesmo tempo propondo retornar de forma renovada à discussão acerca da Natureza. Desse modo, para além de maneiras de lidar com os recursos naturais, de formas de arte e de artesanato dos povos originários a serem preservadas, essas cosmotécnicas poderiam contribuir para recontextualizar a tecnologia moderna. O autor indaga sobre a possibilidade de um diálogo transversal desse tipo, na medida em que o mundo inteiro foi sincronizado e transformado pela força incomensurável das mudanças tecnológicas. Distante de uma visão ingênua, ele questiona como as culturas não europeias poderiam aprender com os descaminhos da modernidade e, ao mesmo tempo, desenvolver uma visão crítica a partir de outros pontos de vista, apontando um potencial descolonizador de usos renovados das tecnologias com o desenvolvimento e a manutenção da tecnodiversidade. São questões as quais já vinham sendo fermentadas pelo feminismo, pela ecologia e pelos debates identitários e étnicos, na sua contestação dos modelos social, cultural, político e econômico vigentes. Assim, podemos estar vislumbrando, talvez, uma janela de oportunidade para a emergência de novas maneiras de pensar e conceber estruturas, capazes de conduzir a “epistemes” distintas dos modelos atuais.

4 DESAFIOS EPISTÊMICOS E INSTITUCIONAIS: DA PRÁXIS AO LOGOS?

Alguns processos contemporâneos no campo da Cultura e da Informação já permitem uma constatação mais positiva de aproveitamento da janela de oportunidade referida acima. Considerando a constatação cada vez mais consolidada das limitações de diversas matrizes simbólicas do Capitalismo, sobretudo na sua capacidade de fomentar uma coletividade intersubjetiva mais concreta, algumas práticas de experimentação epistemológica exploram novos referenciais possíveis de “espaço comum” entre as brechas da hegemonia capitalista. Em outras palavras, buscam romper, com todas as suas limitações contextuais de resistência contra-hegemônica, padrões de significados que se apresentam como obstáculos à configuração de lugares físicos e não-físicos, coletivos, coabitados, compartilhados.

Há um diálogo entre algumas das reflexões alinhavadas anteriormente e aquelas desenvolvidas contemporaneamente por autores refletindo acerca da apropriação de bens compartilhados, nem privados e tampouco estatais, denominados de “comuns” (commons). (DARDOT; LAVAL, 2017DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. Comum: ensaio sobre a revolução no século XXI. São Paulo: Boitempo, 2017; HARVEY, 2014HARVEY, David. Cidades rebeldes: do direito à cidade à revolução urbana. São Paulo: Martins Fontes, 2014.). Os comuns podem ser compreendidos como processos de gestão de recursos coletivos atribuidores de sentido às formas de resistência e aos processos de privatização e monetarização. Assim, colocam em evidência o paradoxo existente numa definição puramente tecnicista-econômica do conceito de inovação, pois boa parte dos valores norteadores das concepções e formas de gestão dos “comuns” ancoram-se na tradição - embora sejam, ainda assim, “inovadores” em relação aos padrões capitalistas vigentes. Mesmo sendo bastante abrangente e fluída, podendo assumir diversas definições, a noção de “comum” sempre compreende uma circulação de informações e saberes, uma construção comunicativa e coletiva (SAVAZONI, 2018SAVAZONI, Rodrigo. O comum entre nós: da cultura digital à democracia do século XXI. São Paulo: Ed. SESC, 2018.). Diversas experiências concretas mundo afora, reunindo compartilhamento, colaboração, organização emancipatória e autônoma, permitem vislumbrar essa forma de construção dialógica. São experiências demandantes de um olhar renovado sobre os fenômenos sociais, incorporando questões e subsídios contemporâneos para a elaboração de uma epistemologia social da Ciência da Informação. Por meio da construção colaborativa do conhecimento, de formas renovadas de gestão coletiva e de apropriações criativas das tecnologias, estas experiências trazem importantes elementos para a reflexão.

Evgeny Morozov e Francesca Bria (2019MOROZOV, Evgeny; BRIA, Francesca. A cidade inteligente: Tecnologias urbanas e democracia. São Paulo: Ubu Editora, 2019.), por exemplo, elencam um conjunto de exemplos de utilização da tecnologia na construção de “comuns digitais” em diversas cidades do mundo, a partir de práticas colaborativas e de governança coletiva dos dados, indo além do modelo das smart cities, principalmente se contrapondo à financeirização neoliberal (MOROZOV; BRIA, 2019MOROZOV, Evgeny; BRIA, Francesca. A cidade inteligente: Tecnologias urbanas e democracia. São Paulo: Ubu Editora, 2019.). No Brasil, uma iniciativa não do governo, mas dos movimentos sociais, foi a desenvolvida pela Agência Cultural Solano Trindade, que, ao criar um site para a instituição, também incorporou um “Mapa Cultural da Quebrada”, por meio de uma linha de fomento da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo (SMC-SP). Segundo os membros da agência, o objetivo do projeto era superar uma dificuldade latente quanto à apropriação das tecnologias da informação e comunicação (TIC) pela população das regiões mais periféricas da cidade, expressa tanto na oferta insuficiente para acesso à internet como na necessidade de ampliação das capacidades cognitivas necessárias à sua utilização (SENA, 2013SENA, Eduardo Augusto. Políticas culturais, tecnologias de informação e democracia cultural: o programa VAI e a constituição da Agência Popular Solano Trindade. São Paulo: Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, 2013. (Dissertação de mestrado).). Essa iniciativa serviu de inspiração para a construção de mapas culturais, mobilizando recursos gráficos, organizacionais, operacionais e computacionais de forma colaborativa. Por outro lado, o uso cada vez mais frequente do Facebook, demonstra alguns dos paradoxos possivelmente presentes na apropriação das TICs pelos movimentos sociais e agentes públicos: embora esta plataforma seja um importante elemento para a explosão do uso da web, ao mesmo tempo integra o movimento de cerceamento à liberdade do uso da internet (SAVAZONI, 2018SAVAZONI, Rodrigo. O comum entre nós: da cultura digital à democracia do século XXI. São Paulo: Ed. SESC, 2018.). Entretanto, é certo que sua disseminação o tornou uma plataforma fundamental para as estratégias de articulação e comunicação dos atores do campo dos movimentos culturais.

Para além disso, essa experiência cartográfica também abre a possibilidade de ressignificar um território, a Quebrada, em outras coordenadas. As periferias do Capitalismo, no geral, sempre foram objetificadas como lugares de normalização da necropolítica (MBEMBE, 2016MBEMBE, Achille. Necropolítica. Arte e Ensaios, São Paulo, n. 32, p. 123-151, 2016.), são as localidades habitadas por aqueles sujeitos que podem ser deixados para morrer, quando não ativamente mortos. No esquema de imaginários da cultura do Capitalismo, são posicionadas como referências de tudo aquilo que a utopia do progresso não é. Processos como o Mapa da Quebrada, por sua vez, podem romper esse posicionamento dos territórios periféricos, permitindo compreendê-los (e até mesmo mapeá-los) como universos inteiros de dinâmicas culturais, artísticas, do Conhecimento e da Informação.

Hoje, a região do Vale de Aburrá, e especialmente a cidade de Medellín, na Colômbia, possivelmente representa a ideia de um laboratório para esses processos de reconfiguração do conhecimento e da apropriação da informação à luz dos desafios postos pela cultura capitalista em crise. Essa ideia está representada no ecossistema bibliotecário da região, composto por duas “partes” em uma constante e diversificada gama de interações: as bibliotecas públicas, resultado de políticas institucionais inspiradas e demandadas pela segunda parte, as bibliotecas populares, historicamente construídas por movimentos sociais dos territórios mais vulnerabilizados (CENTRO NACIONAL DE MEMORIA HISTÓRICA, 2017)

As bibliotecas do ecossistema buscam romper as noções tradicionais da modernidade desse tipo de dispositivo. Ao invés de um lugar depositário de Conhecimento legitimado, cuja função é servir de ponto de acesso individualizado à informação, estendem seus processos para além de seu espaço físico, em um duplo movimento. Por um lado, utilizam os espaços comuns dos territórios como palco, sala, teatro etc. de suas próprias atividades, estimulando um uso comunitário deles ao redor de exercícios de experimentação com a linguagem, ferramenta múltipla de significação da realidade, ativando a possibilidade de efetivamente ocupar esses espaços (as ruas, as quadras, as praças etc.). Por outro, e sobretudo no caso das bibliotecas públicas2 2 Importante esclarecer que esse esforço não é quantitativamente maior nas bibliotecas públicas em relação às bibliotecas populares. A questão, na verdade, reside no fato de as bibliotecas públicas serem iniciativas do poder estatal, mesmo originadas de articulações territoriais, ou seja, vindas “de fora”, e alternativas à uma tradição de políticas de extrema violência. Sua integração às redes locais depende, então de um esforço maior de ganho de confiança dos sujeitos-usuários da biblioteca e elaboração da noção de seu direito àquele lugar. , buscam tornar-se parte da cotidianidade e das redes de vivência coletivas, isto é, integrar-se à vida do território. Parte do esforço nesse segundo eixo é tornar a biblioteca um lugar de fomento, dinamização, e sobretudo legitimação da cultura e do conhecimento germinado ali, no bairro, setor, comuna ou vereda, ou seja, consolidar seu território como universo próprio, legítimo, existente em seus próprios termos. As bibliotecas em si, nessa noção expandida sobre tal dispositivo cultural, servem elas próprias como laboratórios locais de experimentação com a linguagem, isto é, com as formas de significação, partindo das dinâmicas próprias dos territórios. Criam novas cartografias, estudos geográficos, históricos, econômicos, baseadas em articulações, percorridos e diálogos com sujeitos portadores de tradições e conhecimento locais (história, memória, técnicas produtivas, técnicas artísticas etc.). Também realizam atividades diversas, em sua imensa maioria em caráter coletivo, lúdico e dialógico com sujeitos dali, de estímulo à criatividade, à própria experiência, buscando ampliar horizontes do conhecimento e da ação cultural estabelecidos.

Ao mesmo tempo, a extensão de seus processos ao território como um todo e sua integração em suas redes de relações é um esforço de reocupar o “espaço público” enquanto “espaço comum”, isto é, da possibilidade de estar comunitariamente ali. O território, então, se reconfigura não apenas em um espaço de vida coletiva, comunitária, mas também um espaço de construção de conhecimento legítimo, a partir dessa própria noção de espaço compartilhado. E posicionando-o como referência de construção e legitimação do Conhecimento, este próprio é transbordado para além de sua oficialidade hegemônica, formal, e adquire caráter intersubjetivo, de espaço compartilhado. Os sujeitos podem se entender não como objetos, mas agentes da Cultura, e seus diversos imaginários, componentes desses universos simbólicos do território, são ferramenta que os torna protagonistas nesse processo de pensar um mundo fora do regime do Capitalismo.

É evidente que dentro do ecossistema bibliotecário há alguns obstáculos referentes à sua existência dentro do esquema de forças político-culturais da hegemonia cultural. Por exemplo, mesmo com a articulação in loco de bibliotecas públicas e populares ser bastante positiva, e a força histórica do movimento social pelas segundas ter resultado na construção das primeiras, há ainda uma persistente desigualdade de recursos entre elas. Enquanto as públicas são destino de recursos econômicos estatais, compreendendo, em geral, uma infraestrutura mais cara, as populares dependem em grande parte de doações, do trabalho voluntário de seus coordenadores com suas possibilidades de angariar fundos, e estão colocadas nas condições de vulnerabilidade de seus territórios. Há mecanismos de estímulos via editais públicos para as bibliotecas populares, para onde convergem grandes esforços de construção de projetos de captação, mas mesmo com sua importância histórica na mudança de realidade da região não lhes é permitida a consideração no orçamento ordinário de Medellín (FUNDACIÓN RATÓN DE BIBLIOTECAS, 2016).

Porém, mesmo com as problemáticas contextuais de tais iniciativas, tanto a experiência específica do Mapa Cultura da Quebrada quanto essa dimensão mais ampla do ecossistema de bibliotecas do Vale de Aburrá proporcionam subsídios instigantes para a reflexão proposta neste ensaio. Se cada vez mais as crises dentro do sistema do Capitalismo se mostram multidimensionais e integradas, caminhos para responder a elas talvez demandem este mesmo aspecto. E estratégias como as comentadas nesta seção, seguindo essa linha, apontam para uma possibilidade de romper a reificação da Cultura e do Conhecimento hegemônicos através da busca por outros universos de significados, a partir da protagonização dos territórios postos na periferia do mundo.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As dinâmicas contemporâneas da Informação e do Conhecimento impulsionadas pelas tecnologias digitais demandam uma atenção renovada do campo da Ciência da Informação, pois expandem as possibilidades de codificação e dinamização de dados informacionais e dos fluxos sociais e são centrais em algumas das questões sociais recentes. Entretanto, é urgente considerar esse processo de ampliação de possibilidades de codificação e análises da Informação pelas TIC dentro de um panorama geral de aprofundamento das crises sistêmicas do Capitalismo, para que não sejam reificados os modelos dominantes de organização e interpretação pela ciência da informação reprodutores da hegemonia cultural, inclusive dentro das dinâmicas das próprias TIC digitais.

Para tanto, a Ciência da Informação deve estar atenta não apenas às experimentações de ação política recentes que buscam responder aos desafios colocados por esse momento de reposicionamento do Capitalismo, mas também às tendências internas do próprio campo (da ciência da informação, das ciências sociais e dos estudos culturais) que, assim como as novas formas de ação política, buscam explorar e criar diferentes esquemas simbólicos e práticos de interpretação dos fenômenos da realidade a partir de coordenadas de referências alternativas, periféricas e marginalizadas do Capitalismo, um caminho pertinente para a produção de um Conhecimento em resposta às questões atuais das crises sistêmicas. Isto se reflete numa renovada discussão e crítica à produção de epistemologias hegemônicas relacionadas ao processo histórico que produziu estas crises, apontando novas possibilidades de conceber a construção e circulação de conhecimentos não-hegemônicos.

A construção do conhecimento humano é intrinsecamente relacionada às suas tecnologias - materiais e do pensamento -, e, simultaneamente, profundamente vinculado ao meio ambiente. Ao longo da História, entretanto, os modelos que buscaram descrever essas complexas relações geraram omissões e exclusões sobre outras possibilidades do conhecer. Como mencionado anteriormente, autores como Yuk Hui, Sarah Corona-Berkin, Bruno Latour, Pablo Solón, Anne Tsing e outros, se questionam sobre a possibilidade de abordagens epistêmicas e diálogos que compensem e superem estas omissões. São questionamentos inspiradores que se somam às reflexões decoloniais para contestar os modelos social, cultural, político e econômico vigentes, propondo novas maneiras de encarar a produção, organização e o acesso ao conhecimento.

Desse modo, buscamos neste ensaio apontar alguns dos principais tópicos de mudança social contemporânea, sinalizando para possíveis relações com o campo da Ciência da Informação. Por outro lado, também destacamos algumas experiências empíricas no âmbito das políticas e ações culturais e sociais que, em nosso entendimento, apontam para práticas informacionais não convencionais - práticas que podem trazer subsídios para a formulação de questões e abordagens mais atualizadas, contribuindo para tornar mais assertivo o escopo teórico-metodológico do campo. Há, portanto, todo um território de experiências concretas a ser desbravado e refletido a partir da consideração de novos sujeitos, novas conexões e novas referências, que podem ampliar e aprofundar o escopo crítico da Ciência da Informação. O que merece ser destacado nesse processo é o esforço de colocar em diálogo e complementaridade teoria e prática, buscando uma abordagem praxiológica que incorpore, em seus procedimentos, formas de diálogo e colaboração com os sujeitos e suas comunidades e lugares. O desafio reside em elaborar coletivamente metodologias e epistemologias efetivamente interdisciplinares e interseccionais para a análise destes fenômenos, com um olhar comprometido com os contextos sociais locais.

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    O paradigma do crescimento/desenvolvimentismo teve seu auge nas 3 décadas que se sucederam ao pós-guerra, encerrando-se com a crise de petróleo de 1973. A partir daí passa-se a falar no “desenvolvimento sustentável”, a partir do relatório Brundtlant de 1987 e das discussões da ECO-92, que logo se revela também inviável. Com a imposição das diretrizes neoliberais via globalização os termos mais empregados passam a ser economia e/ou crescimento “verde”, incorporando a natureza ao grande ciclo de produção, fabricação e valorização do mercado (DANOWSKI; VIVEIROS DE CASTRO, 2017)
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    Importante esclarecer que esse esforço não é quantitativamente maior nas bibliotecas públicas em relação às bibliotecas populares. A questão, na verdade, reside no fato de as bibliotecas públicas serem iniciativas do poder estatal, mesmo originadas de articulações territoriais, ou seja, vindas “de fora”, e alternativas à uma tradição de políticas de extrema violência. Sua integração às redes locais depende, então de um esforço maior de ganho de confiança dos sujeitos-usuários da biblioteca e elaboração da noção de seu direito àquele lugar.
  • PUBLISHER

    Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação. Publicação no Portal de Periódicos UFSC. As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade.

EDITORES

Franciéle Garcês, Natalia Duque Cardona, Edgar Bisset Alvarez, Ana Clara Cândido, Genilson Geraldo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    15 Fev 2023
  • Aceito
    01 Abr 2023
  • Publicado
    05 Maio 2023
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