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Cidade, subjetividade e território: representações de moradores de favelas

Ciudad, subjectividad, y território: representaciónes de los habitantes de arrabaldes

City, subjectivity and territory: representations of the impoverished subjects

Ville, subjectivité et territoire: représentation des de habitants de périphérie

Resumos

O artigo apresenta uma análise das relações entre espaço, subjetividade e conhecimento, tendo por base um estudo etnográfico desenvolvido em uma favela da cidade de Ubatuba, SP. A análise centra-se na discussão de termos que definem percepções sócio-espaciais, entre sujeitos pobres, analisando o conteúdo social que impregna o uso destes termos e que possibilitam caracterizar distinções à análise das relações sócio-espaciais, marcadas pela desigualdade social.

Espaço; lugar; subjetividade


El artículo presenta uma análisis de las relaciones minetras espacio. subjectividad, y conocimiento, tenedo por base um estúdio etnográfico desarrolldado em um arrabalde de la ciudad de Ubatuba, SP. La análisis está centrado em la discusíon de los termos que definen percepciones sociales y espaciales mientras sujetos pobres, analisando el contenido social que impregna el uso de estes termos y que posibilitan caracterizar distinciónes à análisis de las relaciones sociales y espaciales, marcadas por la desigualdad social.

Espacio; sítio; subjectividad


The article presents an analysis of the relation between space, subjectivity and knowledge based on an ethnographic study developed in a slum pertaining to the town of Ubatuba, in the state of São Paulo, Brazil. The analysis is centered on the discussion of terms that define social-spatial perceptions among impoverished subjects, analyzing the social content that permeates the use of such terms and that makes it possible to characterize distinctions to the analysis of social-spatial relations that are marked by social inequality.

Space; place; subjectivity


L'article présente une analyze des rélations parmis espace, subjectivité et conaissance, a travérs d'un étude ethnographique développé dans une périphérie de la ville de Ubatuba, SP. L'analyse es centrée dans la discution de termes que defini perceptions sociaux et spatiaux, parmis sujets pauvres, avec l'analyse du contenu social que imprégne l'usage de ces termes et que rendent possible caractériser distintion à l'analyse des rélations sociaux et spaciaux, distingues por l'inegalité social.

Espace; place; subjectivité


ARTIGOS

Cidade, subjetividade e território: representações de moradores de favelas

City, subjectivity and territory: representations of the impoverished subjects

Ville, subjectivité et territoire: représentation des de habitants de périphérie

Ciudad, subjectividad, y território: representaciónes de los habitantes de arrabaldes

José Rogério Lopes

Professor Titular do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Unisinos, RS, Brasil

RESUMO

O artigo apresenta uma análise das relações entre espaço, subjetividade e conhecimento, tendo por base um estudo etnográfico desenvolvido em uma favela da cidade de Ubatuba, SP. A análise centra-se na discussão de termos que definem percepções sócio-espaciais, entre sujeitos pobres, analisando o conteúdo social que impregna o uso destes termos e que possibilitam caracterizar distinções à análise das relações sócio-espaciais, marcadas pela desigualdade social.

Palavras-chave: Espaço; lugar; subjetividade.

ABSTRACT

The article presents an analysis of the relation between space, subjectivity and knowledge based on an ethnographic study developed in a slum pertaining to the town of Ubatuba, in the state of São Paulo, Brazil. The analysis is centered on the discussion of terms that define social-spatial perceptions among impoverished subjects, analyzing the social content that permeates the use of such terms and that makes it possible to characterize distinctions to the analysis of social-spatial relations that are marked by social inequality.

Key words: Space; place; subjectivity.

RÉSUMÉ

L'article présente une analyze des rélations parmis espace, subjectivité et conaissance, a travérs d'un étude ethnographique développé dans une périphérie de la ville de Ubatuba, SP. L'analyse es centrée dans la discution de termes que defini perceptions sociaux et spatiaux, parmis sujets pauvres, avec l'analyse du contenu social que imprégne l'usage de ces termes et que rendent possible caractériser distintion à l'analyse des rélations sociaux et spaciaux, distingues por l'inegalité social.

Mots-clé: Espace; place; subjectivité.

RESUMEN

El artículo presenta uma análisis de las relaciones minetras espacio. subjectividad, y conocimiento, tenedo por base um estúdio etnográfico desarrolldado em um arrabalde de la ciudad de Ubatuba, SP. La análisis está centrado em la discusíon de los termos que definen percepciones sociales y espaciales mientras sujetos pobres, analisando el contenido social que impregna el uso de estes termos y que posibilitan caracterizar distinciónes à análisis de las relaciones sociales y espaciales, marcadas por la desigualdad social.

Palabras clave: Espacio; sítio; subjectividad.

Introdução

Neste texto, descrevo dados de uma pesquisa que coordenei em espaços urbanos da região do Vale do Paraíba, SP, e, sobre eles, retomo algumas discussões anteriores para analisar algumas representações produzidas nas relações sócio-espaciais que ocorrem no cotidiano dos sujeitos pobres, em sociedade.

A pesquisa foi realizada com moradores de 6 cidades da região, comparando as representações de crescimento urbano e qualidade de vida, entre sujeitos de classes médias e moradores de áreas de concentração de pobreza (LOPES, 2001). Os dados da pesquisa apontam para a idéia de que o substrato comum das representações de cidade desenvolvida e qualidade de vida, entre os sujeitos das classes médias, é atingir o exercício de uma liberdade de escolha, como estratégia de apropriação da cidade. Já entre a população residente em áreas de exclusão, essa mesma concepção de apropriação aparece de forma ambígua nas representações dos sujeitos.

Buscando analisar essa ambigüidade e alguns de seus desdobramentos nas representações das relações sócio-espaciais, discutirei três dados produzidos no quadro de um dos sub-projetos da pesquisa, que buscou caracterizar a população residente em áreas de concentração de pobreza nas cidades de Ubatuba (litoral norte do Estado de São Paulo) e Campos do Jordão (localizado na Serra da Mantiqueira), identificando indicadores de suas demandas sócio-econômicas, como também representações produzidas acerca de suas condições de vida nessas áreas.

Inicialmente, apresento os dados gerais sistematizados sobre as respostas que os moradores forneceram a um questionário aplicado na pesquisa, devido à convergência que os mesmos apresentaram, em torno de alguns indicadores sobre privação social e representações de cidadania, recortados pelo binômio integração/exclusão urbana. Após, discuto algumas representações das relações sócio-espaciais que esses sujeitos produzem, com base em referências etnográficas dos ambientes que caracterizam as áreas pesquisadas.

Exclusão social e representações espaciais

Os dados aqui apresentados advêm da análise das respostas dos moradores das áreas às seguintes perguntas1 1 A equipe de pesquisadores do projeto aplicou um questionário às famílias residentes nas áreas, respondido pelo membro que se apresentava como responsável pela casa. O questionário levantava informações para a caracterização sócio-econômica da população e as demandas sociais locais. Os dados coletados foram tabulados considerando-se as categorias de gênero, cor e renda. Foram pesquisadas seis áreas em três cidades: Taubaté, Campos do Jordão e Ubatuba, num total de 261 questionários. Para a análise aqui apresentada, foram considerados os dados de 165 questionários, referentes a três áreas, duas localizadas em Ubatuba e uma em Campos do Jordão. :

  • O que poderia ser feito para a melhoria do local onde mora?

  • O que poderia ser feito para a melhoria da cidade?

  • Você acha que seu direito como cidadão é respeitado? Por quê?

As respostas à primeira questão concentraram-se majoritariamente nas ações de:

  • infra-estrutura e urbanização (74.6%), assim distribuídas:

esgoto 25.2% asfalto/calçamento das ruas 23.7% água e luz 13.9% canalização de rios 8.8% construção de praças de lazer 3.0%

Estas respostas são seguidas de:

• serviços urbanos 12.3% • ações públicas ligadas a creches, mutirões, regularização e terrenos, e aterros 9.0% • outras indicações gerais 4.0%.

1.0% não soube responder e 1.0% afirmou que o local está bom.

As respostas à segunda questão concentram-se em dois indicadores importantes:

  • em ações públicas, 29.5% indicaram que é necessário mais emprego e incentivo às atividades produtivas nas cidades;

  • nas indicações gerais, 13.8% indicaram que é preciso mudar os governos ou governantes.

Dos indicadores gerais, tem-se a seguinte distribuição:

• serviços urbanos 16.8% • infra-estrutura e urbanismo 15.2%

13.0% não sabem ou não responderam e para 3.8% as cidades estão boas do jeito que se configuram hoje.

Evidencio alguns elementos da análise comparativa entre tais indicadores. Primeiramente, a distinção clara entre ações para a melhoria: a melhoria do local é avaliada pelas condições de infra-estrutura e urbanismo, enquanto a melhoria da cidade é avaliada pela oferta de empregos e pelo seu governo. Esta distinção aponta para processos de produção e apropriação da cidade que se complementam em ações micro e macro-estruturais.

O índice de 1.0% de sujeitos que não souberam responder a primeira questão e o de 13.0% que não souberam responder a segunda mostram que as ações micro-estruturais são mais perceptivas e objetivas, mas também mostram que a condição de exclusão interfere na produção de representações sobre o conjunto da cidade.

Somente 32.0% dos pesquisados avaliaram a melhoria da cidade pelas mesmas condições que avaliaram a melhoria do local onde moram. Este índice, inclusive, deve ser complementado com outro dado da produção da cidade, nos contextos aqui em pauta: o de que se trata de duas cidades predominantemente turísticas.

E, embora não haja dados gerais sobre a ocupação urbana em Campos do Jordão, os dados de Ubatuba, coletados do Censo 1991, do IBGE, permitem verificar as dimensões como se objetivam os processos de exclusão territorial: para uma população de 45.681 habitantes, em 1991, havia 32.471 casas no município; destas, 31.92% eram casas ocupadas por moradores locais e 68.07% eram casas de turistas. Considerando-se que a área média de construção das casas de turistas é bem maior que a das casas dos habitantes da cidade, tem-se que o percentual de número de casas dos habitantes é maior que a taxa de ocupação territorial urbana pelos mesmos.

No Caso de Ubatuba (e também em Campos do Jordão, por observações empíricas), isso se desdobra em uma distribuição territorial que concentra a população pobre em bairros periféricos e favelas, espalhados em áreas precárias e de risco, escondidas dos espaços por onde os turistas transitam. Nessa perspectiva, instala-se e se reproduz um conflito permanente entre as percepções que os sujeitos pobres elaboram no cotidiano, nessas áreas, e aquelas que eles elaboram nas relações que estabelecem com outras áreas da cidade, em seu conjunto.

Nestas condições, não é de se estranhar que a melhoria da cidade seja percebida e avaliada pelas representações dadas anteriormente. O sentido de apropriação da cidade, em áreas de exclusão, reproduz a limitação do conhecimento da cidade pelo tipo de ocupação dos sujeitos nela inseridos, como veremos adiante.

Os processos multidimensionais pelos e nos quais os sujeitos pobres perdem o sentido de pertencimento ao espaço urbano, nas áreas de exclusão, fragmentam a imagem da cidade e reproduzem valores focalizados territorialmente. A cidade coloca-se para esses sujeitos como um espaço distante, na medida em que estão excluídos de participarem das relações urbanas.

As respostas que os pesquisados deram à terceira questão citada anteriormente auxiliam a compreender essa fragmentação e essa focalização produzidas na exclusão. Entre os pesquisados, cerca de 40% consideram que seus direitos são respeitados e 60% consideram que não são. As justificativas são as seguintes:

São respeitados como cidadãos, porque:

  • não tem problemas;

  • tem dignidade e liberdade;

  • não prejudica ninguém, é sempre respeitado;

  • não passa fome;

  • o cidadão tem que ser respeitado por tudo;

  • porque reclama seus direitos;

  • seus recursos são respeitados;

  • ninguém abusa da família, mas não tem noção das coisas;

  • tem saúde e educação;

  • pelas autoridades sim, pois se precisam elas vêm até aqui;

  • tem o básico, o que precisa;

  • tem educação(mesmo que ruim), nada falta na escola;

  • tem creche perto, água e luz;

  • não é mal tratado/é tratado com dignidade;

  • é bem atendido aonde vai;

  • é respeitado por todos, menos pelo prefeito.

Não são respeitados como cidadãos, porque:

  • são marginalizados pela moradia;

  • os vizinhos brigam muito com eles;

  • têm condição precária de vida;

  • ninguém respeita ninguém;

  • não são oferecidas assistência social e saúde;

  • os aposentados têm salário baixo;

  • pobre não tem direito à nada;

  • com o pobre não há respeito, é sempre humilhado;

  • tem direito ao estudo, mas não há escola, não há vaga;

  • o governo promete e não cumpre;

  • Deus dá e o governo tira dos pobres;

  • o prefeito não ajuda em nada;

  • professores e médicos não respeitam;

  • crianças e idosos são desvalorizados;

  • polícia não protege por sermos pobres/ela é bandida;

  • quando precisa de algo é difícil conseguir;

  • faltam muitas coisas: educação de qualidade, lazer, remédio, comida, emprego, segurança e lazer;

  • há tráfico de drogas;

  • ao trabalhador não é dado o devido valor.

O dado de 40% dos moradores dessas áreas considerarem-se respeitados em seus direitos como cidadão torna-se preocupante, pela limitação das concepções de direitos e cidadania que justificam suas respostas. Por outro lado, as concepções de direitos e cidadania entre aqueles que não se consideram atendidos como cidadãos são diversificadas e focalizadas, na sua grande maioria. Esses dados, todavia, guardam alguns condicionantes importantes para a localização dos sujeitos, em suas relações com o conjunto da cidade: a idéia de direito está condicionada negativamente pelas representações de marginalização, precarização da vida, pobreza, falta de serviços públicos e desvalorização do trabalhador; positivamente, está condicionada pelas representações de dignidade, respeito, atendimento das necessidades básicas, valorização dos recursos locais e reivindicações.

Por tratar-se de áreas de exclusão, onde se confundem a concentração de pobreza, de desempregados, a ausência de serviços públicos, a precarização das moradias e a periferização com relação ao conjunto da cidade, as representações de direitos e cidadania não possuem uma unidade. Em conseqüência, a imagem da cidade emerge a uma "distância próxima", formando uma lógica dialética de percepções geográficas e sociais, e suas relações com o conjunto têm sempre um fundo de desconfiança, descrédito ou desapego.

Esta trajetória de análise mostra que, nas cidades pesquisadas, criam-se mecanismos de exclusão territorial, reproduzindo as estratégias de idealização da urbanidade e de vinculação do sujeito à urbe – ou a uma parte dela – através da ocupação exercida pelo mesmo. Se tal ocupação permite um exercício de visualização da cidade, esta visualização mostra-se fragmentada e focalizada, dificultando uma representação consistente de direito à cidade e de cidadania.

Nessa concepção, e considerando a condição de exclusão em que vive boa parcela da população das cidades, a reprodução desse modelo de idealidade e de vinculação dos sujeitos à urbe torna-se mais acintosa, chegando a constituir-se em uma verdadeira violência simbólica. Esses sujeitos excluídos da produção da cidade, territorial e simbolicamente, perdem progressivamente aquela capacidade de visualização e de criação de estratégias de apropriação da cidade, que garante a liberdade de escolha.

Porém, mesmo submersos em "áreas de sombras"2 2 Veja-se Raymond Ledrut, Sociologie urbaine. Paris: PUF, 1968. (LEDRUT, 1968) do modelo urbano hegemônico, esses sujeitos procuram produzir outras estratégias de superação da exclusão, no próprio cotidiano. Na representação difusa de cidade que esses sujeitos explicitam, evidencia-se a concepção de Ítalo Calvino, de que "uma cidade pode ser aquilo que dela se vê ou se entende" (apud AMARAL, 1992).

E aqui, algumas referências etnográficas dos ambientes que caracterizam as áreas pesquisadas tornam-se importantes.

A área pesquisada em Campos do Jordão denomina-se Favela Acampamento dos Pumas e localiza-se na periferia norte do município, entre um conjunto habitacional popular e uma área de proteção ambiental, distante cerca de 3 km do centro da região de Abernéssia. O local é atendido por luz e água, com acesso a ônibus urbano na redondeza. A área da favela não possui ruas, mas caminhos abertos entre as moradias (geralmente separadas por algum limite natural ou construído) com acesso para carros, e está delimitado por um ribeirão, na direção da cidade (para onde escorre o esgoto do local), e um morro, na direção da área de proteção ambiental, estando sujeito a inundações regulares. As moradias são construídas de madeira ou material misto e sua população é constituída, na maioria, de migrantes da região sul do país, que trabalham sazonalmente na indústria de construção civil ou no turismo. A relativa distância com o centro da cidade, a rede de serviços urbanos existentes nas redondezas e o acesso ao transporte urbano regular fazem com que a população esteja cotidianamente envolvida com o movimento da vida social da cidade.

As áreas de Ubatuba possuem características distintas. Uma, o Jardim Guarany (assim denominada pelos moradores, mas conhecida na cidade como favela Anchieta, nome da escola municipal que se localiza numa rua lateral à favela), está localizada à margem da Avenida Rio Grande do Sul, que é uma das mais importantes da cidade, ligando a semiperiferia do centro da cidade às praias da região sul do município. Localizada bem ao fundo da pista do pequeno aeroporto da cidade, a favela está situada entre a avenida, um ribeirão (para onde também escorre o esgoto das casas da favela e dos bairros que a circundam), a BR 101 que corta Ubatuba e liga as cidades de Santos e do Rio de Janeiro – e um bairro de classe média baixa, mas está integrada no contexto da cidade, próxima de escolas, serviços e redes de apoio à vida urbana. A população é formada por uma maioria de migrantes do sul da Bahia e do sul de Minas Gerais, que buscam trabalho na construção civil e em serviços turísticos. A maioria das casas da área está em processo de transformação, das de madeira para alvenaria, e seus espaços externos são demarcados por muros ou cercas.

A segunda área é a Favela Sertão do Sesmarias, localizada a 7 km do centro da cidade e situada nas encostas de morros que fazem limites com o Parque Estadual da Serra do Mar. A área, cercada de Mata Atlântica, está bem isolada da cidade e é ligada aos bairros periféricos Estufa II e Sesmaria por uma estrada de terra precária, por onde passa uma linha de ônibus duas vezes ao dia. Da entrada da favela até o final da rua central que a corta longitudinalmente, as casas de alvenaria (poucas) vão cedendo vistas na paisagem para casas de material misto e, em sua grande maioria, as casas de madeira. A grande maioria das casas não possui limites demarcados de terrenos entre elas. Composta por migrantes do sul da Bahia, em maioria, a população da área vive dividida entre uma minoria de homens que saem diariamente para trabalhar na construção civil, na cidade e em cidades vizinhas, uma grande parte de homens adultos e jovens que coletam latinhas de alumínio nas praias do município, e de mulheres adultas e jovens, além das crianças, que vivem seu cotidiano na favela, com poucos contatos com a cidade. A entrada da favela é atendida por água e luz, sendo que o restante da área possui luz fornecida por rede pública, mas capta água de um ribeirão que corre ao largo da favela, para onde escorre o esgoto das casas.

Essas diferenças de composição e inserção das favelas nos territórios dos municípios, assim como as diferenças de recursos para a interação dos seus moradores nas relações com a dinâmica da vida na cidade, produzem representações da vida urbana que relativizam os indicadores gerais anteriormente descritos. Trata-se de perceber que as apropriações que os sujeitos excluídos fazem da produção da cidade, desde sua localização em áreas de exclusão, variam de acordo com a compreensão elaborada pelos mesmos acerca dos movimentos contraditórios em que estão inseridos. Em geral, os sujeitos moradores dessas áreas explicitaram uma valorização das relações de vizinhança, justificadas pela solidariedade vicinal (tradicional, ou mecânica, marcada pelas relações de necessidade) e a proximidade que identifica os sujeitos em condições semelhantes – na razão das relações que Paugam (2003) denomina de pobreza integrada – mas que não exclui o reconhecimento de conflitos entre os sujeitos. Entretanto, essa valorização parece variar inversamente à desvalorização – na razão do que Paugam denomina de desqualificação – que os sujeitos sentem ou reproduzem, quando reconhecem a distância marcada entre eles e o conjunto da cidade.

Interfere decisivamente, para essa variação, a representação da condição periférica de inserção dos sujeitos. Assim, as noções de proximidade e vizinhança encerram características que podem mostrá-las como distintas, por mais que sejam utilizadas como equivalentes por esses sujeitos, enquanto noções que explicitam a apropriação da percepção espacial.

Um dos elementos que auxiliam a pretensa equivalência dessas noções usadas pelos sujeitos é o fato de constantemente serem as mesmas aplicadas a situações que pretendem especificar uma condição de exclusão geográfica através de sua utilização. Ou seja, tais noções são geralmente "conjugadas" numa ação que desconsidera suas características essenciais em proveito das mais superficiais.

Tudo se passa como se aquilo que se pode considerar como próximo encerrasse somente uma simples verificação de sua presença na vizinhança do sujeito, no espaço imediato à sua volta, como um estímulo que o atinge e que, por isso, torna-se presente em sua percepção.

Poder-se-ia pensar que essa noção pudesse ocorrer em uma sociedade "primitiva", onde os sujeitos que constroem "essas sociedades estão, igualmente, em certo sentido, em contato direto com a natureza, por ausência e não por excesso, porque não possuem os meios de se apoderarem de um certo número de determinismos naturais" (LÉVI-STRAUSS e CHARBONNIER, 1989, p.128), mas é difícil supor que o mesmo pode ser considerado como correto quando se passa à análise das sociedades urbanas e, mais especificamente, quando se discute essas noções e seus significados para os sujeitos dos centros urbanos contemporâneos, onde o contato direto com a natureza não se estabelece em condições de igualdade, pelo excesso de objetos e situações que propiciam, a todo momento, a necessidade de uma apropriação crescente de condicionamentos materiais - nos dois casos, porém, não convém esquecer que a "representação da realidade implica uma afeição para com ela" (CAMPA, 1985, p.56).

Assim é que, nas favelas Acampamento dos Pumas e Jardim Guarany os limites entre as moradias e, entre essas, as ruas e os caminhos, são demarcados socialmente, de alguma maneira. Resta aqui, mesmo que fragmentariamente, uma distinção entre espaços públicos e privados. Na favela Sertão do Sesmarias, espaços públicos e privados (domésticos) se misturam no cotidiano. Na maioria dos lugares, não há muros, cercas ou arames a demarcar propriedades. Os bares são entradas ou fachadas das casas, e os sujeitos ultrapassam os limites simbólicos entre uns e outras segundo a familiaridade com os moradores. Se há limites, esses são demarcados pelos varais que estendem as roupas ou pelas antenas parabólicas, que trazem a ilusão do conhecimento à distância.

Assim, pode-se perguntar: Sem limites, além das paredes de alvenaria ou madeira, o que é intimidade? O quintal acaba na rua e na mata, ou são a mata e a rua que acabam no quintal? O que se vê de fora ou de dentro?

Entre os moradores da favela Sertão do Sesmarias, diferente dos demais pesquisados, os limites físicos entre as casas, o quintal e a rua, assim como entre o bairro e a Mata Atlântica que cerca quase toda a área do local, são inexistentes. As representações sociais acerca da mata, assim como a sua utilização para alguma atividade, é que definem as fronteiras aos padrões sociais de ação dos moradores. Nesse contexto, as próprias casas se integram à mata, muitas vezes, em uma simbiose entre moradia e natureza que, entretanto, é geralmente descrita como negativa pela população. Essa negatividade do ambiente local está condicionada pelos limites da ocupação, que estão relacionados historicamente com a interdição das casas que estão próximas de áreas de preservação ambiental, pelos fiscais da prefeitura local. Premidos em uma clareira no meio da mata, os moradores produzem uma paisagem interna que contrasta com a externa, sobretudo pela precariedade de recursos urbanos.

Ora, porque o homem urbano não é regular e igualmente afetado por esses condicionamentos naturais, os objetos que poderia considerar propriamente como próximos, porque lhe são presentes, sofreram em boa medida os efeitos da reprodução dos condicionamentos materiais. Tal reprodução, por sua vez, gera um distanciamento do fato de que "o homem é imediatamente ser natural [...] como ser natural, vivo, está [...] dotado de forças naturais [...] É um ser natural ativo" (MARX, 1978, p.40). Daí, a afirmação de Goldmann (1967, p.131) de que "o desenvolvimento da produção capitalista [...] fechou progressivamente a compreensão dos homens aos elementos qualitativos e sensíveis do mundo natural".

Por outro lado, o distanciamento com relação às suas forças naturais, entre os sujeitos da favela Sertão do Sesmarias, é relativizado pela sua condição de exclusão do mercado formal de trabalho. Nas condições de exclusão, os sujeitos desenvolvem atividades ocupacionais (como estratégias de geração de renda) que permitem imprimir minimamente uma marca de pessoalidade ao produto de seu trabalho, como descrevem Lopes e Saboya (1993, p.127), ao analisar a condição do artesão:

[...] por estar à margem da vida econômica formal, o artesão tem o privilégio do resguardo da sensibilidade na sua relação com o mundo. Já um operário de linha de montagem participa de modo impessoal de uma fração do processo de produção. Seu trabalho é desprovido de significação pessoal e até de concretude, ele não se reconhece no produto final.

Assim, começa a tornar-se clara a distinção que se busca, como também as propriedades mais essenciais da noção de proximidade, que a separa da noção de vizinhança. Tal distinção se opera pela "medida" mais ou menos igualitária de apropriação dos condicionamentos naturais e materiais que afetam os sujeitos, na dinâmica das suas interações e relações sociais. Os objetos e os outros sujeitos lhes são próximos não somente porque estão presentes na vizinhança, mas porque encerram condições objetivas de imprimirem um sentido a suas ações, como sujeitos.

Muitos exemplos poderiam somar-se aos utilizados aqui, mas é preferível empregá-los em situações mais concretas, onde se pode analisar de forma mais clara as características que reforçam a idéia de que "o espaço constitui, desde o início da reflexão ocidental, a jaula do homem, a grade através da qual ele elabora a reflexão sobre sua realidade" (CAMPA, 1985, p.182).

Para tanto, pretende-se afunilar a discussão em três direções básicas: o mundo vivido (o espaço próprio, por excelência), o mundo conhecido (e seu espaço antitético: o desconhecido) e o mundo distante.

O mundo vivido

O espaço que encerra a perspectiva da vivência e da convivência, entre os moradores do Sertão de Sesmarias, pode ser definido como o espaço por excelência das relações de proximidade, em contraposição à mata. A casa, o boteco, a escola, as ruas, o ribeirão (onde se lavam as roupas ou se capta água para consumo), as igrejas, os campos de futebol, etc, constituem locais onde regularmente os sujeitos manifestam expressões de proximidade. Contudo, pode-se questionar se são os locais em si, definidos espacialmente, que condicionam essas expressões, ou se, ao contrário, esses locais somente favorecem-nas, em relação com outros elementos atuantes em sua determinação.

Qual seria a relação e a expressão de proximidade que se pode criar a partir da vivência no espaço restrito da casa, por exemplo? E mais, como a casa refere-se constantemente à idéia da presença familiar, de outros sujeitos atuantes no mesmo espaço, com tendência a manifestarem ações que visam à reivindicação ou transformação de espaços próprios de cada um, no universo espacial que a casa constitui como imaginar-se que seria a casa um espaço de proximidade em manifestação? Da Matta (1985), ao analisar as oposições estabelecidas entre os espaços d'A casa e a Rua, seja pela definição dos papéis sexuais ou dos papéis sociais mais amplos referenciados no conjunto de ações de uma coletividade, já mostrou como a regularidade das manifestações e as prescrições sociais estabelecidas em função do uso ou permanência de sujeitos em espaços complementares e/ou opostos, exercem pressão de forma diferenciada sobre a percepção e a expressão que os sujeitos possam elaborar sobre o espaço comum.

A noção de mundo vivido encerra, assim, uma questão mais complexa que a simples idéia de uma proximidade espacial (BETANINI, 1982). Uma casa pode abrigar referenciais diversos – pessoas, objetos, sensações – que condicionem conflitos e distanciem as expressões de uma percepção de que ali estaria um objeto próximo aos sujeitos que nela residem. No entanto, esta presença cotidiana do local, das pessoas, dos objetos e das sensações pode favorecer uma condição de propriedade sobre as relações em que o sujeito se insere. Nessa situação, pode-se denominar esses espaços de próprios, na concepção elaborada por Certeau (1994)3 3 Michel de Certeau define como estratégicos os espaços próprios dos sujeitos, pois é a partir deles que os sujeitos operam práticas segundo um "cálculo das relações de forças que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e poder é isolável de um 'ambiente'. Ela [estratégia] postula um lugar capaz de ser circunscrito como um próprio e portanto capaz de servir de base a uma gestão de suas relações com uma exterioridade distinta" (Certeau, 1994, p. 46). .

O domínio, ou propriedade, das relações dadas em um determinado local condicionam, dessa forma, a percepção e a apreensão simbólica que os sujeitos realizam do espaço. E como não se vive num espaço abstrato, são os espaços de relação que se tornam espaços vividos, próprios. São esses espaços que favorecem ao homem, inclusive, criar uma imagem de si e de suas possibilidades, mesmo quando o conflito esteja aí presente, já que ele faz parte da convivência.

A influência dos espaços vividos sobre as imagens que os sujeitos constroem a respeito de si mesmos está presente na literatura sócio-antropológica, desde as análises das sociedades primitivas até os estudos a respeito da memória4 4 Conferir, por exemplo, a análise desenvolvida por Maurice Halbwachs (1990), sobretudo em seu capítulo IV, A Memória e o espaço. e da modernidade. Ortiz afirma, por exemplo, a respeito das reformas efetuadas por Hausmann, em Paris do século XIX, que

Haussmann traça ruas, avenidas, pontes, praças interligando pontos nevrálgicos da cidade. Um eixo norte-sul, leste-oeste comunica o centro e a periferia, e as grandes vias convergem para as estações de trem. Um sistema de circulação se implanta. [...] A cidade é vista como um organismo vivo, os orgãos comunicando-se entre si (ORTIZ, 1991, p. 203).

para, adiante, constatar que

os homens deste meado do século intuem que certas noções, tradicionalmente enraizadas em suas mentes, tornam-se agora fluidas, fugidias. Dentro da nova ordem o espaço social é representado como algo que começa a se desagregar. Ele é suprimido, ou como diziam alguns, a província torna-se uma extensão das ruas parisienses (Idem, p. 222).

Vê-se que o mundo vivido configura-se, em última instância, como o espaço que auxilia a formação do sujeito, imprimindo-lhe uma série de sensações que podem manifestar-se, posteriormente, como lembranças, fragmentos do universo da memória5 5 O próprio Halbwachs (1990, p.133) afirma que "as imagens espaciais desempenham um papel na memória coletiva. O lugar ocupado por um grupo não é como um quadro negro sobre o qual escrevemos, depois apagamos os números e as figuras". , ou mesmo como reações a ambientes que se pode considerar como desagradáveis. Aliás, muitas vezes sentem-se essas sensações ao adentrar em certos ambientes, sem motivos aparentes.

A formação do sujeito, segundo a importância atribuída a locais próprios para certas manifestações, pode imprimir-lhe sensações profundas de gosto por esse ou aquele tipo de local, de acordo com o que se pretende manifestar. Esse tipo de sensação parece estar presente em Rubem Alves, quando escreve as memórias do ambiente da casa paterna:

[...] a filosofia da sala de visitas era sempre a mesma: mostrar o mínimo, elegantemente. O resto da casa tem que ficar protegido. Mas há outro lugar onde as visitas não entravam, lugar dos amigos: a cozinha. Ali as pessoas se assentavam à roda do fogão e o corpo se libertava de regras de etiqueta. Espaço mágico presidido pelo fogo, o corpo livre do controle do espelho, ali aflora uma outra verdade (ALVES, 1990, p.40).

Ainda, tais espaços de formação, porque impõem regras e normas de conduta, podem resultar em comportamentos que reproduzem simbolicamente um traço cultural, como o que descreve Brandão, ao analisar as regras de convivência de uma comunidade camponesa no Estado de São Paulo:

Pasto, mangueira e terras de lavoura são espaços masculinos não apenas porque são lugares preferenciais de trabalho dos homens. Por extensão, esses são lugares simbolica e existencialmente masculinos. Meninos e meninas podem ir lenhar com as mães nas beiras de mata. Mas só os meninos podem brincar ali com seus amigos. Os filhos homens que lidam com a lavoura e o gado vêem esses locais de trabalho produtivo como seus ambientes próprios e apropriados (BRANDÃO, 1990, p. 92).

O que ambos os exemplos guardam de comum é justamente essa propriedade que os sujeitos manifestam sobre as relações vividas em determinados espaços. Propriedade esta construída sobre sucessivas experiências e classificações das possibilidades e condições de realização de seus interesses na diversidade de espaços em que convivem cotidianamente. A importância de tais classificações é tão forte que, muitas vezes, chega a impor-se como critério à seleção de amizades, atividades, ofícios e profissões, entre outros.

O mundo vivido, dessa forma, constróe-se sobre a trama de relações que se tecem entre diversos espaços, não necessariamente situada na vizinhança da casa, eixo de uma convivência cotidiana. E, embora este eixo tenha sido definido a partir de um referencial teórico arbitrário6 6 Não tão arbitrário, porém, conforme as análises desenvolvidas no livro já citado de Roberto Da Matta (1985). , dado pela suposição de que as relações extra-familiares referem-se, em última instância, àquele espaço de formação, para diversos segmentos sociais este eixo poderia ser pensado como constituído a partir de outros locais, segundo a importância que assumem na vida dos sujeitos.

Uma leitura de alguns estudos etnográficos sobre as relações sociais entre o campesinato brasileiro tradicional, como o de Brandão citado anteriormente, pode mostrar claramente como mesmo as relações que se constroem à vizinhança da casa são diametralmente diferenciadas, quando comparadas aos modelos de vizinhança existentes nas cidades.

A propriedade que se estabelece na relação entre sujeito e espaço, assim, configura-se numa abstração da noção de proximidade, que faz com que o sujeito aproprie-se das características dos espaços em que se insere, de maneira hierárquica.

O mundo conhecido (e o desconhecido)

A experiência de vivenciar espaços que fogem ao domínio das relações aí construídas, mas que proporcionam um determinado referencial para futuras relações, ou melhor, para futuras incursões em sua tessitura de interação social, pode ser pensada e entendida como uma experiência de conhecimento.

Mesmo as relações travadas em espaços circundantes ao eixo de convivência cotidiana – que Augras (1981) denomina espaços de coexistência7 7 A noção de espaço de coexistência é assim definida por Augras (1981, p. 34): "no espaço de coexistência, os homens tecem redes que os aproximam e os afastam, organizando o mundo de maneira a assegurar áreas recíprocas de movimentação". – podem apresentar tais estímulos ao sujeito, desde que não sejam referenciados pelo mesmo com alguma distinção que os aproxime. Um bar próximo a casa ou ao local de trabalho, onde sujeitos regularmente se reconhecem, até estabelecerem relações, ou mesmo a feira aos finais de semana, o supermercado, uma praça e locais similares, podem guardar impressões que vão desde um interesse por espaços ruidosos até situações de inquietação frente à exuberância de um meio ambiente determinado.

Locais que marcam referenciais de conhecimento são muito comuns entre a juventude, que costuma encontrar-se em locais de proximidade e dali sair para "paquerar" em uma série de espaços outros de que guardam sinais de antigos encontros, ou a arriscar novos. Em uma pesquisa sobre sexualidade que realizei com adolescentes do sexo feminino, no Vale do Paraíba8 8 "A orientação literária do imaginário feminino-juvenil sobre a sexualidade", projeto realizado junto ao Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas de Práxis Contemporâneas da Universidade de Taubaté, no período de 2003-2005. , ficou clara a influência de espaços sociais "da moda" – um bar, "cruzeiros" em morros próximos à cidade, traillers de lanches, etc – como locais de encontro que, porém, servem somente como espaços de iniciação aos relacionamentos. Nas falas das próprias adolescentes, é explícita a intenção de atrair os novos namorados para os espaços próprios a elas, favorecendo um domínio maior do relacionamento, depois de estabelecido uma continuidade do mesmo.

Parece estar presente na intenção das jovens, em reconhecer estes espaços de encontro como locais provisórios, a idéia de que um relacionamento mais contínuo deve submeter-se aos mesmos controles que elas exercem sobre seus espaços próprios. Neste sentido, nos espaços de conhecimento seus relacionamentos estão sujeitos à mesma ordem de acasos que as aproximaram de seus novos namorados. São espaços abertos e movimentados, em geral, onde a "paquera" com outras meninas às vezes não pode ser sequer percebida por elas.

Embora situações como as que envolvem grupos sociais, como os grupos de jovens, não sejam incomuns, em geral as relações que fornecem referenciais de conhecimento aos sujeitos são de dois tipos, que, mesmo contrastantes, unificam-se sob a égide de uma premissa básica. Os primeiros acontecem no entorno de seus espaços de domínio interacional, uma vez que eles possibilitam uma expansão dos referenciais de propriedade do mundo vivido. Um bom exemplo dessas relações são as constantes manifestações cotidianas que ocorrem em cidades do interior, que vivem uma trama de informações sobre as ocorrências de vida das pessoas, em todos os espaços das mesmas. Quem já não ouviu a expressão "em cidade pequena, em todos os lugares as pessoas se conhecem e conhecem a vida das pessoas", geralmente associada pejorativamente à ociosidade das pessoas do interior, em contraposição com a privacidade reservada da vida atribulada das capitais e grandes cidades. Razões antitéticas que manifestam uma diferenciação simbólica entre as características do mundo conhecido e do mundo desconhecido: a relação público-privado.

Com efeito, essa ampliação dos referenciais de conhecimento do mundo para uma relação de proximidade e domínio, no espaço das cidades do interior, parece mais afeita a enquadrar-se na simbologia do espaço público que, nelas, é totalmente diferenciado. É a perspectiva de ampliação – ou extrapolação – dos espaços de formação, que aprisionam a reflexão do sujeito, que o fazem ver e vivenciar os espaços vizinhos como espaços a serem "conquistados".

Se essas relações realmente não existem nas grandes cidades é uma questão a ser discutida. Quando se observa o cotidiano de relações dos sujeitos que vivem na periferia dessas grandes cidades, ou em seus bairros mais tradicionais, onde as mudanças do entorno físico são lentas, o quadro que se cria parece ser o oposto: o espaço do bairro, em si, encerra uma série de características que podem ser amplamente reconhecidas pelos membros da coletividade9 9 Esse reconhecimento podia ser verificado pelas imagens de um quadro do programa "Domingão do Faustão", que vai ao ar aos domingos. O quadro era o "Seu vizinho é uma mina", que apresentava o interior de uma casa, num bairro de uma cidade – geralmente média ou grande – e que premiava o dono da casa com uma quantia em dinheiro, caso nenhum dos vizinhos da rua se apresentasse para reivindicar o prêmio, reconhecendo a casa pelas imagens apresentadas. Não se informava o nome da cidade ou do bairro e nem se mostrava os rostos das pessoas da família que ali residiam. O reconhecimento era tão somente do espaço interior da casa e de alguns "flashs" da rua, jardins, etc, através de frestas das janelas. Em várias ocasiões, via-se o vizinho ganhando o prêmio. já que "o grupo urbano não tem a impressão de mudar enquanto o aspecto das ruas e dos edifícios permanece idêntico" (HALBWACHS, 1990, p. 134).

Há um segundo tipo de relações entre sujeitos e espaços conhecidos e desconhecidos, que também sintetiza a diferenciação simbólica entre público e privado, mas em níveis desiguais. Se o primeiro tipo assenta-se sobre uma "necessária" representação e aproximação dos espaços vizinhos conhecidos, o segundo assenta-se na necessidade de atualização sobre os conhecimentos que envolvem os sujeitos como contemporâneos de uma sociedade globalizada, com envolvimentos intra e internacionais. Tais relações surgem em variadas situações: desde interesses conjecturais e causados por questões que se generalizam num dado momento, onde os sujeitos são informados regularmente sobre a configuração de certos espaços, que se tornam o focus de observação de uma ou várias sociedades10 10 O episódio da guerra no Golfo Pérsico, em 91, enfatizou esse tipo de relações. Os telespectadores, de quaisquer emissoras, eram constantemente "bombardeados" com informações sobre as causas da guerra, os espaços estratégicos da luta, os espaços civis e os espaços neutros, dentro dos diversos e regulares "flashs" jornalísticos ou programas especialmente preparados para atualizar os assistentes sobre os diversos espaços que configuravam o conflito. , até situações de interesse particular por espaços determinados, em que poucos sujeitos se especializam no entendimento da configuração dos mesmos11 11 A formação acadêmica, como a experiência de trabalho de Arqueólogos, Geólogos, Geógrafos, Arquitetos e profissionais afins são um bom exemplo deste tipo de relações. . Nos dois casos citados, contudo, como nos demais que se enquadrem nesse segundo tipo de relações, vale reconhecer que a necessidade de atualização dos sujeitos refere-se estritamente a uma condição temporária – em certos casos mais, em outros menos tempo – em que os mesmos procuram somar o maior número de informações possíveis e disponíveis para a configuração do espaço em pauta e as relações aí estabelecidas. Diferentemente das relações do primeiro tipo, onde as pessoas utilizam-se de seus espaços próprios para referenciar, entender e apropriar-se dos espaços vizinhos que lhes interessam, as relações do segundo tipo procuram simbolizar a diferenciação entre público e privado sob a ótica dos envolvimentos sócio-espaciais dos locais que observam, seja porque são informados via uma interpretação pré-estabelecida, ou porque necessitam agir assim para melhor compreender o que procuram conhecer.

Aqui, estão em jogo as distinções operadas socialmente para a definição da relação público/privado, que se conjugam, segundo Jovchelovitch (2000, p.47) por

[...] distinções claras entre o que deve ser oculto e o que deve ser visível, o que deve ser particular e o que deve ser comum, o que deve ser aberto e portanto distribuído a todos, e o que deve ser secreto, reservado e portanto subtraído da esfera aberta a todos. Estas são as questões que constituem o significado fundamental das esferas pública e privada. Elas indicam que existem coisas que devem ser privadas e outras coisas que devem ser apresentadas publicamente (res publica), pois somente assim é que elas podem existir.

Parece que são relações deste tipo as que se estabelecem, atualmente, entre algumas categorias de profissionais urbanos, ligados a determinadas ciências, e determinados grupos étnicos detentores do saber acerca da biodiversidade de nossas florestas tropicais. Nesta relação, porém, a questão posta em causa, sobre as dimensões públicas e privadas oriundas de tais contatos, tem a ver com uma problemática que extrapola em muito os limites desta análise.

Poder-se-ia questionar, no entanto, se a mudança de atitudes em relação aos sujeitos e à biodiversidade existentes nestes espaços de florestas que se constata atualmente, não seria equivalente à discutida por Thomas (1989) sobre as relações entre "O homem e o mundo natural".

Aqui, porém, procuro delimitar que as razões antitéticas que se aplicam à análise das relações público/privado, entre sujeitos e espaços conhecidos e desconhecidos aos moradores do Sertão do Sesmarias, são também diferenciadas. A primeira antítese é percebida no movimento que impulsiona o sujeito a conhecer espaços vizinhos aos seus espaços próprios, ou a conhecer espaços longínquos, configurando-se-lhes suas principais características. A segunda antítese é percebida na distinção dos instrumentos e condições que os sujeitos utilizam para conhecer os espaços longínquos, indo das situações genéricas que o envolvem (como nas atividades ocupacionais na construção civil, ou como coletores de latinhas, nas praias) até as situações particulares construídas por eles próprios.

Isso é o que explica o fato de boa parte dos moradores do Sertão do Sesmarias possuírem antenas parabólicas. E também aqui parece que se pode encontrar uma razão última que é de origem hierárquica. Não a hierarquia que surge da classificação dos interesses de tais sujeitos, mas a hierarquia que resulta da estratificação sócio-espacial como representação derivada das desigualdades sócio-territoriais – que impõe condições mais ou menos favoráveis para o acesso ao conhecimento que se busca alcançar, entre os diversos sujeitos da sociedade.

O mundo distante: interesse ou expropriação?

Em um seminário realizado no Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da PUC-SP, em 1994, que discutia a questão da violência simbólica, a professora Carmem Junqueira fez um interessante comentário sobre o debate atual da questão nos segmentos civis dos países escandinavos. Dizia ela de sua surpresa ao ler um relatório de pesquisa, onde se afirmava que os sujeitos daqueles países sentiam-se violentados, sobretudo por não poderem conhecer outros países que os atraíam por diversos motivos, devido ao custo que isso acarretava, além de outros empecilhos. Quando se buscava fazer uma analogia dessa situação com a questão da violência no Brasil, centrada basicamente na incapacidade de garantir os direitos básicos de sobrevivência da grande maioria da população, criava-se um hiato enorme. Para além da frustração, todavia, restam sinais para se pensar a questão da simbologia do distante, nas relações sócio-espaciais dos moradores do Sertão do Sesmarias.

Embora seja possível supor que a simbologia do mundo distante é também produto de uma relação de interesses entre os sujeitos e os espaços, dados na escala hierárquica que os mesmos dimensionam cotidianamente, as perspectivas da grande maioria da população brasileira tornariam um artifício pecaminoso querer ampliar essa análise para todos os segmentos da sociedade.

Pode-se, porém, estabelecer um outro tipo de categorias que enquadrem essas relações dos sujeitos com espaços e mundos distantes, quando, ao estudar os trabalhos antropológicos em sociedades indígenas, depara-se com espaços que se tornam proibidos, por motivos religiosos, políticos ou mitológicos. Sejam espaços que se distanciem pelo rigor ritual, pela presença de chefes ou pela crença em seu aspecto diferenciado, eles estão muitas vezes presentes nas relações cotidianas da grande maioria das pessoas que, se não podem utilizá-los em ocasiões profanas, podem ao menos vivenciá-los na paisagem, na tradição e até – ou somente – nos sonhos e transes.

As indicações sobre tais variações entre a permissão ou proibição ao uso de determinados espaços são constantes na etnologia. Um espaço de uso coletivo aos membros de um grupo indígena pode ser proibido às mulheres, durante a realização de um "potlatch" no mesmo. Os Balanta, de Guiné-Bissau, realizam rituais propiciatórios nos espaços de plantação de arroz12 12 Os rituais propiciatórios realizados pelos Balanta dividem-se em três momentos específicos: são os jovens entre 16 e 17 anos que semeiam – plantam as sementes no viveiro – devido à idéia de fecundidade, já que eles estão no limiar de sua forma física. Após nascida a planta, em cerca de três semanas, é a mulher que a transplanta para o solo, realizando um ritual que representa a simbiose mulher e terra, enquanto os elementos que acolhem a semente para a sua gestação. Quando da época da colheita, a participação é geral, na aldeia (DELIZOICOV, 1981). , considerando-os locais ordenados pelos próprios rituais, não admitindo, por conseguinte, sua desorganização pela ação humana. A dependência criada em relação à posse de gado, entre os Nuer, gerava um reconhecimento de que "as necessidades humanas têm de se subordinar às necessidades do gado" (Evans-Pritchard, 1978, p.32), o que incluía as divisões entre espaço para plantação e espaço para pastagem. Douglas (1976, p.87) descreve como os bosquímanos estudados por Marshal Thomas dividem o espaço do lar em duas regiões - masculina e feminina – a partir de um bastão que a esposa enfia no solo para marcar onde colocará o seu fogo.

Diferentes em gênero e grau, os espaços distantes que existem nas sociedades ocidentais, e principalmente os que existem para as sociedades do terceiro mundo e suas classes pobres são proibidos por outros motivos, quais sejam: os econômicos. E, se eles se mostram regularmente através de cartazes, filmes e comerciais de TV, mais que provocar o êxtase do transe que elevava o indígena ao seu "paraíso", provocam nos sujeitos pobres um desejo sempre renovado de integração e a reafirmação de sua distância: a distância da expropriação social cotidiana e segregacionista.

Apesar de eles ressentirem muito fortemente a distância que separa seu desejo de igualdade de suas desigualdades reais, essas são muito dispersas para reunificar sua experiência e para produzir uma mobilização contra uma condição julgada intolerável (DUBET, 2003, p. 50).

Assim, a distância de suas condições objetivas com relação à cidade ritualizam-se e se reproduzem também nas suas condições subjetivas. As representações dos sujeitos do Sertão do Sesmarias mostram-se fragmentadas e orientadas pelas percepções de um cotidiano que, regularmente, torna as relações desses sujeitos com o conjunto da cidade impessoais, sendo necessário estabelecer um princípio de proximidade que permita unificar os elementos em conflito. Nesse sentido, Simmel (1983, p.160), afirma que:

Os significados bem diversos relacionados com o símbolo 'distância' têm muita afinidade psicológica entre si. Por exemplo, uma imagem de objeto representada de algum modo como 'distante' parece ter quase sempre um efeito mais impessoal. Se, acompanhada de tal representação, a reação individual seguinte à proximidade imediata e ao toque é menos aguda, tem imediatamente um caráter menos subjetivo e desse modo pode ser o mesmo para um número maior de indivíduos. O conceito geral que abrange uma pluralidade de pormenores é tanto mais abstrato (isto é, mais distante de cada um deles), quanto mais numerosos e diferentes uns dos outros forem estes pormenores. Assim, um ponto de unificação social a uma distância maior dos elementos a serem unificados (tanto no sentido espacial quanto no figurado) parece do mesmo modo ter efeitos especificamente unificadores e abrangentes. A unificação decorrente de um perigo mais crônico do que agudo, decorrente de um conflito sempre latente mas nunca detonado, será mais efetiva quando o problema é a unificação duradoura de elementos algo divergentes.

No caso dos moradores do Sertão do Sesmarias, são as atividades ocupacionais e as relações que estabelecem no espaço local que definem o ponto de unificação social dos espaços cotidianos e relacionais. Essa unificação dirige-se para o conjunto da cidade, mesmo que distante, em contraposição à mata que os cerca. Assim, mais importante que enfatizar a fragmentação das suas concepções de cidade e cidadania, é reconhecer que esses sujeitos buscam unificar os elementos diversos e divergentes decorrentes de suas condições sociais, de forma a humanizarem-se diante da exclusão social. As representações que buscam o sentido de proximidade, entre os moradores da área, relativizam o sentido de exclusão da esfera pública, a que são submetidos, assim como a naturalização dos processos de exclusão, arrastados que foram para áreas limítrofes da urbanidade e da natureza. Como afirma Jovchelovitch (2000, p.47),

[...] o fato de que as pessoas compartilham um espaço comum e estão ligadas umas às outras através do convívio social não é o que as distingue de outros animais. O convívio social não pode ser considerado uma condição humana fundamental. Viver com outras pessoas não é suficiente: ao contrário, é uma necessidade que nos é imposta pelo ciclo biológico da vida que inclui tudo que compartilhamos com outras espécies comer, dormir, reproduzir, etc. Viver com outros de forma humana pressupõe a capacidade de escapar ao domínio da necessidade pura e entrar para um domínio completamente diferente – o domínio da ação, ou da política, onde as pessoas desenvolvem suas capacidades para o discurso e a ação.

Assim, as estratégias dos sujeitos do Sesmarias, na medida em que buscam unificar princípios de ação e formas de sociabilidade que distinguem situações condicionadas ora pela materialidade da vida urbana, ora pelas "forças naturais", orientam-se pela definição de uma proximidade que os humaniza, e humaniza o lugar em que vivem. Trata-se, assim, de estratégias que visam superar o domínio da necessidade, em proveito de um domínio de liberdade que se enuncia: a cidade, como "espaço público da palavra e da ação".

Espaços e proximidades: o lugar como estratégia de apropriação

Sem querer reduzir a análise antropológica à determinação de condicionantes econômicos que possibilitem uma construção às relações sócio-espaciais, a idéia de que as noções de proximidade e vizinhança, no caso estudado, guardam representações das situações de expropriação e segregação que são elaboradas na sociedade, traz à análise uma contribuição importante: a simbologia das relações sócio-espaciais e suas conseqüentes percepções de domínio, conhecimento e distância são determinadas pelas condições de acesso às experiências sensivelmente possíveis nas diversas classes sociais.

No horizonte de toda a discussão, o contraste entre as concepções de espaço público e espaço privado assumem, então, mais que uma simples representação dicotômica de pólos diferenciados. Tornam-se percepções ideologizadas, segundo a direção (unilinear ou circular) e a constância de sua utilização e expressão, nos diversos segmentos sociais.

Em casos mais extremos, esta presença ideológica arrasta, numa mesma percepção, visões diferenciadas de mundo, dadas como novos condicionamentos sociais que se impõem aos sujeitos, desde a produção do espaço urbano, na forma de ordenamentos territoriais que se desdobram do modelo contemporâneo de organização social.

A diversificação e a aceleração de tais ordenamentos, produzidas e reproduzidas no processo de globalização, manifestam-se assim na fragmentação do próprio território, tornando complexas as formas de apropriação sócio-espaciais operadas pelos sujeitos. Da produção do território, como lugar (que, na concepção de Yázigi [2001], forma-se da combinação de elementos presenciais ou não, permanentes e transitórios que compõem uma paisagem) às modulações do urbano, como modos de produção, as cidades tornam-se contextos que comportam a diversidade, o hibridismo e a multiplicidade de sentidos. Logo, a formação identitária do sujeito urbano diferencia e distancia esse sujeito do urbanita (aquele que simplesmente vive nas cidades).

Afetado pelos condicionamentos do espaço urbano e formando-se em um jogo de estratégias de apropriação, frente à exclusão, o sujeito pobre busca constituir lugares próprios, recortados por dimensões valorativas e hierarquizadas, que realizam a mediações entre o citadino e o cidadão.

Elaborando a questão de outra forma: entre o processo de produção do espaço urbano e o da produção das urbanidades, o sujeito pobre "opera" a configuração de lugares, como contextos que sintetizam objetivações e subjetivações relativas às suas condições próprias de vida, mas que visam a integração à cidade, como idealização.

Daí que o lugar é sempre um lugar próprio aos sujeitos, de onde eles visualizam o mundo: o lugar é estratégico e é, ele próprio, estratégia. O lugar compõe a mundividência dos sujeitos, incorporando identidades, mas abrindo-se sempre às transformações vividas ou esperadas nas condições de vida dos sujeitos e nas suas relações sociais.

Notas

Recebido em 10/6/2006; revisado e aprovado em 23/10/2006; aceito em 19/1/2007.

  • ALVES, Rubem. Conversas ao pé do fogo. Tempo e Presença, São Paulo, n. 52, p.25, 1990.
  • AMARAL, Rita. Povo-de-santo, povo de festa: estudo antropológico do estilo de vida dos adeptos do candomblé paulista. Dissertação de Mestrado em Antropologia. São Paulo, USP. 1992.
  • AUGRAS, Monique. O ser da compreensão: fenomenologia da situação de psicodiagnostico. 2.ed. Petrópolis: Vozes, 1981. 96p.
  • BETTANINI, Tonino. Espaço e Ciências Humanas.Tradução de Liliana Laganá Fernandes. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. 155p.
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  • CAMPA, Ricardo. A época das incertezas e as transformações do Estado contemporâneo. Tradução de Aurora Fornoni Bernardini. São Paulo: Difel/Instituto Italiano di cultura, 1985. 288p.
  • CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano (Artes de Fazer). Tradução de Ephraim Ferreira Alves. Petrópolis: Vozes, 1994. 351p.
  • DA MATTA, Roberto. A casa e a rua. São Paulo: Brasiliense, 1985. 140p.
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  • DOUGLAS, Mary. Pureza e perigo. Tradução de Monica Siqueira Leite de Barros e Zilda Zakia Pinto. São Paulo: Perspectiva, 1978. 232p.
  • DUBET, François. As desigualdades multiplicadas. Ijuí: EdUnijuí, 2003. 76p.
  • EVANS-PRITCHARD, Edward Evan. Os nuer. Tradução de Ana M. Goldberg Coelho. São Paulo: Perspectiva, 1978. 276p.
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  • HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. SP: Vértice/Revista dos Tribunais, 1990.
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  • LEDRUT, Raymond. Sociologie urbaine. Paris: PUF, 1968.
  • LÉVI-STRAUSS, Claude; CHARBONNIER, Georges. Arte, linguagem, etnologia. Tradução de Nícia Adan Bonatti. Campinas: Papirus, 1989. 123p.
  • LOPES, José Rogério; SABOYA, Glícia Meiber G. Pessoa, Trabalho, Reificação. Serviço Social e Sociedade, São Paulo, n.41, abril, p.118-30, 1993.
  • LOPES, José Rogério. Cultura e Ideologia São Paulo: Cabral/Robe, 1995, 82p.
  • LOPES, José Rogério. Urbanidade e cidadania: as modulações do urbano e o direito à cidade. Ciências Sociais Unisinos, São Leopoldo, v.37, n.158, p.67-92, 2001.
  • MARX, Karl. Marx (Coleção Os Pensadores). São Paulo, Abril, 1978.
  • PAUGAM, Serge. A desqualificação social. Ensaios sobre a nova pobreza. São Paulo: Cortez, 2003.
  • SIMMEL, Geörg. Conflito e estrutura do grupo. In: MORAES Fş, Evaristo (Org.) Simmel (Coleção Grandes Cientistas Sociais). SP: Ática, p. 150-64, 1983.
  • THOMAS, Keith. O homem e o mundo natural: mudanças de atitudes em relação as plantas e aos animais (1500-1800). Tradução de João Roberto Martins Filho. São Paulo: Cia das Letras, 1989. 454p.
  • YÁZIGI, Eduardo. A Alma do lugar. Turismo, planejamento e cotidiano. SP: Contexto, 2001. 301p.
  • 1
    A equipe de pesquisadores do projeto aplicou um questionário às famílias residentes nas áreas, respondido pelo membro que se apresentava como responsável pela casa. O questionário levantava informações para a caracterização sócio-econômica da população e as demandas sociais locais. Os dados coletados foram tabulados considerando-se as categorias de gênero, cor e renda. Foram pesquisadas seis áreas em três cidades: Taubaté, Campos do Jordão e Ubatuba, num total de 261 questionários. Para a análise aqui apresentada, foram considerados os dados de 165 questionários, referentes a três áreas, duas localizadas em Ubatuba e uma em Campos do Jordão.
  • 2
    Veja-se Raymond Ledrut,
    Sociologie urbaine. Paris: PUF, 1968.
  • 3
    Michel de Certeau define como estratégicos os espaços próprios dos sujeitos, pois é a partir deles que os sujeitos operam práticas segundo um "cálculo das relações de forças que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e poder é isolável de um 'ambiente'. Ela [estratégia] postula um lugar capaz de ser circunscrito como um
    próprio e portanto capaz de servir de base a uma gestão de suas relações com uma exterioridade distinta" (Certeau, 1994, p. 46).
  • 4
    Conferir, por exemplo, a análise desenvolvida por Maurice Halbwachs (1990), sobretudo em seu capítulo IV, A Memória e o espaço.
  • 5
    O próprio Halbwachs (1990, p.133) afirma que "as imagens espaciais desempenham um papel na memória coletiva. O lugar ocupado por um grupo não é como um quadro negro sobre o qual escrevemos, depois apagamos os números e as figuras".
  • 6
    Não tão arbitrário, porém, conforme as análises desenvolvidas no livro já citado de Roberto Da Matta (1985).
  • 7
    A noção de espaço de coexistência é assim definida por Augras (1981, p. 34): "no espaço de coexistência, os homens tecem redes que os aproximam e os afastam, organizando o mundo de maneira a assegurar áreas recíprocas de movimentação".
  • 8
    "A orientação literária do imaginário feminino-juvenil sobre a sexualidade", projeto realizado junto ao Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas de Práxis Contemporâneas da Universidade de Taubaté, no período de 2003-2005.
  • 9
    Esse reconhecimento podia ser verificado pelas imagens de um quadro do programa "Domingão do Faustão", que vai ao ar aos domingos. O quadro era o "Seu vizinho é uma mina", que apresentava o interior de uma casa, num bairro de uma cidade – geralmente média ou grande – e que premiava o dono da casa com uma quantia em dinheiro, caso nenhum dos vizinhos da rua se apresentasse para reivindicar o prêmio, reconhecendo a casa pelas imagens apresentadas. Não se informava o nome da cidade ou do bairro e nem se mostrava os rostos das pessoas da família que ali residiam. O reconhecimento era tão somente do espaço interior da casa e de alguns "flashs" da rua, jardins, etc, através de frestas das janelas. Em várias ocasiões, via-se o vizinho ganhando o prêmio.
  • 10
    O episódio da guerra no Golfo Pérsico, em 91, enfatizou esse tipo de relações. Os telespectadores, de quaisquer emissoras, eram constantemente "bombardeados" com informações sobre as causas da guerra, os espaços estratégicos da luta, os espaços civis e os espaços neutros, dentro dos diversos e regulares "flashs" jornalísticos ou programas especialmente preparados para atualizar os assistentes sobre os diversos espaços que configuravam o conflito.
  • 11
    A formação acadêmica, como a experiência de trabalho de Arqueólogos, Geólogos, Geógrafos, Arquitetos e profissionais afins são um bom exemplo deste tipo de relações.
  • 12
    Os rituais propiciatórios realizados pelos Balanta dividem-se em três momentos específicos: são os jovens entre 16 e 17 anos que semeiam – plantam as sementes no viveiro – devido à idéia de fecundidade, já que eles estão no limiar de sua forma física. Após nascida a planta, em cerca de três semanas, é a mulher que a transplanta para o solo, realizando um ritual que representa a simbiose mulher e terra, enquanto os elementos que acolhem a semente para a sua gestação. Quando da época da colheita, a participação é geral, na aldeia (DELIZOICOV, 1981).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Out 2007
    • Data do Fascículo
      Mar 2007

    Histórico

    • Aceito
      19 Jan 2007
    • Revisado
      23 Out 2006
    • Recebido
      10 Jun 2006
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