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Uma possível hierarquização através de um índice de desenvolvimento económico e social dos Concelhos de Portugal Continental

A social and economic development index - NUTS ranking in Portugal

Une hiérarchisation possible par un indice de développement economique et social des Conseils de Portugal Continental

Un índice del desarrollo social y económico - una clasificación posible de NUTS IV en Portugal

Resumos

O objectivo inicial deste trabalho é o cálculo um Índice de Desenvolvimento Económico e Social (IDES) ao nível de cada concelho (NUT IV) de Portugal e de seguida procede-se à construção de clusters. Os resultados apontam a dicotomia litoral/interior e significativas assimetrias entre os concelhos que integram o país, o que sugere a necessidade de uma especial precaução na delimitação espacial da aplicabilidade de políticas de desenvolvimento regional, em nome da sua eficácia real.

Índice de Desenvolvimento Económico e Social; Desenvolvimento Local; Análise de Clusters


The aim of this study is to calculate a Social and Economic Development Index (SEDI), regarding each concelho (NUTS IV) of Portugal. From there it will move forward to seeking for clusters. Results point to coastal areas/hinterland dichotomies as well as the significant asymmetries between each concelho, which suggests the need for a special care in setting up the spatial boundaries prior to its application to regional development policies on behalf of its true effectiveness.

Social and Economic Development Index; Local development; Cluster Analysis


L'objectif initial de ce travail est le calcul d'un Indice de Développement Economique et Social (IDES) au niveau de chaque conseil (NUT IV) du Portugal et ensuite à la construction de clusters. Les résultats indiquent la dichotomie côte/province intérieure et les asymétries significatives entre les conseils qui intègrent le pays, ce qui démontre le besoin d'une préoccupation spéciale dans la délimitation spatiale de l'applicabilité des politiques de développement régional, au nom de son efficacité réelle.

Indice de Développement Economique et Social; Développement Local; Analyse de Clusters


El objetivo inicial de este trabajo es el cálculo un índice del desarrollo económico y social (IDES) al nivel de cada concelho (NUTS IV) de Portugal, seguido de la construcción de clusters. Los resultados señalan la dicotomía área costera/ interior y asimetrías entre los concelhos que integran el país, qué sugiere la necesidad de una precaución especial en la delimitación del espacio de la aplicabilidad de la política del desarrollo regional, a nombre de su eficacia verdadera.

Índice del desarrollo económico y social; Desarrollo local; Análisis de clusters


ARTIGOS

Uma possível hierarquização através de um índice de desenvolvimento económico e social dos Concelhos de Portugal Continental

Un índice del desarrollo social y económico – una clasificación posible de NUTS IV en Portugal

A social and economic development index - NUTS ranking in Portugal

Une hiérarchisation possible par un indice de développement economique et social des Conseils de Portugal Continental

Francisco Diniz; Teresa Sequeira

Francisco Diniz (fdiniz@utad.pt) e Teresa Sequeira (tsequeir@utad.pt) são investigadores doutorados do CETRAD e docentes do Departamento de Economia, Sociologia e Gestão da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Av. Almeida Lucena, 1. 5000-660 Vila Real – Portugal. Tel: 00 351 259 302 200.

RESUMO

O objectivo inicial deste trabalho é o cálculo um Índice de Desenvolvimento Económico e Social (IDES) ao nível de cada concelho (NUT IV) de Portugal e de seguida procede-se à construção de clusters. Os resultados apontam a dicotomia litoral/interior e significativas assimetrias entre os concelhos que integram o país, o que sugere a necessidade de uma especial precaução na delimitação espacial da aplicabilidade de políticas de desenvolvimento regional, em nome da sua eficácia real.

Palavras-chave: Índice de Desenvolvimento Económico e Social. Desenvolvimento Local. Análise de Clusters.

RESUMEN

El objetivo inicial de este trabajo es el cálculo un índice del desarrollo económico y social (IDES) al nivel de cada concelho (NUTS IV) de Portugal, seguido de la construcción de clusters. Los resultados señalan la dicotomía área costera/ interior y asimetrías entre los concelhos que integran el país, qué sugiere la necesidad de una precaución especial en la delimitación del espacio de la aplicabilidad de la política del desarrollo regional, a nombre de su eficacia verdadera.

Palabras clave: Índice del desarrollo económico y social. Desarrollo local. Análisis de clusters.

ABSTRACT

The aim of this study is to calculate a Social and Economic Development Index (SEDI), regarding each concelho (NUTS IV) of Portugal. From there it will move forward to seeking for clusters. Results point to coastal areas/hinterland dichotomies as well as the significant asymmetries between each concelho, which suggests the need for a special care in setting up the spatial boundaries prior to its application to regional development policies on behalf of its true effectiveness.

Key words: Social and Economic Development Index. Local development. Cluster Analysis.

RESUMO

L'objectif initial de ce travail est le calcul d'un Indice de Développement Economique et Social (IDES) au niveau de chaque conseil (NUT IV) du Portugal et ensuite à la construction de clusters. Les résultats indiquent la dichotomie côte/province intérieure et les asymétries significatives entre les conseils qui intègrent le pays, ce qui démontre le besoin d'une préoccupation spéciale dans la délimitation spatiale de l'applicabilité des politiques de développement régional, au nom de son efficacité réelle.

Palavras-chave: Indice de Développement Economique et Social. Développement Local. Analyse de Clusters.

1 Introdução

Se o desenvolvimento é o futuro este, seguramente, não pode existir sem um claro conhecimento do passado. Ao processo de desenvolvimento está associada, em primeiro lugar, a ideia de observação de uma determinada situação de partida. Ao ser sujeita a uma reflexão aprofundada, torna-se objecto da implementação de um modelo de crescimento indissociável à sua transformação e mudança para um estado não só quantitativamente, mas também, qualitativamente superior.

Apesar do PIB real per capita ser um dos indicadores a que se recorre de forma mais frequente para medir e comparar processos de crescimento/desenvolvimento económico ocorridos em diferentes espaços, o facto de este apenas abranger uma das facetas do desenvolvimento regional, suscita inúmeras críticas por parte dos investigadores que expõem o seu carácter redutor. Na sua exclusiva aplicação, este indicador acaba por negligenciar, por um lado, a vertente social (acesso à educação, saúde, e outras condições de vida) e, por outro, por menosprezar outras variáveis igualmente importantes para medir a perfomance económica de um determinado território (BASTER,1972).

O objectivo deste trabalho consiste, em primeiro lugar, em apresentar uma forma de hierarquizar unidades territoriais de Portugal Continental, ao nível do concelho, tecendo-se considerações acerca do seu posicionamento em termos de um indicador de desenvolvimento económico e social que contemple variáveis susceptíveis de cobrirem inúmeros aspectos para além dos estritamente ligados à economia. Posteriormente, procura-se detectar a presença de relações de homogeneidade entre os diversos concelhos, partindo de um método estatístico multivariado – os clusters. De forma a elucidar os vários passos levados a cabo para cumprir as tarefas acima referidas, será descrita, no ponto 2, a estrutura metodológica utilizada.

No Ponto 3, procede-se à apresentação e consequente análise dos resultados obtidos, que são aprofundados no ponto 4, numa tentativa de obtenção de obtenção de clusters.

Este trabalho termina com algumas reflexões e considerações finais, apresentando as limitações do estudo e algumas pistas para investigação futura.

2 Aspectos metodológicos

Desde de 1990, o PNUD analisa a história recente (a partir de 1960) da evolução do desenvolvimento humano, um fenómeno que se revela, antes de mais, como um processo que conduz ao alargamento das possibilidades oferecidas a cada indivíduo através da realização de três condições essenciais: uma longa vida, uma boa saúde e a aquisição de um saber que permita o acesso aos recursos necessários para auferir um nível de vida conveniente.

No entanto, o conceito de desenvolvimento humano não se esgota com o atingir destes pressupostos, englobando outras dimensões, igualmente importantes (embora de difícil execução), que se prendem com a liberdade política, económica e social; a criatividade; a produtividade; e o respeito pela garantia dos direitos humanos fundamentais. Revela, por isso, dois aspectos indissociáveis, nomeadamente, a criação de capacidades pessoais por um lado, e o uso que os indivíduos dão a essas mesmas capacidades, quer para fins produtivos ou lazer, quer para outros fins políticos, culturais e sociais, por outro. A inexistência de um equilíbrio entre estes dois aspectos do desenvolvimento humano conduz a uma enorme frustração (SEERS, 1972).

Neste sentido foi introduzido, em 1995, o tema do género, passando-se a analisar em que medida a consideração das diferenças de oportunidades entre os géneros poderia alterar a hierarquização dos países face ao seu nível de desenvolvimento. De igual forma, foi dada relevância ao grau de participação das mulheres na vida política e económica da sociedade. A partir de 1997, uma atenção especial à situação da pobreza humana foi materializada através de uma medida da situação dos países, tendo em conta a diferenciação do estatuto da pobreza quando o nível de desenvolvimento é elevado ou ainda está numa fase mais recuada. Por fim, em 1999, foi calculado um índice de realização tecnológica com o fim de definir países líderes, líderes potenciais e seguidores dinâmicos das novas tecnologias (PNUD, 2007).

O presente estudo propõe uma metodologia que segue de perto a que foi adoptada pelo PNUD nos Relatórios anuais sobre o desenvolvimento humano, para quantificar o desenvolvimento económico e social, ao nível local, tomando em consideração a integração de diferentes dimensões (demográfica, económica, social e ambiental), com vista a dar resposta a uma visão conceptual integrada de desenvolvimento.

Relativamente ao modelo de sistematização dos indicadores, optou-se pela utilização de indicadores de status quo. Com efeito, e apesar de se considerar que a realidade do desenvolvimento é representada de uma forma mais adequada quando se analisam as diferentes formas dos indicadores (pressão, status quo e resposta)1 1 Partindo de um trabalho de Friend e Rapport (1979), a OCDE desenvolveu um modelo designado por Pressão – status quo – Resposta (PSR) baseado num conceito de causalidade. , bem como as interacções existentes entre estas - dado a análise em apreço se reportar ao status quo das dinâmicas de desenvolvimento do território que integra a totalidade dos 278 concelhos correspondentes a Portugal Continental - opta-se por levar apenas em consideração a primeira forma enunciada.

Tendo em conta os aspectos metodológicos já referidos, bem como a disponibilidade de dados estatísticos à escala concelhia, o IDES ora elaborado resulta de 15 indicadores representativos de diferentes domínios de abordagem do desenvolvimento (Quadro 1). Assim, ao nível demográfico consideram-se quatro indicadores que procuram levar em consideração não só a vitalidade, como a dinâmica da evolução dos recursos humanos de cada território, ao nível do crescimento demográfico, incluindo o natural e o migratório, e da taxa de fecundidade. No plano da educação, pretende-se medir o grau de ensino atingido pela população, recorrendo para tal, à análise das taxas de analfabetismo, assim como à mensuração da dimensão da população que tem como habilitações o ensino superior. Em seguida, retratam-se as questões do emprego, economia, e sector empresarial, a partir de sete indicadores que nos aportam um importante contributo para o conhecimento mais aprofundado das condições de vida da população, em termos de trabalho e rendimento, traçando igualmente um perfil da estrutura empresarial dos territórios em causa, e de todo um conjunto de questões fundamentais para o assegurar da própria sobrevivência, e para garantir o sentido de pertença e a coesão social. Por fim, os níveis da saúde e da habitação reforçam a componente social retratada neste índice, procurando avaliar não só a dotação em equipamentos como, também, os respectivos graus de acessibilidade, o que traduz, em certa medida, o impacto social das condicionantes demográficas e económicas locais. De resto, no indicador condições de habitabilidade, encontra-se também presente a vertente ambiental, ao serem incluídas três medidas desta variável no indicador composto, no sentido de se medirem diferentes aspectos da vida económico-social com influência na qualidade ambiental dos recursos e do território, como seja o caso da água e dos resíduos.


Outro aspecto metodológico definido diz respeito ao tratamento da informação. Neste caso, a opção foi por uma análise tipo benchmarking, recorrendo para o efeito, a valores de referência: a situação mais favorável (Ls) e a mais desfavorável (Li). Desta forma, o valor de cada indicador para cada concelho é transformado tendo por referência quer o valor mais favorável, quer o mais desfavorável para o caso do conjunto dos concelhos analisados, do qual resulta um intervalo de variação entre zero e um. A leitura dos valores obtidos permite averiguar do posicionamento relativo de cada concelho em relação aquele que detém um resultado mais favorável, sendo ainda igualmente possível averiguar os respectivos níveis de coesão inter e intra territoriais.

A etapa metodológica seguinte consistiu na agregação de todos os índices. Para tal, foi dada igual ponderação5 5 A este propósito foi seguido o mesmo critério que o usado na construção do Índice de Desenvolvimento Humano do PNUD. a cada um dos 15 indicadores, procurando, assim, embora de forma subjectiva, reflectir no índice final a percepção dos autores quanto ao peso relativo que cada indicador tem ao nível do desenvolvimento. Assim, num primeiro momento cada valor de cada indicador é transformado do seguinte modo:

onde,

= índice do indicador do concelho

X = indicador do concelho

Li = valor mais desfavorável para o indicador

Ls = valor mais favorável para o indicador

Num segundo momento, os diferentes indicadores transformados são agregados do modo seguinte:

Para a construção de clusters, procurámos, numa primeira fase, obter clusters hierárquicos, com base em técnicas aglomerativas e divisivas, métodos que recorrem a passos sucessivos, onde os indivíduos, neste caso os concelhos, são considerados, à partida, individualmente, um cluster e, depois, agrupados de acordo com as suas proximidades ou, ao contrário, inseridos num único cluster, e, posteriormente divididos em sub-grupos, em função da distância (MAROCO, 2003).

Foram testados diversos métodos de ligação entre os clusters, com o software SPSS, no sentido de verificar se estes produzem resultados similares, tal como sugerem Pestana e Gajeiro (2003) e Maroco (op. cit.). Deste modo, constatámos que obtivemos resultados de agregação bastante semelhantes para os métodos Complete e Average Linkage (Within groups). Ao utilizar um método não hierárquico, o método K-means6 6 O K-means é um método não hierárquico que começa por uma partição inicial dos indivíduos por um número de clusters previamente definido, consistindo na transferência de um indivíduo para o cluster cujo centróide se encontra a menor distância (REIS, 1993). , os resultados que mais se assemelham entre este último, não hierárquico, e os métodos hierárquicos referidos anteriormente foram os obtidos pelo método Complete Linkage7 7 O critério Complete Linkage é um processo onde a distância entre dois grupos é definida como a distância entre os seus elementos mais afastados ou menos semelhantes. Então, cada grupo passa a ser definido como um conjunto de elementos onde cada um é mais semelhante a todos os elementos do grupo do que a qualquer dos elementos dos restantes grupos (REIS, 1993). , pelo que será este método que iremos eleger para fazer a comparação entre os dois tipos de métodos.

3 Análise dos resultados

Uma vez descritos os procedimentos metodológicos utilizados para o tratamento dos dados inerentes às variáveis escolhidas para retratar os vários níveis abordados, foi possível calcular, para cada um dos 278 concelhos de Portugal Continental, um índice de desenvolvimento económico e social - IDES. Tendo por base a construção deste índice e os valores atingidos ao nível concelhio, começar-se-á por analisar a posição hierárquica ocupada por cada concelho, justificando o seu estado de desenvolvimento pelo ranking ocupado em cada um dos 15 indicadores que compõem o índice final.

O IDES apresenta um valor que oscila entre um pouco menos de ¼ e um máximo de aproximadamente 2/3. O valor do coeficiente de variação é pouco significativo, uma vez que o desvio padrão é cerca de 20% do valor da média. O concelho de Vinhais assume o valor mais baixo do índice (0.2364), o que significa que só está cerca de 24 pontos percentuais acima de ter a pior realização de todos os indicadores. Por seu turno, Lisboa assume o primeiro lugar do ranking, ao atingir um patamar de desenvolvimento de 0.6609, valor que coloca, no entanto, este concelho a 34 pontos de atingir a situação óptima. A concentração do IDES faz-se em 40 pontos, afastando-se menos da pior posição do que da melhor.

Os dois concelhos (cerca de 1%) - Vinhais e Mértola - com um IDES inferior a 0.25, são ambos do interior e da fronteira com Espanha. Esta situação de interioridade continua a ser uma constante para o total dos 16 concelhos que têm um IDES compreendido entre 0.25 e 0.3, e mesmo quando o índice sobe até 0.35, dos 46 concelhos inseridos nesse intervalo (aproximadamente 17% do total analisado), apenas Odemira pertence ao litoral, mais concretamente ao litoral alentejano (Figura 1).


Abrangendo o maior número de concelhos (56 dos 278 concelhos analisados), o escalão de desenvolvimento compreendido entre 0.35 e 0.4, acaba por englobar unicamente Alcácer do Sal, Grândola, Aljezur e Castro Marim, todos referentes ao sul do país, nomeadamente ao litoral do Alentejo e à costa do Algarve. Os restantes 52 concelhos estão, a exemplo do que se verificou anteriormente, situados no interior.

Concluída a análise desta primeira metade do intervalo entre os valores máximos e mínimos do IDES, resulta pertinente voltar a vincar a característica mais evidente até ao momento, nomeadamente, a condição de interioridade dos espaços.

À medida que se sobe no ranking do IDES em mais 0.05, o litoral começa a insinuar-se, embora de forma tímida. O sul participa apenas com Tavira e Vila do Bispo, no Algarve, e Santiago do Cacém, no Alentejo, sendo que no centro do país se encontra a maioria dos concelhos do litoral deste intervalo (Lourinhã, Peniche, Óbidos, Nazaré, Pombal, Cantanhede, Mira e, Murtosa). O norte faz-se representar por Caminha. Os restantes 43 concelhos são todos do interior, que continua a ser, por conseguinte, o espaço maioritário deste nível de desenvolvimento.

Para um IDES entre 0.45 e 0.5, o litoral continua a estar mais representado por concelhos a norte do Tejo, cabendo ao Algarve apenas os casos de Olhão, Silves e Vila Real de Santo António. Apesar de neste escalão de desenvolvimento se verificar uma distribuição percentual relativamente idêntica ao anterior, no que respeita aos concelhos pertencentes ao litoral (cerca de 20%), a grande diferença reside na localização dos concelhos do interior, dado que para este patamar de desenvolvimento, começa a haver uma maior proximidade destes face ao litoral.

Tal facto acaba por se tornar ainda mais evidente quando se avança mais 5 pontos percentuais no IDES, dado que, pela primeira vez, acabam por dominar os concelhos pertencentes ao litoral ou os situados em áreas que lhe são contíguos. Não obstante essa realidade, no mesmo degrau de desenvolvimento surgem Viseu, Guarda e Évora, concelhos com uma forte concentração urbana e que se apresentam consideravelmente afastados da zona costeira. Se a este eixo juntarmos outras cidades do interior com IDES um pouco inferior, pode-se inferir que estes territórios desempenham um papel importante no desenvolvimento policêntrico que foi definido como política de desenvolvimento regional pela União Europeia (COMISSÃO DAS COMUNIDADES, 1999).

Por fim, nos dois últimos níveis do IDES encontram-se os principais centros urbanos do país. Com um índice compreendido entre 0.55 e 0.6 encontram-se os concelhos com as cidades de Aveiro, Braga, Coimbra, Faro e Porto, assim como várias unidades territoriais que pertencem às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto tais como Odivelas, Seixal e Vila Franca de Xira, no primeiro caso, e Maia e Vila Nova de Gaia para o segundo. No escalão máximo do IDES, dominam os concelhos da área metropolitana de Lisboa, com uma única excepção: Albufeira, no Algarve (Mapa 1).


De forma a complementar uma primeira análise da situação dos concelhos face ao IDES, interessa abordar pormenorizadamente cada um dos 15 indicadores que estão na base da construção do índice composto. Tendo sido já referidos anteriormente, estes têm a ver com variáveis que se agrupam em vários níveis: Demografia; Educação; Emprego; Economia; Sector Empresarial; Saúde; Habitação.

Começando pela demografia, um pouco mais de metade dos concelhos de Portugal Continental apresentam um crescimento demográfico negativo, reportando-se os piores casos às unidades territoriais do interior próximas ou juntas da fronteira. Por sua vez, as zonas que registam os maiores aumentos populacionais dizem respeito ao litoral, em especial às áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, assim como a alguns concelhos algarvios. Em contraponto com a ideia já referida de despovoamento do interior, os concelhos de Vila Real, Viseu e Guarda verificam taxas de crescimento demográfico positivas, o que vem reforçar a ideia de policentrismo, atrás mencionada.

O crescimento natural é um fenómeno que se verifica mais a norte do que a sul, muito devido ao contributo positivo da metade da região norte mais próxima do litoral. As regiões de fronteira, a par do que se verifica para o crescimento demográfico, continuam a ser aquelas onde as taxas são menores. Este facto encontra também uma causa nas taxas de fecundidade que apesar de serem, de uma maneira geral, baixas são significativamente menores no interior.

O saldo migratório indica-nos um maior poder de atracção por parte das duas grandes áreas metropolitanas, com excepção dos seus pontos centrais, as cidades de Lisboa e do Porto. De igual forma, a região do Algarve e alguns concelhos do centro litoral português também evidenciam valores bastante positivos nesta matéria.

Sobre a educação, em relação aos dois descritores escolhidos, analfabetismo e educação superior, pode-se dizer que o primeiro tem uma distribuição mais homogénea pelo país, apesar de ainda se verificarem algumas situações preocupantes, como é o caso do Baixo Alentejo a sul. Por outro lado, os maiores contributos para o IDES, no que respeita ao indicador - População com Ensino Superior – pertencem, claramente, aos concelhos onde estão a funcionar estabelecimentos de ensino superior politécnico e universitário.

A taxa de emprego total tem um contributo positivo para o IDES em quase toda a faixa litoral, com as excepções de alguns concelhos localizados na zona mais a norte do país, como Mira, Figueira da Foz, Cantanhede, Murtosa e Pombal, na região centro e de alguns concelhos do litoral alentejano e algarvio. A região do Alentejo Central acaba por verificar igualmente valores bastante positivos. Pelo lado contrário, é no interior norte que o contributo deste indicador é mais negativo. A taxa de desemprego é particularmente, preocupante no Alentejo. Esta situação é confirmada pelo peso dos pensionistas em todo o interior, de norte a sul do país, e em todo o Alentejo. O emprego no sector não primário é um fenómeno de todo litoral, com excepção do Alentejo e dos concelhos menos urbanizados do interior.

Um olhar sobre o indicador PIB per capita legitima uma concentração da economia nas áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa. Há, no entanto, alguns casos dignos de registo. Miranda do Douro e Castro Verde, no interior, estão entre os concelhos com melhor performance neste indicador. Para tal contribuem a produção de energia eléctrica das barragens situadas no primeiro e a presença da indústria de extracção mineira no segundo. Cabe igualmente salientar o facto de a indústria petroquímica estar sedeada no concelho de Sines no litoral alentejano, o que torna este indicador interessante contribuindo, por conseguinte, de forma positiva para o respectivo IDES. Mais uma vez, quase todo o interior, nomeadamente o fronteiriço apresenta níveis baixos para este indicador. O poder de compra é, igualmente, muito mais forte nas áreas metropolitanas acima referidas, assim como também no Algarve. Bragança, Portalegre, Évora e Beja no interior, têm um nível de vida interessante pela tercearização das respectivas economias, a que não é alheia a presença de estabelecimentos de ensino superior nestes concelhos

O índice concelhio empresarial acaba por traduzir novamente a maior concentração da actividade económica nas áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa. Para além destas, a região de Leiria, o litoral algarvio e, mais uma vez, alguns centros urbanos do interior fazem do resto do país um deserto em matéria de empresarialismo.

A saúde revela algumas situações interessantes. Os concelhos das áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa que são adjacentes a estas cidades apresentam muitas debilidades. Este facto também se verifica no Algarve e nas proximidades de Coimbra. A fronteira apresenta carências consideráveis ao nível de infra-estruturas, equipamentos e capital humano, com as excepções de Vimioso a norte, de Castelo Branco no centro e dos concelhos de fronteira do Alto Alentejo a sul.

Por fim, da análise das condições de habitabilidade constata-se que os concelhos do interior norte não muito afastados do litoral apresentam uma maior fraqueza face aos que estão no interior mais profundo, com a devida exclusão dos concelhos de Mértola e Alcoutim pertencentes ao Baixo Alentejo e Algarve respectivamente, que revelam igualmente fortes debilidades nesta matéria. Apesar de se viver muito melhor em ambas as áreas metropolitanas, alguns concelhos do interior conseguem já oferecer condições muito digas em termos de conforto.

4 Análise por recurso a clusters

Para uma análise da relação entre as diversas componentes do IDES procurámos agrupar os concelhos, através da construção de clusters, que como López (2005, p. 441) descreve, trata-se do recurso a um método estatístico multivariado, cuja finalidade essencial é " revelar concentraciones en los datos para su agrupamiento eficiente en clusters (o conglomerados) según su homogeneidad".

Conforme referido no ponto 2, procurámos, inicialmente, obter clusters hierárquicos, constatando-se que se obtiveram resultados de agregação bastante semelhantes para os métodos Complete e Average Linkage (Within groups).

Como a utilização do método não hierárquico K-means exige o estabelecimento, à partida, do número de clusters desejado, desenvolvemos, previamente, a análise com o método hierárquico Complete Linkage com vista ao apuramento desse mesmo número, através da aplicação do critério da distância entre clusters e do critério do R- quadrado. O critério da distância mostrou que poderíamos reter 5 ou 10 clusters, pois é onde se verifica que o declive da recta que une a distância entre dois clusters é relativamente menor. Complementada esta análise com o critério R -quadrado, observámos que a solução de 5 clusters retém 75,9 % da variabilidade total. Adaptando estes resultados ao objectivo da obtenção de um número mínimo de clusters, cremos que a solução de 5 devera ser a escolhida, uma vez que retém, desde logo, uma percentagem significativa da variabilidade total.

A partir dos resultados obtidos pelo método não hierárquico K-means, no qual nos iremos basear para prosseguir a análise, pois, em geral, a classificação dos sujeitos é mais rigorosa nos métodos não hierárquicos, foram apurados os clusters que daremos conta no Mapa 2.


A análise da variância permite-nos identificar quais as variáveis que levam à divisão por clusters, assim como a sua importância relativa8 8 Partindo do principio que se uma variável descriminar bastante entre os clusters, então a variabilidade desta (dada pelo Cluster Mean Square) entre os clusters há-de ser elevada, e dentro do próprio cluster há-de ser diminuta (dada pelo Error Mean Square). Deste modo, as variáveis que mais contribuem para a definição dos clusters são aquelas com maior Cluster Mean Square e menor Error Mean Square, isto é, as que apresentam um maior valor de F (MAROCO, 2003). . Deste modo, constatamos que a variável que mais concorre para a diferenciação dos clusters é I12 (Poder de Compra), seguido por I3 (Crescimento Demográfico Migratório) e depois por I13 (Estrutura Empresarial), I5 (Analfabetismo), I1 (Crescimento Demográfico), I2 (Crescimento Demográfico Natural), I6 (Ensino Superior) e I9 (Emprego no Sector não Primário); e, ainda por I7 (Emprego Total), I4 (Taxa de Fecundidade), I14 (Saúde) e I11 (PIB per capita); por fim, I15 (Condições de Habitabilidade), I8 (Desemprego Total) e I10 (Empregados e Pensionistas).

Cruzando esta informação com as estatísticas descritivas das variáveis por clusters, os testes estatísticos às médias9 9 Pretendeu-se efectuar comparações múltiplas de médias, testando-se, à posteriori, quais os pares de médias diferentes. Para tal, utilizaram-se os testes Post-Hoc de Tukey e Bonferroni. e o mapa anteriormente produzido, poderemos constatar o seguinte:

O Cluster 4, composto pelas cidades de Lisboa e Porto, assume uma posição de domínio em matéria de indicadores de poder de compra (I12), dinamismo da estrutura empresarial (I13) população com ensino superior (I6), indicadores de saúde (I14) e PIB per capita (I11). No tocante a estas mesmas variáveis, este cluster é imediatamente secundado pelo cluster 5, que inclui, entre outros, os principais núcleos urbanos.

O cluster 4 salienta-se ainda relativamente aos restantes clusters pelo mais baixo crescimento demográfico migratório (I3), assim como o cluster 5 se diferencia pelo mais elevado crescimento demográfico (I1).

O cluster 3, representativo da maioria dos concelhos do interior do país, destaca-se pela pelo baixo nível de emprego e elevada taxa de analfabetismo os quais se reflectem na contribuição de I7 e de I5; e pelo mais pequeno nível de população com ensino superior (I6) e de poder de compra (I12).

O cluster 2, que abarca um conjunto de concelhos situados perto do litoral, distingue-se, entre outros factores, pelo comportamento positivo em matéria de nível de desemprego e de crescimento demográfico que se repercutem no I8 e I1, um relativo dinamismo empresarial (I13) apenas superado pelo clusters 4 e 5, e por um muito favorável rácio população empregada por pensionista (I10).

Finalmente o cluster 1, abarcando 89 concelhos que se distribuem pelo território com uma concentração relativa no centro, acaba por assumir uma posição intermédia na maioria dos indicadores.

5 Considerações finais

A análise dos diversos indicadores concelhios constituintes do IDES através da técnica de clusters permitiu reforçar a ideia das características diferenciadoras dos concelhos do litoral e do interior, com uma zona intermédia central, assim como o grupo dos concelhos capital de distrito e limítrofes e o das grandes comunidades Lisboa e Porto.

O simples exercício de sobreposição do mapa das regiões NUT (Nomenclatura de Unidade Territorial) de nível III sobre o mapa concelhio produzido permitiria relevar as grandes assimetrias de desenvolvimento dentro de cada NUT III, naturalmente ainda mais profundas caso a sobreposição fosse efectuada com o mapa do território a nível NUT II. E estas considerações são particularmente importantes em matéria de definição de políticas e instrumentos de desenvolvimento, tradicionalmente formatadas e dirigidas a um nível de agregação territorial demasiado lato para que possam atender às debilidades e especificidades de cada unidade territorial, comprometendo-se assim a sua eficiência e eficácia.

É importante ressalvar que este trabalho foi produzido com cálculo de indicadores com referência ao total do continente. Recalcular estes valores, tendo por base não o país, mas uma unidade territorial inferior, nomeadamente a NUT II e a NUT III, constituirá, certamente, um dos assuntos a desenvolver a em trabalhos posteriores.

Notas:

Recebido em 31/8/2007; revisado e aprovado em 10/12/2007; aceito em 18/2/2008.

Este artigo foi apresentado ao XIII Congresso da Associação Portuguesa de Desenvolvimento Regional, nos Açores, em julho de 2007.

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  • SEERS, D. Os indicadores de desenvolvimento: o que estamos a tentar medir? In: Análise Social (XV), 19, Lisboa, 1972.
  • 1
    Partindo de um trabalho de Friend e Rapport (1979), a OCDE desenvolveu um modelo designado por Pressão –
    status quo – Resposta (PSR) baseado num conceito de causalidade.
  • 2
    O Índice Concelhio Empresarial é a agregação, com igual ponderação, de quatro indicadores, nomeadamente: a) Empresas com sede na região; b) Sociedades com sede na região; c) Pessoal ao serviço nas sociedades com sede na região; d) Volume de vendas das sociedades com sede na região
  • 3
    O Índice Concelhio de Saúde é a agregação, com igual ponderação, de quatro indicadores, nomeadamente: a) n. de médicos/1.000 habitantes; b) n. de farmácias/10.000 habitantes; c) pessoal de Enfermagem/1.000 habitantes; d) n. de camas/1.000 habitantes.
  • 4
    O Índice Concelhio de Condições de Habitabilidade é a agregação, com igual ponderação de onze indicadores em oito domínios, nomeadamente: a) Acessibilidade; b) Déficit Habitacional; c) Condições Abrigo; d) Estado de Conservação; e) Instalações Existentes; f) Rede de Esgotos; g) Abastecimento de Água; h) Alojamentos Vagos.
  • 5
    A este propósito foi seguido o mesmo critério que o usado na construção do Índice de Desenvolvimento Humano do PNUD.
  • 6
    O
    K-means é um método não hierárquico que começa por uma partição inicial dos indivíduos por um número de
    clusters previamente definido, consistindo na transferência de um indivíduo para o
    cluster cujo centróide se encontra a menor distância (REIS, 1993).
  • 7
    O critério
    Complete Linkage é um processo onde a distância entre dois grupos é definida como a distância entre os seus elementos mais afastados ou menos semelhantes. Então, cada grupo passa a ser definido como um conjunto de elementos onde cada um é mais semelhante a todos os elementos do grupo do que a qualquer dos elementos dos restantes grupos (REIS, 1993).
  • 8
    Partindo do principio que se uma variável descriminar bastante entre os
    clusters, então a variabilidade desta (dada pelo
    Cluster Mean Square) entre os
    clusters há-de ser elevada, e dentro do próprio
    cluster há-de ser diminuta (dada pelo
    Error Mean Square). Deste modo, as variáveis que mais contribuem para a definição dos
    clusters são aquelas com maior
    Cluster Mean Square e menor
    Error Mean Square, isto é, as que apresentam um maior valor de F (MAROCO, 2003).
  • 9
    Pretendeu-se efectuar comparações múltiplas de médias, testando-se, à posteriori, quais os pares de médias diferentes. Para tal, utilizaram-se os testes Post-Hoc de Tukey e Bonferroni.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Abr 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008

    Histórico

    • Aceito
      18 Fev 2008
    • Revisado
      10 Dez 2007
    • Recebido
      31 Ago 2007
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