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Desenvolvimento local, empreendedorismo e capital social: o caso de Terra Roxa no estado do Paraná

Local development, entrepreneurship and social capital: the case of Terra Roxa city at Paraná state in Brazil

Développement local, entrepreneurship et capital social: un étude sur la village de Terra Roxa dans la province du Paraná au Brésil

Desarrollo local, espíritu emprendedor y capital social: un estudio sobre la ciudade de Terra Roxa en la provincia del Paraná en Brasil

Resumos

Este artigo analisa a experiência de desenvolvimento local no município de Terra Roxa, localizado no Oeste do Estado do Paraná - Brasil. O empreendimento que está sendo realizado é o de confecção moda bebê. Essa atividade coletiva está, fortemente, associado ao desenvolvimento local, motivado por fatores endógenos. Nesse caso, a dinamização de vários fatores levou ao surgimento e ampliação de uma atividade completamente diferenciada à "vocação" territorial, no qual estão imersas essas empresas de confecção.

Desenvolvimento local; Capital social; Economia urbana


This article analyzes the experience of local development in the Terra Roxa city at Paraná State in Brazil. The enterprise that is being carried through is of confection the fashion baby. This collective activity is, strong, associated to the local development, motivated for endogenous factors. In this case, the growth of some factors led to the sprouting and magnifying of an activity completely differentiated to the "territorial vocation", in which these companies of confection are immersed.

Local development; Social capital; Urban economy


L'objectif de cette article est d'analyser l'experience de développement local dans la village de Terra Roxa au Paraná - Brésil. L'exploitation des entreprises de mode pour les enfants est associée au développement local et des facteurs endogènes. Ces facteurs ont stimulé la démarrage des activités complementaires au profil territorial de la communauté.

Développement local; Capital social; Économie urbaine


Este artículo analiza la experiencia del desarrollo local en la ciudad de Terra Roxa en la Provincia de Paraná en el Brasil. Esta actividad colectiva es asociada al desarrollo de las empresas de confección para los niños, motivada para los factores endógenos. Estos factores estimularon el comienzo de actividades complementares al perfil territorial de la comunidad.

Desarrollo local; Capital social; Economía urbana


ARTIGOS

Desenvolvimento local, empreendedorismo e capital social: o caso de Terra Roxa no estado do Paraná* * Uma versão preliminar dessa temática foi apresentada no II Seminário Internacional de Desenvolvimento Regional, em outubro de 2006, em Santa Cruz do Sul-RS.

Local development, entrepreneurship and social capital: the case of Terra Roxa city at Paraná state in Brazil

Développement local, entrepreneurship et capital social: un étude sur la village de Terra Roxa dans la province du Paraná au Brésil

Desarrollo local, espíritu emprendedor y capital social: un estudio sobre la ciudade de Terra Roxa en la provincia del Paraná en Brasil

Ednilse Maria WillersI; Jandir Ferrera de LimaII; Jefferson Andronio Ramundo StadutoIII

IBacharel em Secretariado Executivo Bilíngüe e Mestre em Desenvolvimento Regional e Agronegócio. Professora pesquisadora na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste/Campus de Toledo). E-mail: ednilse@unioeste.br

IIPh.D. em desenvolvimento regional pela Université du Québec (UQAC). Professor adjunto do Colegiado de Economia e do Mestrado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da UNIOESTE/Campus de Toledo. Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Agronegócio e Desenvolvimento Regional (GEPEC). E-mail: jandir@unioeste.br ou jandirbr@yahoo.ca

IIIDoutor em Economia Aplicada pela ESALQ/USP. Professor adjunto do Colegiado de Economia e do Mestrado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da Unioeste/Campus de Toledo. Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Agronegócio e Desenvolvimento Regional (GEPEC). E-mail: staduto@unioeste.br

RESUMO

Este artigo analisa a experiência de desenvolvimento local no município de Terra Roxa, localizado no Oeste do Estado do Paraná – Brasil. O empreendimento que está sendo realizado é o de confecção moda bebê. Essa atividade coletiva está, fortemente, associado ao desenvolvimento local, motivado por fatores endógenos. Nesse caso, a dinamização de vários fatores levou ao surgimento e ampliação de uma atividade completamente diferenciada à "vocação" territorial, no qual estão imersas essas empresas de confecção.

Palavraschave: Desenvolvimento local. Capital social. Economia urbana.

ABSTRACT

This article analyzes the experience of local development in the Terra Roxa city at Paraná State in Brazil. The enterprise that is being carried through is of confection the fashion baby. This collective activity is, strong, associated to the local development, motivated for endogenous factors. In this case, the growth of some factors led to the sprouting and magnifying of an activity completely differentiated to the "territorial vocation", in which these companies of confection are immersed.

Key words: Local development. Social capital. Urban economy.

RÉSUMÉ

L'objectif de cette article est d'analyser l'experience de développement local dans la village de Terra Roxa au Paraná – Brésil. L'exploitation des entreprises de mode pour les enfants est associée au développement local et des facteurs endogènes. Ces facteurs ont stimulé la démarrage des activités complementaires au profil territorial de la communauté.

Mots-clés: Développement local. Capital social. Économie urbaine.

RESUMEN

Este artículo analiza la experiencia del desarrollo local en la ciudad de Terra Roxa en la Provincia de Paraná en el Brasil. Esta actividad colectiva es asociada al desarrollo de las empresas de confección para los niños, motivada para los factores endógenos. Estos factores estimularon el comienzo de actividades complementares al perfil territorial de la comunidad.

Palabras claves: Desarrollo local. Capital social. Economía urbana.

1 Introdução

Apesar dos problemas macroeconômicos que afetam a economia brasileira, alguns fenômenos de desenvolvimento econômico local se espraiam pelo Brasil, sendo que muitos com características marcantes, como a aglomeração de médias, pequenas e microempresas em uma mesma localidade, ligadas à produção de um ramo de atividade específico – industrial ou de serviço.

No Paraná, mais precisamente na região Oeste do Estado, no município de Terra Roxa é um exemplo desses fenômenos sócio-econômicos. O município de Terra Roxa está situado na parte norte da região Oeste do Paraná. Em 1970, o município ingressa numa fase produtiva de produção agrícola centrada quase exclusivamente na producção cafeeira, altamente tecnificada, mecanizada e com largo uso de insumos. Apesar dos altos investimentos nos cafezais, problemas climáticos levaram a decadência dos cafezais de toda a região no final dos anos 1970 e inicio dos anos 1980. Isto resultou na perda de quase três quartos da população do município entre 1970 e 1990. A agricultura, que fora o grande catalisador do surgimento da cidade, já não parecia tão benevolente e a baixa rentabilidade estimulou muitos a deixarem suas terras para buscar o sustento da família em outros locais.

Contudo, apesar da crise econômica do município, eis que a partir de 1994 surgiu um número expressivo de indústrias de confecções de roupas infantis. O hobby de uma das moradoras da cidade, que poderia ser apenas uma renda extra, frutificou e liderou uma nova configuração econômica para o município de Terra Roxa, cujos resultados atualmente impactam positivamente na estrutura econômico-social local.

Portanto, o objetivo deste artigo é analisar a experiência de desenvolvimento local no município de Terra Roxa, localizado no Oeste do Estado do Paraná – Brasil. Para tanto, ele está dividido em três partes: o quadro teórico que se subdivide na conceituação de capital social, empreendedorismo e territorialidade. Na seqüência é analisado o processo de transformação econômica do Município de Terra Roxa, destacando a nova configuração produtiva que surgiu a partir do ano de 2000 e que foi responsável pela alteração da estrutura urbano-rural para a urbano-industrial. Nessa seção também são analisadas compilações de dados obtidos em pesquisas realizadas nos anos de 2004 e 2005. E para finalizar a conclusão.

2 Quadro teórico

Na nova concepção de desenvolvimento econômico, o espaço deixa de ser contemplado simplesmente como suporte físico das atividades e dos processos econômicos. Ele passa a valorizar os territórios, as relações entre seus atores sociais, suas organizações concretas, as técnicas produtivas, o meio ambiente e a mobilização social e cultural (MARTINELLI e JOYAL, 2004). Neste contexto termos como capital social, empreendedorismo e territorialidade passam a centralizar as discussões acadêmicas enquanto promissoras vertentes de desenvolvimento econômico local.

O capital social, no atual contexto de desenvolvimento econômico, é visto como um ativo que oferece a possibilidade de consolidar metas de desenvolvimento econômico por meio das próprias potencialidades e capacidades da sociedade local. É o que Amâncio et al. (2005) chama de recurso que pode ser mobilizado com a finalidade de permitir aos grupos e/ou indivíduos formas mútuas de ajuda e de cooperação. O capital social pode ser tanto um estoque quanto a base de um processo de acumulação, que permite à determinada sociedade ter maiores chances de competitividade e de sobrevivência no mercado. Neste formato, o capital social compreende a capacidade de organização de uma sociedade, a qual, associada à vida econômica, à confiança e a cooperação transformam-se em potencialidades reais de intervenção econômico-social, facilitando ações coordenadas que podem se tornar base do desenvolvimento econômico local. Este processo se torna viável porque o capital social tem a função de criar e de gerar oportunidades, capacidades e potencialidades nos diversos atores de uma determinada sociedade. Putnam (1996) mostrou isso em suas pesquisas quando descobriu que onde existe capital social, é ele o ponto fundamental para o desenvolvimento econômico.

Para Putnam (1996) capital social diz respeito a determinadas características de uma organização social, como confiança, normas e sistemas, as quais contribuem para o aumento da eficiência desta sociedade, pois facilita ações coordenadas em prol de um objetivo comum. É uma resposta que contrapõe o mito de que a sociedade é composta apenas por grupos de indivíduos independentes, na qual cada um age para atingir objetivos pessoais. Segundo Abramovay (2000), o capital social vem contrapor este mito, pois demonstra que os indivíduos não agem isoladamente e que seus objetivos também não são definidos de forma individualizada. É diante desta constatação que as estruturas sociais contemporâneas devem ser vistas como recursos, como um ativo, pois o capital social é produtivo e através dele se torna possível o alcance de objetivos que não seriam atingidos de forma individualizada.

O capital social é um ativo coletivo de grupos inseridos numa estrutura social. Trata-se de valores e crenças que os cidadãos compartilham, expressando socialização e consenso normativo. Esta postura favorece o espírito cívico e a vida cooperativa, gerando espaços e estruturas de trabalho em equipe, instigando a inovação e a aprendizagem coletiva, fatores importantes para o dinamismo econômico recente. A partir da década de 1990, se percebeu a existência de forte relação entre capital social e a formação de aglomerações produtivas localizadas. Estudos teóricos e empíricos demonstram que em aglomerações produtivas, especialmente aquelas reconhecidas como arranjos produtivos locais, as empresas (de micro, pequeno e médio porte) têm mais condições de sobreviver de modo competitivo e sustentado. Em conjunto com a sociedade local tem alcançado índices de crescimento econômico que viabilizam a retomada do desenvolvimento econômico-social local (ALBAGLI e MACIEL, 2003).

Esta retomada é viabilizada pela existência de indivíduos conhecidos como empreendedores, tidos como os principais agentes de condução do processo de criação de unidades produtivas. Os empreendedores através de sua ação inovam e desenvolvem o universo empresarial permitindo, que o fluxo e o desenvolvimento da economia sejam catalisados. Para Gerber (1996) a personalidade empreendedora transforma a condição mais insignificante numa excepcional oportunidade. Neste contexto o empreendedor é um inovador, um estrategista, um criador de novos métodos de acesso ao mercado já existente ou de criação de novos.

É importante que os empreendedores tenham consciência que o sucesso de seus empreendimentos é conseqüência de um conjunto de habilidades, tais como identificar, agarrar e buscar os recursos para transformar sua idéia inovadora em um negócio lucrativo, demonstrando o valor econômico dessa idéia e que tem condições de torná-lo realidade.

Se o capital social é tido como um ativo que possibilita a convergência de interesses coletivos na direção de determinado objetivo, neste caso para o desenvolvimento econômico de uma localidade e o empreendedorismo, a ação que efetiva este ativo, então se faz necessário entendermos também o significado que se está delineando para o espaço de ação deste capital social, ou como se tem denominado na literatura recente, do espaço territorial do desenvolvimento.

Com base nesta conceituação, percebe-se que o desenvolvimento econômico está diretamente ligado à emergência do potencial do capital social local, bem como com as iniciativas de seus atores em inovar e em definir planos de ação coletivos que os levem a agir em direção a projetos comuns que busquem desencadear o desenvolvimento econômico local. Neste contexto, o território é visto como um meio inovador, até porque, as empresas por si só não se transformam em agentes inovadores. Elas são partes de um meio onde a história, a organização, os comportamentos coletivos e o consenso que os estrutura é que são seus verdadeiros componentes de inovação. Sendo assim, os comportamentos inovadores de um território dependem, diretamente, das variáveis definidas no plano local e na densidade de seu tecido institucional e capital de relações (MAILLAT, 2002).

Assim, é preciso instigar o potencial competitivo do território, pois é através deste que se dinamiza a organização e a participação dos agentes sociais nos processos de desenvolvimento econômico local (MORAES, 2005). São as ações coletivas preconizadas por Schmitz (1997) tida como a tônica que dinamiza as mudanças necessárias à construção de planos locais que possam levar ao desenvolvimento econômico. E são essas mesmas ações coletivas que alteraram e estão movimentando a economia de Terra Roxa, tendo nas indústrias de confecções infantis o desencadeador de superação da estagnação econômica que se apoderou do município desde a década de 1970. Mas, para que se possa compreender o processo de desenvolvimento econômico do Município de Terra Roxa, se faz necessário resgatar, mesmo que em breves palavras, seu contexto histórico, ampliando essa análise a partir da realidade econômica do país e do próprio Estado do Paraná.

3 O desenvolvimento econômico no oeste do Paraná

No Estado do Paraná, nas décadas de 1950 e 1960 a produção preponderante era o café e a extração da madeira. Nesse período, o Oeste do Paraná sofreu um processo migratório inverso ao que ocorreu no Brasil. No setor rural brasileiro ocorria um forte processo de esvaziamento, atraído pelo crescimento do setor urbano-industrial da região Sudeste, e principalmente no Estado de São Paulo. A produção agropecuária de modo geral não tinha praticamente nenhuma incorporação tecnológica. A estrutura fundiária concentrada era apontada como uma das causas, pois com exceção do Sul do país havia grande predomínio dos latifúndios. A forma preponderante de expandir a produção era por meio da incorporação de terra. Com efeito, as fronteiras agrícolas tinham que ser agregadas ao processo produtivo nacional.

É a partir dos anos 1960, que a região teve sua grande explosão populacional. Entre 1960 e 1970, a região recebeu 374.082 pessoas, e a taxa decenal de migração de 0,82% a.a.. Neste período apenas o Distrito Federal, considerada área de fortíssima atração populacional, recebeu mais migrantes que o Extremo Oeste Paranaense. Em 1970 a população rural do Oeste do Paraná estava na ordem de 80%, já em 1980, a população rural e urbana igualavam-se em 50%, iniciando a década de 1990 com uma população urbana de aproximadamente 71%. A alteração na composição da população dos municípios na região Oeste do Paraná bem como no Estado tornaram ambos mais urbanizadas. Esta situação está associada à necessidade de geração de emprego nas cidades (RIPPEL, 2004).

A partir da década de 1970, teve início na região uma nova fase de produção agrícola. A modernização da agricultura brasileira que se alastrou fundamentalmente pelas regiões Sul e Sudeste encontrou condições sócio-econômicas para ser implantada no Oeste do Paraná. O crédito rural oficial e subsidiado era atrelado a um pacote tecnológico. As lavouras temporárias, como as culturas de soja e trigo, foram as principais responsáveis pelo crescimento da produção agrícola e desenvolvimento da região. A produção não resultava mais da policultura de subsistência, mas da especialização na produção de soja e trigo destinados ao mercado interno e exportador (PIFFER, 1997).

A partir da década de 1990, a produção agroindustrial nas regiões produtoras de grãos e outras matérias-primas agropecuárias cresceram verticalmente e começam a ter grande visibilidade para a sociedade e os segmentos políticos, o que contribuiu para que essas regiões caminhassem para a viabilização do desenvolvimento regional e, particularmente, alguns municípios se tornassem pólos com grande área de influência, atraindo novos investimentos e, fundamentalmente, a população dos municípios vizinhos. Também se tornaram receptores de antigos produtores rurais que hoje não tem mais a sua propriedade agrícola.

Mais recentemente, a região Oeste do Paraná teve um grande processo de agroindustrialização concentrada em alguns municípios em razão de vários vetores derivados de vantagens locacionais. Do ponto de vista institucional também há vantagens por meio do recebimento de royalties pelos municípios lindeiros que fazem margem com o lago do Itaipu.

3.1 O município de Terra Roxa: perfil econômico

Em Terra Roxa o processo de emigração foi dramático. Entre 1970 a 1980, considerando-se a migração interestadual, intra-estadual e intra-regional a população decresce de 37.452 habitantes para 25.535, e entre 1980 a 1990 para 19.820 habitantes e, ainda, entre 1990 a 2000 o decréscimo deixa um saldo populacional de apenas 16.293 habitantes no município, como demonstra o Gráfico 1.


Conforme mencionado na introdução, o decréscimo populacional de Terra Roxa é explicado pela transformação no modelo de produção agrícola que afetou todo o Oeste do Paraná. Terra Roxa não escapou da tendência geral dos movimentos demográficos que ocorreu no Brasil, de redução de tamanho das pequenas cidades. Excluído os aspectos políticos, religiosos, raciais ou mesmo de risco de integridade física, a evasão populacional dos pequenos municípios é reflexo do baixo dinamismo econômico.

Mesmo sendo a agricultura a grande geradora de renda para o município, a mesma não dava conta de atender a abundante oferta de mão-de-obra existente, até porque na situação de pequeno proprietário não havia muita demanda de serviços. Outro agravante foi o fato de Terra Roxa estar cercada por várias cidades mais dinâmicas e polarizadoras regionalmente, como: Cascavel, Toledo e Foz do Iguaçu, e em segundo plano as cidades de Palotina e Guairá.

No entanto, a situação começa a mudar com o surgimento das primeiras indústrias de confecções infantis. As quais, a partir segunda metade da década de 1990, registram um rápido crescimento de absorção de mão-de-obra local. O Gráfico 2 demonstra a mudança do perfil produtivo do município, nos quais o expressivo aumento do emprego da mão-de-obra no setor industrial, sobrepõe o ramo tradicional local (agricultura) e inclusive o de serviços. Verifica-se que a partir de 1999 ocorreu um crescimento abrupto da ocupação industrial e, por sua vez, cresce também os setores de serviço e comércio.


4 Evidências empíricas da emergência do capital social, do empreendedorismo e do desenvolvimento local em Terra Roxa-PR

Em Terra Roxa, em 1994, inicia-se um fenômeno que refletia a necessidade de mudar. A primeira indústria de confecção infantil surgiu a partir do ideal de uma das moradoras em contribuir no orçamento familiar. Inicialmente, Dona Celma bordou o enxoval de seus filhos, que por sua vez, expandiu a atividade de forma restrita para aumentar a renda do grupo familiar. No entanto, esta atividade complementar tomou rumos maiores, primeiro tornando-se atividade principal da família, com a adesão do esposo, isto ainda na primeira metade da década de 1990. Vários fatores contribuíram para o êxito dessa atividade no âmbito familiar, mas o impacto positivo ocorre quando a produção artesanal passa para a produção de escala industrial e se alastra pela cidade ávida como um modelo de sucesso. Desta forma, estava-se levantando uma bandeira de resistência ao declínio econômico.

Em menos de cinco anos, a idéia de investir em confecções para bebês contagiou parcela expressiva dos empresários locais, estimulando novos empreendedores, os quais passaram a investir neste segmento, iniciando uma nova fase na história econômica de Terra Roxa. No ano de 2005 existiam cerca de 47 indústrias regularmente abertas e ativas. Estas indústrias detinham 84% do emprego forma industrial do município e representam, junto ao setor de serviços, 30% do PIB municipal (WILLERS, 2006).

Os elementos que conduziram para o crescimento dessas empresas e ao desenvolvimento local, as quais estão assentados sobre um território que foi construído fundamentalmente por um processo de resistência dos seus moradores frente a um declínio econômico persistente.

A história dos empresários das indústrias de confecções infantis de Terra Roxa está diretamente vinculada à história do Oeste do Paraná, de uma maneira geral, e da história do município de um modo mais específico. A maioria absoluta dos empresários nasceu ou veio a residir ainda criança no município, acompanhando o itinerário de seus pais. Segundo o LIS (2004), 67% dos empresários de confecções são nascidos em Terra Roxa ou residente desde a infância e 33% mudaram para Terra Roxa depois da infância.

O vínculo entre estes empresários e a história regional municipal é a origem rural da grande maioria dos empresários. Entre 27 empresários pesquisados, 21 deles (77,8%) são filhos de agricultores e sete ainda têm a agricultura como seu meio de vida. Este dado remete diretamente ao índice de esgotamento de postos de mão-de-obra no setor rural como demonstrado anteriormente.

Com respeito às atividades realizadas anteriormente por esses empresários, em boa parte dos casos, os mesmos já operavam em alguma atividade relacionada com a área em que atualmente estão empreendendo. Entre os 27 entrevistados nove atuavam em áreas diretamente relacionadas ao setor de confecções, outros 5 atuavam como empresários e os demais eram autônomos ou funcionários assalariados. A origem das empresas é proveniente de capital autóctone, ou seja, as empresas nasceram com capitais oriundos da economia pessoal de cada um dos empresários. Indagados diretamente sobre esta questão mais 50% dos empresários indicaram esse expediente como a fonte de recursos do seu empreendimento (LIS, 2004).

As fontes de inspiração para a tomada de decisão de ingresso no ramo foram diversas, entre elas destacam-se principalmente o conhecimento de atividades do ramo, opinião de amigos ou familiares do ramo, bem como o aproveitamento de mão-de-obra local (LIS, 2004). A maior parte das indústrias de confecções infantis Terra Roxa foram criadas a partir de 2000. Essas empresas na grande maioria são de micro e pequeno portes sendo que cerca de 96% tem menos de 100 empregados, e 71%, destas, tem até 20 empregados, como ilustra a Tabela 4.

As indústrias do ramo de confecções infantis são na maior parte fabricantes de vestuário. Há outras empresas atuando como prestadoras de serviços, principalmente fazendo as costuras das roupas e aplicando os bordados. É provável que a expansão da produção nos próximos anos e a participação das empresas prestadoras de serviços se ampliem como um processo de fortalecimento da estrutura produtiva. Segundo o Censo Empresarial (2005) 96% da empresas são de industriais de confecção infantil e 4% são de prestadoras de serviços.

A mão-de-obra empregada nestes estabelecimentos é preponderantemente formal e os treinamentos ocorrem na maioria, no âmbito interno das empresas (Gráfico 3). O processo de aprendizagem é extremamente endógeno, desta forma, espera-se haja fortes respostas dos agentes com a introdução organizada de treinamento da mão-de-obra, e que ocorra um aprendizado coletivo.


O ramo de confecção infantil de Terra Roxa desde seu surgimento cresceu significativamente e a abrangência de seu mercado cresceu com ele. Hoje seus produtos não se limitam mais ao mercado regional, passando a ser exportado e a competir com os produtos de outros estados brasileiros, a Tabela 5 ilustra esta expansão.

Segundo os dados da Tabela, constatou-se que 82% das empresas têm marca própria. Esse resultado é extremamente positivo, pois configura a autonomia em termos de designer e de produção das peças produzidas pelas indústrias, aumentando expressivamente as chances de fixação das marcas no mercado. Desta forma, estas indústrias diferenciam-se das chamadas empresas de facção. As empresas respondem por boa parte da criação de suas roupas, 75% das empresas têm até 100% de criação própria, 17% e 8% têm até 90% e 80%, respectivamente, de criação própria. Esta constatação evidencia e valoriza o potencial artístico local.

Outro indicador que representa um traço de capital social é as relações sociais constituídas entre os empresários, uma vez que, o círculo social de convivência dos empresários é formado em sua grande maioria por pessoas do mesmo ramo. O Gráfico 4 mostra que parcela pequena dos empresários pesquisados apresentava baixo nível de confiança nos seus colegas de atividade. Estes dados evidenciam uma forte propensão à coesão social, pois existe uma confiabilidade média tendendo para o crescimento entre os empresários.


Com a implantação da associação dos empresários de confecções infantis, intitulada "APL de Moda Bebê de Terra Roxa", em 2004, foi possível constatar a existência de colaboração entre as indústrias. Tanto que cerca 93% dos empresários já receberam algum tipo de benéfico advindo desta associação. No Quadro 1 são listados esses benefícios.


5 Conclusão

O município de Terra Roxa tinha uma base econômica apoiada na produção agropecuária, e, atualmente, esta mais diversificada e tende a uma complexidade nas relações intersetoriais pelo efeito desencadeador gerado pelas indústrias de confecções infantis. Com a modernização da agropecuária uma enorme quantidade de mão-de-obra foi liberada e, não tendo um suporte industrial urbano próximo que pudesse representar alguma alternativa, a solução foi à migração para outras fronteiras agrícolas, ou mesmo para centros urbanos mais próximos. Foi o que ocorreu em Terra Roxa entre 1970 a 1980, quando 15 mil pessoas deixaram o município.

Embora o processo migratório tenha diminuído, foi expressivo ainda nas duas décadas seguintes (1980-1990). Isto tudo era de se esperar a partir da implantação de um modelo agrário altamente tecnificado frente à ausência de uma estrutura urbana que absorvesse a mão-de-obra rural dispensada. A incapacidade de absorção urbana se refletiu nos índices estacionários do emprego no setor da indústria e de serviços até, pelo menos, no final da década de 1990. É neste período (final de década de 1990 e início de 2000) que começam a proliferar as indústrias de confecções infantis.

As mudanças ocorridas na estrutura econômica de Terra Roxa foram oriundas do capital social local e do "espírito" empreendedor, cujo reflexo foi o rápido posicionamento do município no mercado de moda bebê brasileiro. No caso deste município, o capital social parece ter maiores proporções, por ter uma parcela expressiva de empresários nascidos no município. Este fato "criou" um vínculo maior com a idéia de crescer e morar no município natal. Um outro elemento importante para caracterizar a origem comum dos empresários é a origem rural dos mesmos, pois 78% deles afirmaram que entre as profissões exercidas pelos pais estava a de agricultor (STADUTO et al., 2005).

A origem familiar agrícola da maior parte dos empresários do ramo de confecções infantis indica o esgotamento ocupacional do setor e a necessidade de buscar outros caminhos. Isso contribuiu na perspicácia de alguns empresários de perceber um mercado promissor, como foi o caso das primeiras indústrias de confecções infantis, ainda na década de 1990. Num segundo momento, foi o aprendizado e a percepção do setor, ainda em crescimento, que levou alguns empregados a tentarem o empreendimento próprio. O que aparece, sempre em comum, é que esses empresários são em sua grande maioria moradores de longo tempo no município e, ainda, que são os geradores dos recursos financeiros utilizados para iniciar seu próprio negócio.

Os empresários de confecção infantis perceberam que não resolveriam as dificuldades de gerar renda e bem estar para suas famílias mudando para outras regiões. A estratégia encontrada pelas pessoas que decidiram ficar em Terra Roxa foi em apostar na idéia das indústrias de confecções infantis. Esta ação evidencia os principais agentes de mudança de Terra Roxa, sua população. É o que se chama de capital social, e é esta particularidade que atribui as indústrias de confecções infantis uma territorialidade específica e única, se comparado aos demais município de seu entorno.

A constituição da associação "APL de Moda Bebê de Terra Roxa" parece ser um ato consciente neste sentido, e os empresários do setor parecem estar convencidos de que sua empresa depende desta "matéria prima", que se configurou por uma "gente" que vive e trabalha em Terra Roxa. Desta forma, uma empresa que treina funcionários não pode ser vista apenas como sua concorrente, mas sim uma colaboradora.

Para tanto, é necessário ter claro que a expansão econômica de hoje só aconteceu em função da existência das pessoas que vivem em Terra Roxa, apesar delas terem uma composição heterogênea, pois foram formadas por imigrantes de vários estados do Brasil e se trata de um município jovem, no entanto, foi se condensando um processo de resistência do lugar em que vivem, o qual foi sendo rapidamente depauperado pelos reversos da história desse município. As indústrias de confecção infantil por mais que sejam de capital privado, têm um grande componente de construção coletiva, cuja organização se configura na atual constituição do APL de moda bebê de Terra.

Recebido em 27/9/2007; revisado e aprovado em 20/12/2007; aceito em 20/2/2008.

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  • *
    Uma versão preliminar dessa temática foi apresentada no II Seminário Internacional de Desenvolvimento Regional, em outubro de 2006, em Santa Cruz do Sul-RS.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Maio 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008

    Histórico

    • Aceito
      20 Fev 2008
    • Revisado
      20 Dez 2007
    • Recebido
      27 Set 2007
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