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Redes sociais de trabalho entre agricultores de um município do estado do Ceará

Social networking among farmers in a city in the state of Ceará

Redes sociales de trabajo entre campesinos en una ciudad del estado de Ceará

Resumo:

Este artigo tem o objetivo de descrever e analisar redes sociais de trabalho entre agricultores de um município do estado do Ceará. Para isso, foram mapeadas as redes sociais de dois agricultores e seus contatos, totalizando oito participantes. Para a coleta de dados, foi utilizada entrevista, observação e a técnica do gerador de nomes para mapeamento das redes sociais. Para a análise dos dados, foram utilizados indicadores de redes com o auxílio dos softwares Ucinet e NetDraw e de Análise de Conteúdo. Os resultados mostraram que as duas redes de trabalho fazem uso de laços de amizade e parentesco para o seu funcionamento, mobilizando capital social para viabilizar a produção rural em uma configuração semelhante a redes socioprodutivas. Contudo, apresentam diferenças, já que uma das redes é mais desenvolvida, com laços mais diversificados e uma maior quantidade de relações de trabalho remunerado e hierarquia. Conclui-se que as redes fazem parte da organização do trabalho dos agricultores e tornam viável a produção dos bens agrícolas, seja por meio de ajuda para a realização das atividades, seja pelo acesso a informações e recursos mais variados.

Palavras-chave:
trabalho; análise de redes sociais; agricultor familiar; laços de trabalho

Abstract:

This article aims to describe and analyze social networking among farmers in a municipality in the state of Ceará. For this, the social networking of two farmers and their contacts were mapped, totaling eight participants. For data collection, interviews, observation and the name generator technique for mapping social networking were used. For data analysis, network indicators were used with the help of Ucinet and NetDraw softwares and Content Analysis. The results showed that the two work networks make use of friendship and kinship ties for their functioning, mobilizing social capital to make rural production viable in a configuration similar to socio-productive networks. However, they present differences, since one of the networks is more developed, with more diversified ties and a greater number of paid work relationships and hierarchy. The conclusion is that the networks are part of the organization of the work of farmers and make the production of agricultural goods viable, either through help to carry out activities, or through access to more varied information and resources.

Keywords:
work; social networking analysis; family farmer; work tes

Resumen:

Este artículo tiene como objetivo describir y analizar las redes sociales de trabajo entre los agricultores de un municipio del estado de Ceará. Para ello, se mapearon las redes sociales de dos agricultores y sus contactos, totalizando ocho participantes. Para la recolección de datos, se utilizó la entrevista, la observación y la técnica generadora de nombres para el mapeo de redes sociales. Para el análisis de datos, se utilizaron indicadores de red con la ayuda de los softwares Ucinet y NetDraw y Análisis de Contenido. Los resultados mostraron que las dos redes de trabajo hacen uso de lazos de amistad y parentesco para su funcionamiento, movilizando capital social para viabilizar la producción rural en una configuración similar a las redes socioproductivas. Sin embargo, presentan diferencias, ya que una de las redes es más desarrollada, con vínculos más diversificados y con mayor número de relaciones laborales remuneradas y jerarquizadas. La conclusión es que las redes son parte de la organización del trabajo de los agricultores y viabilizan la producción de bienes agrícolas, ya sea a través de la ayuda para la realización de actividades, o mediante el acceso a información y recursos más variados.

Palabras clave:
trabajo; análisis de redes sociales; agricultor familiar; lazos de trabajo

1 INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas do século XX, uma série de mudanças impactou o mundo do trabalho rural e afetou o pequeno produtor de base familiar (PICOLOTTO, 2014PICOLOTTO, E. L. Os atores da construção da categoria agricultura familiar no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 52, Supl. 1, p. 63–84, 2014. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-20032014000600004
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; SCHNEIDER, 2003SCHNEIDER, S. Teoria social, agricultura familiar e pluriatividade. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 18, n. 51, p. 99–21, 2003. DOI: https://doi.org/10.1590/S0102-69092003000100008
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). Houve uma ressignificação em relação ao trabalho e à vida do pequeno agricultor, calcada na ideia de que a nação brasileira se alimenta da produção dos agricultores familiares. Essa ideia buscou eliminar a visão do simples produtor de subsistência para colocar no lugar a do gestor e produtor da agricultura familiar, elemento importante para o desenvolvimento rural (PICOLOTTO, 2014PICOLOTTO, E. L. Os atores da construção da categoria agricultura familiar no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 52, Supl. 1, p. 63–84, 2014. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-20032014000600004
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).

O trabalho no campo vem passando por mudanças que remontam à década de 1990 e estão relacionadas tanto a movimentos sociais ligados a sindicatos filiados à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) quanto à formulação de políticas públicas, principalmente a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) (SCHNEIDER, 2003SCHNEIDER, S. Teoria social, agricultura familiar e pluriatividade. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 18, n. 51, p. 99–21, 2003. DOI: https://doi.org/10.1590/S0102-69092003000100008
https://doi.org/10.1590/S0102-6909200300...
). Essas mudanças incluíam, ainda, o uso de novas tecnologias no campo e a racionalização da produção (PICOLOTTO, 2014PICOLOTTO, E. L. Os atores da construção da categoria agricultura familiar no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 52, Supl. 1, p. 63–84, 2014. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-20032014000600004
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). Se, por um lado, as mudanças podem ser consideradas como um avanço do ponto de vista econômico, por outro, acarretam transformações que podem trazer vulnerabilidade às condições, organização do trabalho e relações sociais no ambiente rural (SCOPINHO, 2017SCOPINHO, R. A. A perspectiva da psicologia social do trabalho. In: COUTINHO, M. C.; BERNARDO, M. H.; SATO, L (Org.). Psicologia social do trabalho. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017. p. 127–50.). Levando-se em consideração esses aspectos, percebe-se que alguns impasses persistem entre agricultores que exploram pequenas propriedades, como a dificuldade de aplicação de novas tecnologias na produção, contratação de força de trabalho externa à propriedade (AIRES; SALAMONI, 2013AIRES, H. L. A.; SALOMONI, G. Agricultura familiar e as relações sociais de trabalho: um estudo sobre a pluriatividade na Vila Freire – Cerrito – RS. Geografia Ensino & Pesquisa, Santa Maria, v. 17, n. 1, p. 41–54, 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.5902/223649948738
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) e o atendimento a exigências do mercado na comercialização de produtos (BEZERRA; SCHLINDWEIN, 2017BEZERRA, G. J.; SCHLINDWEIN, M. M. Agricultura familiar como geração de renda e desenvolvimento local: uma análise para Dourados, MS, Brasil. Revista Interações, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 3–15, 2017. DOI: https://doi.org/10.20435/1984-042X-2016-v.18-n.1(01)
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; MORAES; PIRES, 2019MORAES, J. G.; PIRES, M. L. L. S. Agricultura familiar e mercados atacadistas: dinâmicas sociais da Central de Comercialização da Agricultura Familiar (Cecaf/Ceasa) em Recife – Pernambuco. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 57, n. 2, p. 309–25, 2019. DOI:.https://dx.doi.org/10.1590/1806-9479.2019.181152
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).

Em contextos de trabalho, especialmente os que não têm uma prescrição formal estipulada, as redes sociais podem ser importantes para a formação de processos organizativos e estratégias que auxiliem trabalhadores no desenvolvimento de sua atividade (SANTOS; MACIEL; SATO, 2014SANTOS, J. B. F.; MACIEL, R. H.; SATO, L. Trabalhadores informais e a formação de redes socioprodutivas (RSP): considerações teórico-empíricas. Contemporânea, São Carlos, v. 4, n. 2, p. 325–50, 2014.). Essa dinâmica aproxima-se do que Scopinho (2017)SCOPINHO, R. A. A perspectiva da psicologia social do trabalho. In: COUTINHO, M. C.; BERNARDO, M. H.; SATO, L (Org.). Psicologia social do trabalho. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017. p. 127–50. aponta como movimentos de cooperação espontânea em ambientes rurais, que servem tanto para suporte social e fornecimento de ajuda nas necessidades cotidianas como para a realização do trabalho na agricultura. Estudos reconhecem a atuação potencialmente benéfica de redes sociais no âmbito rural, como modo inicial de organização de agricultores para acesso a políticas públicas (SANTOS; CAMPOS; FERREIRA; FREITAS, 2018SANTOS, L.; CAMPOS, A.; FERREIRA, M.; FREITAS, A. Implicações das redes sociais para o acesso às políticas públicas: análise em cooperativas da agricultura familiar. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional, Taubaté, v. 14, n. 1, p. 329–53, jan./abr. 2018. DOI: https://www.rbgdr.net/revista/index.php/rbgdr/article/view/3494
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); para auxílio em situação de adoecimento e satisfação de necessidades sociais (RUIZ; GERHARDT, 2012RUIZ, E. N. F.; GERHARDT, T. E. Políticas públicas no meio rural: visibilidade e participação social como perspectivas de cidadania solidária e saúde. Physis – Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 22, n. 3, 1191–209, 2012. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-73312012000300018
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); como modo de compartilhamento de conhecimentos técnicos e reciprocidade (SABOURIN, PETERSEN; SILVEIRA, 2018SABOURIN, E.; PETERSEN, P. F.; SILVEIRA, L. M. Redes de cooperação da agricultura familiar e do desenvolvimento rural local no Agreste paraibano (Brasil). Redes, Santa Cruz do Sul, v. 23, n. 2, p. 14–36, 2018. DOI: http://dx.doi.org/10.17058/redes.v23i2.11964
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); e fonte de apoio social e suporte para realização do trabalho (PINTO, PONTES; SILVA, 2018PINTO, N. M. A., PONTES, F. A. R.; SILVA, S. S. C. As redes de apoio social das mulheres ribeirinhas da Amazônia: uma abordagem ecológica. Mudanças – Psicologia da Saúde, São Bernardo do Campo, v. 26, n. 1, p. 11–22, 2018. DOI: https://doi.org/10.15603/2176-1019/mud.v26n1p11-22
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).

As redes sociais podem ser definidas como conjuntos de atores (pessoas, grupos, comunidades, organizações) que mantêm relação entre si. Tais relações possibilitam o desenvolvimento de diferentes tipos de laços permeados por trocas de informação, confiança, aprendizagem e amizade (PORTUGAL, 2007PORTUGAL, S. Contributos para uma discussão do conceito de rede na teoria sociológica. Oficina do CES, Coimbra, n. 271, 2007. Disponível em: http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina/ficheiros/271.pdf. Acesso em: 20 jul. 2022.
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). Trata-se de um sistema aberto em constante transformação, em que o conjunto de relações de uma pessoa ou de um grupo “são fontes de reconhecimento, de sentimento de identidade, do ser, da competência, da ação” (MENESES; SARRIERA, 2005, p. 54MENESES, M. P. R.; SARRIERA, J. C. Redes sociais na investigação psicossocial. Aletheia, Canoas, n. 21, p. 53–67, 2005. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-03942005000100006. Acesso em: 20 jul. 2022.
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). Os elementos básicos utilizados para representar uma rede são os nós, os vínculos e os fluxos. Os nós representam os atores, “pessoas ou grupos de pessoas que se agrupam com um objetivo comum” (ALEJANDRO; NORMAN, 2005, p. 2ALEJANDRO, V.; NORMAN, A. Manual introdutório à análise de redes sociais: medidas de centralidade. Toluca: Universidad Autónoma del Estado de México, 2005. Disponível em: https://docplayer.com.br/4895662-Manual-introdutorio-a-analise-de-redes-sociais.html. Acesso em: 20 jul. 2022.
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). Já os vínculos são os laços, as relações estabelecidas entre dois ou mais nós. Os fluxos indicam a direção do vínculo, que pode ser unidirecional (quando a interação entre dois atores não é recíproca, apenas um interage) e bidirecional (quando a interação é recíproca). Quando um ator não estabelece vínculo com nenhum outro membro da rede, pode-se afirmar que ele está solto ou isolado (ALEJANDRO; NORMAN, 2005ALEJANDRO, V.; NORMAN, A. Manual introdutório à análise de redes sociais: medidas de centralidade. Toluca: Universidad Autónoma del Estado de México, 2005. Disponível em: https://docplayer.com.br/4895662-Manual-introdutorio-a-analise-de-redes-sociais.html. Acesso em: 20 jul. 2022.
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).

Granovetter (1973)GRANOVETTER, M. S. The Strength of Weak Ties. The American Journal of Sociology, Chicago, v. 78, n. 6, p. 1360–80, maio, 1973. DOI: https://doi.org/10.1086/225469
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argumenta que os laços entre os atores podem ser de dois tipos: fortes e fracos. Segundo o autor, a teoria dos laços fortes e laços fracos fundamenta-se no relacionamento interpessoal, em que a força do laço é percebida pela combinação do tempo investido, da intensidade emocional, da intimidade (confiança mútua) e das trocas recíprocas que equilibram a relação. Os laços fortes, geralmente formados entre amigos e familiares, conduzem para uma rede de relações mais homogênea e consistente, na qual os atores se conhecem muito bem entre si. Todavia, esse tipo de laço costuma ser redundante no que se refere ao oferecimento de recursos, fornecendo informações e benefícios já conhecidos pelos atores da rede. Já os laços fracos geralmente são provenientes de relações heterogêneas de menor proximidade, sendo caracterizados por uma relação mais fluida e menos intensa. No entanto, é por meio dos laços fracos que os indivíduos acessam novas informações e recursos distintos do que os trocados nas relações de laços fortes (GRANOVETTER, 1973GRANOVETTER, M. S. The Strength of Weak Ties. The American Journal of Sociology, Chicago, v. 78, n. 6, p. 1360–80, maio, 1973. DOI: https://doi.org/10.1086/225469
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).

O estabelecimento de uma rede duradoura de relações associa-se à criação de capital social, que pode ser entendido como um conjunto de recursos que estão disponíveis a determinados grupos que compartilham laços de conhecimento e reconhecimento mútuo. É mobilizado por meio de trocas materiais ou simbólicas, sendo seus principais condicionantes a amizade, a confiança, a cooperação e a reciprocidade (BOURDIEU; 1986BOURDIEU, P. Le capital social. Actes de la recherche en sciences sociales, Lyon, v. 31, p. 2–3, 1980. Disponível em: http://www.persee.fr/doc/arss_03355322_1980_num_31_1_2069. Acesso em: 20 jul. 2022.
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; PUTNAM, 2000PUTNAM, R. D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000.; PORTES, 2000PORTES, A. Capital social: origens e aplicações na sociologia contemporânea. Sociologia, Problemas e Práticas, Lisboa, n. 33, p. 133–58, 2000. Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S087365292000000200007&lng=pt&tlng=pt. Acesso em: 20 jul. 2022.
http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?scri...
). Bourdieu (1986)BOURDIEU, P. Le capital social. Actes de la recherche en sciences sociales, Lyon, v. 31, p. 2–3, 1980. Disponível em: http://www.persee.fr/doc/arss_03355322_1980_num_31_1_2069. Acesso em: 20 jul. 2022.
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considera que o acúmulo de capital social de um determinado indivíduo depende do tamanho da rede de conexões que ele é capaz de mobilizar e do volume do capital (econômico, cultural ou simbólico) possuído por cada um daqueles a quem ele está conectado. Para Putnam (2000)PUTNAM, R. D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000., o capital social se desenvolve a partir de trocas de favores mediadas por relações de confiança. É a confiança que potencializa a prática da cooperação, e vice-versa, criando um ciclo virtuoso que amplia o capital social. Sem confiança e cooperação mútua, pode se estabelecer uma relação de abuso e oportunismo e, por consequência, o provável fim da relação de troca.

Entrelaçando capital social e redes sociais de trabalho, Santos, Maciel e Sato (2014)SANTOS, J. B. F.; MACIEL, R. H.; SATO, L. Trabalhadores informais e a formação de redes socioprodutivas (RSP): considerações teórico-empíricas. Contemporânea, São Carlos, v. 4, n. 2, p. 325–50, 2014. ressaltam a formação de redes socioprodutivas, que organizam processos laborais por meio de redes sociais familiares, de amizade ou de vizinhança que tornam viável a produção de bens e serviços em pequenas unidades produtivas. A rede socioprodutiva pode ser concebida como uma rede de produção de bens ou prestação de serviços formada a partir do capital social de trabalhadores que atuam na informalidade, como autônomos e donos de pequenos empreendimentos informais. É formada pela necessidade de realização de tarefas que o trabalhador não conseguiria realizar sozinho, por exemplo, em uma situação de maior demanda de produtos.

Diante do exposto, o objetivo deste estudo é descrever e analisar redes sociais de trabalho entre agricultores. Para fins deste estudo, será considerada a categoria de agricultor familiar, segundo o disposto na Lei Federal n. 11.326, de 2006, que define o agricultor familiar como aquele que realiza seu trabalho em meio rural, em estabelecimento próprio, com área não maior do que quatro módulos fiscais, usando de forma predominante mão de obra familiar em processos de gestão e produção, e obtendo renda a partir dessa atividade econômica. E, ainda, a categoria ocupacional de agricultor familiar polivalente, que, segundo a Classificação Brasileira de Ocupações, é aquele que gerencia unidade produtiva, sendo responsável por plantio, colheita e comercialização de produtos agrícolas.

Este estudo busca, ainda, agregar subsídios às discussões sobre o trabalho no ambiente rural a partir da psicologia social do trabalho, considerando-se que as pesquisas nessa área ainda são insuficientes (SCOPINHO, 2017SCOPINHO, R. A. A perspectiva da psicologia social do trabalho. In: COUTINHO, M. C.; BERNARDO, M. H.; SATO, L (Org.). Psicologia social do trabalho. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017. p. 127–50.). Os pressupostos da psicologia social do trabalho têm por foco a compreensão dos sujeitos trabalhadores e dos elementos históricos, sociais, materiais e simbólicos que atravessam seu cotidiano laboral. Essa abordagem valoriza o caráter psicossocial e coletivo do trabalho e a reflexão crítica sobre modelos organizacionais tradicionais, dando ênfase ao protagonismo dos trabalhadores e das trabalhadoras na construção dos processos organizativos que compõem sua atividade (BERNARDO; OLIVEIRA; SOUZA; SOUSA, 2017BERNARDO, M. H.; OLIVEIRA, F.; SOUZA, H. A.; SOUSA, C. C. Linhas paralelas: as distintas aproximações da Psicologia em relação ao trabalho. Estudos de Psicologia, Campinas, v. 34, n. 1, p. 15–24, 2017. DOI: https://doi.org/10.1590/1982-02752017000100003
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).

2 MÉTODO

Esta pesquisa tem natureza exploratória, descritiva e qualitativa e é baseada em dados parciais da dissertação de mestrado intitulada “Redes sociais de trabalho do agricultor familiar de Maranguape, Ceará”. A abordagem qualitativa tem por foco os significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes (MINAYO, 2007MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo: Hucitec, 2007., sendo considerada adequada ao objetivo deste estudo. A análise de redes pode envolver parâmetros quantitativos, mas que não se fundamentam em uma abordagem quantitativa (HANNEMAM, 2000), sendo possível articular a análise ao delineamento qualitativo de investigação.

2.1 participantes

A pesquisa iniciou-se com a participação de dois agricultores do município de Maranguape, em uma área serrana da região metropolitana de Fortaleza, CE. Os dois participantes atendiam ao critério de inclusão de ter sua produção comercializada e estar em consonância com o artigo 3 da Lei n. 11.326, de 2006, que caracteriza agricultor familiar, ou com a Classificação Brasileira de Ocupações, que define o perfil do agricultor familiar polivalente.

O primeiro participante, denominado José ou “ator central 1”, tinha 50 anos de idade, sexo masculino, solteiro e ensino médio completo. A propriedade em que trabalhava era própria e com 25 hectares. Sua produção comercial diversificava-se em cultivo de milho, feijão, quiabo, acerola, mamão, produção de mel de abelhas, e a criação de gado e ovelha para abate. O segundo participante, denominado Fernando ou “ator central 2”, tinha 39 anos de idade, sexo masculino, casado e ensino fundamental incompleto. Seu terreno era constituído por pouco menos de um hectare, onde cultivava uma horta de cebolinha e coentro. Durante a pesquisa, mais seis participantes foram incluídos por meio das indicações dos atores centrais, em um total de oito participantes.

2.2 Procedimentos de coleta de dados

A coleta de dados ocorreu em duas etapas distintas. Na primeira, foram realizadas entrevistas semiestruturadas para coleta de dados sociodemográficos, como idade, sexo, estado civil, escolaridade, tempo de trabalho na agricultura, informações sobre a propriedade e sobre o contexto de trabalho dos agricultores. Foi realizada também observação participante como um meio de interação entre pesquisador e agricultores, possibilitando momentos mais informais e o surgimento de informações espontâneas sobre as interações entre os membros das redes e possíveis implicações dessas relações para o trabalho. Os dados coletados foram registrados com o uso de fotografia e notas de campo, feitas durante e logo em seguida às visitas (FLICK, 2009FLICK, U. Desenho da pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009.).

Em uma segunda etapa, foi feito o mapeamento das redes sociais dos dois atores centrais, utilizando inicialmente a técnica “gerador de nomes”, que consiste em apresentar uma pergunta disparadora para que o respondente possa nomear livremente as pessoas com quem se relaciona (LAZEGA, 2014LAZEGA, E. Réseaux sociaux et structures ralationnelles. Paris: PUF, 2014.). A seguinte pergunta disparadora foi usada: “Pensando na realização do seu trabalho nos últimos seis meses, por favor, fale-me o nome das pessoas que você manteve/mantém algum tipo de contato relacionado ao seu trabalho. Não há limite para o número de pessoas, cite quantas forem necessárias”. Em seguida, os participantes responderam informações a respeito dos atores citados: tipo de vínculo que mantinham (família, amizade, cliente), atividade laboral, tempo de relação, qual associação com o seu trabalho e como acontecia o pagamento.

A partir da lista de nomes, foi solicitado aos atores centrais que indicassem aquelas pessoas consideradas mais importantes para a realização de seu trabalho. Tais pessoas foram definidas na análise como “atores vitais”. José (ator central 1) citou quatro atores vitais e Fernando (ator central 2) citou dois. Em momento posterior, foram realizadas entrevistas com os seis atores vitais. Nesta fase, os participantes foram convidados a olhar a lista de nomes gerada e, a partir disso, responder com quais pessoas mantinham algum contato relacionado ao trabalho. Para uma visão mais completa das redes, foi realizada ainda uma última coleta de dados com os atores centrais José e Fernando, que informaram “quem se conecta com quem”, estabelecendo-se, assim, os laços entre os atores indicados. Desse modo, foi possível mapear a “rede egocentrada com conexão para outros” (HANNEMAN, 2000, p. 14HANNEMAN, R. A. Introducción a los métodos de análisis de las redes sociales. Riverside: La Universidad de California Riverside, 2000.) de cada ator central e identificar sua rede social de trabalho.

2.3 Análise de dados

Para a análise dos dados, foram utilizados os softwares Ucinet e NetDraw (BORGATTI; EVERETT; FREEMAN, 2002BORGATTI, S. P.; EVERETT, M. G.; FREEMAN, L. C. Ucinet for Windows: software for social network analysis. Harvard, MA: Analytic Technologies, 2002.), que permitem a identificação de dados reticulares, além da elaboração dos diagramas das redes mapeadas. Foram utilizados na análise os seguintes indicadores: quantidade de nós, densidade (revela a alta ou a baixa conexão da rede a partir do resultado da divisão entre o número de relações existentes com o de relações possíveis), centralidade (considera o número de nós com os quais um ator está diretamente conectado na rede, quanto mais laços diretos, maior a centralidade), formação de cliques (subgrupos formados a partir dos vínculos diretos entre atores da rede constituído por no mínimo 3 atores) e conteúdos transacionados (ALEJANDRO; NORMAN, 2005ALEJANDRO, V.; NORMAN, A. Manual introdutório à análise de redes sociais: medidas de centralidade. Toluca: Universidad Autónoma del Estado de México, 2005. Disponível em: https://docplayer.com.br/4895662-Manual-introdutorio-a-analise-de-redes-sociais.html. Acesso em: 20 jul. 2022.
https://docplayer.com.br/4895662-Manual-...
; HANNEMAN, 2000HANNEMAN, R. A. Introducción a los métodos de análisis de las redes sociales. Riverside: La Universidad de California Riverside, 2000.; LEMIEUX; OUIMET, 2012LEMIEUX, V.; OUIMET, M. Análise estrutural das redes sociais. 2. ed. Lisboa: Instituto Piaget, 2012.). Para melhor ilustrar o diagrama das redes, foram utilizadas cores distintas para destacar as diferentes funções dos atores: atores centrais – vermelho; atores vitais – verde; atores que auxiliam na produção de bens agrícolas – azul; e atores participantes da comercialização dos bens produzidos – amarelo (Figuras 1 e 2).

Figura 1
Rede social de trabalho de José

Figura 2
Rede social de trabalho de Fernando

Para analisar as entrevistas realizadas, foi utilizada a análise de conteúdo (BARDIN, 2011BARDIN, L Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.). Buscou-se analisar as falas obtidas a partir de categorias previamente definidas e de temas que emergiram dos discursos dos entrevistados. O objetivo foi descrever o contexto de trabalho, redes sociais e capital social mobilizados na agricultura.

2.4 Cuidados éticos

Para atender aos aspectos éticos, foram seguidas as recomendações da Resolução n. 466/12 e Resolução n. 510/16. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e todos os participantes assinaram ao Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE). Como forma de garantir o anonimato, os participantes tiveram seus nomes alterados e receberam codinomes contendo a letra inicial do nome atribuído ao ator central da rede e um número, por exemplo: J1, J2, J3, J3, J4 (componentes da rede de José) e F1, F2, F3, F4 (componentes da rede de Fernando).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

De acordo com o objetivo deste estudo, os resultados foram divididos em duas seções. A primeira apresenta a análise das redes sociais de trabalho dos agricultores, identificando parâmetros relacionais e estruturais (quantidade de atores, tipos de laços, conteúdos intermediados e centralidade de atores). A segunda tem por foco as categorias temáticas da análise de conteúdo, destacando-se: contexto de trabalho, abordando vivências, organização e condições de trabalho; e redes sociais e trabalho, abordando as relações de amizade, cooperação, confiança e reciprocidade presentes nas redes de trabalho dos agricultores.

3.1 Redes sociais de trabalho de José e Fernando

A rede social de trabalho de José é composta por 23 pessoas (22 atores citados + 1 ator central), como representado na Figura 1.

Na análise das relações estabelecidas na rede, identificou-se que, em sua maioria (16), os atores mantêm laços duradouros com vínculos de mais de 10 anos. Apenas dois contatos foram apontados como recentes, com menos de dois anos. Entre os tipos de laços, destaca-se o de amizade (10), apontando que amizade e trabalho estão entrelaçados nessa rede. Além disso, três atores são parentes de José (J3, J5 e J6), revelando-se, assim, que mais da metade dos componentes da rede detém relações de amizade e parentesco. Outros nove atores têm relação de prestação de serviço ou de comercialização dos produtos.

Sobre as atividades realizadas no âmbito da rede, 15 atores estavam envolvidos diretamente na produção de bens agrícolas. A remuneração dos membros da rede pelo trabalho desempenhado ia desde pagamento semanal ou por diária para trabalhadores contratados, até uma “ajuda” ou “agrado”. Sete atores estavam conectados por uma relação comercial, sugerindo que, apesar de a maioria dos laços do ator central se voltar para a produção, sua rede tinha um representativo número de relacionamentos voltados ao processo de comercialização dos bens produzidos.

Os atores vitais na realização do trabalho eram o irmão de José (J3), um agricultor aposentado, sua irmã (J5) que trabalhava como envasadora numa fábrica de polpa de fruta, um meeiro (J10) com quem dividia os gastos e os lucros da produção de acerola e um trabalhador permanente sem vínculo formal (J4).

Na análise dos parâmetros estruturais da rede, identificou-se que a rede apresenta 95 relações existentes das 552 relações possíveis, com densidade de 17,21%.

A análise dos cliques revelou a existência de 12 subgrupos, todos com a participação do ator central da rede. Os atores J2, J15, J18, J20 e J21 estão em situação de maior isolamento, estando conectados unicamente com José. Com exceção de J20, que é comerciante, esses atores são trabalhadores contratados eventualmente e pagos por hora ou diária. Em uma situação de ausência de José, esses atores apareceriam soltos e perderiam a ligação com a rede de trabalho, revelando uma posição de vulnerabilidade na configuração de conexões da rede.

Há uma baixa conectividade entre atores vinculados à produção e atores comerciais, apontando para uma posição vantajosa para José, que faz a intermediação dessas relações. Também é significativa a ausência de conexão entre os atores vitais envolvidos na produção. J4 é um trabalhador permanente da propriedade e está conectado com J5, mas não com J3, irmão de José, e J10, o que pode sugerir uma falha na cooperação interna da rede produtiva.

José aparece como ator principal, com o maior número de conexões na totalidade da rede. Contudo, atores vitais se destacam em sua centralidade, como J10 e J5, em quem José tinha extrema confiança. J10 está conectado com outros 10 atores, vinculando-se com 43% da rede, e J5 está conectado com 9 atores (39% da rede). J10 era amigo e meeiro de José, com uma parceria de mais de 15 anos. Era responsável por uma plantação de acerola e dividia os lucros auferidos com o uso do terreno cedido. Já J5 era irmã de José e o ajudava em diversas tarefas, como cuidados com animais de criação (galinhas, ovelhas e porcos) e beneficiamento da produção do mel de abelha. Na ausência do ator central, recebia compradores dos produtos agrícolas e efetivava as vendas.

A rede social de trabalho de Fernando (Figura 2) era composta por 21 pessoas (20 atores citados + 1 ator central) que atuavam em conjunto para a produção e comercialização de hortaliças.

Os laços constituídos na infância representam a maioria das relações, com 13 atores nessa situação. Apenas quatro atores foram citados por Fernando como contatos recentes, com menos de dois anos. Sobre o tipo de vínculo, destacam-se os laços de parentesco (13), o que indica que essa é uma rede que se apoia na mobilização familiar e de amizades (4 atores). A maioria das relações de trabalho foi caracterizada como “ajuda”, com ausência de pagamento, demonstrando a informalidade de arranjos apoiados em laços de amizade e parentesco, em vez de elementos financeiros.

Dos 20 atores indicados, 17 foram vinculados à produção de bens agrícolas. Dois deles eram os atores vitais F1 e F8, respectivamente esposa e cunhado de Fernando. Suas atividades principais eram fazer os canteiros, plantar, limpar e ajudar na separação e amarração das verduras para comercialização. A rede de Fernando também estabelecia relações comerciais, embora em menor quantidade: três atores estavam conectados por relação comercial, sendo F17 um pequeno comerciante, e F18 e F19, vendedores autônomos.

Na análise dos parâmetros estruturais da rede, identificou-se que os 21 atores que compõem a rede apresentam 102 relações, das 402 possíveis, com densidade de 24,28%, não existindo atores com conexões exclusivas com Fernando. Visualmente, é perceptível o maior número de vínculos entre os atores, com mais coesão e comunicação.

Fernando está conectado com todos os atores e por isso aparece de maneira central na rede. O ator F1, que é sua esposa, tem a maior centralidade na rede depois de Fernando, conectando-se com 11 atores (55% da rede). Foi possível constatar que os atores de apoio à produção apresentaram boa conectividade entre si, o que foi confirmado a partir da análise dos cliques. Foram identificados 15 cliques no total, com todos os atores envolvidos em pelo menos um subgrupo.

Na análise das duas redes sociais de trabalho, é possível destacar que existem atores com laços de parentesco e de amizade que são mobilizados pelos atores centrais e que realizam atividades laborais imprescindíveis para o funcionamento e rendimento econômico das propriedades rurais. Os atores com maior centralidade nas redes de trabalho (J5, J10 e F1) têm laço de parentesco ou amizade com os atores centrais, desfrutando de sua confiança. A mobilização dos laços permite atenuar a insuficiência de recursos materiais e financeiros que poderiam impedir os agricultores de atingir sua meta de produção. Nesse sentido, as redes se aproximam da configuração de redes socioprodutivas pois apontam para um arranjo social que possibilita ao trabalhador a realização de atividades produtivas que não conseguiria efetivar sozinho (SANTOS; MACIEL; SATO, 2014SANTOS, J. B. F.; MACIEL, R. H.; SATO, L. Trabalhadores informais e a formação de redes socioprodutivas (RSP): considerações teórico-empíricas. Contemporânea, São Carlos, v. 4, n. 2, p. 325–50, 2014.).

Contudo, as duas estruturas de redes têm formas distintas de interação entre seus componentes. Em sua rede, José ocupa uma posição de corretagem entre os membros, o que significa que é preciso sua intermediação para que certos atores possam interagir. Esse potencial de corretagem possibilita que o ator central se beneficie da situação, pois exerce influência sobre um número maior de membros da rede e, assim, tem mais poder sobre as trocas efetivadas (MIZRUCHI, 2006MIZRUCHI, M. S. Análise de redes sociais: avanços recentes e controvérsias atuais. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 46, n. 3, p. 72–86, 2006. DOI: https://doi.org/10.1590/S0034-75902006000300013
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). Desse modo, a rede de José apresenta uma constituição mais hierárquica, com maior concentração de poder no ator central, uma maior quantidade de relações de trabalho intermediadas por pagamento financeiro, menos relações de parentesco e um foco mais comercial. Aproxima-se do que Santos, Maciel e Sato (2014)SANTOS, J. B. F.; MACIEL, R. H.; SATO, L. Trabalhadores informais e a formação de redes socioprodutivas (RSP): considerações teórico-empíricas. Contemporânea, São Carlos, v. 4, n. 2, p. 325–50, 2014. definem como “redes socioprodutivas em processo de transformação”, isto é, uma rede baseada inicialmente em laços de confiança, mas que, com o tempo, vai assumindo características de um empreendimento capitalista formal. O interesse pela produção passa a ser mais importante do que a sociabilidade, o que faz com que o seu modo de funcionamento e expansão seja direcionado às exigências do mercado, refletindo em uma configuração mais comercial.

Já a rede de trabalho de Fernando se distancia das exigências de uma rede que segue os princípios capitalistas, sendo composta sobretudo por relações familiares e de amizade. Esse dado está associado à maior densidade e quantidade de cliques da rede de Fernando, o que indica uma maior coesão entre os seus membros. Os laços fortes são importantes por oferecerem apoio e recursos para que um pequeno agricultor possa realizar sua produção, pois dificilmente seria capaz de pagar formalmente por tais serviços. No entanto, é uma rede menos profissional e diversificada, quando comparada com a de José. Esse dado pode indicar alguma dificuldade para Fernando se desenvolver economicamente e comercializar a sua produção, visto que tem poucos clientes.

Laços fortes, como familiares e de amizade, podem ser pouco eficientes no que se refere a acesso a informações, novos mercados e oportunidades em geral, sendo os laços fracos com conhecidos e contatos mais distantes os que podem favorecer o alcance desses tipos de recursos (GRANOVETTER, 1973GRANOVETTER, M. S. The Strength of Weak Ties. The American Journal of Sociology, Chicago, v. 78, n. 6, p. 1360–80, maio, 1973. DOI: https://doi.org/10.1086/225469
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). Considerando-se esses aspectos, a rede de trabalho de José apresentou uma composição mais heterogênea, com a presença de laços fortes e laços fracos, com comerciantes, por exemplo. Por apresentar mais laços fracos, essa rede revela-se potencialmente mais apta em relação à aquisição de novas informações e recursos externos que podem incrementar a sua produção. Assim, a rede social de José lhe permite acessar benefícios mais variados, o que pode ser considerado uma configuração de rede mais vantajosa (CATTELL, 2001CATTELL, V. Poor people, poor places, and poor health: the mediating role of social networks and social capital. Social Science & Medicine, Boston, v. 52, p. 1501–16, 2001. DOI: https://doi.org/10.1016/S0277-9536(00)00259-8
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; MARQUES, 2007MARQUES, E. Os mecanismos relacionais. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 22, n. 64, p. 157–61, 2007. DOI: https://doi.org/10.1590/S0102-69092007000200013
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).

Dessa forma, a análise das redes sociais de trabalho de José e Fernando aponta para redes socioprodutivas que têm quase a mesma quantidade de atores, mas que apresentam configurações relacionais diferentes. A rede de Fernando é baseada em laços de sociabilidade primários, mais fortes e menos diversificados, o que pode estar associado à coesão dos laços e à limitação no acesso a recursos. Tal fato relaciona-se a uma produção menos variada, focada no plantio e na comercialização de apenas dois tipos de hortaliça. Já a rede de José, mais diversificada em termos de laços e de produção de bens, contemplando criação de animais e plantio de diversas culturas, apresenta indicadores da potencialidade de expansão da rede.

Pela observação dos aspectos discutidos até aqui, faz-se necessário descrever no próximo tópico as categorias do contexto de trabalho, atentando para a organização do trabalho, as condições de trabalho e o capital social presente nas redes.

3.2 Contexto de trabalho: vivências, condições e organização do trabalho

Os trabalhadores José e Fernando iniciaram sua vida laboral no campo ainda na infância, com atividades simples como espantar pássaros das plantações, conduzir animais para beber água e colher e debulhar milho e feijão. Essas tarefas têm sua origem na necessidade de ajudar os pais no trabalho e no sustento da família: “Já comecei com meu pai. Ele sempre trabalhou na agricultura, né? E a gente começou a trabalhar” (José).

José trabalhou a vida toda como agricultor, atuando inicialmente “em parceria com outros proprietários” até se tornar proprietário de sua terra. Já Fernando teve uma trajetória laboral mais instável, trabalhando na informalidade em uma fazenda, atuando como pedreiro, e com emprego formal, como serviços gerais em uma empresa de criação de aves e de alimentos. Com o dinheiro que recebeu da rescisão do último emprego, decidiu investir na agricultura, atuando no terreno que era usado anteriormente pelo pai de sua esposa. Adquiriu ferramentas e materiais e recebeu a ajuda do seu cunhado, que lhe cedeu o motor e uma parte dos canos para o sistema de irrigação da área.

Em relação às condições de trabalho, como ambiente físico, ferramentas e equipamentos usados na produção, verificou-se, em ambos os casos, que havia uso de tecnologias em parte das atividades nas plantações, o que possibilitava uma produção que pudesse ser absorvida pelo mercado. Constatou-se o uso de motor a diesel e de um sistema de canos e conexões para irrigação na plantação dos dois agricultores. Eles tinham acesso à energia elétrica e contratavam máquinas para cortar forragem e desmatar o terreno para o plantio, mas consideravam o seu custo muito elevado. Os agricultores reconheciam a necessidade de mecanização do trabalho para facilitar e aumentar a produção, mas, principalmente para Fernando, esse acesso era limitado e precário. Destaca-se a presença de novas tecnologias em seu cotidiano, como o uso do celular para agilizar a comunicação com clientes, algo que facilitava o trabalho e a comercialização da produção.

Cabe destacar que foi observada falta de equipamentos de proteção individual (EPIs) durante pulverização de agrotóxico (Figura 3). O uso inadequado de agrotóxicos, com aplicação feita por bombas costais manuais, e a falta de EPIs, entre agricultores familiares, favorecem a intoxicação dos trabalhadores rurais e são considerados riscos ocupacionais (PETARLI et al., 2019PETARLI, G. B.; CATTAFESTA, M., LUZ, T. C.; ZANDONADE, E.; BEZERRA, O. M. P. A.; SALAROLI, L. B. Exposição ocupacional a agrotóxicos, riscos e práticas de segurança na agricultura familiar em município do estado do Espírito Santo, Brasil. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, n. 44, el5, 2019. DOI: https://doi.org/10.1590/2317-6369000030418
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).

Figura 3
Trabalhador sem proteção durante pulverização na plantação de mamão na rede de trabalho de José

Em relação à organização do trabalho, tanto José quanto Fernando relataram acúmulo de funções, longa jornada diária e sobrecarga de tarefas para dar conta da produção.

José tinha uma produção mais diversificada, com criação de animais e plantio de diversas culturas, e relatou realizar atividades como administrar, fazer compras, vender e trabalhar na produção. Embora realizasse funções diversas, podia contar com trabalhadores que o auxiliavam, o que permitia sua dedicação a atividades de gestão, como explicado na fala a seguir:

[...] dentro de um terreno desse, o que as pessoas muitas vezes não contam é a questão administrativa [...] você trabalha, você pastora, você gerencia, você faz tudo isso no mesmo momento, entendeu? (José).

José se identificava com o papel de liderança, em um discurso bem similar ao de um gestor de empresas:

Então, a primeira coisa que eu aconselho é que as pessoas tentem um diálogo com as pessoas e incentivem elas a querer fazer as coisas. Porque você não consegue mandar, entendeu? [...] Você consegue liderar. (José).

Essa configuração não implicava uma menor quantidade de trabalho para José, que precisava estar apto a realizar todas as tarefas necessárias à produção e trabalhava 12 horas diárias. Tal fato pode ser reforçado pela seguinte fala:

[...] você tem que ter disposição, porque... qualquer hora que qualquer um não souber fazer, você tem que saber fazer tudo, porque qualquer um que faltar você é o substituto. Você tem que ser polivalente”. (José).

Quando havia uma maior demanda de produção, José recrutava trabalhadores locais para reforçar os serviços e uma contrapartida material era oferecida em troca do trabalho (mesmo que esse pagamento assumisse uma forma diferente do pagamento de diárias, como escambo ou divisão de lucros).

Já Fernando afirmou que suas principais tarefas eram comprar insumos, preparar os canteiros, plantar, adubar, aplicar pesticida, colher, comercializar e entregar os produtos. Tinha uma plantação mais simples, com o cultivo de hortaliças (coentro e cebolinha), e participava diretamente de toda a cadeia de produção e comercialização. Desempenhava as mesmas funções de todos os que colaboravam com o seu trabalho e sem uma identificação com o papel de gestor. Fernando contava com o auxílio de amigos e familiares (esposa, cunhados, primo, irmãos, sobrinhos, tio), sobretudo quando estavam de folga ou disponíveis: “Estou botando o irmão dela [esposa] para me ajudar. Que é da família, né? [...] saiu da empresa... está parado, aí tá ajudando” (Fernando).

Familiares ajudavam não apenas no cultivo, mas também em tarefas domésticas, quando a esposa precisava ajudar Fernando na entrega de um pedido maior a um cliente. Embora fizesse alguns pagamentos de diárias, em sua rede de trabalho muitos de seus contatos ofereciam suporte sem expectativa de um retorno material.

O cultivo de produtos agrícolas com baixo valor agregado poderia estar associado a um ciclo de baixa geração de renda, o que dava a Fernando uma condição bem limitada para contratação de trabalhadores. Já a estratégia de diversificação de produtos de José poderia estar associada a uma maior geração de renda em sua propriedade, o que permitia a contratação de mais ajudantes, potencializando seu desenvolvimento econômico. A diversificação de produtos agrícolas pode ser apontada como uma estratégia aplicada na agricultura familiar para manutenção de renda, diminuindo a instabilidade de produção devido à sazonalidade (BEZERRA; SCHLINDWEIN, 2017BEZERRA, G. J.; SCHLINDWEIN, M. M. Agricultura familiar como geração de renda e desenvolvimento local: uma análise para Dourados, MS, Brasil. Revista Interações, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 3–15, 2017. DOI: https://doi.org/10.20435/1984-042X-2016-v.18-n.1(01)
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).

No que diz respeito às informações e técnicas utilizadas no cotidiano de trabalho, os participantes relataram a busca por aprimoramento dos conhecimentos por meio de visitas e diálogos com outros agricultores, além da busca por informações em instituições que forneciam assistência especializada e por meio de eventos sobre a agricultura familiar. Percebe-se, assim, que havia um movimento de busca de relações com atores externos à rede de trabalho para otimizar a produção. A troca de saberes com vizinhos e colegas agricultores representa uma ferramenta importante para o desenvolvimento do trabalho, sendo uma prática encontrada entre outros grupos de trabalhadores da agricultura familiar (SABOURIN; PETERSEN; SILVEIRA, 2018SABOURIN, E.; PETERSEN, P. F.; SILVEIRA, L. M. Redes de cooperação da agricultura familiar e do desenvolvimento rural local no Agreste paraibano (Brasil). Redes, Santa Cruz do Sul, v. 23, n. 2, p. 14–36, 2018. DOI: http://dx.doi.org/10.17058/redes.v23i2.11964
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).

Considerando-se o contexto de trabalho analisado, pode-se inferir que os atores centrais José e Fernando tinham uma certa identificação com o trabalho na agricultura, que permeava sua vida laboral. Contudo, estão presentes elementos de precarização, como o início da vida laboral ainda na infância, extensa jornada diária e condições de trabalho precárias, com exposição a riscos ocupacionais, refletindo uma realidade bastante presente no meio rural brasileiro (SCOPINHO, 2017SCOPINHO, R. A. A perspectiva da psicologia social do trabalho. In: COUTINHO, M. C.; BERNARDO, M. H.; SATO, L (Org.). Psicologia social do trabalho. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017. p. 127–50.). Destaca-se, ainda, que os atores que compõem as redes de trabalho atuam na informalidade, reproduzindo relações laborais vulneráveis no âmbito rural. Além desses aspectos, a baixa mecanização da lavoura, que intensifica o trabalho manual, o pouco recurso disponível para investimento em modernização e o aumento da produção são dificuldades enfrentadas por José e, principalmente, Fernando, estando alinhadas às experiências de trabalhadores da agricultura familiar em outras regiões do Brasil (AIRES; SALOMONI, 2013AIRES, H. L. A.; SALOMONI, G. Agricultura familiar e as relações sociais de trabalho: um estudo sobre a pluriatividade na Vila Freire – Cerrito – RS. Geografia Ensino & Pesquisa, Santa Maria, v. 17, n. 1, p. 41–54, 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.5902/223649948738
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; BEZERRA; SCHLINDWEIN, 2017BEZERRA, G. J.; SCHLINDWEIN, M. M. Agricultura familiar como geração de renda e desenvolvimento local: uma análise para Dourados, MS, Brasil. Revista Interações, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 3–15, 2017. DOI: https://doi.org/10.20435/1984-042X-2016-v.18-n.1(01)
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).

A identificação de José com o discurso gerencial de liderança e de dono de empreendimento reforça a ideia de que sua rede de trabalho busca reproduzir o funcionamento de uma empresa, ainda que com vínculos laborais na informalidade e utilização de trocas não mercantis. Assim, indica-se que a cultura do empreendedorismo, da autonomia e da individualização que se associa à intensificação do trabalho e fragiliza formas coletivas de resistência (LIMA, 2010LIMA, J. C. Participação, empreendedorismo e autogestão: uma nova cultura do trabalho? Sociologias, Porto Alegre, v. 25, p. 158–98, 2010. DOI: https://doi.org/10.1590/S1517-45222010000300007
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), geralmente pensada em centros urbanos, encontra eco também no meio rural.

3.3 Redes sociais e trabalho: amizade, cooperação, reciprocidade e confiança

A rede social de trabalho de Fernando é baseada sobretudo em relações sociais de amizade e cooperação. De acordo com a fala de sua esposa:

[...] quando fico em coso, fico imaginando: quem vem ajudar no sexta-feira? Quando ‘dá fé’ chega um bocado de gente e eu acho é bom! Sexta-feira é para amarrar [as hortaliças]. A gente amarra 500 de manhã e 500 de tarde.

Segundo Fernando, muitas vezes a reunião da família e dos amigos em torno da atividade laboral tornava-se também um momento de diversão, entrelaçando trabalho e lazer. Seja por interesses coletivos, seja por ações voluntárias ou exigências do trabalho, os membros dessa rede encontravam-se em constante interação e troca, funcionando como apoio nas atividades que precisam realizar ou na resolução de problemas do cotidiano (Figura 4).

Figura 4
Atores da rede de trabalho de Fernando ajudando na amarração do cheiro-verde

Existia uma dinâmica lúdica envolvida no processo de trabalho. Os trabalhadores costumavam disputar em duplas quem conseguia amarrar mais pares de coentro e cebolinha, fazendo o “maço de cheiro-verde”, muito utilizado como condimento na região Nordeste. Assim, o trabalho também era visto como um momento de descontração entre amigos. A composição da rede de Fernando lhe permitia acessar benefícios típicos dessa configuração: ajuda com o trabalho, atividades laborais mescladas com momentos de lazer etc. Esses laços, geralmente formados entre amigos e familiares, conduzem para uma rede de relações mais homogênea, na qual os atores têm uma relação mais próxima (GRANOVETTER, 1973GRANOVETTER, M. S. The Strength of Weak Ties. The American Journal of Sociology, Chicago, v. 78, n. 6, p. 1360–80, maio, 1973. DOI: https://doi.org/10.1086/225469
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).

O sistema de recompensas empregado, que, em sua maioria, excluía a troca mercantil, reforçava a relação de proximidade e confiança, remetendo à teoria da dádiva, na qual um serviço é oferecido sem garantia de retorno, “mas com esperança de que ocorrerá correspondência, situação que pode estabelecer relações de aliança e de amizade” (CAILLÉ, 2009, p. 103CAILLÉ, A. Dádiva. In: CATTANI, A.; LAVILLE, J-L.; GAIGER, L.I.; HESPANHA, P. (Org.). Dicionário Internacional da Outra Economia. São Paulo: Almedina Brasil, 2009.).

Era apenas por meio dessas relações de companheirismo e reciprocidade que Fernando conseguia desenvolver e ampliar o seu trabalho. Nesse sentido, os laços fortes eram fundamentais, já que proporcionavam um espaço de ajuda laboral e a formação de uma rede mais coesa e integrada. Além disso, desempenhavam o papel de fonte de apoio social, que se relaciona diretamente à manutenção do bem-estar dos envolvidos (PINTO; PONTES; SILVA, 2018PINTO, N. M. A., PONTES, F. A. R.; SILVA, S. S. C. As redes de apoio social das mulheres ribeirinhas da Amazônia: uma abordagem ecológica. Mudanças – Psicologia da Saúde, São Bernardo do Campo, v. 26, n. 1, p. 11–22, 2018. DOI: https://doi.org/10.15603/2176-1019/mud.v26n1p11-22
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).

De acordo com Marques (2007)MARQUES, E. Os mecanismos relacionais. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 22, n. 64, p. 157–61, 2007. DOI: https://doi.org/10.1590/S0102-69092007000200013
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, redes mais homogêneas, baseadas em laços sociais primários, como parentesco e amizade, são características de grupos mais pobres que estabelecem relações de ajuda mútua diante da insuficiência de recursos. Esse parece ser o caso da agricultura familiar, formada basicamente por pequenas unidades produtivas, com dificuldades de produção e de renda, como apontado pela literatura (AIRES; SALOMONI, 2013AIRES, H. L. A.; SALOMONI, G. Agricultura familiar e as relações sociais de trabalho: um estudo sobre a pluriatividade na Vila Freire – Cerrito – RS. Geografia Ensino & Pesquisa, Santa Maria, v. 17, n. 1, p. 41–54, 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.5902/223649948738
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; BEZERRA; SCHLINDWEIN, 2017BEZERRA, G. J.; SCHLINDWEIN, M. M. Agricultura familiar como geração de renda e desenvolvimento local: uma análise para Dourados, MS, Brasil. Revista Interações, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 3–15, 2017. DOI: https://doi.org/10.20435/1984-042X-2016-v.18-n.1(01)
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).

José também fez referência à reciprocidade ao buscar trocar informações sobre técnicas de cultivo com outros agricultores. Nas palavras de José, “muitas vezes você posso informação, outras vezes você recebe”. Segundo ele, é importante estabelecer um diálogo com outros trabalhadores e mostrar-se sempre disponível para ajudar, pois “o segredo é ter um bom relacionamento com as pessoas”, remetendo à existência de relações recíprocas mobilizadoras de capital social (PUTNAM, 2000PUTNAM, R. D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000.).

José também faz referência ao cooperativismo e associativismo, o que é um dado interessante, já que redes sociais engajadas podem favorecer o funcionamento de cooperativas agrícolas (SANTOS et al., 2018SANTOS, L.; CAMPOS, A.; FERREIRA, M.; FREITAS, A. Implicações das redes sociais para o acesso às políticas públicas: análise em cooperativas da agricultura familiar. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional, Taubaté, v. 14, n. 1, p. 329–53, jan./abr. 2018. DOI: https://www.rbgdr.net/revista/index.php/rbgdr/article/view/3494
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). No entanto, a prática ainda aparece como um desafio, pois as relações, muitas vezes, são perpassadas por desconfiança:

Você deve confiar em todos até que lhe provem o contrário e também deve fazer com que as pessoas confiem em você também, né? E, muitas vezes, isso não existe não. As pessoas são muito desconfiadas, querem sempre levar vantagem. (José).

Tal informação reforça achados que apontam que, embora existam laços de amizade entre atores de uma rede de trabalho, não há necessariamente o de confiança (BRAGA et al., 2020BRAGA, N. L.; CARVALHO, R. G.; MARTINS, J. W. L.; MATOS, T. G. R.; MACIEL, R. H.; LOPES, I. P. Redes sociais de amizade, confiança e aprendizagem entre trabalhadores de um restaurante. Revista de Administração da UFSM, Santa Maria, v. 13, edição especial ENGEMA, p. 1255–71, 2020. DOI: https://doi.org/10.5902/1983465932397
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). Pode-se inferir que a fragilidade da confiança expressada por José tenha relação com a configuração de laços fracos de sua rede, que geram acesso a mais recursos, mas são menos coesos. A dificuldade em estabelecer relações de confiança pode se tornar um obstáculo para a criação e mobilização de capital social (PUTMAN, 2000) e para a efetivação de práticas de cooperativismo (LIMA, 2010LIMA, J. C. Participação, empreendedorismo e autogestão: uma nova cultura do trabalho? Sociologias, Porto Alegre, v. 25, p. 158–98, 2010. DOI: https://doi.org/10.1590/S1517-45222010000300007
https://doi.org/10.1590/S1517-4522201000...
).

A formação de redes sociais não garante que laços de confiança e reciprocidade sejam criados, sendo necessário o compartilhamento de sentidos que evoquem valores solidários mais bem disseminados na comunidade, indo além da simples troca utilitarista (SABOURIN; PETERSEN; SILVEIRA, 2018SABOURIN, E.; PETERSEN, P. F.; SILVEIRA, L. M. Redes de cooperação da agricultura familiar e do desenvolvimento rural local no Agreste paraibano (Brasil). Redes, Santa Cruz do Sul, v. 23, n. 2, p. 14–36, 2018. DOI: http://dx.doi.org/10.17058/redes.v23i2.11964
http://dx.doi.org/10.17058/redes.v23i2.1...
). Esses são elementos que devem ser considerados para que a mobilização das redes sociais no ambiente rural possa se articular a políticas públicas e favorecer a agricultura familiar e o desenvolvimento local (RUIZ; GERHARDT, 2012RUIZ, E. N. F.; GERHARDT, T. E. Políticas públicas no meio rural: visibilidade e participação social como perspectivas de cidadania solidária e saúde. Physis – Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 22, n. 3, 1191–209, 2012. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-73312012000300018
https://doi.org/10.1590/S0103-7331201200...
).

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo possibilitou a discussão de duas temáticas em destaque na literatura: agricultores e análise de redes sociais. Por meio do entrelaçamento desses elementos, foi possível analisar as redes e a influência dos seus arranjos reticulares na organização do trabalho. Considera-se que, mesmo com os processos de mudanças que compõem o ambiente rural, as práticas de articulação dos relacionamentos sociais à organização do processo produtivo estão presentes nas duas redes pesquisadas, prevalecendo na rede de Fernando. As redes articulam produção e capital social, nos moldes de redes socioprodutivas, o que era um resultado esperado, tendo em vista a definição de agricultura familiar.

Apesar de apresentarem essas aproximações, foram observadas diferenças importantes nas duas redes estudadas. A rede de trabalho de José mostrou-se mais profissional, aproximando-se de uma organização formal. Uma rede mais diversificada, com a presença de laços fracos e fortes. Por outro lado, é uma rede com traços hierárquicos, na qual José ocupa um lugar de destaque. Isso sugere que, para manter e possibilitar o crescimento da produção, a rede de José tende a apresentar mais precarização, com exploração da mão de obra e relações hierarquizadas.

Já a rede de Fernando, por ser composta em sua grande maioria por laços de amizade e parentesco, revelou-se mais coesa e menos diversificada. Essa constituição explica a ajuda que esse agricultor recebe no dia a dia de trabalho, mostrando-se relevante para efetivar sua produção. Configurou-se como uma rede baseada em seu capital social, solidariedade e companheirismo que muito se aproxima da ideia de cooperação, na qual Fernando busca ajudar e é ajudado por seus parceiros, mesmo quando um pagamento formal não é possível. Entretanto, sua rede apresenta características limitadas em termos de acesso a oportunidades e informações diferentes das circulantes na rede, o que pode dificultar a expansão de sua produção.

Nota-se que, em ambos os casos, as redes e o capital social fazem parte da organização do trabalho dos atores centrais, proporcionando benefícios ao desenvolvimento produtivo. Destaca-se que esse arranjo se insere em um contexto de trabalho que aponta para a insuficiência de recursos próprios da agricultura familiar, com dificuldade de contratação remunerada de trabalhadores e de uso de tecnologias que poderiam substituir o trabalho manual e ampliar a produtividade. Apesar de efeitos benéficos, as redes sociais de trabalho apresentaram limitações em relação à conexão com agentes externos; no caso de Fernando, pela predominância de laços familiares, e no caso de José, pela fragilidade da confiança, o que pode dificultar a expansão desses laços em direção a ações de cooperativismo e acesso a políticas públicas que poderiam fortalecer a agricultura familiar enquanto uma escolha de trabalho e de vida digna no ambiente rural.

Em relação às limitações encontradas na pesquisa, por questões de tempo e de custo, não foi possível entrevistar todos os membros das redes. Entretanto, a aplicação das “redes egocentradas com conexões para outros”, sugerida por Hanneman (2000)HANNEMAN, R. A. Introducción a los métodos de análisis de las redes sociales. Riverside: La Universidad de California Riverside, 2000., mostrou-se acertada e possibilitou uma imagem mais completa das redes. Além disso, a combinação do gerador de nomes com as entrevistas também foi positiva, pois forneceu dados à pesquisa que se complementavam e por isso puderam ser mais bem compreendidos.

Apesar de a pesquisa ter apontado benefícios advindos de uma rede social de trabalho bem estruturada, ainda há muito o que ser investigado e compreendido nesse fenômeno psicossocial. Para pesquisas futuras, sugere-se analisar a formação de redes sociais e de laços solidários mais amplos, que envolvam agricultores de uma mesma região, e a associação entre redes sociais e bem-estar dos trabalhadores.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    07 Dez 2021
  • Revisado
    25 Jul 2022
  • Aceito
    28 Set 2022
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