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Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE): percepções dos diretores das escolas estaduais do município de Campo Grande, MS

National School Feeding Program (NSFP): perceptions of the state schools principals in the city of Campo Grande, MS

Programa Nacional de Alimentación Escolar (PNAE): percepciones de los directores de escuelas estatales de la ciudad de Campo Grande, MS

Resumo

Este estudo objetivou analisar as percepções dos diretores das escolas estaduais de Campo Grande, MS, em relação à Lei do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e aos produtos adquiridos da agricultura familiar. O caso das escolas estaduais de Campo Grande foi analisado a partir da abordagem da Sociologia Econômica, utilizando o conceito de embeddedness. Para o alcance do objetivo, foi formulado um roteiro de entrevista semiestruturado. Foram entrevistados 73 diretores das escolas estaduais de Campo Grande. As entrevistas foram transcritas e analisadas, usando o método de análise de conteúdo por meio da análise categorial temática. Foram associadas 24 percepções negativas à Lei do PNAE, dando origem à construção de 5 grandes categorias: Burocracia, Falta de Organização da Agricultura Familiar, Negligência Governamental, Valor Repassado e Outras. Positivamente, foram associadas 14 percepções à Lei do PNAE, dando origem à construção de 4 grandes categorias: Descentralização Administrativa, Qualidade, Economicamente Positivo e Socialmente Positivo. Conclui-se que há predominância de percepções negativas em relação à Lei do PNAE e que as escolas estaduais de Campo Grande têm dificuldades para cumprir a lei em sua totalidade, apontando que os objetivos da lei em relação à execução nas escolas ainda se mostram distantes de serem atingidos.

Palavras-chave
PNAE; agricultura familiar; mercado institucional; alimentação escolar

Abstract

This study aimed to analyze the perceptions of directors of state schools in Campo Grande, MS, about the National School Feeding Program (NSFP) law and about products purchased from family farming. The case of Campo Grande’s state schools was analyzed from the approach of Economic Sociology, using the concept of embeddedness. To achieve the goal, a semi-structured interview guide was formulated. A total of 73 directors from Campo Grande’s state schools were interviewed. The interviews were transcribed and analyzed by the content analysis method through thematic categorical analysis. Twenty-four were associated with negative perceptions to NSFP’s law, giving rise to the construction of five major categories: Bureaucracy, Lack of Organization of Family Farming, Government Negligence, The Values Passed and Others. Positively there were 14 perceptions associated to NSFP’s law that gave rise to the construction of four major categories: Administrative Decentralization, Quality, Economically Positive and Socially Positive. It shows the predominance of negative perceptions of the NSFP’ law and that state schools of Campo Grande have difficulties to comply with the law in its entirety, pointing out that the objectives of the law in relation to school executions are still far from being achieved.

Keywords
NSFP; family farm; institutional market; school feeding

Resumen

Este estudio tuvo como objetivo analizar las percepciones de los directores de las escuelas públicas de Campo Grande, MS, con relación a la Ley del Programa Nacional de Alimentación Escolar (PNAE) y los productos adquiridos de la agricultura familiar. El caso de las escuelas estatales de Campo Grande se analizó desde la perspectiva de la Sociología Económica, utilizando el concepto de embeddedness. Para lograr el objetivo, se formuló un libreto de entrevista semiestructurado. Se entrevistaron 73 directores de las escuelas estatales de Campo Grande. Las entrevistas fueron transcritas y analizadas, utilizando el método de análisis de contenido a través del análisis temático categórico. Se asociaron 24 percepciones negativas a la Ley PNAE, dando lugar a la construcción de 5 grandes categorías: Burocracia, Falta de Organización de la Agricultura Familiar, Negligencia Gubernamental, Monto Transferido y Otros. Positivamente, se asociaron 14 percepciones a la Ley PNAE, dando lugar a la construcción de 4 grandes categorías: Descentralización Administrativa, Calidad, Económicamente Positivo y Socialmente Positivo. Se concluye que existe un predominio de percepciones negativas con relación a la Ley PNAE y que las escuelas estatales de Campo Grande tenen dificultades para cumplir con la ley en su totalidad, señalando que los objetivos de la ley con relación a la ejecución en las escuelas aún están lejos de ser alcanzadas.

Palabras clave
PNAE; agricultura familiar; mercado institucional; alimentación escolar

1 INTRODUÇÃO

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é um dos maiores programas de alimentação escolar do mundo e o único com atendimento universal. Em 2017, mais de 846 milhões de reais do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) foram destinados à compra de alimentos da agricultura familiar por meio desse programa. Em 2015, o PNAE atendeu 41,5 milhões de estudantes em todo o país (FNDE, 2017aFUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO [FNDE]. Programas/PNAE, Histórico. Portal FNDE, Brasília, DF, 2017a. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/programas/pnae/pnae-sobre-o-programa/pnae-historico. Acesso em: 20 set. 2022.
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).

O artigo 14 da Lei n. 11.947/2009 (BRASIL, 2009aBRASIL. Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2009a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11947.htm. Acesso em: 10 jul. 2015.
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), reforçada pela Resolução n. 26, de 2013 (BRASIL, 2013BRASIL. Resolução n. 26, de 17 de junho de 2013. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Brasília, DF: Ministério da Educação [MEC]; Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Conselho Deliberativo [FNDE]. Disponível em: http://www.ufrgs.br/cecane/downloads/download.php?id=46. Acesso em: 22 ago. 2015.
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), estabeleceu ao PNAE a exigência de que no mínimo 30% dos recursos repassados pelo FNDE fossem usados para a compra de alimentos oriundos diretamente da agricultura familiar e do empreendedor rural familiar ou de suas organizações, priorizando os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas (BRASIL, 2009aBRASIL. Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2009a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11947.htm. Acesso em: 10 jul. 2015.
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; ROSSETTI; WINNIE; SILVA, 2016ROSSETTI, F. X.; WINNIE, L. W. Y.; SILVA, M. V. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o desafio da aquisição de alimentos regionais e saudáveis. Segurança Alimentar e Nutricional, Campinas, v. 23, n. 2, p. 912–23, 2016.). Assim, junto ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), ele representa um dos mais importantes projetos para a compra de alimentos de agricultores familiares no Brasil (SCHWENGBER et al., 2015SCHWENGBER, R. B., RIBEIRO, E. P., SOARES, F. V.; ORAIR, R. O. Escala de compras públicas de alimentos no Brasil. IPC-IG, Working Papers, n. 134, p. 1–42, 2015.).

A partir desse momento, o PNAE se tornou um importante mercado institucional para a compra de alimentos da agricultura familiar (SARAIVA et al., 2013SARAIVA, E. B.; SILVA, A. P. F.; SOUSA, A. A.; CERQUEIRA, G. F.; CHAGAS, C. M. S.; TORAL, N. Panorama da compra de alimentos da agricultura familiar para o programa nacional de alimentação escolar. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 18, n. 4, 2013.; CONSTANTY; ZONIN, 2016CONSTANTY, H. F. P. H.; ZONIN, W. J. Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e sustentabilidade: o caso do município de Marechal Cândido Rondon. Desenvolvimento e Meio Ambiente, Curitiba, v. 36, p. 371–92, 2016.). Entretanto, em 2017, apenas sete estados brasileiros cumpriram o percentual legal de compra mínima de 30% estipulado em lei, sendo: Espírito Santo, 39%; Minas Gerais, 32%; Paraná, 48%; Rondônia, 37%; Rio Grande do Sul, 52%; Santa Catarina, 50%; e Sergipe, 36% (FNDE, 2017bFUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO [FNDE]. PNAE Monitora. Portal FNDE, Brasília, DF, 2017b. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/programas/pnae/pnae-sobre-o-programa/pnae-monitora. Acesso em: 20 set. 2022.
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). Os estados com o menor percentual de compras da agricultura familiar foram: Amapá, 10%; Piauí, 10%; Rio Grande do Norte, 15%; e o Distrito Federal, 9%. Já o estado de Mato Grosso do Sul, desde 2014, registra um percentual de 25% de compra da agricultura familiar. Além disso, das 5.567 entidades executoras (Secretarias de Educação, estados e municípios) que prestaram contas em 2017, 14% (793) não realizaram compras da agricultura familiar (FNDE, 2017bFUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO [FNDE]. PNAE Monitora. Portal FNDE, Brasília, DF, 2017b. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/programas/pnae/pnae-sobre-o-programa/pnae-monitora. Acesso em: 20 set. 2022.
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).

O PNAE vem sendo estudado por autores de diversos campos da ciência, como Economia (BELIK; CHAIM, 2009BELIK, W.; CHAIM, N. A. O programa nacional de alimentação escolar e a gestão municipal: eficiência administrativa, controle social e desenvolvimento local. Revista de Nutrição, Campinas, v. 22, v. 5, p. 595–607, 2009.), Sociologia Rural (TRICHES; SCHNEIDER, 2010TRICHES, R. M.; SCHNEIDER, S. Alimentação escolar e agricultura familiar: reconectando o consumo a produção. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 19, n. 4, p. 933–45, 2010.), Desenvolvimento Rural (SILVA; DIAS; AMORIM JUNIOR, 2015SILVA, M. G.; DIAS, M. M.; AMORIM JUNIOR, P. C. G. Mudanças Organizacionais em Empreendimentos de Agricultura Familiar a partir do Acesso ao Programa Nacional de Alimentação Escolar. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 53, n. 2, p. 289–304, 2015.), Agricultura Familiar (BECKER et al., 2011BECKER, C.; ANDERSSON, F. S.; ALTEMBURG, S. G. N.; COSTA, L. C. Novas concertações sociais e antigos entraves “burocráticos”: a produção de base familiar e ecológica frente aos desafios de acesso ao PNAE. Cadernos de Agroecologia, Recife, v. 6, n. 2, p. 1–5, 2011.) e Nutrição (OLIVEIRA et al., 2022OLIVEIRA, E. C. V.; MADRUGA, F. P.; RETONDARIO, A.; JAGHER, A. School food in child daycare centers: Poor in macro and micronutrients. Clinical Nutrition, [s.l.], v. 43, p. 28–41, 2022.). Apesar dos estudos sobre o PNAE, há poucos trabalhos que enfatizaram a análise das percepções dos diretores de escolas em relação ao programa.

Até 1993, o programa foi executado de forma centralizada, pois o órgão gerenciador planejava os cardápios, adquiria os gêneros alimentícios por procedimento licitatório, contratava laboratórios para a realização do controle de qualidade e se responsabilizava pela distribuição dos gêneros alimentícios em todo o país. A Lei n. 8.913, de 1994, instituiu a descentralização dos recursos para execução do programa, por meio da realização de convênios com os municípios e do envolvimento das Secretarias de Educação dos estados e do Distrito Federal, delegando-se competências para atendimento aos alunos das redes estaduais e municipais das prefeituras que não haviam aderido à descentralização (FNDE, 2017aFUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO [FNDE]. Programas/PNAE, Histórico. Portal FNDE, Brasília, DF, 2017a. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/programas/pnae/pnae-sobre-o-programa/pnae-historico. Acesso em: 20 set. 2022.
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).

A mudança na legislação beneficiou a agricultura familiar, mas trouxe desafios, como a diversificação da produção e a inclusão de alimentos regionais na alimentação escolar (MONEGO et al., 2013MONEGO, E. T.; ALEXANDRE, V. P.; SOUSA, L. M.; MARTINS, K. A.; ROSA, J. Q. S.; SOUZA, P. L. C.; ASSIS, J. N. Produção e potencial agrícolas de alimentos destinados à alimentação escolar em Goiás e no Distrito Federal, na região Centro-Oeste do Brasil. Revista de Nutrição, Campinas, v. 26, n. 2, p. 233–41, 2013.; SOUSA et al., 2015SOUSA, A. A.; SILVA, A. P. F.; AZEVEDO, E.; RAMOS, M. O. Cardápios e sustentabilidade: ensaio sobre as diretrizes do Programa Nacional de Alimentação Escolar. Revista de Nutrição, Campinas, v. 28, n. 2, p. 217–29, 2015.). Além disso, Triches (2010)TRICHES, R. M. Reconectando a produção ao consumo: a aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar para o programa de alimentação escolar. 2010. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Rural) – Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010. aponta que existem três grandes dificuldades para a concretização da compra da agricultura familiar para o PNAE: a burocracia dos processos de aquisição pública, a organização dos agricultores e a formalização das agroindústrias (dificuldade de regularizar e formalizar as agroindústrias, principalmente no quesito das exigências sanitárias).

Um obstáculo em relação à consolidação dos mercados de compras institucionais da agricultura familiar refere-se à dependência concernente à proatividade dos gestores públicos locais em fomentar estes programas (BECKER; ANJOS, 2015BECKER, C.; ANJOS, F. S. São os mercados institucionais da agricultura familiar um instrumento para o desenvolvimento rural? Estudo de caso em municípios do sul do Brasil. Revista de la Facultad de Agronomía, Buenos Aires, v. 114, n. 1, p. 143–52, 2015.). O comprometimento dos gestores constitui uma das principais condições para o êxito das políticas públicas, sendo essa condição fundamental para a implementação da Lei do PNAE (BEZERRA; SOUZA, 2013BEZERRA, O. L. M. P. A.; SOUZA, D. M. S. Promoção da aquisição de produtos da agricultura familiar para a alimentação escolar em Territórios da Cidadania de Minas Gerais e Espírito Santo. Revista de Nutrição, Campinas, v. 26, n. 3, p. 335–42, 2013.; VILELA et al., 2022VILELA, K. F.; FREITAS, A. F.; BRAGA, G. B.; BARBOSA, R. A.; VIEIRA, J. P. L. O Programa Nacional de Alimentação Escolar no Instituto Federal Baiano: uma abordagem relacional do processo de implementação. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 60, p. 1–21, 2022.).

Visto que o PNAE ainda enfrenta dificuldades para cumprir as determinações legais, este artigo estabelece como objetivo: analisar as percepções dos diretores das escolas estaduais de Campo Grande, MS, em relação à Lei do PNAE e aos produtos adquiridos da agricultura familiar. O trabalho apresenta o seguinte problema de pesquisa: quais as percepções predominantes dos diretores das escolas estaduais sobre a Lei do PNAE e os produtos da agricultura familiar?

Este estudo se justifica por considerar que a análise das percepções dos diretores, figuras centrais nas compras para a alimentação escolar no modelo escolarizado5 5 Modelo das escolas estaduais de Campo Grande, MS, sendo que as escolas municipais funcionam no modelo centralizado, por isso ficaram fora da pesquisa. , pode levantar e aprofundar o debate sobre os entraves ao cumprimento das exigências legais de compra de produtos da agricultura familiar, assim como evidenciar os avanços na alimentação escolar desencadeados pelo cumprimento da lei. Essa análise poderá subsidiar ajustes, revisões na Lei do PNAE, bem como fomentar o debate sobre essa temática no meio científico. O tratamento dos dados foi realizado por meio da análise de conteúdo, pois se pauta na decomposição do discurso e identificação de unidades de análise ou grupos de representações para uma categorização dos fenômenos, a partir da qual se torna possível uma reconstrução de significados que apresentem uma compreensão mais aprofundada da interpretação de realidade do grupo estudado (diretores das escolas estaduais da cidade de Campo Grande, MS).

2 PNAE

Não há uma única nem melhor definição sobre o que seja política pública. Souza (2006)SOUZA, C. Políticas Públicas: uma revisão da literatura. Sociologias, Porto Alegre, ano 8, n. 16, p. 20–45, jul./dez. 2006. apresenta uma revisão dos principais conceitos sobre política pública, destacando-se Mead (1995)MEAD, L. M. Public policy: vision, potential, limits. Policy Currents, 1–4, fev. 1995., que a conceitua como um campo dentro do estudo da política que analisa o governo à luz de grandes questões públicas; Lynn (1980)LYNN, L. E. Designing public policy: a casebook on the role of policy analysis. Santa Monica, Calif.: Goodyear. 1980., como um conjunto de ações do governo que irão produzir resultados específicos; Peters (1986)PETERS, B. G. American Public Policy. Chatham, N.J.: Chatham House. 1986. afirma que política pública é a soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou por meio de delegação e que influenciam a vida dos cidadãos; Dye (1984)DYE, T. D. Understanding Public Policy. Englewood Cliffs, N.J.: PrenticeHall, 1984. sintetiza a definição de política pública como o que o governo decide fazer ou não fazer; Laswell (1958)LASWELL, H.D. Politics: Who Gets What, When, How. Cleveland, Meridian Books. 1958. afirma que decisões e análises sobre política pública implicam responder às seguintes questões: quem ganha o que, por que e que diferença faz.

Pode-se, então, “resumir” política pública como a área do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, “colocar o governo em ação” e/ou analisar essa ação e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações. A formulação de políticas públicas constituise no estágio em que os governos democráticos traduzem seus propósitos em programas e ações que produzirão resultados ou mudanças no mundo real. Por último, políticas públicas, após delineadas e formuladas, desdobram-se em planos, programas, projetos, bases de dados ou sistema de informação e pesquisas. Quando postas em ação, são implementadas, ficando então submetidas a sistemas de acompanhamento e avaliação (SOUZA, 2006SOUZA, C. Políticas Públicas: uma revisão da literatura. Sociologias, Porto Alegre, ano 8, n. 16, p. 20–45, jul./dez. 2006.).

Nesse sentido, o PNAE apresenta-se como uma política pública importante, trazendo oportunidades significativas de acesso a mercados para a agricultura familiar no Brasil (COSTA; AMORIN JUNIOR; SILVA, 2015COSTA, B. A. L.; AMORIN JUNIOR, P. C. G.; SILVA, M. G. As Cooperativas de Agricultura Familiar e o Mercado de Compras Governamentais em Minas Gerais. Revista de Economia e Sociologia Rural – RESR, Piracicaba, v. 53, n. 1, p. 109–26, jan./mar. 2015.). O principal ponto de importância do PNAE para a agricultura familiar é que muitas vezes os produtores familiares não têm acesso às redes comerciais, sendo necessária a construção de “pontes” que os vinculem a outros agentes econômicos e sociais (TURPIN, 2009TURPIN, M. E. A alimentação escolar como fator de desenvolvimento local por meio do apoio aos agricultores familiares. Segurança Alimentar e Nutricional, Campinas, S P, v. 16, n. 2, p. 20–42, 2015.; TRICHES; GERHARDT; SCHNEIDER, 2014TRICHES, R. M.; GERHARDT, T. E.; SCHENEIDER, S. Políticas alimentares: interações entre saúde, consumo e produção de alimentos. Interações, Campo Grande, v. 15, n. 1, p. 109–20, 2014.). A demanda institucional apresenta-se como um dos elementos que pode ser usado de forma organizada com outras ações, a fim de garantir mercado para a produção dos agricultores familiares. Isso pode reforçar o benefício ao aluno, à comunidade local, possibilitando debates do PNAE relativos à produção e ao desenvolvimento rural e suas relações com o consumo e a saúde pública (SILVA; SOUZA, 2013SILVA, A. P. F.; SOUSA, A. A. Alimentos orgânicos da agricultura familiar no Programa Nacional de alimentação Escolar do Estado de Santa Catarina, Brasil. Revista de Nutrição, Campinas, v. 26, n. 6, p. 701–14, 2013.; BEVILAQUA; TRICHES, 2014BEVILAQUA, K.; TRICHES, R. M. Implicações da venda de gêneros alimentícios ao Programa de Alimentação Escolar nos aspectos de renda e organização dos agricultores familiares. Segurança Alimentar e Nutricional, Campinas, v. 21, n. 2, p. 448–60, 2014.; MARQUES; BARATA; ALVES, 2016MARQUES, A. C. C.; BARATA, A. J. S. S.; ALVES, R. R. Análise de fornecimento de produtos da agricultura familiar para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) no município de São Gabriel-RS. Ciência e Natura, Santa Maria, v. 38, n. 2, p. 906-12, 2016.).

O PNAE tem como objetivo contribuir para o crescimento e o desenvolvimento biológico, psicológico e social, a aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de hábitos alimentares saudáveis do aluno, por meio de ações de educação alimentar nutricional e da oferta de refeições que cubram suas necessidades nutricionais durante o período letivo (BRASIL, 2009aBRASIL. Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2009a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11947.htm. Acesso em: 10 jul. 2015.
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).

O PNAE atende todos os alunos matriculados na rede pública de ensino e é considerado um dos mais abrangentes programas de alimentação escolar do mundo (SOARES et al., 2018SOARES, P.; MARTINELLI, S. S.; FABRI, R. K.; VEIROS, M. B.; DAVÓ-BLANES, M. C.; CAVALLI, S. B. Brazilian national school food program as a promoter of local, healthy and sustainable food systems: Evaluating the financial implementation. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 23, n. 12, p. 4189–197, 2018.). Após décadas de funcionamento, está presente na maioria dos municípios brasileiros e é considerado o maior programa de suplementação alimentar do Brasil, levando-se em consideração sua abrangência e alcance (BELIK; CHAIM, 2009BELIK, W.; CHAIM, N. A. O programa nacional de alimentação escolar e a gestão municipal: eficiência administrativa, controle social e desenvolvimento local. Revista de Nutrição, Campinas, v. 22, v. 5, p. 595–607, 2009.; TRICHES; SCHNEIDER, 2010TRICHES, R. M.; SCHNEIDER, S. Alimentação escolar e agricultura familiar: reconectando o consumo a produção. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 19, n. 4, p. 933–45, 2010.; FORNAZIER, 2014FORNAZIER, A. Inserção de produtores rurais de regiões com baixa dinâmica econômica para o mercado da alimentação escolar. 2014. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Econômico) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2014.). Entre as políticas públicas direcionadas à alimentação e nutrição no Brasil, ele é o mais antigo e um dos mais importantes, por seu caráter universalizado (SOARES et al., 2015SOARES, P.; MARTINELLI, S. S.; MELGAREJO, L.; DAVÓ-BLANES, M. C.; CAVALLI, S. B. Potencialidades e dificuldades para o abastecimento da alimentação escolar mediante a aquisição de alimentos da agricultura familiar em um município brasileiro. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 20, n. 6, p. 1891–900, 2015.).

Inicialmente, o programa de merenda escolar, como era conhecido, tinha como um dos objetivos oficiais melhorar as condições nutricionais das crianças e diminuir os índices de evasão e repetência, a partir da melhoria do rendimento escolar do aluno. De caráter predominantemente assistencialista em seu início, com a Constituição de 1988, o programa se tornou permanente, sendo que a alimentação dos escolares de ensino fundamental passou a ser um direito legalmente constituído e um dever do Estado (TRICHES, 2010TRICHES, R. M. Reconectando a produção ao consumo: a aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar para o programa de alimentação escolar. 2010. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Rural) – Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010.).

O PNAE assumiu historicamente duas formas de gestão: a centralizada e a descentralizada. Entretanto, a descentralização tem assumido diversas submodalidades: terceirização, estadualização, municipalização, escolarização e gestão compartilhada. O modelo escolarizado é o modelo adotado pelas escolas estaduais em Campo Grande, MS. Esse modelo acontece quando o estado (ou município) recebe os recursos e os repassa para que cada escola de sua rede de ensino realize diretamente a compra e a preparação da alimentação escolar. No modelo escolarizado, é a escola e o CAE que administram o programa. Com isso, o diretor da escola se torna uma figura central na aquisição de alimentos (RODRIGUES, 2013RODRIGUES, P. O programa nacional de alimentação escolar: história e modalidades de gestão. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, Brasília, v. 29, n. 1, 2013.).

Em 2001, a Medida Provisória n. 2.178 (uma das reedições da MP n. 1.784/98), destacou a obrigatoriedade de que 70% dos recursos transferidos pelo Governo Federal fossem usados exclusivamente para aquisição de produtos básicos, respeitando os hábitos alimentares de cada região e a potencialidade agrícola de cada município, incentivando o desenvolvimento da economia local. O CAE foi outra conquista importante, pois é um órgão deliberativo, fiscalizador e de assessoramento, para a efetivação do programa. Isso aconteceu por meio da Lei n. 8.913, de 1994. Ele permite um maior controle da sociedade sobre o PNAE, pois é composto por representantes de entidades civis organizadas, dos trabalhadores da educação, dos discentes, dos pais de alunos e representantes do Poder Executivo (BELIK; CHAIM, 2009BELIK, W.; CHAIM, N. A. O programa nacional de alimentação escolar e a gestão municipal: eficiência administrativa, controle social e desenvolvimento local. Revista de Nutrição, Campinas, v. 22, v. 5, p. 595–607, 2009.).

Nessa linha do tempo, no ano de 2006, foi conquistada a exigência de nutricionista como Responsável Técnico do PNAE, exigindo a presença desses profissionais no quadro técnico de todas as Entidades Executoras. Ainda em 2006, foi estabelecida parceria do FNDE com as Instituições Federais de Ensino Superior, gerando-se os Centros Colaboradores de Alimentação e Nutrição Escolar (CECANEs) (FNDE, 2017aFUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO [FNDE]. Programas/PNAE, Histórico. Portal FNDE, Brasília, DF, 2017a. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/programas/pnae/pnae-sobre-o-programa/pnae-historico. Acesso em: 20 set. 2022.
https://www.fnde.gov.br/index.php/progra...
).

A transferência dos recursos financeiros do Governo Federal aos estados e municípios, para a alimentação escolar, é feita por meio do FNDE, sendo que o montante dos recursos é baseado no número de alunos matriculados na educação básica pública de cada um dos entes governamentais, com base nos dados oficiais de matrículas obtidos no censo escolar do ano anterior ao do atendimento, realizado pelo Ministério da Educação (BRASIL, 2009aBRASIL. Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2009a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11947.htm. Acesso em: 10 jul. 2015.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_at...
).

De acordo com a nova resolução CD/FNDE n. 01, de 8 de fevereiro de 2017 (BRASIL, 2017BRASIL. Resolução n. 1, de 8 de fevereiro de 2017. Altera o valor per capita para oferta da alimentação escolar do Programa de Alimentação Escolar – PNAE. Brasília, DF: Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Conselho Deliberativo [FNDE], 2017. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso-a-informacao/institucional/legislacao/item/10900-resolu%C3%A7%C3%A3o-cd-fnde-mecn%C2%BA-1,-de-8-de-fevereiro-de-2017#:~:text=Altera%20o%20valor%20per%20capita,Programa%20de%20Alimenta%C3%A7%C3%A3o%20Escolar%20%2D%20PNAE. Acesso em: 25 abr. 2018.
https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso...
), o valor repassado pela União a estados e municípios por dia letivo, para cada aluno, é definido com base em cada etapa e modalidade de ensino, sendo:

  • Creches: R$ 1,07;

  • Pré-escola: R$ 0,53;

  • Escolas indígenas e quilombolas: R$ 0,64;

  • Ensino fundamental e médio: R$ 0,36;

  • Educação de jovens e adultos: R$ 0,32;

  • Ensino integral: R$ 1,07;

  • Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral: R$ 2,00;

  • Alunos que frequentam o Atendimento Educacional Especializado no contraturno (turno oposto ao período escolar, com atividades complementares): R$ 0,53.

Além do recurso federal, alguns estados e municípios fazem a complementação financeira dos recursos para a alimentação escolar (BELIK; CHAIM; WEIS, 2004BELIK, W., CHAIM, N. A., WEIS, B. O programa nacional de alimentação escolar como instrumento de promoção do desenvolvimento local. In: CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 42., 2004, Cuiabá. Anais [...]. Cuiabá: SOBER; Universidade Federal de Mato Grosso [UFMT], 2004. p. 1–12.). Segundo os autores, cada município e estado decide sobre o repasse dos recursos próprios para a alimentação escolar, que muda de acordo com o poder de arrecadação e a lei orçamentária aprovada. Outra mudança foi a admissão do atendimento, em 2013, aos alunos que cursam o Atendimento Educacional Especializado (AEE), alunos da Educação de Jovens e Adultos Semipresencial e aqueles matriculados em escolas de tempo integral (BRASIL, 2013BRASIL. Resolução n. 26, de 17 de junho de 2013. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Brasília, DF: Ministério da Educação [MEC]; Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Conselho Deliberativo [FNDE]. Disponível em: http://www.ufrgs.br/cecane/downloads/download.php?id=46. Acesso em: 22 ago. 2015.
http://www.ufrgs.br/cecane/downloads/dow...
).

Em 17 de junho de 2013, foi publicada a Resolução FNDE n. 26, que intensifica um dos eixos do programa, a Educação Alimentar e Nutricional (EAN), ao destinar uma seção às ações da EAN (FNDE, 2017aFUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO [FNDE]. Programas/PNAE, Histórico. Portal FNDE, Brasília, DF, 2017a. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/programas/pnae/pnae-sobre-o-programa/pnae-historico. Acesso em: 20 set. 2022.
https://www.fnde.gov.br/index.php/progra...
). Essa medida revisou o regulamento que era dado pela Resolução n. 38/2009 (BRASIL, 2009bBRASIL. Resolução n. 8, de 16 de julho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica no Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Brasília, DF: Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Conselho Deliberativo [FNDE], 2009b. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso-a-informacao/institucional/legislacao/item/3341-resolu%C3%A7%C3%A3o-cd-fnde-n%C2%BA-38-de-16-de-julho-de-2009. Acesso em: 2 mar. 2018.
https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso...
) referente ao processo de compra por meio da chamada pública, quando for dispensado o processo de licitação, seguindo as regras do artigo 14 da Lei n. 11.947/2009.

Segundo a Resolução n. 26, de 2013, a chamada pública é definida como: “[...] o procedimento administrativo voltado à seleção de proposta específica para aquisição de gêneros alimentícios provenientes da Agricultura Familiar e/ou Empreendedores Familiares Rurais ou suas organizações” (BRASIL, 2013, p. 11BRASIL. Resolução n. 26, de 17 de junho de 2013. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Brasília, DF: Ministério da Educação [MEC]; Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Conselho Deliberativo [FNDE]. Disponível em: http://www.ufrgs.br/cecane/downloads/download.php?id=46. Acesso em: 22 ago. 2015.
http://www.ufrgs.br/cecane/downloads/dow...
). Essa resolução ainda estabelece, em seu Art. 19, a preferência pela compra de alimentos orgânicos, revisando a norma que era dada pela Resolução n. 38/2009 (BRASIL, 2009bBRASIL. Resolução n. 8, de 16 de julho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica no Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Brasília, DF: Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Conselho Deliberativo [FNDE], 2009b. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso-a-informacao/institucional/legislacao/item/3341-resolu%C3%A7%C3%A3o-cd-fnde-n%C2%BA-38-de-16-de-julho-de-2009. Acesso em: 2 mar. 2018.
https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso...
).

A criação da Lei n. 11.947/2009 (BRASIL, 2009aBRASIL. Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2009a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11947.htm. Acesso em: 10 jul. 2015.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_at...
), a qual determina que sejam gastos, no mínimo, 30% dos repasses federais ao PNAE em compras da agricultura familiar, também possibilitou a dispensa licitatória; assim, as compras dos produtos oriundos dos agricultores familiares passaram a ser feitas de forma menos burocrática, por meio de “chamadas públicas” . Esse cenário incentiva, ou em tese deveria incentivar, a compra desses alimentos produzidos localmente, de forma a promover o desenvolvimento rural e a inserção dos agricultores familiares em um mercado competitivo (VILELA et al., 2022VILELA, K. F.; FREITAS, A. F.; BRAGA, G. B.; BARBOSA, R. A.; VIEIRA, J. P. L. O Programa Nacional de Alimentação Escolar no Instituto Federal Baiano: uma abordagem relacional do processo de implementação. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 60, p. 1–21, 2022.).

Em abril de 2015, foi publicada a Resolução CD/FNDE n. 4. Ela modificou a forma de aplicação dos critérios para seleção e classificação dos projetos de venda; estabeleceu o que são grupos formais e informais de assentados da reforma agrária, comunidades tradicionais indígenas e quilombolas; definiu os locais onde deverão ser divulgados os editais das chamadas públicas; incluiu o documento para habilitação dos projetos de venda dos grupos formais; estabeleceu que os preços dos produtos a serem adquiridos da agricultura familiar são aqueles publicados na chamada pública; definiu o limite individual de venda para o agricultor familiar na comercialização para o PNAE por entidade executora; estabeleceu novas regras para o controle do limite individual de venda dos agricultores familiares; e definiu modelos de edital de chamada pública, de pesquisa de preços de projeto de venda e de contrato (FNDE, 2017aFUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO [FNDE]. Programas/PNAE, Histórico. Portal FNDE, Brasília, DF, 2017a. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/programas/pnae/pnae-sobre-o-programa/pnae-historico. Acesso em: 20 set. 2022.
https://www.fnde.gov.br/index.php/progra...
).

Em 2020, o Brasil, como vários países do mundo, vivenciou um fenômeno catastrófico, não observado neste século, a pandemia por covid-19, o que trouxe como consequência, além das elevadas taxas de mortalidade, o retorno à situação de insegurança alimentar e nutricional. De acordo com a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (BRASIL, 2009aBRASIL. Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2009a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11947.htm. Acesso em: 10 jul. 2015.
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, s.p.):

A alimentação adequada é direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poder público adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população. A adoção dessas políticas e ações deverá levar em conta as dimensões ambientais, culturais, econômicas, regionais e sociais. É dever do poder público respeitar, proteger, promover, prover, informar, monitorar, fiscalizar e avaliar a realização do direito humano à alimentação adequada, bem como garantir os mecanismos para sua exigibilidade.

Partindo-se da compreensão de que alimentação adequada, no Brasil, é direito do cidadão e dever do Estado, cabe elucidar o papel do PNAE, neste cenário, haja vista a magnitude e capilaridade de distribuição de alimentos desta política pública de combate à fome e promoção da alimentação adequada (BRASIL, 2009aBRASIL. Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2009a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11947.htm. Acesso em: 10 jul. 2015.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_at...
).

Dada a necessidade de distribuição de alimentos aos escolares, ao mesmo tempo que estes estavam afastados da escola, em virtude do sistema remoto de ensino, implantado para dar continuidade às aulas, de maneira a garantir a biossegurança, diante da pandemia e dos elevados riscos de contágio, o PNAE necessitou se reinventar, mudando a forma de distribuição de refeições nas escolas e passando a distribuir gêneros alimentícios, tanto in natura como embalados/processados. Esse ato foi regulamentado pela Lei n. 13.987/2020, de 7 de abril de 2020, “[...] que autoriza os entes federativos, durante o período de suspensão das aulas presenciais, a distribuir os gêneros alimentícios adquiridos com recursos do PNAE a estudantes ou responsáveis” (BRASIL, 2020BRASIL. Lei n. 13.987/2020, de 7 de abril de 2020. Altera a Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009, para autorizar, em caráter excepcional, durante o período de suspensão das aulas em razão de situação de emergência ou calamidade pública, a distribuição de gêneros alimentícios adquiridos com recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) aos pais ou responsáveis dos estudantes das escolas públicas de educação básica. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 2020. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso-a-informacao/institucional/area-de-imprensa/noticias/item/14017-entrega-de-kits-de-alimenta%C3%A7%C3%A3o-escolar-continua-em-todo-o-brasil. Acesso em: 20 set. 2022.
https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso...
).

Neste espaço de análise de compra direta da Agricultura Familiar para o PNAE, por parte da Secretaria de Estado da Educação de Mato Grosso do Sul, não é possível explicitar o impacto dessas ações desenvolvidas durante a vigência da Lei n. 13.987/2020 (BRASIL, 2020BRASIL. Lei n. 13.987/2020, de 7 de abril de 2020. Altera a Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009, para autorizar, em caráter excepcional, durante o período de suspensão das aulas em razão de situação de emergência ou calamidade pública, a distribuição de gêneros alimentícios adquiridos com recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) aos pais ou responsáveis dos estudantes das escolas públicas de educação básica. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 2020. Disponível em: https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso-a-informacao/institucional/area-de-imprensa/noticias/item/14017-entrega-de-kits-de-alimenta%C3%A7%C3%A3o-escolar-continua-em-todo-o-brasil. Acesso em: 20 set. 2022.
https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso...
). Porém, é imprescindível ponderar que uma reorganização dos processos de aquisição/distribuição de alimentos foi preponderante, seja do ponto de vista da distribuição de alimentos às famílias carentes, num momento de extremo risco de insegurança alimentar, seja em relação à manutenção da aquisição de produtos dos agricultores familiares, que tiveram, nesses processos de compras públicas, uma garantia de comercialização, minimizando, assim, os impactos da redução na renda.

O presente tópico apresentou a Lei do PNAE, assim como as principais mudanças que ocorreram desde a sua criação, os objetivos e as formas de execução dessa lei.

3 EMBEDDEDNESS

O PNAE é uma política pública (conjunto de atividades realizadas pelo governo) que envolve vários agentes econômicos, destacando-se, entre eles: escolas, governo, agricultores familiares. Enquanto política pública, ele faz parte da economia como um todo, visto que envolve agentes econômicos e relações comerciais. Neste estudo, buscou-se entender o funcionamento do PNAE, segundo a percepção dos diretores das escolas estaduais de Campo Grande, MS, utilizando-se, assim, uma abordagem em que a economia é vista como parte constituinte das relações sociais (SILVA; DIAS; AMORIM JUNIOR, 2015SILVA, M. G.; DIAS, M. M.; AMORIM JUNIOR, P. C. G. Mudanças Organizacionais em Empreendimentos de Agricultura Familiar a partir do Acesso ao Programa Nacional de Alimentação Escolar. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 53, n. 2, p. 289–304, 2015.).

No ambiente da Nova Sociologia Econômica (NSE), Karl Polanyi é considerado o “pai” do conceito de embeddedness. Polanyi defende que o embeddedness da economia implica que esta esteja imersa nas relações sociais, ou seja, que não forme uma esfera desvinculada e autônoma à sociedade (MACHADO, 2010MACHADO, N. M. C. Karl Polanyi e a Nova Sociologia Econômica: Notas sobre o conceito de (dis) embeddedness. Revista Crítica de Ciências Sociais, Coimbra, n. 90, p. 71–94, 2010.).

Segundo Polanyi, são as instituições culturais que moldam o comportamento econômico dos indivíduos em uma sociedade complexa. As motivações que desencadeiam o comportamento econômico dos indivíduos só têm sentido dentro do ambiente institucional e das relações sociais em que eles estão inseridos (SCHNEIDER; ESCHER, 2011SCHNEIDER, S.; ESCHER, F. A contribuição de Karl Polanyi para a sociologia do desenvolvimento rural. Sociologias, Porto Alegre, v. 13, n. 27, p. 180–219, 2011.).

Assim, o conceito de embeddedness, segundo Uzzi (1996)UZZI, B. The sources and consequences of embeddedness for the economic performance of organizations: the network effect. American Sociological Review, [s.l.], v. 61, n. 4, p. 674–98, 1996., refere-se ao processo pelo qual as relações sociais geram ações econômicas, formando laços sociais que afetam o comportamento econômico minimamente ou, em alguns casos, de maneira mais acentuada, afetando o sistema e a eficiência econômica. Com base no que foi dito anteriormente, as relações sociais e o ambiente cultural ao qual o agente econômico e o tomador de decisão estão envolvidos afetam suas decisões, o que pode impactar na eficiência de um processo econômico, seja essa decisão tomada para fins pessoais ou não. Uzzi (1997)UZZI, B. Social structure and competition in interfirm networks: the paradox of embeddedness. Administrative Science Quarterly, Ithaca, v. 42, n. 1, p. 35–67, 1997. aponta que, quando há laços sociais, a chance de um contrato atingir seus objetivos e das partes cumprirem com o acordado é maior. Bair (2012)BAIR, J. The Limits to Embeddedness: Triangular Bargaining and the institutional foundations of organizational networks. Institutions Program Working Paper Series, Bolder, v. 8, p. 1–21, 2012. ainda afirma que os laços sociais são de difícil substituição.

Para Granovetter (2007)GRANOVETTER, M. Ação econômica e estrutura social: o problema da imersão. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 6, n. 1, 2007., as pessoas não se comportam nem tomam decisões de forma atomizada (isoladas do contexto social e cultural em que estão inseridas), ou seja, de forma puramente racional e utilitarista, sem levar em consideração seu contexto social, e nem adotam de forma padronizada um roteiro estabelecido para a tomada de suas decisões. Em vez disso, as suas tentativas de realizar ações estão imersas em sistemas concretos e contínuos de relações sociais. As relações duradouras entre os indivíduos ajudam na construção de confiança entre eles, sendo que essa confiança estimula transações econômicas futuras entre essas pessoas. Diferentemente de motivos puramente econômicos, as relações econômicas contínuas tendem a revestir-se de conteúdo social com expectativas de confiança e abstenção de oportunismo (GRANOVETTER, 1985GRANOVETTER, M. Economic acton and social structure: the problem of embeddedness. American Journal of Sociology, Chicago, v. 91, n. 3, p. 481-510, 1985.; GRANOVETTER, 2007GRANOVETTER, M. Ação econômica e estrutura social: o problema da imersão. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 6, n. 1, 2007.).

O funcionamento das organizações depende em parte dos fatores históricos e institucionais, bem como da habilidade de selecionar mecanismos não apenas baseados na se pensa sobre a importância de fatores históricos e institucionais para o funcionamento das organizações, podemos citar um exemplo sobre o PNAE, nos municípios gaúchos de Rolante e Dois Irmãos. Nesses municípios, a compra de alimentos da agricultura familiar para a alimentação escolar se antecipou à própria lei do PNAE, que determinou essa obrigatoriedade em 2009 (TRICHES; SHNEIDER, 2010TRICHES, R. M.; SCHNEIDER, S. Alimentação escolar e agricultura familiar: reconectando o consumo a produção. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 19, n. 4, p. 933–45, 2010.). Em Rolante, essa mobilização ocorre desde 1998, e, em Dois Irmãos, desde 2004. Os municípios estão localizados no berço da colonização alemã, que é um modelo produtivo agrícola com base em pequenas propriedades familiares, onde entidades como a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do estado do Rio Grande do Sul (EMATER) e a Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (FETAG) ajudaram nesse processo de criação de mercados para a agricultura familiar. Esse exemplo ilustra como os fatores históricos e o ambiente institucional, por meio do bom funcionamento das organizações, assim como a importância da interação social, podem impactar um determinado programa de políticas públicas e no desenvolvimento de economias locais (TRICHES; SCHNEIDER, 2010TRICHES, R. M.; SCHNEIDER, S. Alimentação escolar e agricultura familiar: reconectando o consumo a produção. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 19, n. 4, p. 933–45, 2010.).

As instituições podem ser definidas como estruturas criadas pelo homem que pautam as relações políticas, econômicas e sociais. As instituições podem ser informais (sanções, tabus, costumes, tradições e códigos de conduta), e formais (constituições, leis, direitos de propriedade). As instituições foram criadas para criar ordem e reduzir as incertezas em relações de troca (NORTH, 1991NORTH, D. C. Institutions. The Journal of Economic Perspectives, Londres, v. 5, n. 1, p. 97–112, 1991.). Cabe ressaltar que mudanças institucionais no ambiente legal e cultural são demoradas (WILLIAMSON, 2000WILLIAMSON, O. E. The New Institutional Economics: taking stock, looking ahead. Journal of Economic Literature, Nashville, v. 38, n. 3, p. 595–613, 2000.).

Com isso, a abordagem de embeddedness ajuda a compreender o processo de construção social de mercados, especificamente o mercado institucional, e, ao mesmo tempo, caracterizar as relações estabelecidas entre os atores envolvidos no processo de aquisição de alimentos para a alimentação escolar (SILVA; DIAS; AMORIM JUNIOR, 2015SILVA, M. G.; DIAS, M. M.; AMORIM JUNIOR, P. C. G. Mudanças Organizacionais em Empreendimentos de Agricultura Familiar a partir do Acesso ao Programa Nacional de Alimentação Escolar. Revista de Economia e Sociologia Rural, Brasília, v. 53, n. 2, p. 289–304, 2015.), focando a identificação das percepções dos diretores das escolas estaduais de Campo Grande, MS, a partir das mudanças legais do PNAE e da interação entre as escolas e a agricultura familiar.

4 METODOLOGIA

Para o desenvolvimento do trabalho, foi utilizado um estudo de caso de análise qualitativa, justificada pela necessidade de aprofundar o conhecimento de uma realidade específica. As entrevistas foram conduzidas a partir de um roteiro básico, contendo questões abertas semiestruturadas e abordando questões sobre as percepções dos diretores em relação ao PNAE e aos produtos da agricultura familiar. Buscou-se identificar, no ponto de vista dos entrevistados, quais os pontos fortes e fracos dessa lei, se eles acreditam que ela é um incentivo à produção de alimentos da agricultura familiar e qual o conhecimento deles em relação ao percentual de recursos destinados à agricultura familiar e as suas formas de compra. É importante destacar que as percepções negativas se referem às percepções dos diretores que apontam alguma dificuldade para o cumprimento do PNAE. Já as percepções positivas referem-se aos benefícios do PNAE, assim como as melhorias na alimentação escolar por meio da lei e o seu impacto econômico e social.

A cidade de Campo Grande apresentou uma população estimada, em 2015, de 853.622 habitantes, tendo a cidade um IDH-M de 0,784, considerado alto pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Produto Interno Bruto (PIB) anual per capita a preços correntes, em 2013, de R$ 24.839,24 (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA [IBGE], 2016INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA [IBGE]. Brasil/Mato Grosso do Sul/Campo Grande/ Panorama. IBGE.Gov [online], 2016. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ms/campo-grande/panorama. Acesso em: 20 set. 2022.
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ms/ca...
).

Do total de 88 escolas estaduais na cidade de Campo Grande (MATO GROSSO DO SUL, 2015MATO GROSSO DO SUL. SECRETÁRIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO [SED]. Relação de escolas com diretores. Campo Grande: SED, 2015. Disponível em: https://www.sed.ms.gov.br/relacao-de-escolas-com-diretores/. Acesso em: 31 ago. 2015.
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), quatro ficaram fora da pesquisa, restando como universo de estudo um total de 84 escolas públicas estaduais. As quatro escolas que ficaram fora da amostra da pesquisa referem-se a uma que é de responsabilidade do Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN) e não faz parte dos programas da SED; outra que é um berçário dentro do presídio feminino, para que as mães possam amamentar as crianças até os 6 meses de idade e, com isso, não recebe verbas do PNAE; outra refere-se ao distrito de Anhanduí, que não faz parte da zona urbana de Campo Grande, ficando a aproximadamente 60 km de distância do município; e, por último, uma escola técnica do Sistema Único de Saúde (SUS), que também não recebe verbas do PNAE.

Tentou-se contato com os diretores das 84 escolas urbanas desse município, entretanto alguns diretores não puderam ou não quiseram participar da pesquisa; com isso, foi obtido um total de 73 entrevistas. Em duas entrevistas, as diretoras não autorizaram a gravação, pediram que o entrevistador anotasse suas falas em um papel. As 71 gravações realizadas produziram aproximadamente 26 horas de áudio, gerando 307 páginas de dados para análise (incluindo as duas entrevistas anotadas em papel). A média de tempo das entrevistas foi de aproximadamente 22 minutos. A pesquisa de campo ocorreu entre abril e novembro de 2015, totalizando pouco mais de sete meses. As entrevistas foram gravadas em meio digital e posteriormente transcritas. A fidelidade das transcrições foi realizada por meio da audição do conteúdo e, em seguida, as respostas foram organizadas de acordo com as questões do roteiro de entrevista.

As falas dos diretores foram ordenadas aleatoriamente, de 1 a 88, considerando as 88 escolas da rede estadual de ensino da cidade. É importante ressaltar que, mesmo com “apenas” 73 entrevistas realizadas, há falas que correspondem a uma escola classificada com um número acima de 73, o que acontece em virtude da classificação inicial.

O tratamento dos dados foi realizado por meio da análise de conteúdo, pela metodologia de análise categorial temática (BARDIN, 2011BARDIN, L. Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.; SILVA; GOBBI; SIMÃO, 2005SILVA, C. R.; GOBBI, B. C.; SIMÃO, A. A. O uso da Análise de Conteúdo como uma ferramenta para a pesquisa qualitativa: descrição e aplicação do método. Organizações Rurais e Agroindustriais, Lavras, v. 7, n. 1, p. 70–81, 2005.). Para o auxílio na organização e no tratamento dos dados coletados em campo, usou-se o software NVivo 11 Trial.

Este trabalho foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética para Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), sendo o número do parecer: 1.438.741.

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados apontaram que as percepções negativas sobre a Lei do PNAE e produtos da agricultura familiar são predominantes. Por meio dos resultados, foram construídas 4 grandes categorias classificadas como positivas, que englobam 14 percepções, e 5 grandes categorias classificadas como negativas, que englobam 24 percepções.

O Quadro 1 apresenta as categorias associadas positivamente ao PNAE, assim como as percepções dos diretores das escolas estaduais de Campo Grande que foram classificadas dentro dessas grandes categorias.

Quadro 1
Categorias e percepções dos diretores associadas positivamente à Lei do PNAE

A Tabela 1 apresenta as categorias associadas positivamente à Lei do PNAE e suas respectivas frequências absolutas e relativas. Das 73 entrevistas realizadas, em 61 delas (83,56%) foi atribuído pelo menos um ponto positivo a respeito do PNAE. Em 12 entrevistas (16,44%), não foram atribuídos pontos positivos a respeito do programa, por diversos fatores: diretor(a) não tinha opinião a respeito, pouco tempo no cargo e por isso não quis opinar, não visualizava nenhum ponto positivo, as respostas fugiram do tema da pergunta e não foi possível categorizá-la.

Tabela 1
Categorias associadas positivamente à Lei do PNAE

Os dados apresentados pela Tabela 1 apontam que a categoria Qualidade foi a mais representativa nos depoimentos dos diretores, seguida das categorias Descentralização Administrativa e Socialmente Positivo. Com menor frequência, emergiu a categoria Economicamente Positivo. Outras referem-se a alguns depoimentos os quais não foram possíveis serem categorizados dentro das 4 categorias citadas.

O Quadro 2 apresenta as categorias associadas negativamente à Lei do PNAE, assim como as percepções que foram classificadas dentro dessas grandes categorias.

Quadro 2
Categorias e percepções associadas negativamente à Lei do PNAE

A Tabela 2 apresenta as categorias relacionadas negativamente à Lei do PNAE e suas respectivas frequências absolutas e relativas. Das 73 entrevistas, em 65 delas (89%) foi atribuído pelo menos um ponto negativo a respeito do PNAE. Em 8 entrevistas (11%), não foram atribuídos pontos negativos a respeito do programa, por diversos fatores: diretor(a) não tinha opinião a respeito, pouco tempo no cargo e por isso não quis opinar, não visualizava nenhum ponto negativo, as respostas fugiram do tema da pergunta e não foi possível categorizá-la.

Tabela 2
Categorias associadas negativamente à Lei do PNAE

Os dados apresentados pela Tabela 2 apontam que a categoria Burocracia foi a mais representativa nos depoimentos dos diretores, seguida das categorias Falta de Organização da Agricultura Familiar e Valor Repassado. Com menor frequência, emergiu a categoria Negligência Governamental e Outras.

As motivações dos diretores estão relacionadas ao ambiente institucional legal, por meio da necessidade de cumprimento de uma determinação legal para que haja comida na escola, sendo que, antes da obrigatoriedade, a compra da agricultura familiar era pouco expressiva ou inexista. Esses resultados diferem dos encontrados por Triches e Schneider (2010)TRICHES, R. M.; SCHNEIDER, S. Alimentação escolar e agricultura familiar: reconectando o consumo a produção. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 19, n. 4, p. 933–45, 2010., que relatam a mobilização de vários atores (EMATER, FETAG e Prefeituras Municipais) envolvidos com a merenda escolar e a agricultura familiar, além da proatividade dos municípios de Rolante e Dois Irmãos no estado do Rio Grande do Sul, RS, que se anteciparam à própria determinação legal, que ocorreu em 2009 (BRASIL, 2009aBRASIL. Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Brasília, DF: Presidência da República; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2009a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11947.htm. Acesso em: 10 jul. 2015.
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), e passaram a incentivar a agricultura familiar com a compra desses produtos para a merenda escolar. Isso pode sinalizar que os fatores históricos e culturais desses municípios tiveram impacto nesse processo de envolvimento de compra.

No município em estudo (Campo Grande), os resultados apontaram que não há uma criação de relações sociais fortes entre a agricultura familiar e as escolas, além de não haver uma tradição cultural da pequena propriedade e da produção familiar no estado. Isso corrobora Uzzi (1997)UZZI, B. Social structure and competition in interfirm networks: the paradox of embeddedness. Administrative Science Quarterly, Ithaca, v. 42, n. 1, p. 35–67, 1997. e Polanyi (2008) apud Schneider e Escher (2011)SCHNEIDER, S.; ESCHER, F. A contribuição de Karl Polanyi para a sociologia do desenvolvimento rural. Sociologias, Porto Alegre, v. 13, n. 27, p. 180–219, 2011., em que fatores históricos e institucionais impactam no comportamento econômico.

Os resultados apontaram que alguns diretores acreditam que se pode comprar até 30% da agricultura familiar, sinalizando uma falta de conhecimento da legislação, já que a lei determina que o mínimo de compra é de 30%, e não o máximo, como foi apontado. Se alguns diretores não conhecem esse dispositivo legal de o mínimo de compra ser 30%, como é que eles poderão comprar mais do que os 30%?

[...] a gente tem 20% assegurado, porque é até 30%, não quer dizer que você tenha que gastar os 30%, você pode usar até 30%, você não pode deixar de usar nada, mas até 30%, 25%, 18% é uma média razoável que dá pra gente alimentar todo o pessoal de uma forma mais saudável, de uma forma mais com produtos da agricultura familiar. (Diretor 10).

Eles estipulam que a gente pode usar até 25% do valor que vem para a merenda escolar para a agricultura familiar, até, não pode passar disso. To comprando em média 16 a 17% a gente utiliza com a agricultura familiar. (Diretor 26).

[...] então, na verdade você pode comprar até 30% do valor que vem para a escola, você pode comprar até 30% da agricultura familiar, aliás, você deveria gastar 30%, acontece que gastar 30%, é muito, então acaba faltando para outro e você não consegue consumir 30%, porque a agricultura familiar funciona o seguinte, você pode estar comprando o leite, comprando outras coisas, mas eles estão mais preparados para fornecer frutas e verduras e 30% só de frutas e verduras é muita coisa, então você acaba gastando um pouquinho menos que 30%, ou bem menos que 30%, porque você não consegue consumir tudo isso. A agricultura familiar talvez ela deveria abrir mais o leque para fornecer outras coisas, mas hoje ainda está mais centralizado em frutas e verduras. (Diretor 39).

[...] 30% é por lei, não pode ser mais nem pode ser menos. (Diretor 41).

Entretanto, cabe ressaltar, com base em Williamson (2000)WILLIAMSON, O. E. The New Institutional Economics: taking stock, looking ahead. Journal of Economic Literature, Nashville, v. 38, n. 3, p. 595–613, 2000., que mudanças institucionais no ambiente legal são demoradas, o que pode sinalizar que o PNAE ainda precise de tempo e debate entre os atores envolvidos para que as exigências sejam cumpridas em sua totalidade, sendo difícil mensurar o tempo necessário para que tais mudanças ocorram.

As mudanças institucionais na Lei do PNAE, como a descentralização administrativa e a determinação de compra de no mínimo 30% da agricultura familiar, ao mesmo tempo que permitiu mais liberdade de compra das escolas e diretores (no caso da descentralização administrativa), incentivando a compra dos agricultores familiares (no caso da determinação mínima de compra de 30%), criou mais dificuldades para a compra dos produtos para a alimentação escolar. Como exemplo dessas dificuldades, com base nos depoimentos dos diretores, pode-se citar a maior burocratização da compra e falta de preparo das escolas e diretores para lidar com tais mudanças.

Um ponto positivo diz respeito à autonomia que a escola tem para escolher os produtos que serão comprados, então dá para você escolher de acordo com o consumo dos alunos [...]. (Diretor 42).

[...] a própria escola que compra, compramos produtos de qualidade, nós escolhemos de quem comprar, onde comprar. (Diretora 37).

[...] tem a liberdade de você fazer essa compra, de oferecer para a agricultura familiar, para o comércio local e assim por diante [...]. (Diretor 54).

[...] o diretor fica se ausentando, se preocupando e correndo atrás dessa merenda, por exemplo, a gente tem aqui que lançar edital, tem que fazer essa aquisição depois, tem a prova, tem o contrato, muitas vezes depois a gente tem alguns probleminhas de entrega, a gente tem que estar cobrando, então são esses pontos que eu vejo de negativos, o diretor teria que mexer mais com a questão pedagógica mesmo. (Diretora 67).

[...] é muita burocracia, muita papelada, muita coisa, é muita teoria e pouca prática, isso que eu vejo, a ideia é boa, as coisas são boas, só que na realidade perde-se muito tempo com questões burocráticas, isso atrapalha, emperra. (Diretor 27).

[...] o trabalho que esse programa dá, dá muito trabalho, é burocrático demais e a gente se prende a questões burocráticas, então é muito trabalhoso mesmo, a questão de prestação de contas e tudo mais [...]. (Diretora 57).

Uma instituição formal como o PNAE, que deveria reduzir incertezas e facilitar o processo de compra de alimentos para a alimentação escolar e compra de alimentos da agricultura familiar, mostra, segundo os diretores, que a lei está causando o efeito parcialmente inverso, burocratizando e dificultando o processo de compra. Nesse sentido, as mudanças institucionais, em vez de reduzirem as incertezas, trouxeram entraves burocráticos aos diretores, contradizendo o papel das instituições, que é de reduzir as incertezas, segundo North (1991)NORTH, D. C. Institutions. The Journal of Economic Perspectives, Londres, v. 5, n. 1, p. 97–112, 1991.. Além da insatisfação dos diretores devido à burocracia do programa, algumas incertezas foram geradas por meio das mudanças institucionais. Essas incertezas dizem respeito à garantia de que os alimentos comprados da agricultura familiar serão entregues no tempo acordado, já que os diretores apontaram dificuldades logísticas dos agricultores familiares para entregar os produtos. Antes dessas mudanças institucionais que determinam um percentual mínimo de compra da agricultura familiar, o diretor podia comprar, por exemplo, dos mercados, o que gerava menos incertezas na entrega.

[...] antes quando nós fazíamos a compra da merenda escolar através de pesquisa de preço, então era muito mais simples, mais prático, mais rápido para a escola [...]. (Diretor 74).

[...] a gente acaba ficando meio engessado, eu sinto engessamento nisso, a gente poderia estar comprando outras coisas, mas como tem aquele valor X, fica complicado, a gente acaba algumas coisas que às vezes as crianças nem gostam muito de comer, mas é saudável, mas não tem uma boa aceitação na parte deles, a gente precisa comprar, tá na legislação a gente tem que fazer cumprir [...]. (Diretora 33).

A gente tem que oferecer saladas, frutas, mas nem sempre a gente consegue, a gente tem que adequar o cardápio a nossa realidade. Então nós usamos muito arroz, mandioca, alimentos mais fortes, que sustentam mais o aluno da escola pública. Nós temos que adaptar o nosso cardápio. Tem coisas que têm no nosso cardápio, mas o aluno não adapta. (Diretor 61).

[...] preço baseado na tabela base do PROCON6 6 Art. 19. O orçamento estimado de preços unitários, parte integrante do instrumento convocatório para as aquisições de gêneros alimentícios da Chamada Pública e/ou da Licitação (Carta-Convite e/ou Pregão), no âmbito do PNAE, será obrigatoriamente o Preço Referência, o qual deverá ser utilizado pelas escolas da Rede Estadual de Ensino (REE). Entende-se como Preço Referência o preço médio apurado por meio de pesquisa de preço em mercado regional, realizada pela Superintendência de Proteção e Defesa do Consumidor (PROCON-MS), o qual será o parâmetro utilizado pelas UEx. da REE, na análise das propostas decorrentes dos processos de aquisição de gêneros alimentícios, no âmbito do PNAE (CAMPO GRANDE, 2015). , que eles vão agora no teto máximo e não mais antes, que eles brigavam pelo mínimo, agora saiu uma tabela de base, uma tabela bem elevada que o custo elevou bastante, então o poder de compra na licitação da merenda feita pela tabela do PROCON, que não é estadual, é nacional, prejudicou muito. (Diretor 41).

[...] é estipulado um valor e esse valor às vezes é acima do valor que eu poderia conseguir. O preço é mais caro, nem se compara. Tanto é, que eu parei de comprar o pão da agricultura familiar e voltei a comprar o pão em outro lugar. (Diretora 43).

É ótimo ter essa disponibilidade dos 30%, só que a maneira que foi feita é errado. Por exemplo, o governo divulga um preço referência para os produtos da agricultura familiar e esse preço referência não pode ser alterado7 7 Idem nota de rodapé anterior. . Então, como você vai fazer uma licitação em que os agricultores familiares só podem vender a esse preço, em alguns itens, diminuiu o poder de compra da escola. Por exemplo, o agricultor vende a abobrinha a R$ 1,40, mas no preço referência diz que ele tem que me vender a R$ 2,00. Então eu só posso comprar dele a R$ 2,00. (Diretor 61).

Com isso, mostrou-se que as mudanças institucionais/legais não condizem com a realidade da ponta executora (nesse caso, as escolas estaduais), dificultando o cumprimento dos objetivos da Lei do PNAE. Além disso, as mudanças dificultaram e deixaram o processo de compra de alimentos para a alimentação escolar mais demorado.

Segundo Becker et al. (2011)BECKER, C.; ANDERSSON, F. S.; ALTEMBURG, S. G. N.; COSTA, L. C. Novas concertações sociais e antigos entraves “burocráticos”: a produção de base familiar e ecológica frente aos desafios de acesso ao PNAE. Cadernos de Agroecologia, Recife, v. 6, n. 2, p. 1–5, 2011., para que exista êxito nas políticas públicas, é necessário que haja minimamente um conjunto de condições para que as ações propostas sejam condizentes com a realidade.

[...] administrar a merenda da forma como ela é colocada legalmente é um pouco difícil. Existe algo que está inserido no documento, que é bonito, e depois, quando a gente vai transformar isso numa compra e obedecer aos prazos, é totalmente diferente. (Diretora 13).

No município em estudo, os resultados apontaram que as exigências do PNAE se distanciam da realidade das escolas, dificultando esse processo de compra. Para Becker et al. (2011)BECKER, C.; ANDERSSON, F. S.; ALTEMBURG, S. G. N.; COSTA, L. C. Novas concertações sociais e antigos entraves “burocráticos”: a produção de base familiar e ecológica frente aos desafios de acesso ao PNAE. Cadernos de Agroecologia, Recife, v. 6, n. 2, p. 1–5, 2011., as dificuldades de compra de produtos para o PNAE ocorrem devido à falta de preparo da maioria dos gestores públicos envolvidos no programa, bem como a desorganização do segmento agrícola familiar para acessar as chamadas públicas. Triches (2010)TRICHES, R. M. Reconectando a produção ao consumo: a aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar para o programa de alimentação escolar. 2010. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Rural) – Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010. também aponta três grandes dificuldades para a concretização da compra da agricultura familiar para o PNAE: a burocracia dos processos de aquisição pública, a organização dos agricultores e a formalização das agroindústrias. Os resultados deste trabalho corroboram os resultados de Triches (2010)TRICHES, R. M. Reconectando a produção ao consumo: a aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar para o programa de alimentação escolar. 2010. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Rural) – Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010. e Becker et al. (2011)BECKER, C.; ANDERSSON, F. S.; ALTEMBURG, S. G. N.; COSTA, L. C. Novas concertações sociais e antigos entraves “burocráticos”: a produção de base familiar e ecológica frente aos desafios de acesso ao PNAE. Cadernos de Agroecologia, Recife, v. 6, n. 2, p. 1–5, 2011..

Pontos negativos, um que eu estou sentido na carne, infelizmente são poucas empresas que querem participar da licitação8 8 Observou-se, por meio de pesquisa no Diário Oficial do Estado de Mato Grosso do Sul (MATO GROSSO DO SUL, 2021), que essa escola realiza compras por licitação. De acordo com a fala do diretor entrevistado, não ficou claro qual a modalidade de licitação utilizada, no entanto, ficou evidente que nem todos os produtos para a alimentação escolar são comprados por chamada pública. , é sempre as mesmas e infelizmente eu to vendo assim, fazendo uma análise bem justa que eles estão fazendo acordo por fora, então eles já vêm com tudo preparado, quem vai ganhar tal coisa, quem vai ganhar os itens, já divididos. Infelizmente eu vejo isso, e isso prejudica e muito, porque quando nós tínhamos o pregão presencial, nossa o preço caía lá embaixo porque a concorrência era feroz, os lances, quanto mais lances tinha, mais caía preço [...]. (Diretora 22).

A chamada pública não, não acho ela burocrática, porque a chamada pública você faz a publicação no site da Secretaria, os agricultores entram veem aonde tem e vêm participar, burocrático não, a licitação em si da merenda sim, da agricultura familiar não. (Diretora 22).

Outro ponto negativo que a gente sabe, que a sociedade como um todo tem essa certeza, é de desvio, não por parte de diretor, não por parte da escola, mas por parte de gestores maiores que às vezes impede esse dinheiro de chegar na escola por algum tipo de desvio que a gente vê na televisão, na mídia todo dia, que infelizmente isso é um negativo para a alimentação escolar em nível nacional. (Diretor 10).

Negativo é que eles não têm todos os produtos para nos oferecer, e segundo a legislação dá uma declaração de que o produto é fornecido por eles. E existem casos aqui em Campo Grande que eu sei que o produtor dá o atestado de que ele produz maçã, mas aqui é complicado. O preço da agricultura familiar e toda a produção orgânica é mais cara também. Se nós comprássemos direto da CEASA [Centrais de Abastecimento de Mato Grosso do Sul] teríamos um preço mais barato. (Diretora 62).

Segundo os depoimentos de alguns diretores, o governo não fiscaliza adequadamente o PNAE, o que pode facilitar atitudes oportunistas, como a concessão da Declaração de Aptidão do Pronaf (DAP) a agricultores de produtos que eles não produzem, combinação de licitação (tipo chamada pública) entre alguns agricultores familiares e desvios de verbas.

A falta de fiscalização, conforme alguns diretores, sinaliza uma falha no sistema legal de controle. Tanto os órgãos governamentais quanto os atores sociais (pais dos alunos, professores, merendeiras e agricultores locais) deveriam participar ativamente, fiscalizando o cumprimento das diretrizes do programa, o que não acontece na prática.

Outro ponto negativo, aí a AGRAER [Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural] devia fiscalizar, é que dentro dos agricultores familiares, por exemplo, ele chega aqui e fala: “eu vou vender alface, abobrinha e banana”, eu que estou comprando não cabe a mim ir lá na roça e ver se ele tem isso, então o que acontece, ele fornece, ele não tem e aí ele fornece, o que ele não tem ele vai lá e compra no mercado na empresa e fornece para você. Quando a AGENFA [Agência Fazendária] vai emitir um talão, porque o talão da agricultura familiar ele é um pequenininho, verdinho, só que ali quando ele recebe aquele talão ele pode vender tudo, ele pode vender mandioca, abobrinha verde, abóbora cabotiã, ele pode vender chuchu, ele pode vender o que ele tiver lá, só que tem uma resolução que quando ele vai participar de uma chamada pública ele tem que entregar a declaração de que ele produz todos aqueles produtos, aí ele fez a declaração que ele produz, tudo bem, eu enquanto diretor de escola estou comprando dele, não cabe a mim ir lá na roça e ver se ele produz, claro se for uma fiscalização lá ele vai saber, olha o cara tá vendendo uma coisa que não produz, aquilo que ele não produz ele está terceirizando, ele está comprando de outro, entendeu? Então eu acho que nesse, sugestão, nesse talonário, vai lá o fiscal pra fornecer aquele talão deveria ir lá na agricultura dele. Eu sei que existe gente, pessoas que tem até o talonário da agricultura familiar e não tem um pé de alface plantado, e vende no mercado como se ele produzisse, isso, é um ponto negativo, porque eu acho que aí vai lá fiscaliza, beleza, quando for emitir o talão pro cara, vamos ver o que o senhor tem produzido, eu tenho a laranja, eu tenho isso, eu tenho isso, que naquele talão a AGENFA, o órgão competente indicasse pra gente, autorizando a venda de alface, rúcula, agrião, cebola, tomate e alho, pronto, porque é aquilo que ele está produzindo lá, eu acho que aí é uma forma de acabar mais um pouco com o atravessador, eu sei de uma pessoa, por exemplo, que ele entrega em várias instituições, ele produz eu acho que 8 produtos, mas quando ele cota, ele cota 20, 30 produtos da lista, aí o que ele faz? Tem um cara que só planta laranja, mas não tem conhecimento, não tem um carro para ele vender em Campo Grande, para poder entregar no mercado, não tem esse conhecimento, o que ele faz? Ele vai lá e compra do cara. Só que por exemplo, olha só, falar da laranja só para você ter uma base, o quilo da laranja, ele sai a R$ 1,43, o cara vai lá e compra a R$ 0,50 o quilo da laranja, porque na verdade ele compra por caixa, ele vai lá e compra a caixa, o produtor fala: “nossa como tá barato”, aí ele fala: “não, mas eu tenho que fazer o frete, gastar meu combustível”, e o coitado não sabe quanto está. Eu acho que precisaria ter essa fiscalização. Porque quando chega em uma chamada pública você vai olhar, olha o senhor plantou cebola, mas o senhor não produz cebola, você não tem autorização, o seu talão tá aqui, o senhor só é banana, você só vai participar da banana, aí você acaba com o atravessador, porque tem muito mercado abrindo, ele vai lá, ele tem um alqueire de terra, ele vai lá cadastra, aí ele quer fornecer como agricultor familiar, na verdade ele não é, ele é um atravessador, mas ele está dentro, porque a legislação está permitindo. (Diretor 31).

O recurso que deveria ser destinado para os agricultores familiares, já que as escolas pagam um preço prêmio por produtos da agricultura familiar, acaba indo em parte para as mãos dos atravessadores (comerciantes que compram da agricultura familiar e repassam às escolas), sinalizando descumprimento das regras e desperdício de recurso público. A estrutura (ou falta dela) de fiscalização do PNAE se mostra falha, abrindo “brechas” para atitudes oportunistas. Essa estrutura falha mostra que a estrutura institucional do PNAE em Campo Grande não construiu mecanismos formais e informais suficientes para evitar atitudes oportunistas no programa.

Os resultados apontam que há oportunismo por parte dos agricultores familiares, mesmo podendo essa relação de compra se tornar contínua, já que as escolas são obrigadas a comprar da agricultura familiar. Isso, em parte, contradiz o que foi colocado por Granovetter (2007)GRANOVETTER, M. Ação econômica e estrutura social: o problema da imersão. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 6, n. 1, 2007., o que deixa em aberto até que ponto essas relações contínuas impedem ou diminuem oportunismos, e como saber em que momento essas relações contínuas criam vínculos capazes de impedir ou diminuir atitudes oportunistas, se é que isso é possível.

Segundo os diretores, aponta-se a necessidade de que os repasses às escolas sejam reajustados para atender às exigências do programa, visto que os valores estão defasados e sem aumento dos repasses per capita desde 2010, diminuindo o poder de compra das escolas devido ao processo inflacionário.

[...] a per capta é muito baixa por aluno e ela é o mesmo valor já tem alguns anos, não sofreu reajuste, então no final do ano a gente acaba passando por um aperto aí, então eu vejo que é difícil pra gente fazer cumprir exatamente os 30% [...]. (Diretora 33).

Negativo é a verba ser pouca, assim R$ 0,30 por aluno não dá pra você oferecer uma coisa de qualidade pro aluno. Você tem que pegar o preço mais baixo, e quando fazemos isso a gente trabalha com um produto inferior. Se fosse um preço maior, seria um produto melhor. (Diretor 36).

Tal reclamação se justifica em parte, pois o último aumento do valor per capita por aluno aconteceu em 20109 9 Refere-se ao ano do último aumento até o término da pesquisa de campo. (TRICHES, 2010TRICHES, R. M. Reconectando a produção ao consumo: a aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar para o programa de alimentação escolar. 2010. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Rural) – Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010.). Em contrapartida, a inflação acumulada de 2010 a 2014 foi de 34,54%. Se fosse corrigido por esse índice, o valor repassado deveria ser de aproximadamente R$ 0,40 por aluno, em 2015 (IBGE, 2017INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA [IBGE]. IPCA - Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo. IBGE.Gov [online], 2017. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/Precos_Indices_de_Precos_ao_Consumidor/IPCA/Fasciculo_Indicadores_IBGE/ipca-inpc_201703caderno.pdf.. Acesso em: 12 abr. 2017
http://www.ibge.gov.br/Precos_Indices_de...
).

A defasagem do repasses financeiros, segundo as percepções dos diretores, prejudica a oferta de uma merenda nutritiva e de qualidade, colocando em risco um dos objetivos do PNAE, que é o oferecimento de uma merenda de qualidade. Além disso, essa defasagem dos recursos está comprometendo o cumprimento do cardápio e dificultando o oferecimento da merenda na quantidade necessária.

Outro ponto de destaque, segundo os diretores, é a falta de preparo e organização dos agricultores familiares para atender adequadamente as escolas. Em diversos momentos, os agricultores não conseguem a documentação exigida pelas escolas, não conseguem oferecer uma maior diversidade de produtos e ainda possuem dificuldades logísticas de entrega, prejudicando os prazos acordados com as escolas e a qualidade dos produtos. Nesse sentido, os resultados mostram que agricultores transgridem regras, como a venda de produtos que não produzem. Resultados similares sobre a dificuldade de os agricultores obterem documentação e certificação dos seus produtos podem ser vistos em Silva e Sousa (SILVA; SOUZA, 2013SILVA, A. P. F.; SOUSA, A. A. Alimentos orgânicos da agricultura familiar no Programa Nacional de alimentação Escolar do Estado de Santa Catarina, Brasil. Revista de Nutrição, Campinas, v. 26, n. 6, p. 701–14, 2013.). Entretanto o foco dos autores foi identificar o panorama de compra de alimentos orgânicos no estado de Santa Catarina.

Outro ponto negativo que eu vejo da agricultura familiar, também tem fornecedor pequeno que se quebra muito fácil. Eu não tenho como fornecer tomate, o preço do tomate subiu. E aí? Como é que eu vou fazer para eu me repor? Ah, houve uma praga [hipoteticamente] e o meu fornecedor quer me substituir por outro alimento que eu comprei. Então é o risco também que eu tenho com ele é muito grande, com o agricultor familiar. (Diretor 11).

A questão da alimentação escolar que eu acho ruim é a agricultura familiar, de ser escolhido só com o grupo daqui e que muitas das vezes, dependendo do clima, do tempo, eles não têm o alimento pra ser oferecido e a gente tem que fazer com eles uma cota. (Diretora 26).

Os resultados apontaram que, apesar de o PNAE ter objetivos mais amplos do que apenas colocar comida na escola, as percepções dos diretores mostraram que o caráter assistencialista e a necessidade de colocar a comida na escola ainda predomina como uma das principais preocupações dos gestores. Isso ocorre, segundo os diretores, devido à carência e necessidade alimentar de alunos.

Por meio dos resultados, é possível apontar que, apesar de alguns avanços na Lei do PNAE nos últimos anos, que possibilitaram algumas melhoras na alimentação escolar, como produtos mais frescos e maior diversificação na merenda, além de avanços econômicos e sociais, com a abertura e garantia de parte desse mercado institucional à agricultura familiar, o PNAE apresenta falhas em sua execução e ainda está distante de cumprir todas as exigências legais. Com isso, mostra-se necessário o envolvimento de todos os atores envolvidos diretamente com o programa, assim como da sociedade em geral, possibilitando um maior debate em relação aos objetivos e a estrutura do PNAE, suas reais necessidades e possibilidades diárias, podendo isso contribuir para o cumprimento da lei, de modo que esta esteja de acordo com a realidade e não seja mais apenas algo “figurativo” e “bonito no papel”, sem aplicabilidade no dia a dia das escolas.

Embora os resultados deste estudo mostrem uma predominância de aspectos negativos, um estudo de Souza (2017)SOUZA, A. G. Os Entraves e a assimetria informacional nas compras diretas da agricultura familiar para o Programa Nacional de Alimentação Escolar. 2017. Dissertação (mestrado) – Faculdade de Administração, Ciências Contábeis e Economia, Universidade Federal da Grande Dourados, Dourados, 2017., em que as compras são realizadas pelos municípios (41 municípios do estado de Mato Grosso do Sul), apontou resultados divergentes, demonstrando que, nesse nível de gestão (gestão municipal), o desempenho relativo a compras públicas de alimentos da agricultura familiar para o PNAE está, em média, satisfatório (31% dos recursos gastos em compras da agricultura familiar em 2015), no estado de Mato Grosso do Sul.

Isso mostra que as mudanças formais, assim como as leis, devem caminhar juntas das mudanças informais, como costumes, tradições, códigos de conduta, para que se possa alcançar o seu maior cumprimento. Bair (2012)BAIR, J. The Limits to Embeddedness: Triangular Bargaining and the institutional foundations of organizational networks. Institutions Program Working Paper Series, Bolder, v. 8, p. 1–21, 2012. argumenta que os laços sociais apresentam limites, o que evidencia a importância entre normas formais e informais. Apenas as normas formais não fazem um mercado funcionar adequadamente (como no caso do PNAE) e as normas informais também são falhas se tratadas de forma isolada, ou seja, ambos podem desempenhar um papel importante em maior ou menor grau.

Pode-se observar, por meio dos resultados, que este mercado (as escolas estaduais de Campo Grande, MS) não demonstra ter características de um mercado enraizado. Não apenas porque o Estado não fez as mudanças necessárias junto a esta realidade, mas porque os atores sociais locais não buscaram esta construção. Ou seja, mesmo em um ambiente institucional com mudanças de regras formais em curso (artigo 14 da Lei 11.947/2009), ele não se sustenta sem que haja mudanças nas regras informais – crenças, valores, costumes, tradições. Isso aponta que um dos fatores para que o PNAE não tenha tido o êxito que deveria se dá pelo fato de não estar embebido nas relações sociais.

6 CONCLUSÕES

O estudo mostrou a predominância de percepções negativas dos diretores das escolas estaduais de Campo Grande em relação à Lei do PNAE. Também ficou evidente que, até o momento das entrevistas, a lei não era cumprida em sua totalidade nas escolas estaduais, sendo que, segundo os depoimentos dos diretores, as exigências legais não condizem com a realidade de execução das escolas.

Por meio das percepções dos diretores, foram construídas 5 categorias negativas em relação à Lei do PNAE e 4 categorias positivas. Verificou-se que a categoria Qualidade foi a mais positivamente representativa, já que, segundo os diretores, as mudanças institucionais permitiram a compra de alimentos frescos, nutritivos e saudáveis, proporcionando uma maior diversificação da merenda e uma comida boa aos alunos. A categoria Burocracia foi a mais representativa negativamente, sendo que, conforme os diretores, algumas mudanças institucionais dificultaram a execução do PNAE, podendo-se destacar as mudanças constantes na legislação10 10 Como exemplo: compra por meio de chamada pública (estabelecida pela Resolução n. 38/2009, com base no artigo 14 da Lei n. 11.947/2009) e obrigatoriedade legal de compra de no mínimo 30% da agricultura familiar (BRASIL, 2009). , preço de referência, mudanças que não condizem com a realidade das escolas, dificultando o cumprimento da lei, atraso na verba e demora no processo de compra.

Além disso, dentre as principais dificuldades da compra de produtos da agricultura familiar, destaca-se a falta de organização dos agricultores familiares. Outro fator preponderante foi o desconhecimento dos diretores em relação a diversos aspectos do PNAE. Aponta-se que ainda há pouca diversidade agrícola para atender à demanda das escolas, o que gera dificuldades em encontrar determinados produtos, criando-se, assim, a necessidade de os agricultores familiares ampliarem o seu escopo de produção. Além disso, observou-se o quão complexo é, para os agricultores, realizar a logística de entrega e a falta de conhecimento destes em relação à Lei do PNAE.

Os resultados apontaram que o maior incentivo aos diretores é a obrigatoriedade legal, sendo que o Estado fez mudanças institucionais sem a devida preparação das escolas e dos diretores para o cumprimento das exigências legais. Nesse sentido, algumas mudanças não condizem com a realidade das escolas, sendo que não houve um devido preparo e contrapartida, por parte do Estado, para que os diretores e as escolas cumprissem a lei em sua totalidade, não havendo um ambiente institucional propício ao cumprimento de todas as exigências do PNAE; por exemplo, a defasagem dos valores repassados.

O estudo permitiu concluir que o processo de compra direta da agricultura familiar não se mostra enraizado nas escolas estaduais de Campo Grande, MS, o que, em parte, pode ser atribuído aos diretores das escolas estaduais, visto que, mesmo com a exigência de compra mínima de 30% da agricultura familiar, muitos deles não as conheciam, dificultando, assim, a construção desse mercado, uma vez que o diretor é figura central no processo de compra no modelo escolarizado. Isso mostra que as mudanças formais, assim como as leis, devem caminhar juntas das mudanças informais, como costumes, tradições, códigos de conduta, para que se possa alcançar o seu maior cumprimento.

Segundo os diretores, apesar de algumas melhorias na merenda das escolas com as mudanças ocorridas na Lei do PNAE, que permitiu uma maior autonomia de compra das escolas, alimentos mais frescos, alimentação saudável, além do incentivo econômico e social aos agricultores familiares, ainda assim, a execução do PNAE se mostra falha, apontando fragilidades do programa, como a falta de fiscalização adequada. Portanto, para que a lei seja cumprida em sua totalidade, é necessário superar essas fragilidades. Para isso, sugere-se um maior envolvimento dos diversos atores dessa lei, incluindo desde os agricultores familiares até os diretores das escolas. É importante, também, que se debatam as reais possibilidades de fornecimento da agricultura familiar e possibilidades de execução por parte das escolas; entretanto são necessárias investigações subsequentes a respeito do tema.

A principal limitação deste estudo é a realização das entrevistas com apenas um ator envolvido com o processo de execução do PNAE (os diretores das escolas estaduais). Também seria importante a aplicação de pesquisas com os demais atores (merendeiras, professores, alunos, membros da sociedade civil, nutricionistas, agricultores, entre outros) envolvidos com o programa, pois estes também são impactados direta ou indiretamente e podem apresentar percepções, assim como sugestões, diferentes dos diretores, tornando o debate em relação à Lei do PNAE mais amplo.

Uma segunda limitação deste estudo está refletida na questão da temporalidade. Os dados foram coletados no ano de 2015 e não foi realizada nova entrevista com os gestores das escolas públicas, para analisar a evolução das ações e do cumprimento da lei do PNAE por esses estabelecimentos ao longo dos anos ou em um período mais recente. Os resultados, portanto, não refletem a atual percepção dos diretores dessas escolas a respeito da Lei do PNAE e aquisição de produtos da agricultura familiar.

Em termos gerenciais, este estudo mostrou as dificuldades encontradas pelos diretores para o funcionamento do PNAE na época em que os dados foram coletados. Com isso, o estudo pode servir como base para analisar o cumprimento dessa lei e ser utilizado pelos agricultores familiares, para que eles possam compreender os principais problemas apontados pelos diretores em relação aos produtos da agricultura familiar, possibilitando, assim, uma melhor compreensão das necessidades das escolas em relação aos seus produtos.

As contribuições acadêmicas referem-se à elaboração de categorias positivas e negativas associadas à Lei do PNAE, assim como as percepções associadas a elas. Também é importante ressaltar, como contribuição, a vasta pesquisa de campo, a qual permitiu a construção deste estudo, possibilitando conhecer, em profundidade, as percepções dos diretores. As categorias elaboradas também podem servir de guia para outros estudos na área, verificando se em outras localidades, ou com outros atores, elas são válidas.

No que concerne ao cenário atual do PNAE no Estado de Mato Grosso do Sul, a Secretaria de Estado da Educação de Mato Grosso do Sul reorganizou o Departamento de Alimentação Escolar, providenciando a contratação de profissionais nutricionistas, com vistas a um processo de gestão mais descentralizado, com suporte técnico personalizado em virtude das diferenças regionais, que impactam nos hábitos alimentares e nas necessidades nutricionais específicas, como as questões étnicas, pautadas por maior ou menor concentração de populações indígenas no Estado (DOE/MS, 2021).

Nesse sentido, recomendam-se estudos futuros que busquem dimensionar e analisar impactos das ações da gestão do PNAE pela Secretaria de Estado da Educação de Mato Grosso do Sul, diante de possíveis assimetrias observáveis na lacuna temporal, particularmente, em que se vivenciou um fenômeno de pandemia.

Sugere-se também, para trabalhos futuros, o debate para a construção de indicadores relacionados à Lei do PNAE, para medir sua eficiência, eficácia e efetividade, no sentido de mensurar qual o impacto (econômico e social) dessa lei nos mais diversos lugares do país. Outra sugestão é o debate para tentar tornar a lei mais simples e menos burocrática, para que seus objetivos sejam cumpridos adequadamente. Com relação à lacuna temporal, sugere-se que pesquisas futuras possam coletar novos dados sobre a percepção dos diretores das escolas estaduais de Campo Grande, MS, em relação à Lei do PNAE e aos produtos adquiridos da agricultura familiar, e comparar com os resultados apresentados neste estudo.

  • 5
    Modelo das escolas estaduais de Campo Grande, MS, sendo que as escolas municipais funcionam no modelo centralizado, por isso ficaram fora da pesquisa.
  • 6
    Art. 19. O orçamento estimado de preços unitários, parte integrante do instrumento convocatório para as aquisições de gêneros alimentícios da Chamada Pública e/ou da Licitação (Carta-Convite e/ou Pregão), no âmbito do PNAE, será obrigatoriamente o Preço Referência, o qual deverá ser utilizado pelas escolas da Rede Estadual de Ensino (REE). Entende-se como Preço Referência o preço médio apurado por meio de pesquisa de preço em mercado regional, realizada pela Superintendência de Proteção e Defesa do Consumidor (PROCON-MS), o qual será o parâmetro utilizado pelas UEx. da REE, na análise das propostas decorrentes dos processos de aquisição de gêneros alimentícios, no âmbito do PNAE (CAMPO GRANDE, 2015CAMPO GRANDE. Resolução conjunta SED/SEFAZ/SAD n. 4, de 22 de maio de 2015. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica da Rede Estadual de Ensino de Mato Grosso do Sul no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Diário Oficial, Campo Grande, MS, 2015. Disponível em: http://www.spdo.ms.gov.br/diariodoe/Index/Download/DO8927_26_05_2015. Acesso em: 2 set. 2018.
    http://www.spdo.ms.gov.br/diariodoe/Inde...
    ).
  • 7
    Idem nota de rodapé anterior.
  • 8
    Observou-se, por meio de pesquisa no Diário Oficial do Estado de Mato Grosso do Sul (MATO GROSSO DO SUL, 2021MATO GROSSO DO SUL (Estado). Edital n. 1/2021 – SAD/SED/GAEN. Ano XLIII n. 10.603. Diário Oficial Eletrônico, Campo Grande, MS, 12 ago. 2021. p. 67. Disponível em: https://www.spdo.ms.gov.br/diariodoe/Index/Download/DO10603_12_08_2021. Acesso em: 20 set. 2022.
    https://www.spdo.ms.gov.br/diariodoe/Ind...
    ), que essa escola realiza compras por licitação. De acordo com a fala do diretor entrevistado, não ficou claro qual a modalidade de licitação utilizada, no entanto, ficou evidente que nem todos os produtos para a alimentação escolar são comprados por chamada pública.
  • 9
    Refere-se ao ano do último aumento até o término da pesquisa de campo.
  • 10
    Como exemplo: compra por meio de chamada pública (estabelecida pela Resolução n. 38/2009, com base no artigo 14 da Lei n. 11.947/2009) e obrigatoriedade legal de compra de no mínimo 30% da agricultura familiar (BRASIL, 2009).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2023

Histórico

  • Recebido
    04 Mar 2021
  • Revisado
    22 Ago 2022
  • Aceito
    04 Out 2022
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