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Influência de fatores obstétricos, socioeconômicos e nutricionais da gestante sobre o peso do recém-nascido: estudo realizado em uma maternidade em Teresina, Piauí

Obstetric, social, economic and nutritional factors of pregnant women of newborn weight: study accomplished in a maternity in Teresina, Piauí

Resumos

OBJETIVOS: analisar a influência de fatores obstétricos, socioeconômicos e nutricionais sobre o peso do recém-nascido (RN) em uma maternidade de Teresina. MÉTODOS: estudo descritivo realizado com 277 gestantes em trabalho de parto e seus RN, incluindo-se mulheres com idade entre 20 a 34 anos, pré-natal iniciado entre a 10ª e 16ª semana de gestação, idade gestacional >37 semanas, não fumantes, sem doenças, com feto único, vivo e sem má formação congênita e com fichas ou cartão devidamente preenchidos. Para análise estatística, foram utilizados o teste do qui-quadrado, t de Student e análise de variância (p <0,05). RESULTADOS: constatou-se uma população jovem, de baixo poder aquisitivo, escolaridade de oito a mais anos. O incremento semanal médio de peso materno foi 389,3 ± 140,3 g, com ganho total de 12,0 ± 4,6 kg. No tocante aos RN, 73,6% nasceram com peso entre 3000 a 3999 g. Houve associação estatística do peso ao nascer com altura materna (p = 0,001) e total de ganho de peso durante a gestação (p = 0,013). CONCLUSÕES: um adequado ganho de peso durante a gestação e o atendimento pré-natal deve ter um relevante papel em promover essa boa evolução, prevenindo mau prognóstico neonatal.

Ganho de peso; Estado nutricional; Peso ao nascer


OBJECTIVES: to analyze the influence of obstetric, social, economic and nutrition factors on newborn weight in a maternity hospital of Teresina. METHODS: a descriptive study focusing 277 pregnant women during labor and their newborns aimed at women aged between 20 and 34 years old, prenatal care initiated between the 10th and 16th week of pregnancy, pregnancy length >37 weeks, non-smoking, disease free, one fetus, alive and with no congenital malformation, medical files dully completed. Statistical analysis was performed by the chi-square and t Sudent tests. RESULTS: a population of young low income mothers receiving eight or more years of education was focused. The average weekly increase of maternal weight was 389.3 ± 140.3 g, with total weight gain of 12.0 ± 4.6 kg. In relation to newborns' weight, 73.6% weighed 3000 to 3999 g. Statistical association between newborn weight and maternal height was determined (p = 0.001), as well as with the total weight gain during pregnancy (p = 0.013). CONCLUSIONS: adequate weight gain and prenatal care during pregnancy are relevant to assure a good neonatal prognosis.

Weight gain; Nutritional status; Birth weight


ARTIGOS ORIGINAIS ORIGINAL ARTICLES

Influência de fatores obstétricos, socioeconômicos e nutricionais da gestante sobre o peso do recém-nascido: estudo realizado em uma maternidade em Teresina, Piauí

Obstetric, social, economic and nutritional factors of pregnant women of newborn weight: study accomplished in a maternity in Teresina, Piauí

Geânia de Sousa Paz LimaI; Helena Alves de Carvalho SampaioII

IDepartamento de Nutrição. Universidade Federal do Piauí. Av: Senador Área Leão, 4041. São Cristóvão. Teresina, PI, Brasil. CEP: 64.051.090 E-mail: geaniapaz@ig.com.br

IIMestrado em Saúde Pública. Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza, Ceará, Brasil

RESUMO

OBJETIVOS: analisar a influência de fatores obstétricos, socioeconômicos e nutricionais sobre o peso do recém-nascido (RN) em uma maternidade de Teresina.

MÉTODOS: estudo descritivo realizado com 277 gestantes em trabalho de parto e seus RN, incluindo-se mulheres com idade entre 20 a 34 anos, pré-natal iniciado entre a 10ª e 16ª semana de gestação, idade gestacional >37 semanas, não fumantes, sem doenças, com feto único, vivo e sem má formação congênita e com fichas ou cartão devidamente preenchidos. Para análise estatística, foram utilizados o teste do qui-quadrado, t de Student e análise de variância (p <0,05).

RESULTADOS: constatou-se uma população jovem, de baixo poder aquisitivo, escolaridade de oito a mais anos. O incremento semanal médio de peso materno foi 389,3 ± 140,3 g, com ganho total de 12,0 ± 4,6 kg. No tocante aos RN, 73,6% nasceram com peso entre 3000 a 3999 g. Houve associação estatística do peso ao nascer com altura materna (p = 0,001) e total de ganho de peso durante a gestação (p = 0,013).

CONCLUSÕES: um adequado ganho de peso durante a gestação e o atendimento pré-natal deve ter um relevante papel em promover essa boa evolução, prevenindo mau prognóstico neonatal.

Palavras-chave: Ganho de peso, Estado nutricional, Peso ao nascer

ABSTRACT

OBJECTIVES: to analyze the influence of obstetric, social, economic and nutrition factors on newborn weight in a maternity hospital of Teresina.

METHODS: a descriptive study focusing 277 pregnant women during labor and their newborns aimed at women aged between 20 and 34 years old, prenatal care initiated between the 10th and 16th week of pregnancy, pregnancy length >37 weeks, non-smoking, disease free, one fetus, alive and with no congenital malformation, medical files dully completed. Statistical analysis was performed by the chi-square and t Sudent tests.

RESULTS: a population of young low income mothers receiving eight or more years of education was focused. The average weekly increase of maternal weight was 389.3 ± 140.3 g, with total weight gain of 12.0 ± 4.6 kg. In relation to newborns' weight, 73.6% weighed 3000 to 3999 g. Statistical association between newborn weight and maternal height was determined (p = 0.001), as well as with the total weight gain during pregnancy (p = 0.013).

CONCLUSIONS: adequate weight gain and prenatal care during pregnancy are relevant to assure a good neonatal prognosis.

Key words: Weight gain, Nutritional status, Birth weight

Introdução

Nas últimas décadas o Brasil tem apresentado importantes avanços na Saúde Materno-Infantil, diminuindo as taxas de mortalidade tanto materna, quanto infantil.1 Por outro lado, embora os óbitos referentes à fase neonatal venham mantendo coeficientes estáveis, percentualmente, em algumas regiões do país, apresentam nítida tendência a aumento.1

Entre os numerosos fatores condicionantes do risco neonatal que ainda subsistem, se encontram o baixo peso de nascimento (<2500 g) e o peso insuficiente ao nascer (2500 a 3000 g). Estes recém-nascidos (RN) estão expostos a grave risco de morbimortalidade perinatal ligado às características de imaturidade biológica que afeta a maioria de seus sistemas,2 e, além disso, os problemas mentais, orgânicos e neurológicos que aparecem na idade adulta são mais graves que nas crianças nascidas com peso adequado.3

Segundo dados do Ministério da Saúde4 a quantidade de crianças com menos de 2500 g, em 2001, no Brasil, foi de 7,86%. No Piauí esse percentual varia de 6,32% no Estado para 8,22% na capital, sendo que na Maternidade Dona Evangelina Rosa, Centro de Referência para Atenção Materno-Infantil de Alto Risco no Estado, o percentual de recém-nascidos com baixo peso e peso insuficiente ao nascer foi, respectivamente, de 13,0% e 23,5% no ano de 2002.

Tendo em vista que as distribuições do peso ao nascer e as condições de saúde são determinadas por diversos fatores complexos e inter-relacionados que se originam de condições biológicas, sociais e ambientais às quais a mulher está exposta durante a gestação, é fundamental que se identifique, durante o pré-natal, quais os fatores que constituem risco para o nascimento de crianças com peso inadequado. Assim a proposta do presente estudo foi verificar a influência do ganho de peso, história obstétrica e condição socioeconômica da gestante sobre o peso do seu RN. Espera-se que, conhecendo tal situação, se possa planejar uma assistência pré-natal que efetivamente inclua ações que reduzam as inadequações nutricionais detectadas na Maternidade citada.

Métodos

O estudo caracterizou-se como transversal, descritivo e analítico.

A população foi constituída por gestantes atendidas em trabalho de parto na Maternidade Dona Evangelina Rosa em Teresina, Piauí, Brasil, e seus recém-nascidos, entre janeiro a maio de 2003. Para cálculo da amostra, aplicou-se a fórmula da população finita para a variável, inadequação do peso ao nascer (crianças com pesos fora do limite de 3000 a 3999 g), que na Maternidade estudada, no ano de 2002, foi de 41,6%, e a população considerada no estudo para um semestre do ano foi de 935 mulheres e, fixando-se erro amostral de 5%, resultou numa amostra de 277 mulheres, as quais satisfizeram os seguintes critérios de inclusão: idade entre 20 a 34 anos, primeira consulta do pré-natal efetuada entre a 10ª e 16ª semana de gestação, idade gestacional >37 semanas, não fumantes, sem doenças, com feto único, vivo e sem má formação congênita, com fichas ou cartão devidamente preenchidos e que, devidamente informadas dos objetivos da pesquisa, concordaram em participar da investigação. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição responsável pelo estudo. Os dados foram coletados num formulário estruturado, obtidos diretamente com a mãe (idade materna, estado civil, escolaridade, ocupação, renda familiar, número de partos, data nascimento do último filho) em seu cartão de gestante (data da última menstruação, resultados de exames laboratoriais, freqüência ao pré-natal, idade gestacional da primeira consulta, estatura, peso pré-gestacional e peso da primeira e última consulta) e no seu prontuário de puérpera (peso RN, tipo de parto, idade gestacional do RN); foi obtido o peso no momento da admissão.

As medidas de peso após a admissão foram tomadas com as gestantes sem calçados e com o mínimo de roupa. A balança utilizada foi do tipo não digital, da marca Filizola, modelo 31, com subdivisão de 100 g e carga máxima de 150 kg. A escala para medida da altura era fixa à balança, em haste vertical, com divisão de 0,5 cm e escala extensiva situada entre 95 e 195 cm. A obtenção da altura, na maioria dos casos, foi realizada durante o pré-natal.

O estado nutricional pré-gravídico foi determinado pelo índice de massa corpórea (IMC), obtido pela relação peso (kg)/[altura (m)]2. Para classificação das gestantes, foi utilizada a recomendação do National Academy of Sciences do Institute of Medicine:5 baixo peso, IMC <19,8; eutrofia, IMC de 19,8 a 26; sobrepeso IMC de 26 a 29 e obesidade IMC >29.

O incremento de peso semanal foi calculado pela diferença do peso antes do parto e o peso do primeiro controle pré-natal, dividido pelo número de semanas transcorridas entre ambas as faixas. Para classificar a adequação do ganho de peso semanal, utilizou-se o critério segundo Stevens-Simon e Mccanarney:6 aumento lento <280 g/semana; aumento normal 280 a 450 g/semana e aumento rápido >450 g/semana.

O aumento total de peso durante a gravidez foi obtido pela diferença do peso antes do parto e o peso pré-gravídico, com análise de acordo com a recomendação do Ministério da Saúde:7 ganho de peso adequado 8 a 16 kg, ganho de peso insuficiente <8 kg e excesso de ganho de peso valores superiores a 16 kg.

Para classificação do peso ao nascer utilizou-se o critério da Organização Mundial da Saúde (OMS):8 baixo peso (crianças com menos de 2500 g), peso insuficiente (2500 g a 2999 g), peso adequado (3000 g a 3999 g) e excesso de peso (4000g ou mais).

A medida da idade gestacional foi baseada na data da última menstruação, corroborada pelo exame de ultra-sonografia, com posterior confirmação pelo método preconizado por Capurro et al.9

A paridade foi entendida como número de gestações que resultaram em nascidos vivos ou mortos, excluindo os casos de abortos, tendo sido categorizada semelhante ao estudo de Almeida et al.10 em: a) nulíparas (nenhum filho); b) multíparas (um a quatro filhos) e c) grande multíparas (cinco a mais filhos). Considerou-se com menor risco gestacional a mãe multípara.

O intervalo interpartal foi avaliado considerando o intervalo entre nascimento do último filho e o nascimento do filho atual. Semelhante à avaliação dos fatores de risco na gravidez recomendado pelo Ministério da Saúde,7 considerou-se como adequado o intervalo interpartal >2 anos ou <5 anos.

Os dados foram processados em microcomputador, utilizando-se os softwares Epi-info, versão 2000 e o SPSS/PC, versão 9.0. Na análise estatística foram utilizadas, inicialmente, tabelas de freqüências simples, no sentido de caracterizar a amostra. No segundo momento, foram utilizados o teste do qui-quadrado, o teste t de Student, e a análise de variância de Pearson. O teste de qui-quadrado foi aplicado quando as variáveis foram categóricas e para as comparações de médias, os demais testes. O nível de significância fixado foi de 0,05 (5%) para rejeição da hipótese nula.

Resultados

As 277 gestantes estudadas tinham idade média de 25 ± 3,8 anos, a maioria (88,8%) com companheiro, em união oficializada ou não e 53,8% tinham um nível de instrução de oito ou mais anos de estudo formal. Quanto à participação no orçamento familiar, 75,8% realizava atividade doméstica, não remunerada, resultando num rendimento nominal mensal bastante baixo, obtendo-se uma renda familiar per capita média em torno de 0,63 ± 0,74 salário mínimo.

No atinente aos dados obstétricos, identificou-se que mais da metade da população (59,9%) foi constituída por multíparas, mulheres com um a quatro filhos; 1,1% tinham tido cinco ou mais filhos e 39% eram nulíparas. Quanto ao espaçamento gestacional, a maioria (56,2%) apresentou um intervalo entre dois a cinco anos. Na análise das consultas realizadas durante o pré-natal, o estudo mostrou que a média da idade gestacional da primeira consulta foi de 11,6 ± 2,9 semanas; quanto ao número de consultas realizadas nesse período, 63,9% das gestantes foram atendidas seis ou mais vezes, sendo também seis a média encontrada para o total de atendimentos nesse período.

A classificação do estado nutricional da mãe antes da gestação, determinado pelo IMC, representado no Tabela 4, mostra que predominou a normalidade (188), existindo, entretanto, 89 mães com má nutrição, por déficit ou excesso, sendo mais freqüente o baixo peso (49), seguido do sobrepeso (22) e obesidade (18). Quanto à altura materna, a média observada foi de 154,2 ± 5,6 cm, tendo sido encontrado apenas 4,7% das gestantes com estatura inferior a 145 cm. E em relação ao peso antes da gestação, a média verificada foi de 54,4 kg ± 9, 04, sendo que 11,6% e 3,2% apresentaram, respectivamente, peso <45 kg e >75 kg.

O incremento semanal médio de peso materno foi de 389,3 ± 140,3 g/semana e o total de ganho de peso ao final da gravidez, teve uma média de 12 ± 4,6 kg, com a maioria exibindo ganho na faixa de 8-16 kg, 107 mães tiveram ganho de peso inadequado, sendo que em 54 dessas o ganho foi inferior a 8 kg e, em 53 superior a 16 kg (Tabela 6).

No tocante aos recém-nascidos, o peso de nascimento em gramas teve uma média de 3315 ± 401,5 g. Na classificação do peso ao nascer (Tabela 1), a maioria (73,6%) teve peso adequado (3000 a 3999 g), 1,5% eram de baixo peso (2500 g) e 19,5% tinham um peso insuficiente (2500 a 2999 g).

Quanto à idade gestacional, segundo o método Capurro Somático, a média foi de 39,2 ± 1,0 semana, tendo a maior concentração de crianças entre 38 a 40 semanas, representando 87,7% da amostra.

Na Tabela 2 e 3 se apresentam as diferentes categorias de peso ao nascer em relação às características socioeconômicas (idade materna, estado civil, escolaridade e renda per capita) e obstétricas (paridade, intervalo interpartal e número de consultas no pré-natal) com altura materna. Observa-se que só houve associação estatisticamente signficante entre peso ao nascer e altura da materna.

Na Tabela 4, ao confrontar a altura, peso e IMC pré-gestacional, juntamente com as diferenças entre as médias do ganho de peso semanal e total da mãe durante a gestação e as médias de peso ao nascer, não se observou associação estatística. Vale ressaltar, no entanto, que ao relacionar o estado nutricional pré-gravídico e a distribuição do total de ganho de peso durante a gravidez, segundo a recomendação do Ministério da Saúde (Tabela 5), identificou-se uma associação positiva (p = 0,004) entre as variáveis.

Na distribuição do ganho de peso semanal e total durante a gestação com as médias de peso dos bebês, os dados revelam associação significante somente entre o ganho de peso total e peso ao nascer (p = 0,01). (Tabela 6)

Discussão

O perfil das gestantes delineia-se como uma população jovem, com idade entre 20 a 34 anos. Do ponto de vista reprodutivo essa faixa etária é considerada ótima,11 pois o menor risco perinatal é observado quando a idade materna está compreendida entre 20 a 30 anos,12 que neste estudo representou 87,4% da amostra.

Quanto ao estado civil, o fato da mãe ser solteira é um aspecto importante a ser considerado, pois além da desvantagem psicológica, a ausência do pai, em geral, traz menor estabilidade econômica para a família, podendo se constituir em fator de risco para o baixo peso ao nascer.13,14 Contudo, no presente estudo, os achados quanto à relação com o peso ao nascer apontam proximidade nos percentuais entre as mulheres casadas e com outro tipo de relacionamento, não se evidenciando, portanto, relação de dependência entre as variáveis.

Em relação à escolaridade, verificou-se que mais da metade das mulheres tinham de oito a mais anos de estudo, taxa semelhante à média nacional entre mulheres de 20 a 24 anos responsáveis pelo domicílio - 54,8%.15 Essa constatação é interessante, considerando-se que aquelas mães que freqüentam por mais de oito anos a escola têm na maior escolaridade um fator protetor para a ocorrência de recém-nascido de baixo peso.16,17 No entanto, no presente estudo, a quantidade de anos de freqüência à escola não interferiu no peso de nascimento.

Quanto à atividade econômica, somente 24,2% das mulheres exerciam atividade remunerada. Essa situação de pequena inserção no mercado de trabalho e da impossibilidade de dividir o sustento familiar com o companheiro pode comprometer a qualidade de vida da mãe, do bebê e dos outros familiares. As mães que recebiam menos de um salário mínimo per capita tinham um maior percentual de crianças com peso menor que 3000 g (22,4% versus 12,5%). No entanto, não houve significância estatística. Talvez essa não significância seja devida ao fato da maioria receber menos de um salário mínimo por mês, impossibilitando uma comparação entre as duas categorias de renda com o peso ao nascer.

Para Victora et al.,13 a renda familiar parece ser realmente importante para o baixo peso ao nascer no grupo de renda até um salário mínimo mensal, enquanto nos estratos de renda maiores, incluindo o de 1,1 a três salários, que ainda pode ser considerado como de baixa renda, as proporções de baixo peso ao nascer são relativamente baixas.

Em relação à paridade, não se observou diferença significativa entre o número de filhos e as categorias de peso ao nascer. Resultado esse, semelhante ao estudo de Almeida e Jorge,10 em Santo André, São Paulo, porém discordante de alguns trabalhos que evidenciaram existir associação entre paridade e baixo peso ao nascer, havendo maior proporção desse entre as primigestas3,12,18 ou entre as primigestas e as grandes multíparas.11,16

Considerando o intervalo entre as gestações, também não foi constatada relação de dependência entre essa variável e peso ao nascer. No entanto, os dados da literatura mostram que intervalos muito curtos ou prolongados entre as gestações podem aumentar a chance de um bebê nascer prematuro ou com baixo peso. No primeiro caso, devido à incapacidade da mãe em recuperar as reservas nutricionais entre uma gravidez e outra19,20 e no segundo, está relacionado às enfermidades maternas.3

Quanto aos indicadores da assistência pré-natal, todas as gestantes selecionadas iniciaram o pré-natal no primeiro trimestre da gestação, mas 36,1% delas fizeram menos de seis consultas, ou seja, não cumpriram o calendário mínimo proposto pelos órgãos oficiais. Por outro lado, o percentual foi bem maior (62%) em pesquisas realizadas na região Norte e Nordeste do país,21 o que deixa as gestantes estudadas numa situação privilegiada.

Ao comparar o número de consultas durante o pré-natal com o peso do RN, observou-se que praticamente não houve diferença nos percentuais entre as mães que tiveram menos de seis ou de seis ou mais consultas, não havendo, portanto, associação estatística entre as variáveis.

Segundo Halpern et al.,22 o progresso no atendimento pré-natal está inevitavelmente correlacionado com sua qualidade, facilidade de acesso e, mais importante, com o cuidadoso acompanhamento de cada gestante e não ao número de consultas realizadas. E, em geral, as mulheres que recebem cuidados desde o primeiro trimestre têm melhores resultados gestacionais do que aquelas com início tardio.23

A classificação do estado nutricional da mãe antes da gestação segundo o IMC, mostra que mais da metade das gestantes era normal, enquanto que as desnutridas e com excesso de peso representaram, respectivamente, 17,7% e 14,4% da amostra. Comparando-se esses dados com os do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN)24 verifica-se que a população de gestantes eutróficas se encontra semelhante àquela observada em Teresina, Piauí, para gestantes com menos de vinte semanas de gestação, 66,0%, havendo, porém, uma maior diferença quanto ao déficit e excesso ponderal, que na capital do Estado foi de 24,4% e 10,0%, respectivamente.

No atinente aos índices antropométricos maternos antes da gestação, observou-se que a maioria das gestantes exibiu altura, peso e IMC pré-gestacional que não configuram risco gestacional. No entanto, ao relacionar a altura materna com as faixas de peso ao nascer, evidenciou-se forte associação estatística (p = 0,001), corroborando achados que apontam a menor altura com risco de baixo peso ao nascer.

O aumento de peso total durante a gestação correspondeu à média recomendada por muitos autores (12,0 ± 4,6 kg), com a maioria exibindo ganho na faixa de 8 a 16 kg, dentro do preconizado pelo Ministério da Saúde.7 Da mesma forma, o incremento semanal médio de peso materno (389 g/semana) se aproximou bastante dos 400 g/semana, recomendado pelo Ministério da Saúde para mulheres eutróficas entre 10 a 40 semanas de gestação. Contudo, chamou atenção a freqüência de ganho total de peso insuficiente entre as mães eutróficas e excessivo entre essas e as mães com sobrepeso e obesidade pré-gestacional, ressaltando a necessidade de um acompanhamento mais eficiente do ganho de peso durante a gestação e atendimento nutricional não apenas para as gestantes com baixo peso, mas para todas, contribuindo para evitar déficit ou excesso ponderal ao final da gravidez, reduzindo, assim, ao mínimo os riscos obstétricos e de obesidade pós-parto.

Avaliando a relação entre ganho de peso total e semanal durante a gestação com as médias de peso dos recém-nascidos, observou-se que houve associa-ção significante (p = 0,01) somente entre o peso ao nascer e o ganho de peso total da gravidez. Comportamento semelhante a esse foi visto, também, no estudo de Griffiths et al.,25 porém tanto o ganho de peso semanal como o ganho total apresentaram correlação com o peso ao nascer, o que demonstra o efeito benéfico que podem ter, em termos de desenvolvimento neonatal, as intervenções nutricionais durante a gestação.

Em se tratando das características dos RN estudados, cuja idade gestacional média foi de 39,2 semanas, o peso médio de 3315 ± 401,5 g é bastante próximo da cifra observada na tabela de crescimento e desenvolvimento do National Center for Health Statistics (NCHS).26 Destaca-se, no entanto, a baixa proporção de RN com peso abaixo de 2500 g (1,5%), muito inferior à encontrada no Piauí e no Brasil, 6,32% e 7,86%, respectivamente,4 e um pouco abaixo dos países desenvolvidos,que gira em torno de 4 a 5%.27 Mas ao levar-se em conta a cifra almejada pela OMS,8 de pelo menos 85% dos recém-nascidos com peso maior ou igual a 3000 g, constata-se que o percentual de crianças dentro deste desse patamar ainda se encontra aquém do desejado, 79%.

Com base nos resultados obtidos, conclui-se que a associação entre peso ao nascer e altura materna,bem como com o total de ganho de peso durante a gestação,demonstra a influência do estado nutricional materno nas condições de nascimento, ressaltando a importância de um acompanhamento nutricional pré-natal eficiente, que atue sobre as inadequações de ganho de peso detectadas.

Agradecimentos

À Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FUNCAP) pelo suporte financeiro.

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Recebido em 12 de fevereiro de 2004

Versão final apresentada em 11 de junho de 2004

Aprovado em 21 de julho de 2004

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Nov 2004
  • Data do Fascículo
    Set 2004

Histórico

  • Aceito
    21 Jul 2004
  • Revisado
    11 Jun 2004
  • Recebido
    12 Fev 2004
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