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Freqüência de desaparecimento do refluxo vésico-ureteral de graus I a III em pacientes pediátricos

Vesicoureteral grade I to III reflux disappearance frequency in pediatric patients

Resumos

OBJETIVOS: avaliar a freqüência do desaparecimento do refluxo vésico-ureteral (RVU) primário de graus I a III em crianças e correlacionar com idade no diagnóstico, sexo, grau e lateralidade. MÉTODOS: estudo retrospectivo de 34 crianças com RVU diagnosticado por uretrocistografia miccional (UCM). Cinco pacientes eram meninos (mediana: um ano e seis meses) e 29 meninas (mediana: três anos) O exame controle pela UCM ou cistografia foi realizado em intervalos de 12 a 24 meses. Na análise das variáveis utilizou-se a curva de sobrevida de Kaplan-Meier. RESULTADOS: o desaparecimento do RVU ocorreu em 52,9% dos pacientes. Comparando faixas etárias não houve diferença estatística. Nos meninos o desaparecimento do RVU ocorreu na mediana de 24 meses e nas meninas, de 60 meses. Houve diferença estatística entre os sexos (p = 0,02). Houve desaparecimento do RVU em 80% dos pacientes com RVU de grau I (mediana: 25,5 meses), 66,6% de grau II (mediana: 48 meses) 40% de grau III (mediana: 60 meses); em 21% no bilateral (mediana: 48 meses) e 75% no unilateral (mediana: 28,5 meses). Houve diferença estatística entre os graus de RVU (0,02) e lateralidade (p = 0,05). CONCLUSÕES: o desaparecimento do RVU ocorreu no sexo masculino, nos graus I ou II e unilateral.

Refluxo vésico-ureteral; Evolução


OBJECTIVES: to evaluate the frequency of disappearance of primary vesicoureteral reflux (VUR) grade I to III in children and correlate with patient's age at diagnosis, sex, grade and laterality. METHODS: a retrospective study of 34 children with VUR detected by voiding cystourethrography (VCU). Five patients were boys (median of age: one year and six months) and 29 were girls (median of age: three years). Control exams by VCU or IC were made in performed 12 to 24 months. Kaplan-Meier survival curves were used for analysis. RESULTS: VUR cessation was observed in 52.9% of patients. Comparing age it was not observed statistic difference. VUR cessation occurred in a median of 24 months in boys and 60 months in girls. There was statistic difference between sex (p = 0.02). VUR cessation occurred in 80% of patients with grade I (median: 25.5 months), 66.6% grade II (median: 48 months), 40% grade III (median: 60 months), in 21% of bilateral (median: 48 months) and 75% of unilateral VUR (median: 28.5 months). There was statistic difference between the grade (p = 0.02) and laterality (p = 0.05) of the VUR. CONCLUSIONS: VUR cessation occurred in grade I or II and unilateral, in boys,

Vesico ureteral reflux; Evolução


ARTIGOS ORIGINAIS ORIGINAL ARTICLES

Freqüência de desaparecimento do refluxo vésico-ureteral de graus I a III em pacientes pediátricos

Vesicoureteral grade I to III reflux disappearance frequency in pediatric patients

Célia S. Macedo; Márcia C. Riyuzo; Herculano D Bastos

Disciplina de Nefrologia Pediátrica. Departamento de Pediatria. Faculdade de Medicina de Botucatu. Universidade do Estado de São Paulo. Rua Rubião Jr, s.n. Botucatu, SP, Brasil. CEP 18.618-970. E-mail: pediatri@fmb.unesp.br

RESUMO

OBJETIVOS: avaliar a freqüência do desaparecimento do refluxo vésico-ureteral (RVU) primário de graus I a III em crianças e correlacionar com idade no diagnóstico, sexo, grau e lateralidade.

MÉTODOS: estudo retrospectivo de 34 crianças com RVU diagnosticado por uretrocistografia miccional (UCM). Cinco pacientes eram meninos (mediana: um ano e seis meses) e 29 meninas (mediana: três anos) O exame controle pela UCM ou cistografia foi realizado em intervalos de 12 a 24 meses. Na análise das variáveis utilizou-se a curva de sobrevida de Kaplan-Meier.

RESULTADOS: o desaparecimento do RVU ocorreu em 52,9% dos pacientes. Comparando faixas etárias não houve diferença estatística. Nos meninos o desaparecimento do RVU ocorreu na mediana de 24 meses e nas meninas, de 60 meses. Houve diferença estatística entre os sexos (p = 0,02). Houve desaparecimento do RVU em 80% dos pacientes com RVU de grau I (mediana: 25,5 meses), 66,6% de grau II (mediana: 48 meses) 40% de grau III (mediana: 60 meses); em 21% no bilateral (mediana: 48 meses) e 75% no unilateral (mediana: 28,5 meses). Houve diferença estatística entre os graus de RVU (0,02) e lateralidade (p = 0,05).

CONCLUSÕES: o desaparecimento do RVU ocorreu no sexo masculino, nos graus I ou II e unilateral.

Palavras-chave: Refluxo vésico-ureteral, Evolução

ABSTRACT

OBJECTIVES: to evaluate the frequency of disappearance of primary vesicoureteral reflux (VUR) grade I to III in children and correlate with patient's age at diagnosis, sex, grade and laterality.

METHODS: a retrospective study of 34 children with VUR detected by voiding cystourethrography (VCU). Five patients were boys (median of age: one year and six months) and 29 were girls (median of age: three years). Control exams by VCU or IC were made in performed 12 to 24 months. Kaplan-Meier survival curves were used for analysis.

RESULTS: VUR cessation was observed in 52.9% of patients. Comparing age it was not observed statistic difference. VUR cessation occurred in a median of 24 months in boys and 60 months in girls. There was statistic difference between sex (p = 0.02). VUR cessation occurred in 80% of patients with grade I (median: 25.5 months), 66.6% grade II (median: 48 months), 40% grade III (median: 60 months), in 21% of bilateral (median: 48 months) and 75% of unilateral VUR (median: 28.5 months). There was statistic difference between the grade (p = 0.02) and laterality (p = 0.05) of the VUR.

CONCLUSIONS: VUR cessation occurred in grade I or II and unilateral, in boys,

Key words: Vesico ureteral reflux, Evolução

Introdução

O refluxo vésico-ureteral (RVU) é um evento anormal e constitui-se do retorno da urina da bexiga para o trato urinário superior.1,2 A infecção urinária é fator freqüente que leva à descoberta do RVU; estima-se que 35% de todas as crianças com infecção urinária sintomática apresentarão o RVU.3,4 Em crianças assintomáticas o RVU é diagnosticado em 0,5% a 1% dos pacientes.2

O RVU primário é congênito e não está associado com doença neuromuscular ou obstrução de vias urinárias baixas, mas decorrente do comprimento curto do ureter intravesical, que não é eficiente na sua ação anti-refluxo e que pode ser geneticamente determinado.2 O RVU secundário é conseqüente de patologias urológicas, cuja doença de base pode estar associada a obstrução uretral ou doença neuromuscular, como bexiga neurogênica e disfunção vesical.2

O diagnóstico do RVU é feito pelas investigações por imagem que incluem a uretrocistografia miccional (UCM) e a cistografia (CI) de medicina nuclear ou isotópica.2,4 Cada qual encerra vantagens e desvantagens. A UCM define a anatomia, permitindo uma classificação relativamente acurada do refluxo que, atualmente, é classificado nos graus de I a V.2,4,5 A CI não oferece essa avaliação, sendo o RVU referido como leve, moderado ou grave. Além disso, na UCM durante o esvaziamento da bexiga, a uretra pode ser visualizada em detalhe, sendo importante em meninos para o diagnóstico de válvula de uretra posterior.2,4 A principal vantagem da CI é reduzir apreciavelmente a irradiação das gônadas.4 A CI comparada a UCM apresenta maior sensibilidade no diagnóstico do RVU em crianças pequenas, mas este fato não está claro com relação às crianças maiores.6 Um estudo prospectivo relatou correlação de 70% entre CI e UCM, em 23% a CI foi positiva e UCM negativa e em 7% a UCM revelou refluxo de grau leve e a CI foi normal.7

A freqüência com que se diagnostica o RVU na criança varia inversamente com a idade.8 O refluxo associado à infecção urinária é comum em crianças jovens; foi observado em 70% de crianças menores de um ano, 25% das menores de quatro anos, 15% das menores de 12 anos e 5% dos adultos.9

As complicações do RVU nas crianças são episódios recorrentes de pielonefrite e a formação de cicatrizes renais. A avaliação pela cintilografia renal pelo dimercaptosuccinic acid (DMSA) de pacientes com RVU revelou presença de cicatrizes renais na metade dos casos; essa alta incidência pode estar associada ao atraso no diagnóstico.10 Essas crianças podem apresentar novas cicatrizes ou ampliação da área afetada, principalmente na vigência de infecção urinária.11 Torna-se fundamental a pesquisa de RVU em crianças com infecção urinária bem como a avaliação da presença de cicatrizes renais.

A Associação Americana de Urologia realizou uma revisão sobre tratamento do RVU a partir de artigos publicados no período entre 1965 a 1994 e recomendou antibióticos profiláticos contínuos como tratamento inicial de crianças com RVU de todos os graus; inclusive em crianças de um a cinco anos com RVU de graus IV e V sem cicatrizes renais.12 No seguimento dos pacientes com RVU de grau IV e V, a conduta cirúrgica é indicada caso ocorra a persistência do RVU.11 Em crianças com um a cinco anos de idade e RVU grau V com cicatrizes renais recomendaram o procedimento cirúrgico.12 A idade do paciente ao diagnóstico do RVU, a adesão ao tratamento e a presença de cicatrizes renais são fatores que influenciam o tratamento cirúrgico.

Estudos relatam que o RVU primário tende a se resolver espontaneamente em aproximadamente um terço dos casos em cada ano de seguimento.11-17

Dados sobre o tempo de desaparecimento do RVU não são unânimes, há diferenças quanto à classificação do grau do RVU; estudos relatam apenas a evolução do RVU dilatado de grau III e IV,14,16 outros consideraram todos os graus do RVU.11,13-15,17

Paralelo à discussão do tempo de desaparecimento do RVU, surge a questão do tempo da manutenção de profilaxia para evitar recorrência de pielonefrite nas crianças com RVU; preocupação que abrange os familiares bem como os médicos do paciente. Um texto de revisão sobre a instituição de quimioprofilaxia nas crianças com RVU relata que o uso de profilaxia com doses baixas de antimicrobiano em longo prazo comparado à correção cirúrgica do RVU não difere no prognóstico das crianças quanto ao desenvolvimento de dano renal crônico e de novas cicatrizes renais.18 Há também referência de autores não recomendando a profilaxia nas crianças com RVU graus I e II, porém recomendando profilaxia nos altos graus de RVU.18 Em outro estudo, autores relataram que nas crianças com qualquer grau de RVU e submetidas à descontinuidade da quimioprofilaxia na idade média de oito anos, ocorreu desaparecimento do RVU em 19,6% dos pacientes e a recorrência da infecção urinária em 11,8% dos casos, sugerindo a descontinuidade da quimioprofilaxia em casos selecionados de RVU.19 Em vista da necessidade de mais estudos que esclareçam a melhor forma de conduzir os casos de RVU, há recomendação pela manutenção da quimioprofilaxia em toda criança com RVU primário, independente do grau do RVU, enquanto ele estiver presente.18

Pela alta incidência de RVU em crianças com infecção urinária (no Serviço foi observada a incidência de 43,4% de RVU primário10) dos fatos relatados acima e considerando que os pacientes com RVU necessitam de seguimento contínuo, o objetivo do presente estudo foi avaliar a freqüência do desaparecimento do RVU primário de grau I a III em crianças e correlacionar o desaparecimento do RVU com a idade do paciente no diagnóstico, o sexo, o grau e a lateralidade do RVU.

Métodos

Estudo retrospectivo de 34 pacientes com RVU primário acompanhados no Ambulatório da Disciplina de Nefrologia Pediátrica do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina de Botucatu, São Paulo, Brasil, da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", no período de 1994 a 2001.

Cinco pacientes eram do sexo masculino com idade entre três meses a um ano e sete meses (mediana de um ano e seis meses) e 29 do sexo feminino com idade entre sete meses a nove anos e três meses (mediana de três anos). Todas as crianças foram mantidas com profiláticos até o desaparecimento do RVU; 23 receberam ácido nalidíxico, sete nitrofurantoína e quatro cefalexina.

Critérios de inclusão: crianças com RVU primário de grau I a III em tratamento clínico com antibiótico ou quimioterápico profilático que apresentavam exames seqüenciais, UCM ou CI, realizados em período acima de um ano de tratamento contínuo.

Critérios de exclusão: crianças com RVU secundário, como válvula de uretra posterior, bexiga neurogênica, Síndrome de Prune Belli, com instabilidade vesical.

Estudo por imagem

O diagnóstico do RVU foi realizado pela UCM e o grau do RVU foi classificado de acordo com classificação Internacional do RVU.5 A UCM foi realizada no período mínimo de quatro semanas após tratamento da infecção urinária. Na avaliação do desaparecimento do RVU foram utilizados a UCM ou CI. Isso se deveu ao fato de o trabalho ser retrospectivo e de período longo como observado em outros estudos;11,14 também a CI está sendo, desde 1998, o método preferido de avaliação no Serviço pelas suas vantagens de maior sensibilidade e menor exposição à irradiação das gônadas.4,6,7 O exame controle pela UCM ou CI foi realizado em intervalos de 12 a 24 meses. O intervalo de tempo entre o primeiro e o último exame para avaliação do desaparecimento do RVU foi de 12 a 60 meses (média 32,4 ± 13,2 meses); 20 realizaram UCM (tempo médio = 32,4 ± 13,2 meses) e 14 a CI (tempo médio = 31,2 ± 12,0 meses). A UCM foi realizada em oito pacientes com RVU bilateral e em 12 com RVU unilateral. A CI foi realizada em seis pacientes com RVU bilateral e em oito com RVU unilateral. A idade do paciente no exame controle pela UCM foi 2,0 a 9,5 anos no RVU de grau I, 2,0 a 9,0 anos no de grau II e 3,6 a 13,3 anos no de grau III; e dos pacientes avaliados pela CI foi 3,2 a 5,9 anos no RVU de grau I, 3,5 a 11,0 anos no de grau II e 2,8 a 9,6 anos no de grau III. Uma menina com RVU bilateral de grau I à direita e IV à esquerda, previamente submetida à cirurgia para nefrectomia do rim esquerdo iniciou o seguimento com seis anos e seis meses e foi incluída no grupo de RVU unilateral. Desaparecimento do RVU foi considerado como ausência do RVU no exame controle (UCM ou CI). Os resultados foram considerados a partir do primeiro e último estudos.

Análise estatística

Os parâmetros avaliados foram: idade ao diagnóstico do RVU (menor de um ano, entre um e um ano e 11 meses, entre dois e três anos e 11 meses e maior de quatro anos), sexo, grau do RVU (I, II e III) e lateralidade do RVU (unilateral ou bilateral). Nos pacientes com RVU bilateral foi considerado o maior grau de RVU.

Para comparação dos parâmetros estudados entre os pacientes que apresentaram e os que não apresentaram desaparecimento do RVU utilizou-se a curva de sobrevida de Kaplan-Meier, com o teste log-rank. Os testes estatísticos foram realizados com auxílio de um programa de computador intitulado SAS para PC, versão 6,12 (SAS Institute, Cary, NC).

A significância estatística foi definida como p <0,05.

O trabalho foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu da São Paulo, Brasil, da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho".

Resultados

A Tabela 1 apresenta a faixa etária no diagnóstico do RVU, grau e lateralidade do RVU dos pacientes. Na UCM inicial, RVU bilateral foi observado em 41,2% (14/34) dos pacientes. Observou-se predomínio do RVU de grau III em 55,9% (19/34) dos casos. Dez pacientes com RVU grau III eram menores de dois anos de idade.

A evolução do RVU nas unidades renais está representada na Tabela 2. O total de unidades renais com RVU foi 48; 28 unidades renais foram avaliadas pela UCM e 20 pela CI. A proporção de unidades renais com RVU de graus I, II ou III avaliada pela UCM ou CI foi semelhante (p = 0,21). O tempo médio de desaparecimento do RVU nas unidades renais foi de 31,62 ± 10,46 meses. Comparando-se os métodos UCM e CI, em relação ao desaparecimento do RVU de graus I, II ou III das unidades renais nas faixas etárias <1 ano, entre um ano a um ano e 11 meses, entre dois anos a três anos e 11 meses e > 4 anos, não se observou diferença estatística significativa (p = 0,25).

A Tabela 3 apresenta o método de avaliação do RVU, a faixa etária ao diagnóstico do RVU, o sexo, o grau e a lateralidade do RVU dos pacientes.

Em 18 pacientes (52,9%) observou-se o desaparecimento do RVU. Nestes a avaliação pela UCM foi realizada em três pacientes com RVU bilateral e em nove com RVU unilateral; e pela CI em seis pacientes com RVU unilateral. As probabilidades estimadas de persistência do RVU nos pacientes submetidos à avaliação do RVU pela UCM ou CI no período de observação foram de 39,91 ± 4,02% na UCM e de 45,32 ± 5,54% na CI. Essa diferença não atingiu significância estatística pela análise de log-rank (p = 0,70).

Em relação à idade do paciente no diagnóstico do RVU. A mediana de tempo do desaparecimento do RVU nos pacientes menores de um ano foi de 36 meses, na idade entre um ano e um ano e 11 meses foi de 48 meses, na idade entre dois anos a três anos e 11 meses foi de 28,5 meses e na idade acima de quatro anos foi de 60 meses. As probabilidades estimadas de persistência do RVU no período de observação foram de 40,04 ± 6,92% na faixa etária menor de um ano, de 39,06 ± 3,83% entre um ano e um ano e 11 meses, de 27,75 ± 1,52% entre dois a três anos e 11 meses e de 47,14 ± 5,27% acima de quatro anos. Essa diferença não atingiu significância estatística pela análise de log-rank (p = 0,54). Doze pacientes (35,29%) tiveram o diagnóstico de RVU com a idade acima de quatro anos.

O desaparecimento do RVU nos meninos ocorreu na mediana de tempo de 24 meses e nas meninas, de 60 meses. As probabilidades estimadas de persistência do RVU no período de observação foram de 28,80 ± 6,11% no sexo masculino e 44,33 ± 3,62% no feminino. Essa diferença atingiu significância estatística pela análise de log-rank (p = 0,02). Tal comparação pode ser observada na Figura 1.


Observou-se desaparecimento do RVU em 53,8% (7/13) dos ureteres com RVU de grau I, em 63,6% (7/11) de grau II e em 50,0% (12/24) de grau III. Em três pacientes com RVU bilateral de grau I e II, de I e III e de II e III, observou-se o desaparecimento do RVU no ureter com RVU de menor grau.

Em relação aos pacientes, o desaparecimento do RVU foi observado em 80% dos pacientes com RVU de grau I (4/5), em 66,6% com RVU grau II (6/9) e em 40 % com RVU III (8/20). Uma criança com RVU unilateral apresentou, no período de avaliação de três anos, redução do grau de III para I. A mediana do tempo de desaparecimento do RVU de grau I foi de 25,5 meses, de grau II foi de 36 meses e de grau III foi de 60 meses. As probabilidades estimadas de persistência do RVU nos pacientes no período de observação foram de 25,50 ± 4,33% no RVU de grau I, 36,31 ± 5,70% no grau II e 46,61 ± 4,30% no grau III. Essa diferença atingiu significância estatística pela análise de log-rank (p = 0,02). Tal comparação pode ser observada na Figura 2.


Quanto à lateralidade o desaparecimento do RVU ocorreu em 21% dos pacientes (3/14) com RVU bilateral e em 75% (15/20) com RVU unilateral. A mediana de tempo de desaparecimento do RVU no RVU unilateral foi 28,5 meses e no bilateral foi 48 meses. As probabilidades estimadas de persistência do RVU no período de observação foram de 35,91 ± 3,80% no RVU unilateral e 42,20 ± 2,00% no bilateral. Essa diferença atingiu significância estatística pela análise de log-rank (p = 0,05). Tal comparação pode ser observada na Figura 3.


A recorrência de infecção urinária foi observada em 11 (32,3%) pacientes; nove crianças apresentaram um episódio de infecção urinária em seis meses e duas crianças, dois episódios em seis meses. Em sete crianças a infecção urinária foi causada pela E coli, em uma pelo gênero Proteus sp, em uma por Klebsiella sp e em duas pela Pseudomonas sp. Dentre as 11 crianças que apresentaram infecção urinária, sete tinham RVU de grau III e quatro tinham RVU de grau II. Das sete crianças com RVU de grau III que apresentaram infecção urinária, em três houve persistência do RVU.

Discussão

Grandes estudos retrospectivos relatam que o RVU primário de grau moderado (graus I a III) apresenta resolução espontânea na freqüência de 80% dentro de cinco anos do diagnóstico.13,16 O segmento ureteral intra-mural cresce com a idade e a melhora progressiva seguida de cura espontânea do refluxo pode ser esperada na maioria dos pacientes, especialmente nos casos de refluxo de baixo grau.1

O desaparecimento do RVU pode ser avaliado por dois exames consecutivos de UCM ou CI11,15,16 ou por um exame, UCM ou CI, posterior negativo como definimos em nosso estudo.17,20

A freqüência de desaparecimento do RVU é descrita em relação ao número de ureteres ou de pacientes com RVU que apresentaram desaparecimento do refluxo.21 No período de 2 a 22 anos, 49% a 83% de ureteres apresentam desaparecimento do RVU.11,14,15,22-25 No período de 2 a 38 anos, desaparecimento do refluxo ocorreu em 15% a 80% de crianças ou adolescentes.9,14,16,22,24-28 Em nossa casuística a porcentagem de pacientes e do número de ureteres que apresentaram resolução do RVU foi semelhante ao descrito na literatura.15,16,25-28

Em crianças menores de cinco anos no início do seguimento que apresentavam RVU de grau III e IV, o desaparecimento do RVU no período de 5 e 10 anos, esteve significativamente associado à idade no início do seguimento.16 Outros autores relataram que o desaparecimento do RVU de graus I a V não esteve associado à idade no diagnóstico,15,17,29 resultados semelhantes ao presente trabalho.

Um percentual de 75% de crianças com suspeita de alteração renal no ultra-som pré-natal e com RVU diagnosticado pós-natal, sob tratamento clínico, apresentaram resolução do RVU em 100% de ureteres com RVU de grau I/II, em 50% de grau III e em 66,6% de grau IV/V durante dois anos de avaliação.24

Em crianças com diagnóstico de RVU no primeiro ano de vida, sob tratamento clínico, o desaparecimento espontâneo do RVU ocorreu em 100% no RVU de grau I, 86,7% no de grau II e 81,6% no de grau III no período entre um a dois anos de seguimento.20 Os autores sugerem que o RVU identificado precocemente tem história evolutiva diferente e melhor prognóstico. Observamos o desaparecimento do RVU em 75% dos pacientes com diagnóstico no primeiro ano de vida e também observamos que o diagnóstico do RVU foi tardio, em 35% dos pacientes com idade acima de quatro anos. Salienta-se a necessidade de investigação do RVU em crianças com infecção urinária febril.18,29

Um estudo de crianças com a mediana de idade de 0,3 anos meninos e 2,2 anos em meninas revelou maior persistência do RVU em meninas,17 resultado semelhante ao obtido neste estudo. Outros autores descreveram que o sexo não influenciou na porcentagem de desaparecimento do RVU.11,14 No presente trabalho o desaparecimento do RVU ocorreu em todos os meninos; esse fato pode estar associado ao diagnóstico do RVU realizado no primeiro ano de vida nesses pacientes20,24 ou da prevalência do RVU de grau I ou II unilateral.7,11,16,20,22

O grau do RVU tem influência sobre o seu desaparecimento. O período para a cura espontânea do refluxo é maior no RVU de graus maiores.13,16,17,22,24,25 Após cinco anos de seguimento, observou-se 80% de cura no RVU de grau II e 46% no de grau III.21 Autores comparando pacientes com RVU de grau I, II e III, relataram maior prevalência de resolução apenas do RVU de grau I quando comparado ao RVU de grau III.17 Outros autores descreveram maior incidência de desaparecimento do RVU de grau I-II comparado ao de grau III a V,11,16,22 fato que observamos em nosso estudo.

Os dados de literatura indicam que o grau do RVU tem significância na evolução para o seu desaparecimento, não se observando diferença se o refluxo é unilateral ou bilateral.11,17 Nos pacientes com RVU III ou IV observou-se persistência significativamente maior do RVU quando esse era bilateral.14,16 Em nosso estudo, observamos persistência significativamente maior do RVU bilateral mesmo nos de grau I e II.

A persistência do RVU pode ser fator de recorrência de infecção urinária.18,21 É sugerida a manutenção de quimioprofiláticos nos portadores de RVU até que ocorra o seu desaparecimento.18 No seguimento de pacientes com RVU é fundamental o esclarecimento das famílias e do paciente para manterem adesão ao uso prolongado de medicações profiláticas bem como a realização de exame de cultura de urina.

Neste estudo tivemos menor número de meninos e em faixa etária menor de dois anos em relação às meninas e utilizamos dois exames diferentes na avaliação do controle do RVU, fatos que podem limitar o estudo. Entretanto, no período médio de 36 meses, 53% dos pacientes com RVU de grau I a III, em tratamento clínico, apresentaram desaparecimento do refluxo. O desaparecimento do RVU ocorreu principalmente nas crianças do sexo masculino, no RVU de graus I ou II e no RVU bilateral. Sugere-se a manutenção de quimioprofilaxia, exames de cultura de urina a cada dois meses ou se o paciente apresentar febre ou outra sintomatologia indicativa de infecção urinária e realização de pesquisa da presença de refluxo utilizando-se UCM ou CI após período mínimo de dois anos de seguimento.

Recebido em 2 de dezembro de 2003

Versão final apresentada em 10 de maio de 2004

Aprovado em 28 de julho de 2004

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Nov 2004
  • Data do Fascículo
    Set 2004

Histórico

  • Aceito
    28 Jul 2004
  • Revisado
    10 Maio 2004
  • Recebido
    02 Dez 2003
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