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Pressões respiratórias máximas de pico e sustentada na avaliação da força muscular respiratória de crianças

Maximum peak and sustained respiratory pressures in the assessment of respiratory muscular strength in children

Resumos

OBJETIVOS: comparar os valores de PImax e PEmax de pico e sustentado em uma população de crianças em idade escolar. MÉTODOS: estudo observacional descritivo de caráter transversal. Foram avaliadas 144 crianças saudáveis de 7 a 11 anos de ambos os gêneros. Foirealizada avaliação antropométrica e mensuraçãodas pressões respiratórias máximas, de pico e sustentada, através do manovacuômetro digital. A criança sorteou qual pressão respiratória iria realizar inicialmente. A medida da PImax foi realizada a partir da capacidade pulmonar total e a medida da PEmax a partir do volume residual. Os dados foram analisados através do programa SPSS 17.0 atribuindose o nível de significância de 5%. RESULTADOS: os achados obtidos foram: 78,53 ± 22,53 cmH2O para PIpico ; 91,11 ± 23,0 cmH2O para a PEpico e 72,95 ± 21,22 cmH2O e 86,25 ± 21,8 cmH2O para PIsust e PEsust, respectivamente. Osvalores obtidos através das pressões respiratórias de pico (PIpico e PEpico) foram significativamente superiores as medidas obtidas para as pressões respiratórias sustentadas (PIsust e PEsust) independentemente do gênero ou idade avaliada (p=0,001). CONCLUSÕES: a utilização de medidas de pico na avaliação das pressões respiratórias máximas, mais facilmente obtidas na prática clínica, pode comprometer a real mensuração da força muscular respiratória em crianças de 7 a 11 anos.

Criança; Músculos respiratórios; Força muscular


OBJECTIVES: to compare peak and sustained values of PImax and PEmax in a sample of schoolaged children. METHODS: a descriptive observational crosssection analysis. 144 healthy boys and girls between the ages of 7 and 11 were evaluated. An anthropometric assessment was performed and measurements of peak and sustained respiratory muscle strength with the use of a digital manometer. The child chose at random what initial respiratory pressure to hold. The measurement of PImax was taken from total lung capacity and the measurement of PEmax from residual volume. Data was analyzed using SPSS 17.0 and was attributed a significance level of 5%. RESULTS: the following findings were produced bythe study: 78.53 ± 22.53 cmH2O for PIpeak and 72.95 ± 21.22 cmH2O and 86.25 ± 21.8 cmH2O for PIsust and PEsust respectively. The values obtained throughpeak respiratory pressures (PIpeak and PEpeak) were significantly higher than the measurements obtained for sustained respiratory pressures (PIsust and PEsust)regardless of gender or age assessment (p=0.001). CONCLUSIONS: the use of measures in assessing peak maximum respiratory pressure, more easily obtained in clinical practice, may undermine the real measurements of respiratory muscle strength in children between 7 and 11 years of age.

Child; Respiratory muscles; Muscle strength


ARTIGOS ORIGINAIS ORIGINAL ARTICLES

Pressões respiratórias máximas de pico e sustentada na avaliação da força muscular respiratória de crianças

Maximum peak and sustained respiratory pressures in the assessment of respiratory muscular strength in children

Laise Chaves de Oliveira; Tânia Fernandes Campos; Raíssa de Oliveira Borja; Gabriela Suéllen da Silva Chaves; Renata Nóbrega Delgado; Raquel Emanuele de França Mendes; Karla Morganna Pereira Pinto de Mendonça

Departamento de Fisioterapia. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Av. Senador Salgado Filho, 3000. Campus Universitário. Lagoa Nova. Natal, RN, Brasil. CEP: 59.151600. Email: kmorganna@ufrnet.br

RESUMO

OBJETIVOS: comparar os valores de PImax e PEmax de pico e sustentado em uma população de crianças em idade escolar.

MÉTODOS: estudo observacional descritivo de caráter transversal. Foram avaliadas 144 crianças saudáveis de 7 a 11 anos de ambos os gêneros. Foirealizada avaliação antropométrica e mensuraçãodas pressões respiratórias máximas, de pico e sustentada, através do manovacuômetro digital. A criança sorteou qual pressão respiratória iria realizar inicialmente. A medida da PImax foi realizada a partir da capacidade pulmonar total e a medida da PEmax a partir do volume residual. Os dados foram analisados através do programa SPSS 17.0 atribuindose o nível de significância de 5%.

RESULTADOS: os achados obtidos foram: 78,53 ± 22,53 cmH2O para PIpico ; 91,11 ± 23,0 cmH2O para a PEpico e 72,95 ± 21,22 cmH2O e 86,25 ± 21,8 cmH2O para PIsust e PEsust, respectivamente. Osvalores obtidos através das pressões respiratórias de pico (PIpico e PEpico) foram significativamente superiores as medidas obtidas para as pressões respiratórias sustentadas (PIsust e PEsust) independentemente do gênero ou idade avaliada (p=0,001).

CONCLUSÕES: a utilização de medidas de pico na avaliação das pressões respiratórias máximas, mais facilmente obtidas na prática clínica, pode comprometer a real mensuração da força muscular respiratória em crianças de 7 a 11 anos.

Palavras-chave: Criança, Músculos respiratórios, Força muscular

ABSTRACT

OBJECTIVES: to compare peak and sustained values of PImax and PEmax in a sample of schoolaged children.

METHODS: a descriptive observational crosssection analysis. 144 healthy boys and girls between the ages of 7 and 11 were evaluated. An anthropometric assessment was performed and measurements of peak and sustained respiratory muscle strength with the use of a digital manometer. The child chose at random what initial respiratory pressure to hold. The measurement of PImax was taken from total lung capacity and the measurement of PEmax from residual volume. Data was analyzed using SPSS 17.0 and was attributed a significance level of 5%.

RESULTS: the following findings were produced bythe study: 78.53 ± 22.53 cmH2O for PIpeak and 72.95 ± 21.22 cmH2O and 86.25 ± 21.8 cmH2O for PIsust and PEsust respectively. The values obtained throughpeak respiratory pressures (PIpeak and PEpeak) were significantly higher than the measurements obtained for sustained respiratory pressures (PIsust and PEsust)regardless of gender or age assessment (p=0.001).

CONCLUSIONS: the use of measures in assessing peak maximum respiratory pressure, more easily obtained in clinical practice, may undermine the real measurements of respiratory muscle strength in children between 7 and 11 years of age.

Key words: Child, Respiratory muscles, Muscle strength

Introdução

A avaliação da força muscular é absolutamenteimportante para sabermos a capacidade do músculo ventilatório para realizar contração efetiva e efetivo trabalho muscular. A compreensão da relação existente entre força muscular e a pressão gerada é considerada complexa, uma vez que a medida da pressão depende da conformação e características da caixa torácica e da parede abdominal, que estão intimamente relacionadas com a força dos músculos respiratórios.1 O instrumento clássico para medir, ao nível da boca, as pressões respiratórias estáticas máximas – pressão inspiratória máxima (PI) e maxpressão expiratória máxima (PEmax) – é o manovacuômetro, podendo ser analógico ou digital, que conectase ao indivíduo em teste através de um tubo cilíndrico onde se encaixa uma peça bucal por onde são realizados esforços expiratórios ou inspiratórios.2,3

De acordo com alguns autores,4,5 a pressão de pico referese ao valor mais elevado durante a manobra, enquanto que a pressão sustentada pode ser interpretada como a pressão média máxima (Psust), definida como o valor máximo de pressão, ao redor da pressão de pico (Ppico), durante o tempo de um segundo. Estes autores defendem que o valor mais fidedigno para se obter as pressões respiratórias máximas (PRMs) é através do valor sustentado durante o primeiro segundo da medida.1 O tempo de sustentação da manobra pode variar, de acordo com os autores, desde pelo menos um segundo a pelo menos três segundos.2,6-9

Pacientes que apresentam desordens neuromusculares podem apresentar perda de força dos músculos respiratórios e, portanto, a avaliação da força dos músculos respiratórios nestes pacientes deve fazer parte da rotina.10 Para estes pacientes, assim como para os pacientes que se encontram em desmame da ventilação mecânica já está bem conceituado, devido a pequena capacidade de sustentação destes pacientes, a utilização do valor de pico para o teste da força feito através do manovacuômetro.11

Existem estudos com o objetivo de testar a força muscular respiratória em crianças a fim de se obter um valor de normalidade. Contudo, ainda existem divergências entre os autores com relação ao momento específico para análise gráfica (pressão x tempo) para identificar a pressão respiratóriamáxima. Em geral, os estudos de avaliação da força muscular respiratória, recomendam no mínimo um segundo de sustentação durante a realização das manobras para obtenção das pressões respiratórias máximas, mas não apresentam claramente o momento exato em que estas são mensuradas.11 Dentro deste grupo de ressalvas, a maioria dos estudos feitos com crianças considera como valor da pressão respiratória máxima o valor de platô,12-14 que se refere ao intervalo de um segundo, imediatamente após o pico de pressão, no qual é exercida a máxima pressão com a menor variabilidade.3,4 Contudo, o valor platô é consideravelmente menor do que o valor de pico e até mesmo da pressão sustentada de acordo com a curva pressão x tempo1,3 podendo subestimar os valores reais de força obtidos pelo indivíduo.

Devese também levar em consideração que a maioria dos equipamentos utilizados na prática clínica, nos consultórios e hospitais é de manovacuômetros analógicos, considerados de baixo custo, quando comparados com os equipamentos digitais. Esses equipamentos apresentam a limitação de mensurar pontualmente a pressão inspiratória e expiratória máxima e não da curva de pressão exercida pelo sujeito.15 Em outras palavras, apresentam a pressão de pico o que também acontece com alguns aparelhos digitais onde há apenas um transdutor de pressão e um sistema de gravação do valor mais altoobtido durante a manobra. Até mesmo, equipamentos mais modernos como o desenvolvido por Hamnegard et al.,4 em estudo realizado no Reino Unido (Precision Medical, UK),4 em que se consegue o registro da pressão sustentada, este valor só é mensurado para sustentações maiores que 1,5s. Em sustentações inferiores a este tempo, o equipamento registra apenas o valor da pressão de pico.

Apesar de ser notório que as pressões respiratórias máximas de pico podem ser obtidas maisfacilmente, que as pressões sustentadas, e com instrumentos mais acessíveis, ainda existem dúvidas sobre a validade da utilização destas pressões na avaliação da força muscular respiratória na população infantil. Ainda inexiste evidência científica suportada em estudos que tenham comparado, em amostras de crianças, estes dois níveis de pressão durante a avaliação da força muscular respiratória. Portanto o propósito deste estudo foi comparar os valores de pico com a pressão sustentada obtida durante a avaliação das pressões respiratórias máximas de crianças saudáveis realizado com o manovacuômetro digital.

Métodos

Trata-se de um estudo observacional descritivo de caráter transversal, o qual foi aprovado pelo do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 278/2009, e realizado de acordo com a Declaração de Helsinki.Todos os pais ou responsáveis assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).

Participaram do estudo crianças, de ambos os sexos, com faixa etária compreendida entre 07 e 11 anos e que se encontravam matriculadas no ensino fundamental em escolas públicas da rede estadual e privada de ensino do município do Natal/RN. Foram incluídas na amostra crianças que não apresentavam diagnóstico de doença pulmonar crônica, cardiovascular ou neuromuscular;9 história de traumatismo recente de vias aéreas superiores, tórax ou abdome;3 ter apresentado febre (três semanas)2,3 e gripe e/ou resfriado na semana anterior ao procedimento;3,6 história de tabagismo;2,3,6 evidente deformidade torácica;3,6 problema agudo do ouvido médio;3 hérnia abdominal;3 glaucoma ou deslocamento de retina;3 presença de comprometimento neurológico e/ou incompreensão das orientações necessárias para a realização da manovacuometria;3,9 tivessem fazendo uso de medicações como glicocorticóides inalatórios ou sistêmicos, mineralocorticóides, estimulantes do sistema nervoso central, barbitúrios ou relaxantes musculares;9 percentil menor que 5 e maior que 85 na curva do índice de massa corporal(IMC) em relação à idade e ao sexo, proposta peloNational Center for Health Statistics (NCHS).16

Os limites de idade foram estipulados conforme o artigo 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente(1990),17 o qual considera criança a pessoa até 12 anos incompletos. Já a idade mínima foi determinada de acordo com a capacidade de compreensão e realização correta das manobras.12

Foram consideradas perdas amostrais as crianças que se recusaram e/ou desistiram de participar da avaliação, não compreenderam os comandosnecessários à realização da avaliação ou que apresentaram alguma doença aguda do trato respiratóriodurante o período de coleta.

Para a seleção dos sujeitos foi realizado inicialmente um contato com a 1ª Diretoria Regional de Educação (DIRED) para obtenção da anuência e listagem de todas as escolas de ensino fundamentalda rede pública estadual do município de NatalRN. Posteriormente, foi solicitada ao departamento de estatística da Secretaria Estadual de Educação/RN uma listagem (dados do Educasenso 2009) com informações referentes à quantidade de alunos, divididos por sexo e idade, de cada escola pública e privada que possuíssem turmas do ensino fundamental. A partir daí, foi realizado um sorteio das escolas proporcional ao número de escolas pertencentes a cada rede de ensino totalizando 27 escolas, valor correspondente a 10% do total de escolas da cidade.

Em seguida, os diretores das escolas sorteadas, foram contatados a fim de obter a anuência e listagem dos alunos. Os dados foram coletados no período entre novembro de 2009 e outubro de 2010. Em cada escola foram sorteados 50 alunos distribuídos por sexo e faixa etária estudada, (onúmero sorteado foi escolhido com uma margem de segurança de perdas) os quais receberam uma carta para os pais contendo um termo de ConsentimentoLivre e Esclarecido explicando o objetivo, a importância e os procedimentos do trabalho, uma ficha de avaliação sobre a criança a respeito do estado de saúde da mesma para os pais das crianças responderem, além de recomendações para o dia da avaliação, como não realizar atividade física extenuante um dia antes da avaliação, ir com roupa confortável e não ter realizado refeição volumosa pelo menos três horas antes dos procedimentos.2,6

Em um segundo contado com a criança ocorreu a devolução do termo de Consentimento Livre e Esclarecido, bem como, a ficha de avaliação respondida. Após a análise da documentação foram identificadas as crianças elegíveis para o estudo. Devese ressaltar que mesmo quando o responsável assinava o termo de consentimento, se a criança recusavase a participar a vontade da mesma foi respeitada.

Na avaliação, foi utilizada ficha de avaliação prévia padronizada para coletar dados pessoais, antropométricos, informações obtidas da avaliação respiratória e registrar as pressões inspiratórias e expiratórias máximas.

O instrumento utilizado para avaliação do peso corporal foi uma balança digital (Personal Scale QIE 2003B, China). A altura foi mensurada utilizandose uma fita métrica de 150 centímetros (cm), fixada na parede a 50 cm do chão. A fórmulade peso/altura2 foi utilizada para calcular o índice de massa corporal. A partir dos gráficos específicos para cada sexo, calculouse o percentil para idade.16

O equipamento utilizado na realização das medidas das pressões máximas foi o manovacuômetro digital MVD300 (Globalmed®, PortoAlegre, RS, Brasil), calibrado de 300 a +300 cmH2O, com precisão de 1 cmH2O, o qual contém um tubo de silicone de 50 cm, acoplado a um filtro descartável biológico (Vida Tecnologia Biomédica, São Paulo, SP, Brasil), o qual possui uma membrana hidrofóbica bacteriana. O bocal padronizado para este estudo apresentava extremidade achatada de material plástico rígido (Globalmed®, Porto Alegre, RS, Brasil), com orifício de dois mm de diâmetro na parte superior para dissipar pressões adicionais causadas pela contração dos músculos faciais. Este se encontrava acoplado ao manuvacuômetro através de uma peça plástica denominada rescal, a qual possui um orifício que conecta o sistema com o ar ambiente. Em todas as medidas realizouse a utilização de um clipe nasal para evitar o escape de ar. Aavaliação foi realizada com o manovacuômetro conectado a um computador utilizando um conversor externo USB para porta Serial RS232 (Comtac, Brasil). Através do software de aquisição de dados (versão 1.5) do equipamento a criança recebeu feedback visual e auditivo.

As medições das pressões, inspiratória e expiratória, máximas foram realizadas de acordo com o método proposto por Souza,3 por um único avaliador treinado previamente.Acriança sorteou qual pressão respiratória iria realizar inicialmente através de dois cupons iguais onde no verso estava escrito PI e PE. Durante a medição da PImax a criança respirou normalmente através do bocal; durante três ciclos respiratórios, em seguida foi solicitado que realizasse uma expiração máxima.Através de um gesto previamente combinado, o escolar indicava o momento em que chegava ao fim da expiração máxima. Nesse momento, o avaliador ocluía o orifício do rescal. Em seguida, a criança efetuava um esforço inspiratório máximo, contra a via aérea ocluída, próximo à capacidade pulmonar total.Durante a medição da PEmax, foi dada orientação semelhante. No entanto, inicialmente o participanteinspirava até alcançar sua capacidade pulmonar total e, em seguida, efetuava um esforço expiratóriomáximo, contra a via aérea ocluída.3 Para avaliação da PEmax foi realizado compressão dos lábios e bochechas evitando perda da pressão respiratória para fora do bocal.18 Para realização do teste o paciente, permaneceu sentado confortavelmente, formando um ângulo de 90º de quadril e com as costas apoiadas na cadeira.

Foram realizadas no máximo nove manobras para cada tipo de pressão respiratória medidas,13 contendo no mínimo três manobras aceitáveis e duas reprodutíveis entre as aceitáveis, foi utilizada a maior delas. Entre uma medida e outra foi dado um minuto de descanso e cinco minutos de descanso entre a medição da PImax e PEmax. A avaliação da força muscular respiratória, através das pressões respiratórias máximas, é considerada uma avaliação válida e confiável.19 Na população infantil, os estudos que utilizaram este método datam desde 1964.20 Posteriormente, diversos autores propuseram valores de normalidade e/ou equações preditivas para a força muscular respiratória de crianças e adolescentes através da manovacuometria digital e/ou analógica.7,12,13

Foram avaliadas a pressão arterial, frequênciacardíaca e saturação periférica de oxigênio, da criança antes de iniciar o teste, imediatamente após a primeira medida sorteada, antes da segunda medição e imediatamente após a segunda medida. Estes parâmetros foram utilizados como critério para interrupção da avaliação, caso as crianças apresentassem valores inferiores a 80% do previsto.21

O equipamento MVD300 da Globalmed® utilizado para este estudo, só fornece diretamente os valores de pressão de pico. Diante disso, os valores das pressões médias máximas foram determinados através da análise da curva pressão versus tempo fornecido pelo software do manovacuômetro. Posteriormente, os valores obtidos a partir destes gráficos foram exportados para o programa Microsoft Office Excel 2007 e analisados de acordo com o protocolo estabelecido pelo pesquisador.

Os dados da amostra foram analisados através do SPSS 17.0 (Statistical Package for the SocialScience) atribuindose o nível de significância de 5%. A estatística descritiva foi realizada através de médias e desviospadrões. O teste de KolmogorovSmirnov foi utilizado para testar a normalidade dos dados, sendo encontrada distribuição normal para as variáveis, peso, altura, percentil, IMC, PIsust, PIpico, PEsust, PEpico.

O teste t de Student pareado foi utilizado para comparar os valores de PImax e PEmax de pico com o sustentado tanto nos meninos como nas meninas. Para comparar as pressões respiratórias máximas de pico entre os meninos e meninas que compuseram a amostra foi utilizado o teste t'Student nãopareado. Este mesmo teste também foi utilizado para comparar a pressão sustentada e as variáveis independentes (peso, altura e IMC) entre os gêneros. Considerando que o poder de um estudo é definido como a capacidade que o mesmo tem para demonstrar uma diferença estatisticamente significante, (ou "efeito") foi calculado o tamanho do efeito através do cálculo de Cohen's para as comparações entre as pressões inspiratórias e expiratórias máximas, de pico e sustentadas, entre crianças de mesmo sexo e sexos diferentes.

Resultados

Participaram do estudo 157 crianças, das quais quatro recusaram participar, cinco foram perdas amostrais por não compreenderem o comando solicitado, três por não conseguirem realizar as três manobras aceitáveis e duas reprodutíveis dentro de no máximo nove manobras como requerido pela metodologia do estudo e um por apresentar febre durante o período de avaliação. A amostra total foi composta, portanto, por 144 crianças (52 de escolas públicas e 92 de escolas particulares). Destas, 63 eram do sexo masculino e 81 do sexo feminino.

Na Tabela 1 observase a comparação das variáveis independentes (peso, altura e IMC) entre os gêneros. A Tabela 2 apresenta a distribuição da amostra de acordo com o sexo e a idade. Em média os meninos tinham 9 ± 1,2 anos e as meninas 8,7 ± 1,2 anos. As crianças avaliadas apresentaram 30,21 ± 5,66 kg de peso; 1,35 ± 0,09 m de altura, respectivamente. Em média as pressões respiratórias de pico foram 78,53 ± 22,53 cmH2O para PIpico e 91,11 ± 23,0 cmH2O para a PEpico. As medidas obtidas para as pressões respiratórias máximas sustentadas foram 72,95 ± 21,22 cmH2O e 86,25 ± 21,8 cmH2O para PIsust e PEsus, respectivamente de forma que as pressões de pico foram significativamente maiores que os valores obtidos de pressão sustentada tantopara medidas de PI como para medidas de PE.

A Tabela 3 apresenta os valores médios acompanhados do desviopadrão das pressões respiratórias máximas. No sentido horizontal é possívelobservar a diferença entre os valores das pressões de pico e sustentadas entre crianças de mesmo sexo e as linhas verticais mostram a comparação entre meninas e meninos para as pressões inspiratórias e expiratórias de pico e sustentadas.

Discussão

Os achados do presente estudo demonstraram que a pressão de pico facilmente obtida através dos instrumentos de medida da pressão inspiratória e expiratória máximas, analógicos e digitais, podem ser significativamente superiores às pressões médias máximas observadas para estas mesmas variáveis. Estes achados estão suportados por estudos prévios11 que ao avaliarem amostras de adultos saudáveis, também encontraram diferenças significativas entre os valores de pico e sustentado. Estes mesmos autores concordam que a utilização de medidas de pico na avaliação da força muscular respiratória pode superestimar o grau de força muscular. Contrariamente o estudo realizado por Hamenegard et al.,4 apontou inexistência de diferença entre estas medidas, independente das faixas etárias, ao utilizar um instrumento capaz de registrar tanto as pressões de pico quanto as sustentadas.

A ideia de que o valor de pico possa prejudicar o diagnóstico precoce de fraqueza muscular não é compartilhada por alguns autores.5,22 Windisch et al.,5 ao compararem os valores de pico e sustentados obtidos para as pressões respiratórias máximas de adultos jovens, em uma zona rural na Alemanha, apesar de concluírem que estas pressões foram diferentes, afirmaram que a pressão de pico não apresenta desvantagem e pode ser comparativamente usada. Na avaliação do atual estudo, observou-se que as pressões de pico sempre foram superiores, independentemente do gênero e da faixa etária avaliada. Resultados semelhantes foram observados anteriormente.5,11

Os dados desta pesquisa diferem dos achados de estudos prévios envolvendo crianças saudáveis. Wagener et al.,22 avaliaram a força muscular respiratória de 40 crianças, de uma escola primária na Austrália. Cada sujeito foi avaliado sete vezes incluindo mensurações realizadas nos turnos da manhã e tarde por quatro semanas. Os valores de pico obtidos não diferiram significativamente dos valores sustentados nas avaliações realizadas no turno vespertino, assim como nos grupos de idade. Estes autores não comentaram se as diferenças observadas entre as medidas, de pico e sustentadas, poderiam estar relacionadas com o turno em que as avaliações foram realizadas. No entanto, sugeriram que em crianças saudáveis, a área muscular da musculatura do ombro e a força dos músculos respiratórios estão relacionadas. Acrescentaram ainda, que a pressão de pico está relacionada quantitativamente com a massa muscular e reflete a musculatura torácica em crianças normais.22 Contrariamente, Ringquist23 havia afirmado anteriormente que a pressão de pico está correlacionada com a força abdominal. Este afirmou ainda, que no sexo feminino essa pressão é influenciada pela capacidade vital forçada e que ocorre importante interação entre o formato da caixa torácica e os músculos respiratórios. Nos meninos a pressão gerada está fortemente associada à área de secção transversa muscular.

A diferença de força muscular respiratória entre os sexos tem sido observada na maioria dos estudos.6,7,12,13,22 De acordo com achados prévios,7,12,13 em indivíduos pré e pós-púberes, observa-se uma predominância de superioridade nos valores das pressões respiratórias máximas nos indivíduos do sexo masculino, sendo esta diferença mais pronunciada durante e após a puberdade. Em um estudo realizado com o objetivo de avaliar a força muscular respiratória em garotos de 11 a 17 anos, observou-se que a força muscular inspiratória aumenta significativamente com o crescimento dos 11 a 17 anos, e dos 11 aos 15 anos para a força muscular expiratória.14 No presente estudo, foiobservado que os valores obtidos no teste da força muscular inspiratória e expiratória, os meninos obtiveram valores superiores aos obtidos pelas meninas, tanto para os valores de pressão de pico quanto para pressão sustentada.

De acordo com as fases de desenvolvimento cognitivo de Piaget o padrão intelectual que persistirá durante a idade adulta, isto é, a forma final de funcionamento mental é alcançado na fase 4, o período das operações formais (que ocorre em médiaaos 12 anos). Nas fases anteriores a forma de organização mental está sofrendo o processo de amadurecimento.24 Este fato torna-se interessante, pois, apesar da acessibilidade, simplicidade do método de avaliação da força muscular respiratória pela manovacuômetria1,25 este é um teste esforço-dependente e requer clara compreensão da técnica, pois uma participação inadequada do sujeito avaliado pode limitar sua execução conforme as recomendações da literatura a cerca da sustentação da manobra durante a avaliação de crianças. Tal fato poderia sustentar a hipótese de utilização da pressão de pico como alternativa válida da força muscular respiratória na prática clínica.

Neste estudo, todas as crianças realizaram a avaliação respiratória de maneira satisfatória necessitando em média de cinco manobras para obtenção de uma medida reprodutível. Diante do grau de disparidade entre os valores de pressão, de pico e pressão sustentada, encontrados, podese recomendar a utilização da pressão sustentada para crianças com idade inferior a 12 anos. Em estudos anteriores onde foram utilizadas amostras com faixas etárias semelhantes7,22 também não ocorreram limitações metodológicas em função da idade das crianças. Além disso, o estudo da função pulmonar em crianças que se encontram na segunda infância é de importância vital para o entendimento do sistema respiratório, psicológico e para a avaliação clínica.26 Em contrapartida, Domènech-Clar et al.,13 não avaliaram crianças menores que oito anos afirmando que até os sete anos de idade a criança poderia apresentar baixo nível de compreensão e colaboração o que poderia repercutir em uma baixa reprodutibilidade das medidas obtidas.

Além de se estudarem os aspectos biocognitivos envolvidos para uma possível diferença entre os valores de pressões avaliadas, na faixa etária avaliada, devese observar o equipamento utilizado para realização das medições. A amplitude da diferença entre a pressão de pico e a sustentada dependerá da inércia tanto do sistema respiratório quantodo equipamento de medição, que juntos levam a um pico repentino do esforço (overshoot).18,27 Eright et al.,28 durante a avaliação de 4443 idosos, utilizaram um sistema de medição digital que, segundo eles, não apresenta inércia significativa entre valores de pico e sustentado, considerando em seu estudo os valores de pico para as pressões máximas.

Montemezzo et al.29 utilizou um sistema digitalonde o software do computador tinha papel de identificar o período de um segundo onde houve maior sustentação de pressão e também o intervalo de um segundo de menor variabilidade. Desta forma realizava o registro tanto da pressão de pico quanto da sustentada,15,29,30 facilitando o trabalho do examinador durante a medição das pressões respiratórias.

A taxa de retorno do TCLE e da ficha de avaliação respondida foi considerada limitação do estudo, pois muitos destes não retornavam ou não forneciam informações importantes inclusive assinaturas dos pais/responsáveis pelas crianças. Outro fator limitante foi a dificuldade encontrada para avaliar as crianças no turno em que estas estudavam, consequente à resistência das escolas, sobretudo nas escolas particulares.

Em conclusão, os achados deste estudo demonstram que a pressão respiratória máxima de pico é superiormente significativa quando comparada com a pressão respiratória máxima sustentada em crianças de 7 a 11 anos de idade. Embora os equipamentos analógicos sejam mais acessíveis e a pressão de pico seja mais facilmente mensurada, acreditamos que esta medida possa servir apenas como uma estimativa da força muscular respiratória, porém sem caráter substitutivo. Enfatizamos que para otimizar o diagnóstico precoce de fraqueza muscular, é importante a utilização de instrumentos capazes de mensurar a pressão respiratória máxima sustentada.

Recebido em 18 de julho de 2011

Versão final apresentada em 7 de maio de 2012

Aprovado em 8 de agosto de 2012

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jan 2013
  • Data do Fascículo
    Dez 2012

Histórico

  • Recebido
    18 Jul 2011
  • Aceito
    08 Ago 2012
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