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Pesquisa Translacional e a importância da sua difusão

O investimento na pesquisa biomédica tem crescido progressivamente nos últimos anos, entretanto o seu impacto na aplicação de novas terapias e diagnóstico não tem acompanhado o mesmo ritmo. Neste contexto, a Pesquisa Translacional, que visa a aplicação das descobertas geradas por pesquisas de laboratório e estudos pré-clínicos para o desenvolvimento de ensaios clínicos e adoção de melhores práticas, pode equilibrar essa disparidade, garantindo que as descobertas da pesquisa básica sejam traduzidas em ganhos para a saúde humana.

A pesquisa translacional envolve um processo conhecido por translação do conhecimento, no qual o foco da investigação científica na área da saúde adquire um fluxo de informação bidirecional entre as pesquisas básica e clínica, resultando em uma aplicabilidade real do conhecimento e de novas tecnologias, melhorando a aplicação clínica de novos conceitos terapêuticos, e, finalmente, proporcionando benefícios diretos aos principais interessados neste processo: os pacientes.

Sendo bidirecional, esta modalidade de pesquisa caracteriza-se como um processo de duas vias, onde ocorre a tradução das descobertas da pesquisa de bancada para a aplicação clínica e/ou o estudo de resultados clínicos para a compreensão dos mecanismos moleculares de doenças, através da identificação de biomarcadores específicos. Desta forma, agrega valor científico, baseado em evidências, para o direcionamento de estratégias terapêuticas, monitoramento e cura de doenças, e também para a criação e implementação de políticas, abordagens preventivas e de prestação de cuidados de saúde.

Embora a nomenclatura seja recente, a Pesquisa Translacional tem raízes em práticas antigas de investigação já que muitas vezes se aliou resultados experimentais em bancadas de laboratório a propostas para avaliações clínicas, embora não no nível de aplicação direta. Porém, o que se percebe na atualidade é que, além da criação de um novo termo para denominar este segmento de pesquisa, criou-se uma sistematização para sua prática, que ocorre com metodologia aperfeiçoada e conta com sistemas de informação mais eficazes como, por exemplo, sistemas em rede.

A pesquisa translacional começou a ganhar espaço no meio científico a partir da publicação de um editorial do Journal of the American Medical Association (JAMA) em 2002, no qual se discutia a necessidade de aplicar de maneira prática os avanços adquiridos através da pesquisa básica com o objetivo de melhorar a saúde humana através de novidades na área de prevenção, diagnóstico e tratamento das doenças.

Começou-se então uma busca por parte dos pesquisadores em saúde, para criar mecanismos capazes de favorecer a translação do conhecimento entre os dois meios: a bancada e a clínica. Os Estados Unidos despontou primeiramente no desenvolvimento desses estudos, criando grupos de trabalhos, estimulando e financiando a pesquisa translacional. Um importante avanço na área foi à criação dos periódicos Translational Research (anteriormente The journal of Laboratory and Clinical Medicine) e o The American Journal of Translational Research, hoje com projeção significativa no âmbito internacional.

E, atualmente, vários outros jornais como o Science Translational Medicine e Translational Psychiatry. Na área de saúde pública o American Journal of Epidemiology tem publicado sobre o assunto.

No National Institute of Health -USA (NIH), a pesquisa translacional passou a ser prioridade desde o ano de 2003, tendo como um dos principais objetivos o fortalecimento da pesquisa clínica, para estabelecer a comunicação entre o laboratório e a prática clínica e, assim, traduzir a investigação biomédica básica em novas terapias eficazes, e complementarmente trazendo observações clínicas para o laboratório. A experiência de uma instituição com a pesquisa translacional pode enfatizar o desafio de mobilizar a equipe de pesquisadores para realização da mesma, pois muitos ainda relatam que, embora tenha havido um aumento significativo do interesse pela pesquisa básica (ocasionado pela revolução genética, bioinformática e outras técnicas de laboratório) por parte dos pesquisadores, não houve igual empenho dos mesmos par realização da pesquisa translacional propriamente dita. Desta forma, apesar de dispor de infra-estrutura adequada para o desenvolvimento das pesquisas, as Instituições tem passado por dificuldades para realização das mesmas, decorrente da falta de envolvimento de pesquisadores qualificados.

Neste contexto, percebe-se que, embora a existência de uma infra-estrutura que permita o trabalho seja importante, para o sucesso neste tipo de investigação, é necessário o engajamento de especialistas, a criação de incentivos evolvendo pesquisadores das ciências básicas e clínicas, de forma que se complementem em suas competências.

No Brasil, instituições de saúde e programas de pós-gradução em diversas regiões tem se empenhado na realização e ampliação da pesquisa translacional, estruturando seus serviços através da criação de centros específicos, projetos de apoio à pesquisa e incentivo à pesquisas multidisciplinares. Para tanto, contam com apoio de iniciativas do governo federal, como a criação da Rede Nacional de Pesquisa Clínica, pelo Ministério da Saúde, e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Translacional em Medicina, através do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), além de investimento de outras instituições de fomento à pesquisa. Tem sido realizados, também, encontros para discussão e troca de saberes nesta área com pesquisadores nacionais e internacionais.

No âmbito da saúde materno-infantil, muitos aspectos clínicos e assuntos a eles associados já foram extensamente estudados nas mais variadas situações, sendo de grande importância para prática em saúde. Porém, existem casos que seguem sem compreensão completa, limitando as intervenções, bem como casos que poderão ser abordados de maneira diferente no futuro, através de novas descobertas da ciência. Nesta perspectiva, a pesquisa translacional representa elemento fundamental para ampliação do conhecimento científico, baseado nas necessidades desta específica população-alvo, voltada para proporcionar práticas melhores, mais eficazes e baseada nos melhores níveis de evidência científica, contribuindo para melhora da qualidade de vida e diminuição da mortalidade e morbidades encontradas nessa área, assim como nas demais áreas da saúde humana.

Finalmente, dada a dimensão alcançada pela Pesquisa Translacional, é fundamental uma maior divulgação dos trabalhos da área através de periódicos científicos, de escopos os mais variados. De fato a disseminação dos resultados de pesquisas com abordagem translacional deveria ser fortemente implementada, para que novos achados sejam analisados e aplicados criteriosamente à saúde individual e comunitária.

Neste sentido, as revistas da área de saúde coletiva podem ter um papel relevante, sendo mesmo sua responsabilidade, visto que pesquisas multiabrangentes e interdisciplinares com bases científicas sólidas são elementos imprescindíveis para uma melhor atenção à saúde das populações como um todo.

É nesse contexto que a nossa Revista, a Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, abre o seu espaço para a divulgação de conhecimentos na área.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2013
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