Acessibilidade / Reportar erro

Aderência à higiene das mãos através das recomendações da Organização Mundial de Saúde em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal

Resumo

Objetivos:

avaliar aplicação da técnica de higienização das mãos numa unidade de terapia intensiva neonatal em uma maternidade de Salvador, Bahia, Brasil.

Métodos:

estudo transversal no qual foi avaliada a técnica de higienização das mãos com água e sabão e álcool gel e o consumo de solução de álcool gel e por categoria profissional. Um instrumento adaptado da OMS foi usado e aplicado usando questionários. A amostra foi composta por médicos, fisioterapeutas, enfermeiros e técnicos de enfermagem.

Resultados:

a aderência à higienização das mãos foi deficiente em termos de técnica e de frequência (a execução correta da técnica variou de 0 a 13,3% entre as categorias profissionais). A higienização das mãos foi ignorada por 27% dos médicos e 51,8% dos técnicos de enfermagem. Depois de tocar superfícies próximas aos pacientes foi o momento mais ignorado. O uso mensal de álcool gel foi 35% do valor esperado.

Conclusões:

apesar das investigações internacionais e esforços para melhores resultados, a adesão e o cumprimento das diretrizes de higienização das mãos ainda é deficiente.

Palavras-chave
Higiene das mãos; Terapia intensiva neonatal; Organização Mundial da Saúde

Abstract

Objectives:

to evaluate the application of hand hygiene technique, according to the World Health Organization (WHO) recommendations, in the neonatal intensive care unit, at a Maternity in Salvador de Bahia, Brazil.

Methods:

cross-sectional study. Hand hygiene technique by professional category and alcohol solution consumption were systematically registered. For this task an adapted instrument created by the WHO was used and applied using factsheets. The sample was taken from medical physicians, physiotherapists, nurses and nursing technicians.

Results:

hand hygiene adherence regarding WHO recommendations was deficient in terms of technique and in terms of frequency (adequate technique ranged from 0% to 13.3% between professional categories). Hand hygiene was frequently ignored (27% between physicians and 51.8% between nursing technicians). The moment right after touching surfaces next to patients was the most ignored one. Alcohol gel solution monthly use was only 35% of the expected value for the unit.

Conclusions:

despite the international investigations and efforts for better results, the adherence and compliance to the hand hygiene guidelines is still deficient and continues to be a major problem.

Key words
Hand hygiene; Intensive care neonatal; World Health Organization

Introdução

Por mais de 150 anos, a higiene das mãos foi pesquisada no ambiente hospitalar como forma de prevenir a transmissão de bactérias, infecções e morte.11 Rotter M. Hand washing and hand disinfection. In: Mayhall CG, editor. Hospital epidemiology and infection control. 2 ed. Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins ;1999. p. 1339-55. Semmelweis22 Semmelweis I. Etiology, concept, and prophylaxis of childbed fever (History of Science and Medicine). The University of Wisconsin Press; 1983. já havia demonstrado empiricamente a redução da mortalidade materna em uma maternidade em Viena após o uso de solução clorada para higiene das mãos. Apesar da importância da higiene das mãos ser reconhecida pelos profissionais de saúde, a baixa adesão continua sendo evidenciada na literatura científica.33 Sousa ECP, Silva FL. The knowledge and the accession of practice hand hygiene of health professionals: literature review. Rev Saúde Foco. 2016; 3 (1): 84-93.

Estudos clínicos demonstraram a importância da higiene das mãos como forma efetiva de evitar a transmissão de agentes patogênicos perigosos para a saúde e de reduzir danos desnecessários aos pacientes.44 Allegranzi B, Pittet D. Role of hand hygiene in healthcare-associated infection prevention. J Hosp Infect. 2009; 73 (4): 305-14. A higiene das mãos adequada é uma medida preventiva cientificamente comprovada e facilmente aplicada. Desta forma, a importância da aderência aos protocolos de higiene das mãos é uma das medidas mais importantes para a prevenção da transmissão de agentes patogênicos nas instituições de saúde.55 Girou E, Legrand P, Soing-Altrach S, Lemire A, Poulain C, Allaire A, Tkoub-Scheirlinck L, Chai SH, Dupeyron C, Loche CM. Association between hand hygiene compliance and methicillin-resistant Staphylococcus aureus prevalence in a French rehabilitation hospital. Infect Control Hosp Epidemiol. 2006. 27 (10): 1128-30.-66 - Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Segurança do Paciente em Serviços de Saúde: Higienização das Mãos / Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Brasília: Anvisa; 2009.

As infecções relacionadas a assistência a saúde (IRAS) são uma grande ameaça para qualquer paciente. O baixo nível de adesão às recomendações e protocolos de higiene das mãos continua sendo um grande problema por causa do risco associado à transmissão e infecção de patógenos.77 WHO (World Health Organization). Benedetta Allegranzi, Sepideh Bagheri Nejad, Gabriela Garcia Castillejos, Claire Kilpatrick, Edward Kelley, Elizabeth Mathai. Report on the Burden of Endemic Health Care-Associated Infection Worldwide. Clean care is safer care. 2011.-88 Pires D, Soule H, Bellissimo-Rodrigues F, Gayet-Ageron A, Pittet D. Hand Hygiene With Alcohol-Based Hand Rub: How Long Is Long Enough? Infect Control Hosp Epidemiol. 2017; 38(5): 547-552. Uma taxa de prevalência entre 3,5% e 12% de IRAS em países desenvolvidos é estimada pela OMS.99 WHO World Alliance for Patient Safety. Health-Care Associated Infections. Available at: http://www.who.int/gpsc/country_work/gpsc_ccisc_fact_sheet_en.pdf
http://www.who.int/gpsc/country_work/gps...
Nos países em desenvolvimento, os dados são escassos e, quando presentes, os níveis são geralmente maiores (é estimada uma taxa de prevalência de IRAS de 20,1%). As IRAS são especialmente um problema nas unidades de terapia intensiva (UTIs) devido a sobrecarga de trabalho dos profissionais e baixo cumprimento de medidas de prevenção e controle de infecção, pacientes com sistema imunológico alterado, com tempo de permanência prolongado e elevada frequência de procedimentos invasivos, como ventilação mecânica e cateterismo vascular central.1010 Alp E, Damani N. Healthcare-associated infections in intensive care units: epidemiology and infection control in low-to-middle income countries. J Infect Dev Ctries. 2015; 9 (10): 1040-5.-1111 Fortaleza CMCB, Padoveze MC, Kiffer CRV, Barth AL, Carneiro ICDRS, Giamberardino HIG, Rodrigues JLN, Santos Filho L, de Mello MJG, Pereira MS, Gontijo Filho PP, Rocha M, Servolo de Medeiros EA, Pignatari ACC. Multi-state survey of healthcare-associated infections in acute care hospitals in Brazil. J Hosp Infect. 2017; 96 (2): 139-44.

O estudo foi realizado em uma maternidade localizada em Salvador, Bahia, no Nordeste do Brasil. A maternidade presta serviços à mulheres grávidas de alto risco de todo o estado da Bahia. No ano de 2014, a incidência de IRAS na UTI neonatal (UTIn) foi de 25,85 para 1000 pacientes e os principais microorganismos isolados em hemoculturas durante o período foram Staphylococcus epidermidis (57%) e Candida parapsilosis (22%).

Com o objetivo de melhorar a adesão adequada às técnicas de higiene simples das mãos, vários guias internacionais foram desenvolvidos. Estes guias orientam os momentos em que a higiene simples das mãos deve ser realizada e quando utilizar a solução de álcool gel, são os chamados "cinco momentos para a higiene das mãos".1212 Oliveira AC, Gama CS, Paula AO. Multimodal strategy to improve the adherence to hand hygiene and self-assessment of the institution for the promotion and practice of hand hygiene. J Public Health (Oxf). 2017; 1-6. doi: 10.1093/pubmed/fdx035
https://doi.org/10.1093/pubmed/fdx035...
-1313 Farinaz Farhoudi, Anahita Sanaei Dashti, Minoo Hoshangi Davani, Nadiyeh Ghalebi, Golnar Sajadi, Raziyeh Taghizadeh. "Impact of WHO Hand Hygiene Improvement Program Implementation: A Quasi-Experimental Trial. BioMed Res Int. 2016; Article ID 7026169, 7 pages. doi:10.1155/2016/7026169
https://doi.org/10.1155/2016/7026169...
Apesar destes esforços e iniciativas internacionais, a adesão à higiene das mãos permanece abaixo de 50% nos países desenvolvidos e continua sendo muito baixa entre médicos e enfermeiros.1414 Wetzker W, Bunte-Schönberger K, Walter J, Pilarski G, Gastmeier P, Reichardt Ch. Compliance with hand hygiene: reference data from the national hand hygiene campaign in Germany. Journal of Hospital Infect. 2016; 92 (4): 328-31.-1515 Kingston L, O´Connell NH, Dunne CP. Hand Hygiene-related clinical trials reported since 2010: a systematic review. J Hosp Infect. 2016. 92 (4): 309-320.

A equipe do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar (SCIH) na maternidade realiza rotineiramente treinamentos de higiene das mãos e medição do uso de solução de álcool gel na UTIn, de acordo com as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). A solução de álcool gel é usada em todo o mundo como uma medida indireta para a medição da adesão à higiene simples das mãos. O uso institucional de álcool gel na UTIn da maternidade está atualmente abaixo do ideal recomendado pela OMS de 20 mL por paciente por dia.1616 Brasil. Ministério da Saúde. Anvisa. Fiocruz. Anexo 01: Protocolo para a prática de higiene das mãos em serviços de saúde. Protocolo integrante do Programa Nacional de Segurança do Paciente. 09/07/2013.

Considerando as diretrizes emitidas pelo Ministério da Saúde e as Políticas Nacionais de Segurança do Paciente, as elevadas taxas de IRAS na UTIn e baixos indicadores de uso de solução de álcool gel na maternidade, a avaliação da higiene das mãos na UTIn é fundamental, para promover práticas adequadas de higiene simples das mãos e a redução das taxas de IRAS.

O objetivo deste estudo transversal foi avaliar as práticas de higiene das mãos entre os profissionais da UTIn. O estudo avaliou os seguintes tópicos:

  1. Técnica de higiene simples das mãos e adesão às recomendações da OMS;

  2. Consumo médio de solução de álcool gel.

Métodos

O estudo foi realizado na maior maternidade do Estado da Bahia de referência para o cuidado de gestantes de alto risco. Tem 249 leitos e presta serviços especializados em ginecologia obstetrícia, neonatologia, cirurgia pediátrica, medicina intensiva e medicina interna. O estudo foi realizado na UTIn, com capacidade de 20 leitos, no entanto, durante períodos de superlotação, pode ser ampliado para 24. O cuidado é dado aos pacientes clínicos e cirúrgicos, exceto a neurocirurgia. Na unidade, sempre havia disponível água visivelmente limpa, com torneiras ligadas através do mecanismo mãos-livres (ativada com o cotovelo), com um número total de cinco pias. Em todas as pias sempre havia disponível sabão (5 dispensadores) e toalha de papel. Havia também solução de álcool gel (AG) disponível em vários locais: a) almotolia de solução de álcool gel em bandeja, localizada em cada um dos leitos da unidade; e b) 5 dispensadores de parede. Ao lado de cada pia, havia um cartaz ilustrando técnica adequada de higiene das mãos com água e sabão (AS).

A avaliação da técnica de higienização das mãos foi realizada durante as rotinas de trabalho utilizando como referência os "cinco momentos de higiene das mãos" estabelecidos pela OMS. A avaliação das categorias profissionais foram realizadas de forma aleatória por três membros treinados da equipe SCIH. Para essa tarefa, foi adaptado e aplicado um instrumento criado pela OMS. De forma sistemática, foram coletados os seguintes dados: data, sexo, categoria profissional, o momento da higiene simples das mãos teoricamente necessário para a tarefa desenvolvida e a higiene simples da mãos realizada pelo profissional durante o período de observação, de acordo com as recomendações da OMS.

Foram avaliados médicos, fisioterapeutas, enfermeiros e técnicos de enfermagem que trabalhavam durante a semana, finais de semana e durante os três turnos (manhã, tarde e noite). Estas categorias foram selecionados por fornecerem cuidados de rotina para os pacientes. Para o tamanho da amostra, foi considerado uma confiança de 90% e uma estimativa de erro de 0,05 (necessário 271 momentos para a higiene simples da mãos). Os profissionais de saúde foram observados individualmente em suas tarefas diárias por períodos de 15 minutos durante três meses após a aprovação do comitê de ética. Para diminuir o risco de mudança no comportamento da equipe durante a avaliação, eles foram informados apenas que o SCIH estaria avaliando as rotinas diárias do setor, omitindo que a higiene das mãos fosse o foco da avaliação.

Os cinco momentos da higiene simples das mãos foram classificados em cinco categorias: a) Não feito: o profissional avaliado não realizou nenhum dos cinco momentos necessários para a higiene das mãos de acordo com as recomendações da OMS; B) AG Adequado: o profissional realizou a técnica adequada com solução de álcool gel (duração do procedimento e técnica), em qualquer um dos cinco momentos de acordo com as recomendações da OMS; C) AG inadequado: o profissional realizou a técnica inadequada para higiene das mãos com solução de álcool gel em qualquer um dos cinco momentos; D) AS Adequado: o profissional realizou a técnica adequada para higiene das mãos com água e sabão (duração do procedimento e técnica) em qualquer um dos cinco momentos de acordo com as recomendações da OMS; E) AS inadequado: o profissional realizou técnica inadequada para higiene das mãos com água e sabão em qualquer um dos cinco momentos.

Os seguintes indicadores foram calculados: 1) Adesão à higiene simples das mãos com solução de álcool gel ou água e sabão na UTIn: número de vezes que o profissional higienizou as mãos dividido pelo número de vezes que deveria ter sido realizada a técnica, multiplicado por 100; 2) Higiene simples das mãos com álcool gel ou água e sabão na UTIn, levando em consideração os cinco momentos de higiene das mãos, conforme especificado pela OMS: número de vezes em que o profissional higienizou as mãos dividido pelo número de vezes que deveria ter sido realizada a técnica, multiplicado por 100. 3) Uso de solução de álcool gel na UTIn: monitoramento do volume de solução de álcool utilizada para cada 1.000 pacientes dia.

O SCIH também realizou o cálculo mensal do uso mínimo de solução de álcool gel esperado em mililitros na UTIn por mês de acordo com os critérios da OMS. O valor (46,640 ml) foi utilizado como parâmetro de referência para o uso mensal de solução de álcool registrada na UTIn.

As variáveis categóricas foram apresentadas como proporções (%). Para análise, os "cinco momentos de higiene das mãos" foram divididos em três grupos: a) 'não feito' para indivíduos que não realizaram higiene das mãos; B) "Adequado AG / AS" para indivíduos que realizaram higiene simples das mãos de forma adequada com água e sabão ou solução de álcool gel; e c) "Inadequado AG / AS" para indivíduos que realizaram higiene simples das mãos de forma inadequada.

A pesquisa respeitou as recomendações de privacidade e confidencialidade pela Resolução nº466, de 12 de outubro de 2012, Conselho Nacional de Saúde para Pesquisa Científica com Seres Humanos e foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Santa Izabel com o número CAAE: 51932215.8.0000.5520.

Resultados

Os profissionais avaliados na UTIn foram: 9 fisioterapeutas, 10 médicos, 14 enfermeiras e 20 técnicos de enfermagem alocados em 3 turnos (manhã, tarde e noite) e foram registrados 274 momentos para higiene das mãos. A técnica adequada de higiene simples das mãos, realizada com álcool gel ou com água e sabão, independentemente do momento da higiene simples das mãos, variou de 0% entre técnicos de enfermagem a 13,3% entre os fisioterapeutas. Independentemente da categoria profissional e do momento de higiene simples das mãos que estava sendo avaliado, a higiene das mãos foi freqüentemente ignorada (27% entre médicos e 51,8% entre técnicos de enfermagem).

O momento "depois de tocar superfícies próximas ao paciente" foi o mais ignorado independentemente da categoria profissional (a cada 100 vezes necessária foi realizada apenas em 33,7). A categoria profissional de técnicos de enfermagem não higienizou as mãos com sabão e água, com técnica adequada de acordo com as recomendações da OMS, em nenhum dos momentos observados. Independentemente da categoria profissional, a higiene simples das mãos com água e sabão foi preferida quando comparada com o uso de solução de álcool gel (97% dos médicos; 85,7% dos fisioterapeutas; 92,2% dos enfermeiros e 91,5% dos técnicos de enfermagem prefereriram o uso de água e sabão). O uso de solução de álcool gel para a higiene simples das mãos foi muito baixo e a técnica não foi praticada adequadamente por nenhum dos profissionais avaliados (Tabela 1).

Tabela 1
Avaliação por categoria profissional para conduta de higiene simples de mão antes de qualquer intervenção prática ou teórica, nos "cinco momentos de higiene das mãos" na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.

Avaliação de Indicadores:

  1. Adesão à higiene simples das mãos com solução de álcool gel ou água e sabão: com este indicador, foram avaliadas as oportunidades de higiene simples das mãos (número de vezes em que foi identificada a higiene das mãos e número de vezes em que a técnica deveria ter sido realizada) de acordo com a categoria profissional. Foi identificado, por exemplo, que a cada cem vezes em que era necessária a higiene simples das mãos, os médicos realizaram aproximadamente 70% (23 práticas de higiene simples das mãos observadas para 33 momentos necessários). A categoria com menor adesão à higiene simples das mãos foi a de técnico de enfermagem com apenas 48,1% (64/133) das oportunidades observadas, tanto com solução de álcool gel ou água e sabão, indepdentemente se a técnica foi adequada ou não (Figura 1).

    Figura 1
    Indicador de adesão à higiene das mãos por categoria profissional na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.

    Figura 2
    Indicador de aderência à higiene das mãos levando em consideração os "cinco momentos de higiene das mãos" na Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais.

  2. Higiene simples das mãos com álcool gel ou sabão e água na UTIn, levando em consideração os cinco momentos de higiene das mãos conforme especificado pela OMS: houve momentos que foram mais frequentemente realizados. O momento que apresentou a maior adesão foi a "higienização das mãos antes de realizar procedimentos limpos ou assépticos" com 81,2% (13/16). O momento que apresentou a menor a adesão, independentemente da categoria profissional avaliada, foi "higiene das mãos após tocar superfícies próximas ao paciente", sendo realizado apenas 27 vezes em 80 oportunidades (Tabela 1).

  3. Uso de solução de álcool gel na UTIn: a média mensal de utilização de solução de álcool gel para higiene das mãos na unidade foi de 16.341ml, muito inferior ao mínimo esperado de 46.640 ml estabelecido pela equipe do SCIH.

Discussão

Algumas limitações devem ser observadas neste estudo transversal. Em primeiro lugar, a higiene simples das mãos foi avaliada por observação direta. Os profissionais não conheciam o foco da avaliação da equipe, porém existe a possibilidade de mudar seu comportamento (efeito Hawthorne). Hagel et al.1919 Hagel S, Reischke J, Kesselmeier M, Winning J, Gastmeier P, Brunkhorst FM, Scherag A, Pletz MW. Quantifying the Hawthorne Effect in Hand Hygiene Compliance Through Comparing Direct Observation With Automated Hand Hygiene Monitoring. Infect Control Hosp Epidemiol. 2015; 36 (8): 957-62. identificaram que o efeito Hawthorne é mais pronunciado em unidades de alta complexidade, mas insignificante em unidades de baixa complexidade. Este efeito é pouco provável no nosso estudo, dado a elevada falta de adesão ao uso adequado de solução de álcool gel ou de água e sabão.

Em segundo lugar, o indicador desenvolvido pela OMS para avaliar a adesão profissional às recomendações de higiene das mãos não leva em consideração a duração da exposição ou o tempo de exposição que cada categoria profissional gasta com os pacientes. A determinação da influência da duração das atividades de atenção ao paciente sobre a conformidade com a higiene simples das mãos deve ser avaliada. Neste estudo, as categorias profissionais que passaram mais tempo com os pacientes, enfermeiros e técnicos de enfermagem, apresentaram o pior adesão à higiene das mãos. Vários pesquisadores identificaram que o aumento da carga de trabalho é um fator de impacto negativo na adesão.2020 Tomar S, Lodha R, Kapil A. Hand hygiene compliance of healthcare workers in a pediatric intensive care unit. Indian Pediatr. 2015; 52 (7): 620-1.-2121 Sharma S, Sharma S, Puri S, Whing J. Hand hygiene compliance in the intensive care units of a tertiary care hospital. Indian J Community Med. 2011; 36 (3): 217-21. Variáveis como o desgaste causado por rotinas de trabalho (gravidade dos pacientes, super-lotação, número de turnos por semana, número de empregos) não foram registrados. Também neste estudo observaram-se significativamente mais avaliações de técnicos de enfermagem quando comparados com as dos médicos e os médicos tiveram maiores taxas de adesão. Diferentes resultados foram encontrados por alguns autores, como Duggan, que publicou um estudo com 2373 observações de higiene simples das mãos realizada por médicos e enfermeiras. Nesse estudo houve uma correlação inversa entre o nível educacional profissional e a taxa de adesão.2222 Duggan JM, Hensley S, Khuder S, Papadimos TJ, Jacobs L. Inverse correlation between level of profesional education and rate of handwashing compliance in a teaching hospital. Infect Control Hosp Epidemiol. 2008; 29 (6): 534-8. Na nossa pesquisa, o número de observações registradas para a categoria de "médicos" foi pequena, tornando difícil distinguir se a melhor adesão à higiene simples das mãos foi real ou apenas uma variação aleatória. Além disso, os anos de educação, treinamento, motivação e experiência profissional não foram registrados.

Em terceiro lugar, o gênero não foi possível de ser avaliado como um fator associado à técnica de higiene simples das mãos. Apenas 16 de 274 avaliações foram realizadas por profissionais do sexo masculino. A maioria dos profissionais da maternidade eram do sexo feminino (apenas quatro individuos observados eram do sexo masculino). Outras características, como anos de experiência e idade dos participantes, são potenciais fatores confundidores, mas não foram consideradas neste estudo.

Em quarto lugar, as avaliações foram realizadas considerando apenas as recomendações da OMS para a higiene simples das mãos. Não há evidências que demonstrem que as recomendações da OMS são as melhores, mas foram consideradas pela equipe como um padrão internacional de boas práticas para técnicas de higiene simples das mãos. Outras técnicas podem ser efetivas ou até melhores que as recomendações da OMS mas não foram consideradas na nossa pesquisa.

Uma baixa adesão à higiene simples das mãos tem sido relatada em outros estudos. Primo em Goiás, no Brasil, realizou um estudo antes-depois. Antes da intervenção, foram registradas 119 oportunidades para a higiene das mãos. A adesão média foi de 21% e em todas as oportunidades a higiene foi realizada com água e sabão.2323 Primo MGB, Ribeiro LCM, Figueiredo LFS, Sirico SCA, Souza MA. Adesão à prática de higienização das mãos por profissionais de saúde de um Hospital Universitário. Rev Eletr Enf. 2010; 12 (2): 266-71. Um comportamento semelhante foi identificado em nosso estudo onde as taxas de uso de solução de álcool gel foram muito baixas. Taxas de adesão semelhantes foram encontradas em países desenvolvidos. Em um estudo multicêntrico que incluiu 13 hospitais em Ontário, Canadá, foi evidenciada uma taxa média de adesão à higiene das mãos de 31,2%. A adesão estava associada positivamente com a categoria de profissionais da enfermagem, a disponibilidade de dispensadores de álcool e o internamento do paciente em apartamento.2424 Mertz D, Johnstone J, Krueger P, Brazil K, Walter SD, Loeb M. Adherence to hand hygiene and risk factors for poor adherence in 13 Ontario acute care hospitals. Am J Infect Control. 2011; 39 (8): 693-6. Monsalve et al.2525 Monsalve MN, Pemmaraju SV, Thomas GW, Herman T, Segre AM, Polgreen PM. Do Peer Effects Improve Hand Hygiene Adherence among Healthcare Workers? Infect Control Hosp Epidemiol. 2014; 35 (10): 1277-85. em um estudo observacional usando uma rede de sensores em uma unidade de cuidados intensivos de 20 leitos em um grande hospital universitário, observou uma taxa de adesão de 20,85%, que aumentou para 27,9% quando outros profissionais de saúde estavam presentes, sugerindo a influência de colegas na adesão à higiene das mãos. A OMS identificou resultados similares com os descritos acima. Vários hospitais (807) de 91 países (12 do Brasil) completaram uma Pesquisa sobre Auto-Avaliação da Higiene das Mãos. O objetivo foi avaliar e acompanhar o progresso na promoção institucional para melhorar a adesão a higiene simples das mãos, incluindo indicadores em cinco categorias (mudança de sistema, treinamento e educação, avaliação e feedback, lembretes no local de trabalho e clima de segurança institucional para higiene das mãos). Cada indicador recebeu um valor que somava até um máximo de 100 pontos para cada categoria (pontuação máxima de 500 pontos). Os hospitais participantes eram principalmente públicos (70%), a menor pontuação média foi registrada na Região Africana (280,9 ± 127,3), enquanto a maior foi na região do Sudeste Asiático (420,6 ± 77,6), representando 60 e 231 centros de saúde, respectivamente. Entre os indicadores, as menores pontuações foram para avaliação e feedback sobre atividades de higiene simples das mãos e o clima institucional de segurança do paciente.2626 Kilpatrick C, Allegranzi B. Summary Report: Hand Hygiene Self-Assessment Framework Survey 2016. A report from the WHO Infection Prevention and Control Global Unit. Available at: http://www.who.int/gpsc/5may/hand-hygiene-report.pdf
http://www.who.int/gpsc/5may/hand-hygien...

A natureza multifacetada e complexa das IRAS é tal que a higiene simples das mãos é necessária, mas sozinha não é suficiente para reduzí-las. De acordo com Huynh et al.,2727 Huynh B-T, Padget M, Garin B, Herindrainy P, Kermorvant-Duchemin E, Watier L, Guillemot D, Delarocque-Astagneau E. Burden of bacterial resistance among neonatal infections in low income countries: how convincing is the epidemiological evidence? BMC Infect Dis. 2015; 15: 127. a incidência de infecção neonatal em países em desenvolvimento é a principal causa de morte em crianças menores de 5 anos, devido a uma série de fatores de risco como o surgimento e a disseminação de resistência a antibióticos.

Neste estudo, água, sabão, álcool gel e papel toalha foram fornecidos adequadamente e não foram evidenciadas limitações para o uso desses elementos. A adesão à higiene simples das mãos era deficiente tanto em termos de técnica quanto em termos de frequência com que esta medida preventiva de infecções deveria ter sido realizada, de acordo com os critérios da OMS. O uso de solução de álcool gel foi muito inferior ao indicado após a avaliação do SCIH da maternidade.

A técnica de higiene simples das mãos e a adesão às recomendações da OMS foram deficientes neste estudo. A razão para não aderir às orientações recomendadas não foi pesquisada e não foram o objetivo deste estudo. A higiene simples das mãos continua a ser uma estratégia de baixo custo, fácil acesso e eficiente para a prevenção da transmissão de bactérias e IRAS, mas a adesão e o cumprimento das diretrizes de higiene simples das mãos ainda é deficiente e continua a ser um grande problema no mundo, principalmente em países em desenvolvimento.

Apesar das investigações internacionais e dos esforços para obter melhores resultados e considerando as evidências clínicas atuais, parece necessário que sejam realizados maiores esforços para implementar pesquisas e intervenções adequadas para melhorar a adesão profissional dos processos de controle de infecção e recomendações para higiene simples das mãos.

Melhorar a adesão e a técnica de higiene simples das mãos seguindo as recomendações da OMS em práticas efetivas pode refletir na prestação de um cuidado assistêncial de melhor qualidade. No entanto, ainda é necessário estimular a conscientização e promover uma cultura institucional de segurança do paciente que, entre outras coisas, melhore a técnica de adesão e higiene simples das mãos. Assim, sugere-se que, além do compromisso individual, também seja necessário o compromisso das lideranças institucionais e o alinhamento de responsabilidades em ações como: campanhas educacionais constantes, ações de mobilização, suporte operacional e estrutural.

References

  • 1
    Rotter M. Hand washing and hand disinfection. In: Mayhall CG, editor. Hospital epidemiology and infection control. 2 ed. Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins ;1999. p. 1339-55.
  • 2
    Semmelweis I. Etiology, concept, and prophylaxis of childbed fever (History of Science and Medicine). The University of Wisconsin Press; 1983.
  • 3
    Sousa ECP, Silva FL. The knowledge and the accession of practice hand hygiene of health professionals: literature review. Rev Saúde Foco. 2016; 3 (1): 84-93.
  • 4
    Allegranzi B, Pittet D. Role of hand hygiene in healthcare-associated infection prevention. J Hosp Infect. 2009; 73 (4): 305-14.
  • 5
    Girou E, Legrand P, Soing-Altrach S, Lemire A, Poulain C, Allaire A, Tkoub-Scheirlinck L, Chai SH, Dupeyron C, Loche CM. Association between hand hygiene compliance and methicillin-resistant Staphylococcus aureus prevalence in a French rehabilitation hospital. Infect Control Hosp Epidemiol. 2006. 27 (10): 1128-30.
  • 6
    - Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Segurança do Paciente em Serviços de Saúde: Higienização das Mãos / Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Brasília: Anvisa; 2009.
  • 7
    WHO (World Health Organization). Benedetta Allegranzi, Sepideh Bagheri Nejad, Gabriela Garcia Castillejos, Claire Kilpatrick, Edward Kelley, Elizabeth Mathai. Report on the Burden of Endemic Health Care-Associated Infection Worldwide. Clean care is safer care. 2011.
  • 8
    Pires D, Soule H, Bellissimo-Rodrigues F, Gayet-Ageron A, Pittet D. Hand Hygiene With Alcohol-Based Hand Rub: How Long Is Long Enough? Infect Control Hosp Epidemiol. 2017; 38(5): 547-552.
  • 9
    WHO World Alliance for Patient Safety. Health-Care Associated Infections. Available at: http://www.who.int/gpsc/country_work/gpsc_ccisc_fact_sheet_en.pdf
    » http://www.who.int/gpsc/country_work/gpsc_ccisc_fact_sheet_en.pdf
  • 10
    Alp E, Damani N. Healthcare-associated infections in intensive care units: epidemiology and infection control in low-to-middle income countries. J Infect Dev Ctries. 2015; 9 (10): 1040-5.
  • 11
    Fortaleza CMCB, Padoveze MC, Kiffer CRV, Barth AL, Carneiro ICDRS, Giamberardino HIG, Rodrigues JLN, Santos Filho L, de Mello MJG, Pereira MS, Gontijo Filho PP, Rocha M, Servolo de Medeiros EA, Pignatari ACC. Multi-state survey of healthcare-associated infections in acute care hospitals in Brazil. J Hosp Infect. 2017; 96 (2): 139-44.
  • 12
    Oliveira AC, Gama CS, Paula AO. Multimodal strategy to improve the adherence to hand hygiene and self-assessment of the institution for the promotion and practice of hand hygiene. J Public Health (Oxf). 2017; 1-6. doi: 10.1093/pubmed/fdx035
    » https://doi.org/10.1093/pubmed/fdx035
  • 13
    Farinaz Farhoudi, Anahita Sanaei Dashti, Minoo Hoshangi Davani, Nadiyeh Ghalebi, Golnar Sajadi, Raziyeh Taghizadeh. "Impact of WHO Hand Hygiene Improvement Program Implementation: A Quasi-Experimental Trial. BioMed Res Int. 2016; Article ID 7026169, 7 pages. doi:10.1155/2016/7026169
    » https://doi.org/10.1155/2016/7026169
  • 14
    Wetzker W, Bunte-Schönberger K, Walter J, Pilarski G, Gastmeier P, Reichardt Ch. Compliance with hand hygiene: reference data from the national hand hygiene campaign in Germany. Journal of Hospital Infect. 2016; 92 (4): 328-31.
  • 15
    Kingston L, O´Connell NH, Dunne CP. Hand Hygiene-related clinical trials reported since 2010: a systematic review. J Hosp Infect. 2016. 92 (4): 309-320.
  • 16
    Brasil. Ministério da Saúde. Anvisa. Fiocruz. Anexo 01: Protocolo para a prática de higiene das mãos em serviços de saúde. Protocolo integrante do Programa Nacional de Segurança do Paciente. 09/07/2013.
  • 17
    WHO (World Health Organization). To collect data about structures and resources at ward level; 2009.
  • 18
    WHO (World Health Organization). A form to complete when monitoring hand hygiene; 2009.
  • 19
    Hagel S, Reischke J, Kesselmeier M, Winning J, Gastmeier P, Brunkhorst FM, Scherag A, Pletz MW. Quantifying the Hawthorne Effect in Hand Hygiene Compliance Through Comparing Direct Observation With Automated Hand Hygiene Monitoring. Infect Control Hosp Epidemiol. 2015; 36 (8): 957-62.
  • 20
    Tomar S, Lodha R, Kapil A. Hand hygiene compliance of healthcare workers in a pediatric intensive care unit. Indian Pediatr. 2015; 52 (7): 620-1.
  • 21
    Sharma S, Sharma S, Puri S, Whing J. Hand hygiene compliance in the intensive care units of a tertiary care hospital. Indian J Community Med. 2011; 36 (3): 217-21.
  • 22
    Duggan JM, Hensley S, Khuder S, Papadimos TJ, Jacobs L. Inverse correlation between level of profesional education and rate of handwashing compliance in a teaching hospital. Infect Control Hosp Epidemiol. 2008; 29 (6): 534-8.
  • 23
    Primo MGB, Ribeiro LCM, Figueiredo LFS, Sirico SCA, Souza MA. Adesão à prática de higienização das mãos por profissionais de saúde de um Hospital Universitário. Rev Eletr Enf. 2010; 12 (2): 266-71.
  • 24
    Mertz D, Johnstone J, Krueger P, Brazil K, Walter SD, Loeb M. Adherence to hand hygiene and risk factors for poor adherence in 13 Ontario acute care hospitals. Am J Infect Control. 2011; 39 (8): 693-6.
  • 25
    Monsalve MN, Pemmaraju SV, Thomas GW, Herman T, Segre AM, Polgreen PM. Do Peer Effects Improve Hand Hygiene Adherence among Healthcare Workers? Infect Control Hosp Epidemiol. 2014; 35 (10): 1277-85.
  • 26
    Kilpatrick C, Allegranzi B. Summary Report: Hand Hygiene Self-Assessment Framework Survey 2016. A report from the WHO Infection Prevention and Control Global Unit. Available at: http://www.who.int/gpsc/5may/hand-hygiene-report.pdf
    » http://www.who.int/gpsc/5may/hand-hygiene-report.pdf
  • 27
    Huynh B-T, Padget M, Garin B, Herindrainy P, Kermorvant-Duchemin E, Watier L, Guillemot D, Delarocque-Astagneau E. Burden of bacterial resistance among neonatal infections in low income countries: how convincing is the epidemiological evidence? BMC Infect Dis. 2015; 15: 127.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2017

Histórico

  • Recebido
    11 Jan 2017
  • Aceito
    20 Jun 2017
Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira Rua dos Coelhos, 300. Boa Vista, 50070-550 Recife PE Brasil, Tel./Fax: +55 81 2122-4141 - Recife - PR - Brazil
E-mail: revista@imip.org.br