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A Iniciativa Hospital Amigo da Criança: contribuição para o incremento da amamentação e a redução da mortalidade infantil no Brasil

Resumo

Objetivos:

estimar a fração atribuível populacional da mortalidade infantil evitável mediante as mudanças em indicadores de amamentação no Brasil devido à Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC).

Métodos:

trata-se de uma estimativa do impacto da IHAC na redução da mortalidade infantil com nível de inferência de plausibilidade, utilizando-se dados secundários da II Pesquisa de Prevalência do Aleitamento Materno de 2008. Inicialmente calculou-se o efeito da IHAC em elevar as taxas da amamentação na primeira hora de vida, amamentação exclusiva e qualquer amamentação a partir das prevalências de amamentação entre os nascidos em hospitais amigos da criança (HAC) e os nascidos em não hospitais amigos da criança (NHAC). Posteriormente, foi estimada a fração atribuível da não amamentação para mortalidade neonatal tardia, mortalidade por todas as causas e mortalidade por infecções, para nascidos em HAC e NHAC e estimou-se o número de óbitos evitáveis caso todas as crianças nascessem em HAC.

Resultados:

a redução de 4,2% das mortes neonatais tardias foi atribuída ao aumento das prevalências de AMPHproporcionado pela IHAC. Mediante a promoção da amamentação em menores de 6 meses, a IHAC contribuiu potencialmente para reduzir 3,5% de mortes por todas as causas e 4,2% de mortes por infecção.

Conclusões:

a redução da mortalidade em crianças de 7 a 180 dias em 2008, potencialmente atribuível à IHAC através da promoção de indicadores de AM, reforça a importância de fortalecer e expandir essa iniciativa no Brasil para aumentar a sobrevivência infantil.

Palavras-chave:
Mortalidade infantil; Aleitamento materno; Saúde infantil

Abstract

Objectives:

to estimate the population attributable fraction of preventable infant mortality rates due to changes in breastfeeding (BF) indicators attributable to the Baby Friendly Hospital Initiative (BFHI).

Methods:

an estimate on the impact of BFHI in reducing infant mortality with an inferential level of plausibility, using secondary data from the II Breastfeeding Prevalence Survey of 2008. Initially, the effect of BFHI on breastfeeding in the first hour of life, exclusive breastfeeding, and any breastfeeding based on the prevalence of the outcomes among infants born in BFHI or non-BFHI was calculated. Second, the population attributable fraction of nonbreastfeeding was estimated for late neonatal mortality, mortality by all causes and infant mortality by infections, for BFHI and non-BFHI, and the number of potentially avoidable deaths if all children were born in BFH.

Results:

reduction of 4.2% of late neonatal deaths due to the increase in BF prevalence in the first hour, as provided by BFHI. BFHI potentially contributed with 3.5% of all-cause deaths and 4.2% of deaths from infection by BF promotion in infants below 6 months.

Conclusions:

the reduction of mortality in children between 7 and 180 days in 2008 potentially attributable to BFHI through the promotion of BF indicators reinforces the importance of strengthening and expanding this initiative in Brazil to ultimately enhance child survival.

Key words:
Infant mortality; Breastfeeding; Child health; BFHI

Introdução

No período de 1990 a 2016 a mortalidade infantil declinou 52,3% no mundo e no Brasil caiu 73,6% passando de 53 para 14 mortes infantis em cada 1000 nascidos vivos. Entretanto continua sendo uma preocupação da Saúde Pública por tratar-se de um forte indicador das condições de vida e iniquidades em saúde de uma população. No mesmo período, a mortalidade neonatal foi reduzida em 48,6% no mundo e em 69% no Brasil. Contudo, as disparidades sociais persistem e incidem em aumento de mortes de crianças em situação de vulnerabilidade social.11 UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância). Levels & Trends in Child Mortality: Report 2017 - Estimates developed by the UN inter-agency group for child mortality estimation. New York: UNICEF/WHO; 2017. [acesso em 26 fev 2018]. Disponível em: http://child-mortality.org/files_v21/download/IGME%20report%20 2017%20child%20mortality%20final.pdf
http://child-mortality.org/files_v21/dow...

Dentre os fatores que reduzem a mortalidade infantil, a amamentação constitui-se na prática isolada com maior efetividade, com potencial para evitar 823.000 mortes anuais em crianças menores de cinco anos em todo o mundo, além de diminuir o risco de doenças agudas e crônicas e favorecer o crescimento e desenvolvimento infantil; este efeito é potencializado quando se inicia na primeira hora após o nascimento e praticada de forma exclusiva nos primeiros 6 meses de vida.22 Lamberti LM, Zakarija-Grkovic I, Walker CL, Theodoratou E, Nair H, Campbell H. Breastfeeding for reducing the risk of pneumonia morbidity and mortality in children under two: a systematic literature review and meta-analysis. BMC Public Health. 2013; 13 (Suppl. 3): S18.

3 Sankar MJ, Sinha B, Chowdhury R, Bhandari N, Taneia S, Martines J, Bahl R. Optimal breastfeeding practices and infant and child mortality: a systematic review and metaanalysis. Acta Pediatr. 2015; 104 (3): 3-13.

4 Victora CG, Bahl R, Barros AJD, França GVA, Horton S, Krasevec J et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016; 387 (10017): 475-90.

5 WHO (World Health Organization). National Implementation of the Baby-friendly Hospital Initiative, Geneva; 2017. [acesso em 10 de set 2017]. Disponível em: http://www.who.int/nutrition/publications/infantfeeding/bfhi-national-implementation2017/en/
http://www.who.int/nutrition/publication...
-66 Khan J, Vesel L, Bahl R, Martines JC. Timing of Breastfeeding Initiation and Exclusivity of Breastfeeding During the First Month of Life: Effects on Neonatal Mortality and Morbidity-A Systematic Review and Metaanalysis. Matern Child Health J. 2015; 19: 468-79 Estimativas do impacto da amamentação sobre a mortalidade infantil realizadas em São Paulo mostraram que frações de mortalidade evitáveis por amamentação superaram os 60% para infecção respiratória.77 Escuder MM, Venâncio SI, Pereira JCS. Estimativa de impacto da amamentação sobre a mortalidade infantil. Rev Saúde Pública. 2003; 37 (3); 319-25.

Contudo, a despeito das fortes evidências sobre os benefícios da amamentação exclusiva nos primeiros seis meses de vida as prevalências nacional e mundial permanecem abaixo da meta de 50% recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o ano de 2025.44 Victora CG, Bahl R, Barros AJD, França GVA, Horton S, Krasevec J et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016; 387 (10017): 475-90.,55 WHO (World Health Organization). National Implementation of the Baby-friendly Hospital Initiative, Geneva; 2017. [acesso em 10 de set 2017]. Disponível em: http://www.who.int/nutrition/publications/infantfeeding/bfhi-national-implementation2017/en/
http://www.who.int/nutrition/publication...
,88 OPAS (Organización Panamericana de la Salud). La Iniciativa hospital amigo del nino en América Latina y el Caribe: Estado actual, retos y oportunidades. Washington, DC: OPS, 2016.

No Brasil, a partir da década de 1980 foram implementadas algumas estratégias de promoção, proteção e apoio à amamentação que resultaram em efeitos positivos em todos os indicadores de amamentação.99 Rea MF. Reflexões sobre a amamentação no Brasil: de como passamos a 10 meses de duração. Cad Saúde Pública. 2003; 19 (Supl. 1): S37-S45. A taxa de amamentação na primeira hora de vida (AMPH), era de 43% em 2006, segundo a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS); em 2008 a II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno (II PPAM) encontrou 67,1%1010 Brasil. Ministério da Saúde. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília, DF; 2009. 108p. [acesso em 26/02/2018] Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publica-coes/pesquisa_prevalencia_aleitamento_materno.pdf
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e mais recentemente o Inquérito Nacional Nascer no Brasil, realizado em maternidades brasileiras, portanto, com menor risco de viés de memória que inquéritos anteriores, apontou uma prevalência nacional de 56%.1111 Carvalho ML, Boccolini CS, Oliveira MIC, Leal MC. The baby-friendly hospital initiative and breastfeeding at birth in Brazil: a cross sectional study. Reprod Health. 2016; 13(3): 119. A duração mediana da amamentação passou de 2,5 para 11,3 meses no período de 1975 a 2008 e o aleitamento materno exclusivo em menores de seis meses, embora tenha aumentado em 14 vezes, passando de 3,1% para 41,0%, ainda se encontra abaixo do esperado.1010 Brasil. Ministério da Saúde. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília, DF; 2009. 108p. [acesso em 26/02/2018] Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publica-coes/pesquisa_prevalencia_aleitamento_materno.pdf
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,1212 Venâncio SI, Saldiva SRDM, Monteiro CA. Tendência secular da amamentação no Brasil. Rev Saúde Pública. 2013; 47 (6): 1205-8.

Dentre as ações implementadas para promover o aleitamento materno a Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC) está entre as intervenções mais eficazes para melhorar as taxas de AMPH, AME, amamentação predominante (AMP) e qualquer amamentação (AM).1313 Martens PJ. What do Kramer's Baby-Friendly Hospital Initiative PROBIT studies tell us? A review of a decade of research. J Hum Lact. 2012; 28 (3): 335-42.

14 Sinha B, Chowdhury R, Sankar MJ, Martines J, Taneia S, Mazumder S et al. Interventions to improve breastfeeding outcomes: a systematic review and meta-analysis. Acta Pediatr. 2015; 104: 114-35.
-1515 Pérez-Escamilla RP, Martinez JL, Segura-Pérez S. Impact of the Baby-friendly Hospital Initiative on breastfeeding and child health outcomes: a systematic review. Matern Child Nutr. 2016; 12 (3): 402-17. A IHAC foi criada pela OMS e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância no início da década de 1990 com o objetivo de diminuir a morbimortalidade infantil por meio do estímulo à prática da amamentação. Em 2016, 10% dos nascimentos globais ocorreram em HAC, variando de 35% na Europa a 5% na África, sendo 15% na América Latina e Caribe.55 WHO (World Health Organization). National Implementation of the Baby-friendly Hospital Initiative, Geneva; 2017. [acesso em 10 de set 2017]. Disponível em: http://www.who.int/nutrition/publications/infantfeeding/bfhi-national-implementation2017/en/
http://www.who.int/nutrition/publication...
,88 OPAS (Organización Panamericana de la Salud). La Iniciativa hospital amigo del nino en América Latina y el Caribe: Estado actual, retos y oportunidades. Washington, DC: OPS, 2016. No Brasil, em 2016 havia 326 hospitais credenciados correspondendo a uma cobertura de 23,4% dos nascimentos no país.55 WHO (World Health Organization). National Implementation of the Baby-friendly Hospital Initiative, Geneva; 2017. [acesso em 10 de set 2017]. Disponível em: http://www.who.int/nutrition/publications/infantfeeding/bfhi-national-implementation2017/en/
http://www.who.int/nutrition/publication...
,88 OPAS (Organización Panamericana de la Salud). La Iniciativa hospital amigo del nino en América Latina y el Caribe: Estado actual, retos y oportunidades. Washington, DC: OPS, 2016.,1616 Cruz NS. Evolução do grau de cumprimento dos critérios preconizados pela Iniciativa Hospital Amigo da Criança no Brasil. In: IBFAN. Anais do XIV Encontro Nacional de Aleitamento Materno; 2016, 22 a 25 de nov; Florianópolis, Brasil. 2016. p.528.

Embora a efetividade da IHAC em elevar as taxas de amamentação esteja bem demonstrada na literatura,1313 Martens PJ. What do Kramer's Baby-Friendly Hospital Initiative PROBIT studies tell us? A review of a decade of research. J Hum Lact. 2012; 28 (3): 335-42.

14 Sinha B, Chowdhury R, Sankar MJ, Martines J, Taneia S, Mazumder S et al. Interventions to improve breastfeeding outcomes: a systematic review and meta-analysis. Acta Pediatr. 2015; 104: 114-35.
-1515 Pérez-Escamilla RP, Martinez JL, Segura-Pérez S. Impact of the Baby-friendly Hospital Initiative on breastfeeding and child health outcomes: a systematic review. Matern Child Nutr. 2016; 12 (3): 402-17. ainda é pouco conhecido seu efeito potencial na redução de mortes infantis. Considerando-se a importância de estudos de impacto e estimativas de realidade para se avaliar políticas e ações de saúde, o objetivo desta análise foi estimar a fração atribuível populacional da mortalidade infantil mediante as mudanças em indicadores de amamentação no Brasil devido à IHAC.

Métodos

Trata-se de uma estimativa do impacto da IHAC na redução da mortalidade infantil com nível de inferência de plausibilidade, baseada no cálculo de fração atribuível populacional (FAP). A FAP é uma medida capaz de mensurar o efeito da eliminação do fator de risco para determinado desfecho, medindo o quanto a ocorrência do desfecho pode ser diminuída se o fator de risco fosse eliminado e, portanto, permite quantificar o efeito de uma estratégia preventiva na Saúde Pública.1717 McIsaac KE; Moineddin R; Matheson FI. Breastfeeding as a means to prevent infant morbidity and mortality in Aboriginal Canadians: A population prevented fraction analysis. Can J Public Health. 2015; 106 (4): 217-222.

18 Rezende LFM, Eluf-Neto J. Fração atribuível populacional: planejamento de ações de prevenção de doenças no Brasil. Rev Saúde Pública. 2016; 50: 30.
-1919 Camey AS, Agrononik M, Radaelli J, Hirokata NV. Fração atribuível populacional. Rev HCPA. 2010; 30 (1): 77-85.

Utilizaram-se duas fontes de dados secundários nas análises, uma para coleta de dados sobre a prevalência de amamentação em crianças nascidas em Hospitais Amigos da Criança (HAC) ou não Hospitais Amigos da Criança (NHAC) e outra para dados nacionais de mortalidade infantil.

As prevalências de amamentação entre crianças nascidas em HAC e NHAC foram obtidas da II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno (II PPAM) realizada no Brasil em 2008. A PPAM é um inquérito nacional realizado em todas as capitais brasileiras e no Distrito Federal sobre as práticas de alimentação infantil envolvendo lactentes menores de um ano que comparecem às campanhas nacionais de multivacinação. O protocolo de pesquisa da II PPAM foi aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto de Saúde (Protocolo 001/2008, de 06/05/2008), após consulta à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa.

Os participantes da II PPAM foram selecionados considerando o número de postos de vacinação e o número de crianças imunizadas em cada posto no ano anterior. A amostra foi definida em duas etapas. Na primeira etapa, foram sorteados os postos e na segunda o sorteio sistemático das crianças na fila para serem vacinadas. O instrumento para coleta de dados contemplava características das crianças e suas mães, o nascimento em HAC ou NHAC e o consumo alimentar da criança nas últimas 24 horas.1010 Brasil. Ministério da Saúde. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília, DF; 2009. 108p. [acesso em 26/02/2018] Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publica-coes/pesquisa_prevalencia_aleitamento_materno.pdf
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Para esta análise foram incluídas apenas crianças menores de seis meses de idade (n=18.929), 34,1% nasceram em HAC e metade (50,7%) nasceram de parto normal. No momento da entrevista, 71,4% das mães possuíam de 20 a 35 anos, 38,5% estudaram até nove anos e apenas 14,7% das mães trabalhavam fora de casa. A amostra da PPAM foi delineada para ser representativa das mães e crianças residentes nas capitais brasileiras e Distrito Federal.1010 Brasil. Ministério da Saúde. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília, DF; 2009. 108p. [acesso em 26/02/2018] Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publica-coes/pesquisa_prevalencia_aleitamento_materno.pdf
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,1212 Venâncio SI, Saldiva SRDM, Monteiro CA. Tendência secular da amamentação no Brasil. Rev Saúde Pública. 2013; 47 (6): 1205-8.

Para o cálculo do número de mortes evitáveis foram utilizados os dados nacionais de mortalidade infantil disponíveis no DATASUS, sistema do Ministério da Saúde, Brasil, referentes ao ano de 2008, para os três indicadores de mortalidade especificados a seguir: (a) Mortalidade neonatal tardia definida como óbitos ocorridos de 7 a 27 dias de vida completos. Optou-se por utilizar apenas os óbitos ocorridos neste período devido à forte influência dos fatores perinatais na mortalidade neonatal precoce (óbitos ocorridos de 0 a 6 dias de vida completos)]; (b) Mortalidade por todas as causas ocorridas no período de 7 dias a 180 dias de vida e (c) Mortalidade por infecção ocorrida no período de 7 dias a 180 dias de vida.

A análise dos dados consistiu de 2 etapas descritas na Figura 1. A primeira etapa buscou identificar a associação entre nascer em HAC e práticas de amamentação e consistiu de dois passos. No primeiro passo (1a) foram obtidas as prevalências dos três indicadores de amamentação segundo nascimento em HAC ou NHAC. Para garantir a representatividade das prevalências dos indicadores de amamentação, estas foram obtidas levando-se em conta a complexidade da amostra da II PPAM, considerando o peso amostral de cada capital. No segundo passo (1b), calculou-se a diferença percentual nas prevalências de amamentação devido ao nascimento em HAC mediante a seguinte expressão:

Preval ê ncia HAC preval ê ncia NHAC X 100 preval ê ncia NHAC

Figura 1
Descrição das etapas de análise para estimativa da redução da mortalidade infantil mediada pela amamentação promovida pela Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC).

Na segunda etapa, estimou-se a fração atribuível da IHAC na redução da mortalidade infantil mediada pelo incremento da amamentação. Para tal, no primeiro passo dessa segunda etapa (2a) calculou-se a fração atribuível populacional da não amamentação para crianças nascidas em NHAC (FAPNHAC) e para os nascidos em HAC (FAPHAC), considerando-se os três indicadores de mortalidade selecionados. Nesta análise a FAP foi calculada conforme proposto por Rezende e Eluf-Neto.1818 Rezende LFM, Eluf-Neto J. Fração atribuível populacional: planejamento de ações de prevenção de doenças no Brasil. Rev Saúde Pública. 2016; 50: 30.

FAP = Pex RR 1 / Pex RR 1 + 1

Onde, RR é o risco relativo de mortalidade de expostos em relação aos não expostos. Foram obtidas as estimativas de risco relativo (RR) de meta-análises sobre efeito da amamentação nos indicadores de mortalidade descritos na literatura (Tabela 1) e Pex é a prevalência da exposição obtida a partir dos dados da II PPAM.

Tabela 1
Efeito da não amamentação nos indicadores de mortalidade infantil, segundo meta-análises.

Foram consideradas como fatores de exposição duas condições: a não amamentação na primeira hora de vida (NAMPH) e a não amamentação em menores de 6 meses (NAM). Como desfechos foram analisados (i) mortalidade neonatal tardia mediada pela exposição à NAMPH, (ii) mortalidade por todas as causas e (iii) mortalidade por infecção mediada pela exposição à NAM comparada a crianças em AME, ambos em menores de 6 meses.

No segundo passo (2b), foi estimado o número de óbitos infantis atribuíveis à não amamentação aplicando as FAPs estimadas (FAPNHAC e FAPHAC) aos dados de mortalidade infantil ocorridos em 2008. Dessa forma, a estimativa do número de mortes evitáveis pela promoção da amamentação, caso todas as crianças nascessem em HAC, foi obtido subtraindo-se os óbitos atribuíveis à FAPNHAC da FAPHAC.

A análise estatística dos dados foi realizada no programa StataSE 14.1 e Excel®. A comparação entre as proporções foi realizada pelo teste do qui-quadrado e o cálculo dos intervalos de confiança das FAPs pelo método de substituição, conforme proposto por Daly2020 Daly LE. Confidence limits made easy: Interval estimation using a substitution method. Am J Epidemiol. 1998; 147(8): 783-90. e aplicado em estudos dessa natureza.1717 McIsaac KE; Moineddin R; Matheson FI. Breastfeeding as a means to prevent infant morbidity and mortality in Aboriginal Canadians: A population prevented fraction analysis. Can J Public Health. 2015; 106 (4): 217-222.

Resultados

Na amostra obtida da II PPAM as taxas de aleitamento materno entre as crianças nascidas em HAC (34,1% dos 18.929 menores de 6 meses) foram significativamente mais elevadas em todos os indicadores. A Tabela 2 apresenta as prevalências dos três indicadores de amamentação investigados para crianças nascidas em HAC e NHAC. Para as nascidas em HAC, a AMPH aumentou em 11,7%, o AME em 7,9% e o AM em 2,1%.

Tabela 2
Prevalências e diferença percentual dos indicadores de amamentação considerando o nascimento em Não Hospital Amigo da Criança (NHAC) ou Hospital Amigo da Criança (HAC). Capitais brasileiras e Distrito Federal, 2008.

Ao serem calculadas as FAPs da mortalidade infantil pela não amamentação, observou-se que se todas as crianças nascessem em HAC a fração de mortalidade atribuível à não amamentação seria menor para todos os desfechos em virtude das taxas mais elevadas de aleitamento materno proporcionadas pela IHAC (Tabela 3).

Tabela 3
Fração atribuível populacional (FAP) da mortalidade infantil associada à não amamentação considerando nascimentos em Não Hospital Amigo da Criança (NHAC) e Hospital Amigo da Criança (HAC). Capitais brasileiras e Distrito Federal, 2008.

A Tabela 4 estima quantas mortes seriam evitadas caso todas as crianças nascessem em HAC ao serem aplicadas as FAPNHAC e FAPHAC ao número de mortes infantis ocorridas em 2008 no Brasil. A redução na mortalidade proporcionada pela IHAC foi de 4,2% para mortalidade neonatal tardia, 3,5% para mortalidade por todas as causas e 4,2% para mortalidade por infecção.

Tabela 4
Estimativa das mortes atribuíveis à não amamentação entre crianças nascidas em Não Hospital Amigo da Criança (NHAC), em Hospital Amigo da Criança (HAC) e mortes potencialmente evitadas pela Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC). Capitais brasileiras e Distrito Federal, 2008.

Discussão

Os resultados retratam de maneira inédita o impacto potencial da IHAC na redução da mortalidade infantil no Brasil ao elevar as prevalências de diferentes indicadores de amamentação e o quanto nascer em Hospital Amigo da Criança significa em termos de vidas salvas. Entre os nascidos em HAC a prevalência da amamentação na primeira hora de vida foi 11,7% maior que os não nascidos em HAC. Da mesma forma, o AME em menores de seis meses foi 7,9% mais prevalente entre os nascidos em HAC. Essas prevalências mais elevadas de amamentação resultaram na redução de 3,5 a 4,2% dos óbitos infantis entre crianças de 7 a 180 dias de vida, caso todas as crianças nascessem em HAC.

O efeito observado na redução da mortalidade neonatal tardia, em decorrência de maior prevalência na AMPH em crianças nascidas em HAC, reforça as evidências dessa prática como um importante fator de proteção à sobrevivência infantil.66 Khan J, Vesel L, Bahl R, Martines JC. Timing of Breastfeeding Initiation and Exclusivity of Breastfeeding During the First Month of Life: Effects on Neonatal Mortality and Morbidity-A Systematic Review and Metaanalysis. Matern Child Health J. 2015; 19: 468-79,88 OPAS (Organización Panamericana de la Salud). La Iniciativa hospital amigo del nino en América Latina y el Caribe: Estado actual, retos y oportunidades. Washington, DC: OPS, 2016.,2121 Debes AK, Kohli A, Walker N, Edmond K, Mullany LC. Time to initiation of breastfeeding and neonatal mortality and morbidity: a systematic review. BMC Public Health. 2013; 13 (Suppl. 3): S19.,2222 Edmond KM, Zandoh C, Quigley MA, Amenga-Etego S, Owusu-Agyei S, Kirkwood BR. et. Delayed breastfeeding initiation increases risk of neonatal mortality. Pediatrics. 2006; 117 (3): e380-6. Edmond et al.2222 Edmond KM, Zandoh C, Quigley MA, Amenga-Etego S, Owusu-Agyei S, Kirkwood BR. et. Delayed breastfeeding initiation increases risk of neonatal mortality. Pediatrics. 2006; 117 (3): e380-6. em um ensaio randomizado com 10.947 crianças em Gana demonstrou o efeito protetor da amamentação precoce observando que 22% das mortes neonatais poderiam ser evitadas se a amamentação fosse iniciada na primeira hora de vida e 16% se todas as crianças fossem amamentadas no primeiro dia. A redução inferior encontrada em nosso estudo - em que pesem as diferenças de um país africano e outro na América - pode ser justificada pelo fato de não ser esta uma análise direta do efeito da amamentação na mortalidade, e sim uma estimativa do efeito da IHAC mediado pela amamentação promovida.

Ao mesmo tempo, evidencia a relevância dessa política como uma das estratégias mais efetivas para fomentar a AMPH por preconizar o adiamento dos cuidados de rotina do recém-nascido, dando oportunidade ao contato pele-a-pele logo após o parto, favorecendo o início precoce do aleitamento materno.66 Khan J, Vesel L, Bahl R, Martines JC. Timing of Breastfeeding Initiation and Exclusivity of Breastfeeding During the First Month of Life: Effects on Neonatal Mortality and Morbidity-A Systematic Review and Metaanalysis. Matern Child Health J. 2015; 19: 468-79,1111 Carvalho ML, Boccolini CS, Oliveira MIC, Leal MC. The baby-friendly hospital initiative and breastfeeding at birth in Brazil: a cross sectional study. Reprod Health. 2016; 13(3): 119.,1414 Sinha B, Chowdhury R, Sankar MJ, Martines J, Taneia S, Mazumder S et al. Interventions to improve breastfeeding outcomes: a systematic review and meta-analysis. Acta Pediatr. 2015; 104: 114-35.,2323 Venâncio SI, Saldiva SR, Escuder MM, Giugliani ER. The baby-friendly hospital initiative shows positive effects on breastfeeding indicators in Brazil. J Epidemiol Community Health. 2012; 66 (10): 914-8. A OMS recomenda que este procedimento seja incorporado aos padrões nacionais de qualidade para cuidados de saúde materna, neonatal e infantil, visando a prevenção de mortes infantis.55 WHO (World Health Organization). National Implementation of the Baby-friendly Hospital Initiative, Geneva; 2017. [acesso em 10 de set 2017]. Disponível em: http://www.who.int/nutrition/publications/infantfeeding/bfhi-national-implementation2017/en/
http://www.who.int/nutrition/publication...
,88 OPAS (Organización Panamericana de la Salud). La Iniciativa hospital amigo del nino en América Latina y el Caribe: Estado actual, retos y oportunidades. Washington, DC: OPS, 2016.

A redução de 602 óbitos por todas as causas e 723 mortes por infecção em menores de 6 meses foi identificada mesmo com pequena diferença percentual em qualquer amamentação promovida pela IHAC (2,1%). Nossos achados corroboram resultados descritos na literatura.22 Lamberti LM, Zakarija-Grkovic I, Walker CL, Theodoratou E, Nair H, Campbell H. Breastfeeding for reducing the risk of pneumonia morbidity and mortality in children under two: a systematic literature review and meta-analysis. BMC Public Health. 2013; 13 (Suppl. 3): S18.,77 Escuder MM, Venâncio SI, Pereira JCS. Estimativa de impacto da amamentação sobre a mortalidade infantil. Rev Saúde Pública. 2003; 37 (3); 319-25.,44 Victora CG, Bahl R, Barros AJD, França GVA, Horton S, Krasevec J et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016; 387 (10017): 475-90. Lamberti et al.22 Lamberti LM, Zakarija-Grkovic I, Walker CL, Theodoratou E, Nair H, Campbell H. Breastfeeding for reducing the risk of pneumonia morbidity and mortality in children under two: a systematic literature review and meta-analysis. BMC Public Health. 2013; 13 (Suppl. 3): S18. observaram que crianças não amamentadas, quando comparadas a crianças em amamentação mesmo que parcial, apresentaram 4,7 vezes maior risco de morte por todas as causas e 9,5 vezes maior de morte por pneumonia.22 Lamberti LM, Zakarija-Grkovic I, Walker CL, Theodoratou E, Nair H, Campbell H. Breastfeeding for reducing the risk of pneumonia morbidity and mortality in children under two: a systematic literature review and meta-analysis. BMC Public Health. 2013; 13 (Suppl. 3): S18.,33 Sankar MJ, Sinha B, Chowdhury R, Bhandari N, Taneia S, Martines J, Bahl R. Optimal breastfeeding practices and infant and child mortality: a systematic review and metaanalysis. Acta Pediatr. 2015; 104 (3): 3-13.,44 Victora CG, Bahl R, Barros AJD, França GVA, Horton S, Krasevec J et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016; 387 (10017): 475-90.,88 OPAS (Organización Panamericana de la Salud). La Iniciativa hospital amigo del nino en América Latina y el Caribe: Estado actual, retos y oportunidades. Washington, DC: OPS, 2016. Victora et al.44 Victora CG, Bahl R, Barros AJD, França GVA, Horton S, Krasevec J et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016; 387 (10017): 475-90. em revisão sistemática e metanálise evidenciou a proteção contra o risco de morrer por doenças infecciosas conferida por qualquer amamentação e, em especial pelo AME, proteção que se estende até o segundo ano de vida. Logo, o aumento da amamentação deve estar entre as principais prioridades para reduzir mortes infantis, justificando investimentos em políticas públicas promotoras do aleitamento materno.44 Victora CG, Bahl R, Barros AJD, França GVA, Horton S, Krasevec J et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016; 387 (10017): 475-90.,55 WHO (World Health Organization). National Implementation of the Baby-friendly Hospital Initiative, Geneva; 2017. [acesso em 10 de set 2017]. Disponível em: http://www.who.int/nutrition/publications/infantfeeding/bfhi-national-implementation2017/en/
http://www.who.int/nutrition/publication...
,88 OPAS (Organización Panamericana de la Salud). La Iniciativa hospital amigo del nino en América Latina y el Caribe: Estado actual, retos y oportunidades. Washington, DC: OPS, 2016.

Tais evidências, portanto, fundamentam o propósito original da IHAC de contribuir para a redução da mortalidade infantil, haja vista a associação entre IHAC e taxas mais elevadas de amamentação.1313 Martens PJ. What do Kramer's Baby-Friendly Hospital Initiative PROBIT studies tell us? A review of a decade of research. J Hum Lact. 2012; 28 (3): 335-42.

14 Sinha B, Chowdhury R, Sankar MJ, Martines J, Taneia S, Mazumder S et al. Interventions to improve breastfeeding outcomes: a systematic review and meta-analysis. Acta Pediatr. 2015; 104: 114-35.
-1515 Pérez-Escamilla RP, Martinez JL, Segura-Pérez S. Impact of the Baby-friendly Hospital Initiative on breastfeeding and child health outcomes: a systematic review. Matern Child Nutr. 2016; 12 (3): 402-17. Neste estudo, apesar da efetividade da IHAC em elevar as prevalências do aleitamento materno, o efeito observado é mais discreto quando comparado a estudos internacionais. Um ensaio comunitário, quase experimental, realizado em 54 municípios da Noruega, incluindo 2.030 crianças mostrou que a IHAC aumentou em 33% a probabilidade de AME em menores de seis meses.2424 Baeruk A, Langsrud O, Loland BF, Tufte E, Tylleskar T, Fretheim A. Effectiveness of Baby-friendly community health services on exclusive breastfeeding and maternal satisfaction: a pragmatic trial. Matern Child Nutr. 2016; 12: 428-39.

Recente revisão sistemática com meta-análise concluiu que a IHAC contribuiu para aumentar em 20% a AMPH, em 49% o AME nos primeiros seis meses e em 66% qualquer amamentação.1414 Sinha B, Chowdhury R, Sankar MJ, Martines J, Taneia S, Mazumder S et al. Interventions to improve breastfeeding outcomes: a systematic review and meta-analysis. Acta Pediatr. 2015; 104: 114-35. Pérez-Escamilla et al.1515 Pérez-Escamilla RP, Martinez JL, Segura-Pérez S. Impact of the Baby-friendly Hospital Initiative on breastfeeding and child health outcomes: a systematic review. Matern Child Nutr. 2016; 12 (3): 402-17. revisando estudos de 19 países concluiu que a IHAC tem efeito positivo nos desfechos de amamentação em curto, médio e longo prazo, confirmando os resultados do estudo PROBIT, pioneiro em demonstrar a efetividade da IHAC.1313 Martens PJ. What do Kramer's Baby-Friendly Hospital Initiative PROBIT studies tell us? A review of a decade of research. J Hum Lact. 2012; 28 (3): 335-42.

Sabe-se entretanto que a ocorrência desse efeito está sujeita ao cumprimento dos Dez Passos para o Sucesso da Amamentação, base da Iniciativa. Segundo Pérez-Escamilla et al.1515 Pérez-Escamilla RP, Martinez JL, Segura-Pérez S. Impact of the Baby-friendly Hospital Initiative on breastfeeding and child health outcomes: a systematic review. Matern Child Nutr. 2016; 12 (3): 402-17. existe uma relação dose-resposta entre o número de etapas da IHAC nas quais as mulheres estão expostas e a probabilidade de melhorar os desfechos da amamentação. DiGirolamo2525 DiGirolamo AM, Grummer-Strawn LM, Fein SB. Effect of maternity-care practices on breastfeeding. Pediatrics. 2008; 122 (Suppl. 2): 43-9. observou que mães que não experimentaram nenhum dos passos da IHAC tiveram 13 vezes mais chance de interromper precocemente a amamentação. Dentre esses, o passo 10 (encaminhamento das mães a grupos de apoio na atenção básica), parece ser essencial para sustentar os efeitos da IHAC na amamentação a longo prazo por fortalecer as ações de apoio e promoção da amamentação realizadas na atenção básica.1515 Pérez-Escamilla RP, Martinez JL, Segura-Pérez S. Impact of the Baby-friendly Hospital Initiative on breastfeeding and child health outcomes: a systematic review. Matern Child Nutr. 2016; 12 (3): 402-17.,2626 Passanha A, Benício MHD, Venâncio SI, Reis MCG. Influência do apoio ao aleitamento materno oferecido pelas maternidades. Rev Saúde Pública. 2015; 49: 85.

No Brasil, dados do monitoramento on-line da IHAC realizado anualmente pelo Ministério da Saúde, apontam aumento do grau médio de cumprimento dos Dez passos de 56,8% em 2011 para 86,8% em 2015, com evolução do passo 4 (contato pele-a-pele) de 45% para 65% no mesmo período.1616 Cruz NS. Evolução do grau de cumprimento dos critérios preconizados pela Iniciativa Hospital Amigo da Criança no Brasil. In: IBFAN. Anais do XIV Encontro Nacional de Aleitamento Materno; 2016, 22 a 25 de nov; Florianópolis, Brasil. 2016. p.528. No entanto, estudos nacionais realizados ao longo dos 25 anos da IHAC no Brasil, destacaram as dificuldades para o cumprimento dos 10 passos em hospitais credenciados.2626 Passanha A, Benício MHD, Venâncio SI, Reis MCG. Influência do apoio ao aleitamento materno oferecido pelas maternidades. Rev Saúde Pública. 2015; 49: 85.

27 Ortiz PN, Rolim RB, Souza MFL, Soares PL, Vieira TO, Vieira GO, Lyra PPR, Silva LR. Comparação das práticas de amamentação em hospitais IHAC e não credenciados em Salvador, Bahia. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2011; 11(4): 405-13.

28 Oliveira MIC, Hartz ZMA, Silva KS. Avaliação da implantação da iniciativa hospital amigo da criança no Rio de Janeiro, Brasil. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2012; 12 (3): 281-95.
-2929 Araújo MFM, Otto AFN, Schmitz BAS. Primeira avaliação do cumprimento dos dez passos para o sucesso do aleitamento materno nos Hospitais Amigos da Criança do Brasil. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2003; 3 (4): 411-9. Este pode ser, portanto, um dos principais fatores que contribuiram para minimizar a efetividade da IHAC na redução da mortalidade infantil via promoção da amamentação observada neste estudo.

Recentes relatórios da OMS e OPAS reconhecem que a IHAC, em nível mundial, enfrenta inúmeros desafios em termos de sustentabilidade, financiamento e prioridades concorrentes. Dentre os principais desafios encontram-se resistência às mudanças e falta de identificação com a Iniciativa, problemas com recursos humanos, como a rotatividade de pessoal e a falta de treinamento e violações do Código Internacional de Comercialização de Substitutos de leite materno. Alertam que a atenção à essa política vem diminuindo ao longo do tempo, carecendo ser revitalizada, haja vista sua importância na promoção da amamentação para salvar vidas.55 WHO (World Health Organization). National Implementation of the Baby-friendly Hospital Initiative, Geneva; 2017. [acesso em 10 de set 2017]. Disponível em: http://www.who.int/nutrition/publications/infantfeeding/bfhi-national-implementation2017/en/
http://www.who.int/nutrition/publication...
,88 OPAS (Organización Panamericana de la Salud). La Iniciativa hospital amigo del nino en América Latina y el Caribe: Estado actual, retos y oportunidades. Washington, DC: OPS, 2016.

No Brasil, um estudo observou que a implantação da IHAC constitui um processo de mudança abrangente que influencia diferentes aspectos de uma instituição, incluindo mudanças estruturais e tecnológicas e em especial de ordem cultural, passando pela resistência à mudança e falta de apropriação da Iniciativa por médicos e gestores.3030 Sekya SR, Luz TR. Mudança organizacional: implantação da Iniciativa Hospital Amigo da Criança. Ciênc Saúde Coletiva. 2010; 15 (Supl. 1): 1263-73. Isto é necessário para a sensibilização e humanização dos profissionais envolvidos na aplicação das práticas adequadas do parto/nascimento e amamentação. Essas questões requerem enfrentamento e ajudam a explicar os desafios para o cumprimento dos critérios exigidos pela Iniciativa, que podem determinar seu impacto na redução da mortalidade infantil.

Embora as estimativas de prevalência dos indicadores de amamentação tenham sido obtidas de uma amostra representativa das crianças residentes nas capitais brasileiras e Distrito Federal, não é possível afirmar, no momento da realização do estudo, se os HAC cumpriam os Dez Passos. Dessa forma, as estimativas de impacto da IHAC mediada pelo aumento das prevalências da amamentação podem estar subestimadas, sendo esta uma limitação deste estudo. Contudo, a abordagem da FAP consiste em uma metodologia viável e recomendada que deve ser repetida para avaliar o impacto de intervenções em saúde pública.1717 McIsaac KE; Moineddin R; Matheson FI. Breastfeeding as a means to prevent infant morbidity and mortality in Aboriginal Canadians: A population prevented fraction analysis. Can J Public Health. 2015; 106 (4): 217-222.

18 Rezende LFM, Eluf-Neto J. Fração atribuível populacional: planejamento de ações de prevenção de doenças no Brasil. Rev Saúde Pública. 2016; 50: 30.
-1919 Camey AS, Agrononik M, Radaelli J, Hirokata NV. Fração atribuível populacional. Rev HCPA. 2010; 30 (1): 77-85.

Consideramos que os dados gerados, não obstante a limitação citada, trazem importante contribuição em favor da expansão dessa política no Brasil.

A IHAC contribuiu para reduzir óbitos infantis em crianças de 7 a 180 dias em 2008 no Brasil. A redução da mortalidade infantil potencialmente atribuível a IHAC por elevar as prevalências de diferentes indicadores de amamentação justificam e reforçam a importância de investimentos nacionais no fortalecimento, expansão e sustentabilidade dessa política pública.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    15 Set 2017
  • Aceito
    16 Jul 2018
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