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COVID-19 e desenvolvimento infantil: material educativo para familiares

Resumo

Objetivos:

descrever os procedimentos metodológicos, a fundamentação teórica, as atividades e orientações que compõem material educativo elaborado para familiares, com foco no desenvolvimento de bebês e crianças de 0 a 5 anos no período da pandemia.

Métodos:

pesquisa metodológica aplicada à elaboração e validação de um material educativo. A elaboração envolveu as etapas de revisão da literatura, de criação gráfica e de validação por especialistas.

Resultados:

a revisão da literatura proveu materiais e fundamentação sobre princípios e marcos do desenvolvimento infantil e formas de estimulação por meio da concretização das ocupações infantis. A etapa de validação por especialistas forneceu maior grau de confiabilidade quanto ao potencial de estimulação das atividades e adequação da expressão escrita do material.

Conclusões:

os métodos empregados permitiram desenvolver, avaliar e aperfeiçoar o material educativo garantindo maior qualidade para orientar e assistir as famílias na estimulação diária dos filhos por meio do manejo das ocupações que foram interrompidas. O material pode ser útil para profissionais da educação e saúde, apoiar no ensino de graduação e/ou em atividades de extensão universitária que tenham o foco no desenvolvimento infantil.

Palavras-chave
Desenvolvimento infantil; Saúde da criança; Educação em saúde; COVID-19

Abstract

Objectives:

to describe methodological procedures, theoretical foundation, activities and guidelines that compose an educational material designed for family members with a focus on the development of babies and children from 0 to 5 years old during the pandemic period.

Methods:

methodological research was applied to the preparation and validation of the educational material. The elaboration involved a literature review, graphic material creation and a validation by experts.

Results:

the literature review provided materials and background on child development principles and forms of stimulation through the realization of child occupations. The stage of validation by specialists provided a greater degree of reliability regarding the potential to stimulate activities and adequacy of the written elements of the material.

Conclusions:

the methods employed made it possible to develop, evaluate and improve the educational material, ensuring greater quality to guide and assist families in the daily stimulation of their children and in the management of occupational disruption. The material can also be useful for education and health professionals, support undergraduate education and/or university extension activities that focus on child development.

Key words
Child development; Child health; Health education; COVID-19

Introdução

Desde finais de 2019, a pandemia causada pelo coronavírus (COVID-19), de forma abrupta, impôs as pessoas a experiência de viver sob a privação de oportunidades ocupacionais. Portanto, parte significativa da população vivencia diariamente a perda da oportunidade de acessar educação e emprego, edifícios, bibliotecas, espaços públicos e recreativos, mover-se livremente dentro de suas próprias comunidades, viajar para outra cidade, Estado e/ou país. Tal privação e perdas já eram vivenciadas pelas pessoas com deficiência ou que vivem marginalizadas pela condição de pobreza, por racismo, entre outros.11. Hammeil KW. Engagement in living during the Covid-19 pandemic and ensuing occupational disruption. [Internet], 2020. [acesso 5 set 2020]. Disponivel em:http://caot.ca/document/7179/Ensuring%20occupational%20disruption.pdf?fbclid=IwAR0Gocd3XIPpEME4 wbPrJ2CnsIuY_WzIBBt6NncdCYoDgl4k8rAG6-cKEU
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O isolamento social constitui uma recomendação mundial no combate ao contágio do COVID-1922. WHO (World Health Organization). Coronavirus disease (COVID-19) advice for the public. [Internet], 2020. [acesso 5 set 2020]. Disponivel em: https://www.who.int/emergencies/diseases/novelcoronavirus2019/advice-for-public
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e a Terapia Ocupacional tem o compromisso, tanto de apoiar esta recomendação, como de promover a conscientização de que a interrupção das ocupações diárias pode afetar a saúde física, mental e ocupacional, bem como orientar formas de manejar esta interrupção.33. Mynard L. Normal life has been disrupted. Managing the disruption caused by COVID-19. An Occupational Therapy Guide I. [Internet], [acesso 5 set 2020]. 2020. Disponivel em: https://otaus.com.au/publicassets/af4690026f6aeal 19404005056bel3b5/OT%20Guid%20COVID-19%20March%202020.pdf?246d3087-7f6d-eall-9404-005056bel3b5
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Especificamente em relação à população infantil, a recomendação do isolamento social paralisou a ida às escolas, eliminou a convivência com amigos, fechou parques, cancelou atividades esportivas e culturais, interrompendo as usuais formas de concretização das ocupações de estudar, conviver com familiares fora do núcleo doméstico, o brincar e o de lazer. Por isso, é fundamental a conscientização sobre como esta interrupção pode afetar a saúde mental e ocupacional das pessoas e que estas ocupações precisam ser redimensionadas, de modo que haja a continuidade do desenvolvimento e da aprendizagem.33. Mynard L. Normal life has been disrupted. Managing the disruption caused by COVID-19. An Occupational Therapy Guide I. [Internet], [acesso 5 set 2020]. 2020. Disponivel em: https://otaus.com.au/publicassets/af4690026f6aeal 19404005056bel3b5/OT%20Guid%20COVID-19%20March%202020.pdf?246d3087-7f6d-eall-9404-005056bel3b5
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Contudo, há de se considerar que essas crianças fazem parte de uma família com adultos que também precisam conviver com as interrupções impostas pela COVID-19. Inúmeros familiares passaram a exercer seus trabalhos remunerados a partir de seus domicílios, outros tiveram redução da carga horária de trabalho e tantos outros perderam seus empregos. Com isso, o contexto familiar precisa ser considerado ao pensar medidas para o manejo da interrupção das ocupações típicas da infância.

Pesquisadores têm mostrado que a resiliência diante de uma crise é essencial no seu enfrentamento e que o estilo de enfrentamento baseado no que é preciso ser feito diante de um problema está associado a níveis mais baixos de ansiedade e problemas de saúde.44. Summerfield D. The invention of post-traumatic stress disorder and the social usefulness of a psychiatric category. Brit Med J. 2001;322:95-8. Wilcock55. Wilcock AA. Occupation for Health. Brit J Occup Ther. 1998; 61(8): 340-5. refere que é impossível imaginar a vida humana sem o fazer, uma vez que as pessoas estão constantemente fazendo algo com algum propósito pessoal ou para outrem. Historicamente, a evolução humana foi resultante de contínuos e progressivos fazeres que possibilitaram a sobrevivência da espécie.55. Wilcock AA. Occupation for Health. Brit J Occup Ther. 1998; 61(8): 340-5. Conforme o que foi feito e/ou como foi feito repercutiu em estimulação, entretenimento e saúde, ou em depressão, alienação e stress: “fazer ou não fazer são poderosos determinantes do bem-estar ou da doença” (p.3).55. Wilcock AA. Occupation for Health. Brit J Occup Ther. 1998; 61(8): 340-5.

Rodger e Zivian66. Rodger S, Ziviani J. Children, their environments, roles and occupations in contemporary society. In: S Rodger, J Ziviani. Occupational therapy with children: understanding children’s occupations and enabling participation. Oxford, UK: Blackwell Publishing; 2006. p. 3-18. indicam que as ocupações fornecem um senso de propósito, atuam na organização do tempo e espaço e constituem um meio para o desenvolvimento e a expressão da identidade. As ocupações têm sido classificadas em autocuidado, trabalho/produtividade ou escola, lazer ou brincar, e espiritualidade. As variações são decorrentes do que é típico para cada ciclo etário, por exemplo, trabalho/produtividade para os adultos e escola e brincar para as crianças. A forma como as crianças veem a si mesmas e o mundo está diretamente relacionada com os papeis que assumirem. Conforme a criança adquire papéis como o de estudante, de amigo, de irmão ou um ser que brinca, ocupa uma posição ou status, adquire uma identidade social e obrigações relacionadas e experimentadas por meio do que faz e como faz.

Portanto, as ocupações e papéis ocupacionais fornecem estrutura para os dias das crianças, sendo importante que haja equilíbrio no engajamento em ocupações e seus respectivos papéis. O engajamento excessivo repercutirá em demandas em excesso, em conflitos de papéis, em estresse, tédio, e desmotivação que podem acarretar o sub-engajamento ocupacional. Por outro lado, quando uma pessoa não pode desempenhar as ocupações e os papéis que deseja, por motivo de doença, deficiência, déficits em habilidades e/ou por existirem condições circunstanciais que impedem ou impossibilitam, Rodger e Ziviani66. Rodger S, Ziviani J. Children, their environments, roles and occupations in contemporary society. In: S Rodger, J Ziviani. Occupational therapy with children: understanding children’s occupations and enabling participation. Oxford, UK: Blackwell Publishing; 2006. p. 3-18. referem que há uma perturbação ou interrupção das ocupações e de papeis ocupacionais. Terapeutas ocupacionais atuam com crianças cujas ocupações e papeis ocupacionais tenham sido perturbados ou interrompidos.66. Rodger S, Ziviani J. Children, their environments, roles and occupations in contemporary society. In: S Rodger, J Ziviani. Occupational therapy with children: understanding children’s occupations and enabling participation. Oxford, UK: Blackwell Publishing; 2006. p. 3-18.

Para Thibeault77. Thibeault R. Occupation and the rebuilding of civil society: notes from the war zone. Journal of Occupational Science. 2002; 9: 38-47. o processo de reconstrução da vida e de promoção do bem-estar, após episódios de interrupção das ocupações, requer a atenção para o cuidar de si mesmo e dos outros; para a experimentação de sentimentos de pertencimento, conexão, prazer, esperança, sensação de coerência, continuidade, propósito e significado; para o envolvimento em papéis e ocupações significativas e valorizadas por cada um.

Profissionais da área da saúde frequentemente fornecem materiais educacionais para a população alvo de distintas intervenções, embora não necessariamente tenham recebido orientação especifica para a preparação dos mesmos. Estes materiais educacionais propiciam que as pessoas possam relembrar a(s) informações sempre que precisarem, favorecem a fixação e permanência da mensagem, possuem flexibilidade no horário de acesso e fácil portabilidade.88. Hoffmann T, Worrall L. Designing effective written health education materials: Considerations for health professionals. Disabil Rehabil. 2004; 26 (19): 1166-73.

Na atual pandemia de COVID-19, é imprescindível que a transferência do conhecimento para a população sobre as melhores práticas de mitigação dos efeitos da privação do convívio social ocorra em um ritmo igual ou melhor do que o ritmo de agravamento da pandemia. Sabe-se que a disseminação das publicações acadêmicas tradicionais em sites ou por via eletrônica é lenta, tendo as redes sociais acelerado este processo.99. Chan A, Nickson CP, Rudolph JW, Lee A, Joynt GM. Social media for rapid knowledge dissemination: early experience from the COVID-19 pandemic. Anaesthesia. 2020; 75(12): 1579-82. Entretanto, o material educacional, além de ter acesso aberto, precisa conter as informações-chave em um formato claro e prático.99. Chan A, Nickson CP, Rudolph JW, Lee A, Joynt GM. Social media for rapid knowledge dissemination: early experience from the COVID-19 pandemic. Anaesthesia. 2020; 75(12): 1579-82.

Estudos têm apontado para a existência de materiais educativos cuja leitura é muito difícil, comprometendo a compreensão e o armazenamento da informação pelas pessoas.88. Hoffmann T, Worrall L. Designing effective written health education materials: Considerations for health professionals. Disabil Rehabil. 2004; 26 (19): 1166-73. Além da adequação da escrita, o próprio objetivo do material tem que ser evidente para que o leitor tenha interesse e dispense sua atenção na leitura. Materiais escritos que fornecem informações sobre “como fazer” são recomendados pois as pessoas têm interesse e/ou necessidade por informações que as ajudem na resolução de seus problemas e/ou que melhorem o próprio bem-estar.88. Hoffmann T, Worrall L. Designing effective written health education materials: Considerations for health professionals. Disabil Rehabil. 2004; 26 (19): 1166-73.

O presente artigo, reconhecendo o compromisso ético de tornar público um conhecimento cientifico para familiares com crianças que repentinamente sofreram a interrupção de suas ocupações em virtude do COVID-19, apresenta um material educativo on line, ou seja, disponível nas redes sociais, composto por atividades e orientações para que familiares realizem com seus filhos em casa. A proposição de atividades e orientações constitui um recurso para o manejo das ocupações infantis que deixaram de ser concretizadas da sua forma usual e para a estimulação do desenvolvimento da população infantil.

Métodos

Trata-se de uma pesquisa metodológica, conforme definida por Polite e Beck1010. Polit DF, Beck CT. Tipos específicos de pesquisa. In: Polit DF, Beck CT. Fundamentos de pesquisa em enfermagem: avaliação de evidencias para a prática de enfermagem. 7 ed. Porto Alegre, RS: Artmed; 2011. p. 316-38. “Os estudos metodológicos tratam do desenvolvimento, da validação e da avaliação de ferramentas e métodos de pesquisa (p.330)”. Segundo Polite e Beck1010. Polit DF, Beck CT. Tipos específicos de pesquisa. In: Polit DF, Beck CT. Fundamentos de pesquisa em enfermagem: avaliação de evidencias para a prática de enfermagem. 7 ed. Porto Alegre, RS: Artmed; 2011. p. 316-38. “a maior parte dos estudos metodológicos é não experimental e frequentemente focada no desenvolvimento de novos instrumentos”.1010. Polit DF, Beck CT. Tipos específicos de pesquisa. In: Polit DF, Beck CT. Fundamentos de pesquisa em enfermagem: avaliação de evidencias para a prática de enfermagem. 7 ed. Porto Alegre, RS: Artmed; 2011. p. 316-38. No presente estudo, o enfoque foi a elaboração e validação de manual educativo conforme descritos por Echer.1111. Echer IC. Elaboração de manuais de orientação para o cuidado em saúde. Rev Latino-Am Enferm. 2005; 13(5): 754-7. Desta forma, o material foi elaborado em três etapas: Etapa 1: revisão da literatura para constituição da fundamentação teórica sobre desenvolvimento infantil e formas de estimular este desenvolvimento por meio da concretização das ocupações infantis; Etapa 2: criação do material gráfico; Etapa 3: validação do material por especialistas.

Etapa 1: revisão e fundamentação teórica

Foi realizada uma revisão na literatura, conforme Grant e Booth.1212. Grant MJ, Booth A. A typology of reviews: an analysis of 14 review types and associated methodologies. Health Information & Libraries Journal. 2009; 26: 91-108. Isto significa um exame da literatura recente que não envolve parâmetros de termos e cronologia, pois não se prevê a replicação da revisão, mas sim a captura de materiais que se adequem ao tema investigado. O exame da literatura ocorreu nos websites das associações internacionais e nacionais de terapia ocupacional, no website da Organização Mundial da Saúde, no website do Centers for Disease Control and Prevention, no website do Ministério da Saúde do Brasil, nas bases de dados Scielo.org e Pubmed, além do Google Acadêmico.

As buscas foram realizadas por meio dos termos “desenvolvimento infantil”, “marcos do desenvolvimento”, “estimulação infantil”, “ocupações infantis”, e seus correspondentes na língua inglesa “child development”, “development milestones”, “child stimulation”, “child occupations”. Dentre os materiais encontrados, foram selecionados e utilizados documentos oficiais, artigos científicos e livros que ofereceram conhecimento sobre os princípios e marcos do desenvolvimento infantil e sobre formas de estimular o desenvolvimento por meio da concretização das ocupações infantis. A partir deste conhecimento as atividades e orientações foram definidas e fizeram parte da criação do material educativo.

Etapa 2: Criação do material gráfico

A criação do material gráfico ocorreu após a definição das atividades e orientações a serem incluídas no material educativo. Com base na literatura encontrada, as autoras fizeram uma produção textual que foi encaminhada ao diagramador. O diagramador realizou a criação do material gráfico por meio da formatação e diagramação do texto. A formatação textual consistiu na escolha do tipo, tamanho e cor da fonte utilizada, do espaçamento entre linhas e entre parágrafos, e no estabelecimento dos limites das margens e tipo de programa a ser utilizado para criação/edição e exibição da apresentação gráfica. A diagramação envolveu, em conjunto com a formatação, o planejamento visual da comunicação a ser expressa no material educativo, ou seja, da estética visual que o texto deveria apresentar uma vez que este atua como discurso carecendo de uma linguagem específica e uma rede de significação.1313. Souza Â, Pellanda LC. A diagramação de textos científicos tornou-se urna atividade secundaria? Rev HCPA. 2010; 30 (2): 196-197.

Etapa 3: Validação do material

Segundo Echer1111. Echer IC. Elaboração de manuais de orientação para o cuidado em saúde. Rev Latino-Am Enferm. 2005; 13(5): 754-7. a validação de manuais voltados para o cuidado em saúde deve ser realizada em várias etapas de análise, sendo a primeira constituída por profissionais de saúde e áreas afins, especialistas na temática. Na sequencia o processo deve ser realizado por possíveis usuários do manual. A contribuição dos profissionais especialistas na temática- por possuírem conhecimentos, experiências e interesses que podem diferir, complementar ou questionar os dos elaboradores do material -favorece a construção de um material que atende às reais demandas e expectativas do público alvo. Em conjunto, as etapas possibilitam que o material uniformize e oficialize práticas de cuidado em saúde.1111. Echer IC. Elaboração de manuais de orientação para o cuidado em saúde. Rev Latino-Am Enferm. 2005; 13(5): 754-7.

O material elaborado e descrito neste artigo passou pela análise de oito especialistas na temática, de diferentes categorias profissionais, a saber: quatro pedagogos que atuam com crianças do ensino infantil, dois terapeutas ocupacionais que atuam na área da reabilitação infantil, uma pedagoga que é coordenadora pedagógica de ensino infantil e fundamental, um educador físico que é professor e coordenador da área de educação física numa secretaria municipal de ensino. Os profissionais tiveram acesso virtual ao material e responderam a um questionário criado no Google forms. O questionário continha uma pergunta referente ao potencial das atividades para estimular o desenvolvimento infantil e outra sobre a clareza na escrita e descrição das atividades. Como o material foi composto por atividades agrupadas por meses e anos de vida, as duas perguntas do questionário foram feitas para cada um dos grupos etários sendo as respostas distribuídas numa escala Likert que correspondia a: 1. discordo totalmente, 2. discordo, 3. neutro, 4. concordo e 5. concordo totalmente. Além disso, havia um campo para que o profissional pudesse justificar suas respostas e emitir sua opinião, crítica ou sugestão. Os profissionais não precisavam se identificar, garantindo privacidade para a expressão de suas ideias.

Resultados e Discussão

Material educativo,1414. Figueiredo MO, Alegretti AL. Atividades para familiares realizarem com os filhos em casa. São Carlos: UFSCar/CPOI, 2020. ISBN: 978-65-86558-04-3. Disponivel em: http://www.sibi.ufscar.br/arquivos/atividades-para-familiares-realizarem-com-os-filhos-em-casa.pdf
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apresentado no formato online com treze páginas coloridas, composta por conteúdos textuais e ilustrativos. A fundamentação teórica do material educativo, obtida através da revisão da literatura, e que determinou a seleção das atividades e orientações refere-se aos princípios e marcos do desenvolvimento infantil e formas de estimulação do desenvolvimento de crianças de 0 a 5 anos por meio da concretização das ocupações infantis.

Portanto, para a elaboração do material, considerou-se que o desenvolvimento infantil constitui um processo sequencial de maturação neurológica e sensorial, crescimento físico, aquisição de habilidades motoras, cognitivas, afetivas, sociais e de comunicação. Tal processo é iniciado na vida intrauterina e continua no pósparto,1515. Noer C, Halpern R. O pediatra e a promoção do desenvolvimento infantil: otimizando a consulta. Residencia Pediátrica.2018; 8(3): 156 - 162.,1616. Silk JS, Redcay E, Fox, NA. Contributions of social and affective neuroscience to our understanding of typical and atypical development. Dev Cogn Neurosci. 2014; 8: 1-6. sendo influenciado por fatores biológicos, ambientais e socioeconômicos.1717. Amorin RCA, Laurentino GEC, Barros KMFT, Ferreira, ALPR, Moura Filho AG, Raposo MCF. Programa de saúde da familia: proposta para identificação de fatores de risco para o desenvolvimento neuropsicomotor. Rev Bras Fisioter. 2009; 13(6): 506-13. Desta forma, as mudanças e aquisições ocorrem sequencialmente ao longo do tempo, compreendendo os marcos do desenvolvimento.1818. Papalia DE, Olds SW, Feldman RD. Desenvolvimento Humano. 8 ed. Porto Alegre: ARTMED Editora S.A; 2006. Estes marcos podem ser observados nos bebês e nas crianças, constituindo-se em indicadores para o acompanhamento de cada ciclo etário.1919. CDC (Centers For Disease Control And Prevention). Learn the Signs. Act Early. [Internet], 2020. [acesso 5 set 2020]. Disponivel em: https://www.cdc.gov/ncbddd/actearly/ index.html?CDC_AA_refVal=https%3A%2F%2Fwww.cdc .gov%2Factearly%2Findex.html
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Papalia e Olds1818. Papalia DE, Olds SW, Feldman RD. Desenvolvimento Humano. 8 ed. Porto Alegre: ARTMED Editora S.A; 2006. referem os principais marcos do desenvolvimento motor e cognitivo típico durante a denominada primeira infância (0 a 3 anos) e segunda infância (dos 3 aos 6 anos). Em adição, Rosa Neto2020. Rosa Neto F. Manual de avaliação motora. Porto Alegre: Artmed; 2002.,2121. Rosa Neto F. Manual de avaliação motora: intervenção na educação infantil, ensino fundamental e educação especial. 3 ed. rev. Florianópolis: DIOESC; 2015. apresenta o desenvolvimento infantil a partir de aquisições relativas à motricidade fina, motricidade global, equilíbrio, esquema corporal, organização espacial, organização temporal e linguagem. Na Tabela 1 estes marcos e aquisições são sintetizados, tendo utilizados como referencial para a seleção e disposição das atividades e orientações do material educativo por ciclos etários.

Tabela 1
Marcos e aquisições do desenvolvimento infantil.

Desta forma, as atividades e orientações contidas no material educativo voltam-se para a estimulação das habilidades motoras e cognitivas, conforme os marcos do desenvolvimento referidos por Papalia e Olds1818. Papalia DE, Olds SW, Feldman RD. Desenvolvimento Humano. 8 ed. Porto Alegre: ARTMED Editora S.A; 2006. e no “CDC’s Developmental Milestones”.1919. CDC (Centers For Disease Control And Prevention). Learn the Signs. Act Early. [Internet], 2020. [acesso 5 set 2020]. Disponivel em: https://www.cdc.gov/ncbddd/actearly/ index.html?CDC_AA_refVal=https%3A%2F%2Fwww.cdc .gov%2Factearly%2Findex.html
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As atividades propostas, em maior ou menor grau requerem a motricidade fina, motricidade grossa, esquema corporal, organização espacial, organização temporal e linguagem, e por isso podem ser estimuladoras destas habilidades e aquisições, com base nas definições propostas por Rosa Neto2020. Rosa Neto F. Manual de avaliação motora. Porto Alegre: Artmed; 2002.,2121. Rosa Neto F. Manual de avaliação motora: intervenção na educação infantil, ensino fundamental e educação especial. 3 ed. rev. Florianópolis: DIOESC; 2015. e no “Help®...at Home 0-3”.2222. Warshaw SP. HelpV́...at Home 0-3. Developmental Support and Information. Handouts for Families with Infants and Toddlers Birth to Three. (2 ed.). Palo Alto, CA: Vort Corporation; 2006.

As atividades e orientações contidas no material foram, portanto, agrupadas por fases do desenvolvimento e distribuídas por meses e anos de vida, apresentadas na Tabela 2.

Tabela 2
Atividades e orientações por faixa etária.

As atividades e orientações do material educativo constituem formas de estimular o desenvolvimento infantil enquanto possibilitam que crianças em isolamento social – no presente caso confinadas em casa em meio à pandemia – concretizem as ocupações típicas da idade, como o brincar, o estudar e o autocuidado. Por isso, a elaboração do material educativo também pautou-se na promoção de: a) um ambiente seguro e saudável para o aprendizado, crescimento e desenvolvimento físico, cognitivo e mental; b) participação nas ocupações típicas para idade; c) desenvolvimento de habilidades que possibilitem o engajamento nas ocupações e atividades diárias; d) saúde, do bem-estar e da satisfação com a vida, conforme recomendações da Associação Americana de Terapia Ocupacional2323. American Occupational Therapy Association. Estrutura da prática da Terapia Ocupacional: dominio e processo - 3a ed. traduzida. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de Säo Paulo. 2015; 26 (esp): 1-49. e da Associação Canadense de Terapeutas Ocupacionais.2424. Canadian Association of Occupational Therapists. Enabling occupation: An occupational therapy perspective (Rev. ed.). Ottawa, ON: CAOT Publications ACE; 2002. As entidades propõem a prevenção ou minimização da privação ocupacional, entendendo-se que, dependendo do tipo de ambiente em que uma pessoa vive, pode haver uma limitação no acesso e desfrute de experiências significativas e favoráveis ao desenvolvimento pessoal.2525. Occupational Therapy Australia. Position Paper: Occupational deprivation. [Internet], 2016. [acesso 5 set 2020]. Disponivel em: https://otaus.com.au/publicassets/ 5e5829df2503e911a2c2b75c2fd918c5/Occupational%20De privation%20(April%202016).pdf
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,2626. Whiteford G Occupational Deprivation: Global Challenge in the New Millennium. Brit J Occup Ther. 2000; 63 (5): 200-4.

Por fim, em relação à etapa de validação por especialistas, houve uma unânime concordância em relação às atividades sugeridas auxiliarem na estimulação do desenvolvimento da população alvo do material, sendo realizadas sugestões para uma escrita mais didática e impessoal. As sugestões foram acatadas, gerando a versão final.1414. Figueiredo MO, Alegretti AL. Atividades para familiares realizarem com os filhos em casa. São Carlos: UFSCar/CPOI, 2020. ISBN: 978-65-86558-04-3. Disponivel em: http://www.sibi.ufscar.br/arquivos/atividades-para-familiares-realizarem-com-os-filhos-em-casa.pdf
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Considerações finais

Na atual pandemia de COVID-19, a mídia social tem sido um recurso para a disseminação de conhecimento, especificamente na divulgação de materiais educativos para distintas populações e finalidade. O presente artigo apresentou o desenvolvimento de um material educativo composto por sugestões de atividades e orientações para serem realizadas por familiares com seus filhos, na circunstancia do isolamento social imposto pela pandemia. Tais atividades e orientações visam a continuidade do desenvolvimento das habilidades infantis e a concretização de ocupações e papéis ocupacionais típicos da idade. A elaboração do material foi pautada no compromisso ético de tornar público um conhecimento científico para familiares com crianças que repentinamente viveram a interrupção dos seus cotidianos usuais. A audiência do material educativo também pode ser estendida para os profissionais da saúde e da educação que atuam na assistência e orientação destes familiares. O presente artigo possibilita subsidiar o processo de ensino e das atividades de extensão universitária que visem o desenvolvimento infantil, especificamente na primeira e segunda infâncias.

A metodologia adotada para elaboração do material seguiu diversos procedimentos. Utilizamos a revisão da literatura que propiciou que as atividades e orientações fossem baseadas nos marcos e princípios do desenvolvimento infantil e em formas de estimulação deste desenvolvimento, considerando a importância do fazer e das ocupações para o desenvolvimento e a existência humana. A validação por especialistas forneceu maior grau de fiabilidade quanto ao potencial de estimulação das atividades e de sua qualidade e eficácia. Conclui-se que o material produzido, enquanto estratégia de tradução/transferência de conhecimento, pode contribuir para o manejo da interrupção abrupta das ocupações infantis, garantindo aos familiares acesso à orientações e sugestões de atividades que favorecem a estimulação e a continuidade do desenvolvimento de bebês e crianças de 0 até 5 anos.

A despeito dos cuidados tomados, não nos foi possível inferir a avaliação dos familiares sobre o material produzido. Do mesmo modo, apenas profissionais de uma região do país foram consultados, o que nos impede de assegurar a validade cultural do material em outros contextos. Pesquisas futuras deverão aplicar modelos de investigação quantiqualitativa para identificar a utilidade do material em grupos diversos. Destaca-se que as atividades sugeridas não são excludentes, mas sugeridas como estratégias ocupacionais, dentre tantas outras, que podem estimular o desenvolvimento infantil e possibilitar a concretização de ocupações e papéis ocupacionais típicos da infância.

Contribuição dos autores

Figueiredo MO contribuiu com a concepção teórica e metodológica do estudo, coleta de dados, discussão e redação. Alegretti AL e Magalhães L contribuíram no aporte teórico e metodológico e revisão final. Todos os autores aprovaram a versão final do artigo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jun 2021
  • Data do Fascículo
    Maio 2021

Histórico

  • Recebido
    15 Out 2020
  • Aceito
    25 Nov 2020
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