Mortalidade materna pela COVID-19 no Brasil: atualizações

É de imensa relevância o conteúdo do artigo dos autores Souza e Amorim.¹ Dessa forma, é importante atualizar as informações sobre o panorama da mortalidade materna pelo COVID-19 no país.

O artigo traz informações sobre 2020, enquanto dados de 2021 mostram um impacto ainda maior nessa população. Novas informações importantes advêm do recém-criado“Observatório Obstétrico Brasileiro COVID-19”²: A média de mortes semanais de gestantes e puérperas pela COVID-19 mais que dobrou em 2021 quando comparadas a 2020. Em todo o ano de 2020 foram contabilizadas 459 mortes de gestantes e puérperas, com média semanal de 10,6 óbitos. Enquanto em 2021, até julho de 2021, já foram contabilizadas 1153 mortes, com média semanal de 44,3 óbitos.² Ainda que a média semanal de mortes da população em geral do país também tenha aumentado em 2021, apresentando acréscimo de 60,5% nos óbitos,³ no grupo de gestantes e puérperas o aumento foi ainda maior, alcançando um aumento de 151%.² Além disso, o levantamento feito pelo Observatório afirma que a principal causa de óbitos maternos é a falta de acesso ao adequado tratamento contra o vírus, quando infectadas. Concordante com essas afirmações, o estudo de Takemoto,⁴ citado pelo artigo em questão,¹ afirma que 20% das gestantes e puérperas internadas pelo Sars-CoV-2 não tiveram acesso a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e 36% não foram intubadas.⁴ Dessa forma, a falta de UTI e intubação afetou um terço dos óbitos maternos durante a pandemia, representando a grave falha do atendimento a saúde no Brasil.

Além disso, o tipo de parto também parece influenciar nos desfechos maternos de gestantes infectadas pela COVID-19. Um estudo espanhol constatou que os partos cesáreos estão associados a um agravamento clínico de grávidas assintomáticas ou com sintomas leves⁵; desse grupo, 21,6% das gestantes apresentaram piora clínica, diante de 4,9% das que fizeram parto vaginal. Somado a isso, 13,5% do primeiro grupo precisaram ser levadas a UTI após a cirurgia, frente a nenhuma das que realizaram parto vaginal. Considerando que o Brasil é o segundo país que mais realiza cesáreas no mundo,⁶ é essencial uma reavaliação dos riscos e benefícios de cada tipo de parto em gestantes portadoras da COVID-19 no país, a fim de prevenir complicações.

Além dos óbitos causados diretamente pela infecção da COVID-19, ainda deve-se considerar os desfechos desfavoráveis da gestação por consequência indireta do vírus. Em uma pesquisa feita com 2.753 grávidas e puérperas brasileiras, uma em cada três afirmou ter diminuído a ida as consultas de pré-natal e a realização de exames durante a pandemia.⁷ Mais da metade das gestantes afirmaram muita preocupação para sair de casa e monitorar a gestação. O pré-natal adequado é efetivo e necessário na prevenção de morbidades e mortes maternas, uma vez que rastreia e trata infecções e problemas nutricionais maternos.⁸,⁹ Dessa forma, pré-natais feitos de forma inadequada por conta da pandemia aumentam as chances de desfechos maternos desfavoráveis até mesmo para gestantes não infectadas pelo vírus.

Em meio a esse cenário, o Ministério da Saúde divulgou uma nota técnica em maio de 2021 em que recomenda a vacinação de gestantes que primeiramente apresentem comorbidades, bem como puérperas e lactantes.¹⁰ Apesar da falta de consenso, a vacinação foi, posteriormente, indicada de forma ampliada a todas as mulheres grávidas ou puérperas até 45 dias da gravidez.¹¹ Dessa forma, a perspectiva de diminuição de infecção e óbitos traz esperança a essa população tão afetada pela pandemia do COVID-19.

References

• ¹
  Souza ASR, Amorim MMR. Mortalidade materna pela COVID-19 no Brasil. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2021 Feb; 21 (Suppl 1): 253-6.
• ²
  Observatório Obstétrico Brasileiro (OOBr). COVID-19 [Internet]. Espírito Santo: OOBr; 2020; [access in 2021 Apr 21]. Available from: https://observatorioobstetrico.shinyapps.io/covid_gesta_puerp_br/
  » https://observatorioobstetrico.shinyapps.io/covid_gesta_puerp_br/
• ³
  Conselho Nacional de Justiça (BR). Portal da Transparência. Óbitos com suspeita ou confirmação de COVID-19 [Internet]. Brasília: Conselho Nacional de Justiça; 2020; [access in 2021 Jul 13]. Available from: https://transparencia.registrocivil.org.br/especial-covid
  » https://transparencia.registrocivil.org.br/especial-covid
• ⁴
  Takemoto MLS, Menezes MO, Andreucci CB, Nakamura-Pereira M, Amorim MM, Katz L, et al The tragedy of COVID-19 in Brazil: 124 maternal deaths and counting. Int J Gynecol Obstet. 2020 Jul; 15 (1): 154-6.
• ⁵
  Martínez-Perez O, Vouga M, Melguizo SC, Acebal LF, Panchaud A, Muñoz-Chápuli M, et al Association between mode of delivery among pregnant women with COVID-19 and maternal and neonatal outcomes in Spain. JAMA. 2020 Jul; 324 (3): 296-9.
• ⁶
  World Health Organization (WHO). WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience. Geneva; WHO; 2018.
• ⁷
  Instituto Patrícia Galvão (BR). Mulheres grávidas e puérperas diante do coronavírus [Internet]. São Paulo: Instituto Patrícia Galvão; 2020; [access in 2021 Apr 20]. Available from: https://assets-institucionalipg.sfo2.cdn.digitaloceanspaces.com/2020/10/INSTITUTOPATRICIAGALVAOLOCOMOTIVA_RelatorioGravidezeCovidVersaoFinal.pdf
  » https://assets-institucionalipg.sfo2.cdn.digitaloceanspaces.com/2020/10/INSTITUTOPATRICIAGALVAOLOCOMOTIVA_RelatorioGravidezeCovidVersaoFinal.pdf
• ⁸
  Bhutta ZA, Das JK, Bahl R, Lawn JE, Salam RA, Paul VK, et al Can available interventions end preventable deaths in mothers, newborn babies, and stillbirths, and at what cost? Lancet. 2014 Jul; 384 (9940): 347-70.
• ⁹
  Pacheco AJ, Katz L, Souza AS, Amorim MM. Factors associated with severe maternal morbidity and near miss in the São Francisco Valley, Brazil: a retrospective, cohort study. BMC Pregnancy Childbirth. 2014 Feb; 14: 91.
• ¹⁰
  Ministry of Health (BR). Nota Técnica nº 627/2021-CGPNI/ DEIDT/SVS/MS. 19 de maio de 2021. Orientações referentes à suspensão temporária da vacinação contra a covid-19 com a vacina AstraZeneca/Oxford em gestantes e puérperas; interrupção da vacinação contra a covid-19 em gestantes sem comorbidades e continuidade da vacinação contra a covid-19 em gestantes com comorbidades [Internet]. Brasília (DF): Ministry of Health; 2021; [access in 2021 Jul 01]. Available from: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-content/uploads/2021/05/Nota-Te%CC%81cnica-651-2021-CGPNI-DEIDT-SVS-MS.pdf
  » https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-content/uploads/2021/05/Nota-Te%CC%81cnica-651-2021-CGPNI-DEIDT-SVS-MS.pdf
• ¹¹
  Ministry of Health (BR). Nota Técnica nº 2/2021-SECOVID/ GAB/SECOVID/MS. Trata-se de atualização das recomendações referentes a vacinação contra a covid-19 em gestantes e puérperas até 45 dias pós-parto [Internet]. Brasília (DF): Ministry of Health; 2021; [access in 2021 Jul 13]. Available from: https://sei.saude.gov.br/sei/controlador_externo.php?acao=documento_conferir&codigo_verificador=0021464579&codigo_crc=4863F560&hash_download=3cfd43ffbcbac4b08f37ce10fc87697b0116fa8bbb63303a6110477124d1d99cd053c45d86c748bfe31764f024e-1f046f2de39d9289b8534bdbbb87ed5c878df&visualizacao=1&id_orgao_acesso_externo=0
  » https://sei.saude.gov.br/sei/controlador_externo.php?acao=documento_conferir&codigo_verificador=0021464579&codigo_crc=4863F560&hash_download=3cfd43ffbcbac4b08f37ce10fc87697b0116fa8bbb63303a6110477124d1d99cd053c45d86c748bfe31764f024e-1f046f2de39d9289b8534bdbbb87ed5c878df&visualizacao=1&id_orgao_acesso_externo=0

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  05 Ago 2022
• Data do Fascículo
  Apr-Jun 2022

Histórico

• Recebido
  21 Jul 2021
• Revisado
  23 Ago 2021
• Aceito
  31 Ago 2021