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Efeito da Densidade de Presas e do Acasalamento na Taxa de Predação de Fêmeas de Podisus nigrispinus (Dallas) (Heteroptera: Pentatomidae) em Condições de Laboratório e Campo

Effect of Prey Density and Mating Status on Predation Rate of Females of Podisus nigrispinus (Dallas) (Heteroptera: Pentatomidae) in Laboratory and Field Conditions

Resumos

Avaliou-se a taxa de predação de fêmeas virgens ou acasaladas de Podisus nigrispinus (Dallas) em diferentes densidades de lagartas de Alabama argillacea (Huebner) em condições de laboratório e de campo. Em laboratório, empregaram-se potes plásticos de 500 ml contendo fêmeas do predador, uma folha de algodão e lagartas de A. argillacea (50 ± 10 mg) nas densidades de uma, duas, quatro, oito e 16 lagartas. No campo, algodoeiros na fase de florescimento foram engaiolados, sendo empregadas as mesmas densidades de lagartas que no laboratório. Em ambas as condições, as fêmeas de P. nigrispinus apresentaram ganho de peso e aumento de sua taxa de predação com o aumento da densidade de lagartas de A. argillacea, mas com valores maiores para fêmeas em laboratório. Nas duas condições, o ganho de peso e a taxa de predação foram semelhantes para fêmeas virgens ou acasaladas. No campo, P. nigrispinus explorou 94,7% e 21,2% da área foliar disponível na menor e maior densidade de presas, respectivamente. O tempo de manipulação e a taxa de ataque estimadas foram de 3,37 ± 0,82h e de 0,076 ± 0,013h-1 em laboratório, e de 3,33 ± 0,93h e de 0,017 ± 0,003h-1 em campo. A resposta funcional em laboratório e no campo foi caracterizada como do Tipo II. Os números observados e estimados de lagartas predadas pelo modelo foram significativamente correlacionados com as condições de laboratório (r = 0,78) e de campo (r = 0,70).

Controle biológico; percevejo predador; curuquerê-do-algodoeiro; resposta funcional; Alabama argillacea


The predation rate of unmated and mated females of Podisus nigrispinus (Dallas) was evaluated on different densities of Alabama argillacea (Huebner) caterpillars (50 ± 10 mg), in laboratory and field conditions. In the laboratory, the predator females were maintained in 500 ml plastic jars with five different densities of prey (one, two, four, eight, and 16). In the field, caterpillars at the same densities were caged on flowering cotton plants. Under both conditions, females gained weight and increased the predation rate when the availability of prey increased, although higher values were obtained for females kept in the laboratory. Weight gain and predation rate did not differ between unmated and mated females under both conditions. In the field, P. nigrispinus searched 94.7% of the available foliar area under low prey density, and 21.2% under high prey density. The estimated handling time and attack rate were, respectively, 3.37 ± 0,82h and 0.076 ± 0.013h-1 in the laboratory, and 3.33 ± 0.93h and 0.017 ± 0.003h-1 in the field. The functional response corresponded to a type II for both conditions. The number of killed caterpillars observed and estimated by the model were highly correlated for both laboratory (r = 0.78) and field (r = 0.70) conditions.

Biological control; stinkbug predator; cotton leafworm; functional response; Alabama argillacea


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BIOLOGICAL CONTROL

Efeito da Densidade de Presas e do Acasalamento na Taxa de Predação de Fêmeas de Podisus nigrispinus (Dallas) (Heteroptera: Pentatomidae) em Condições de Laboratório e Campo

JOSÉ E.M. OLIVEIRA1, JORGE B. TORRES1, ALBERTO F. CARRANO-MOREIRA2 E JOSÉ C. ZANUNCIO3

1DEPA-Fitossanidade, UFRPE, Av. Dom Manoel de Medeiros s/n, Dois Irmãos,

52171-900, Recife, PE, jorge@mail.ufrpe.br

2Depto. de Ciência Florestal, UFRPE, Av. Dom Manoel de Medeiros s/n, Dois Irmãos 52171-900 Recife, PE

3Depto. de Biologia Animal, UFV, 36571-000 Viçosa, MG

Effect of Prey Density and Mating Status on Predation Rate of Females of Podisus nigrispinus (Dallas) (Heteroptera: Pentatomidae) in Laboratory and Field Conditions

ABSTRACT – The predation rate of unmated and mated females of Podisus nigrispinus (Dallas) was evaluated on different densities of Alabama argillacea (Huebner) caterpillars (50 ± 10 mg), in laboratory and field conditions. In the laboratory, the predator females were maintained in 500 ml plastic jars with five different densities of prey (one, two, four, eight, and 16). In the field, caterpillars at the same densities were caged on flowering cotton plants. Under both conditions, females gained weight and increased the predation rate when the availability of prey increased, although higher values were obtained for females kept in the laboratory. Weight gain and predation rate did not differ between unmated and mated females under both conditions. In the field, P. nigrispinus searched 94.7% of the available foliar area under low prey density, and 21.2% under high prey density. The estimated handling time and attack rate were, respectively, 3.37 ± 0,82h and 0.076 ± 0.013h-1 in the laboratory, and 3.33 ± 0.93h and 0.017 ± 0.003h-1 in the field. The functional response corresponded to a type II for both conditions. The number of killed caterpillars observed and estimated by the model were highly correlated for both laboratory (r = 0.78) and field (r = 0.70) conditions.

KEY WORDS: Biological control, stinkbug predator, cotton leafworm, functional response, Alabama argillacea.

RESUMO – Avaliou-se a taxa de predação de fêmeas virgens ou acasaladas de Podisus nigrispinus (Dallas) em diferentes densidades de lagartas de Alabama argillacea (Huebner) em condições de laboratório e de campo. Em laboratório, empregaram-se potes plásticos de 500 ml contendo fêmeas do predador, uma folha de algodão e lagartas de A. argillacea (50 ± 10 mg) nas densidades de uma, duas, quatro, oito e 16 lagartas. No campo, algodoeiros na fase de florescimento foram engaiolados, sendo empregadas as mesmas densidades de lagartas que no laboratório. Em ambas as condições, as fêmeas de P. nigrispinus apresentaram ganho de peso e aumento de sua taxa de predação com o aumento da densidade de lagartas de A. argillacea, mas com valores maiores para fêmeas em laboratório. Nas duas condições, o ganho de peso e a taxa de predação foram semelhantes para fêmeas virgens ou acasaladas. No campo, P. nigrispinus explorou 94,7% e 21,2% da área foliar disponível na menor e maior densidade de presas, respectivamente. O tempo de manipulação e a taxa de ataque estimadas foram de 3,37 ± 0,82h e de 0,076 ± 0,013h-1 em laboratório, e de 3,33 ± 0,93h e de 0,017 ± 0,003h-1 em campo. A resposta funcional em laboratório e no campo foi caracterizada como do Tipo II. Os números observados e estimados de lagartas predadas pelo modelo foram significativamente correlacionados com as condições de laboratório (r = 0,78) e de campo (r = 0,70).

PALAVRAS-CHAVE: Controle biológico, percevejo predador, curuquerê-do-algodoeiro, resposta funcional, Alabama argillacea.

A cultura do algodoeiro, Gossypium hirsutum L. var latifolium Hutch, pode ser danificada em suas fases de desenvolvimento por diversos insetos, os quais podem causar danos significativos e comprometer a produção. Entre esses insetos, destaca-se o curuquerê-do-algodoeiro, Alabama argillacea (Huebner) (Lepidoptera: Noctuidae), considerada praga-chave desta cultura e que pode provocar perdas entre 21 e 35% na produção (Bleicher et al. 1983, Ramalho 1994).

A utilização de percevejos predadores destaca-se como uma alternativa econômica e ecologicamente viável para o controle biológico do curuquerê. No Brasil, estudos visando o uso desses predadores são, ainda, poucos e recentes, mas Santos et al. (1995, 1996) mostraram que o curuquerê é uma presa adequada para o desenvolvimento do percevejo predador Podisus nigrispinus (Dallas). Estudos sobre o comportamento de P. nigrispinus no campo sob diferentes densidades da presa A. argillacea são essenciais para o entendimento da interação predador-presa. Por outro lado, devido à gama de presas utilizadas por P. nigrispinus e à mobilidade de seus adultos, é difícil quantificar a participação desses predadores na mortalidade da praga-alvo em um agroecossistema. Os métodos tradicionais para a avaliação da eficiência de inimigos naturais propostos por Luck et al. (1988) e DeBach & Rosen (1991) não são aplicáveis para esses predadores. Assim, estudos são conduzidos em telados, onde se pode medir a predação instantânea, mediante a resposta funcional em função da população da presa em uma determinada área, como realizado por O'Neil (1988, 1989). Dependendo do predador, da presa e das condições climáticas, a taxa de predação em relação à densidade de presas pode originar três tipos básicos de curvas de predação. Em áreas com limitada variação da densidade de presas, é esperado um resultado de mortalidade da presa independente da densidade, representado por um incremento linear (tipo I), uma resposta negativamente dependente da densidade, representado por um decréscimo da curva (tipo II) e positivamente dependente da densidade, correspondente a um incremento temporário da taxa de predação (tipo III). Um agente de controle biológico eficiente deve apresentar resposta dependente da densidade, pois com tal comportamento será capaz de regular a população da presa (Murdoch & Oaten 1975).

A resposta funcional é empregada para avaliar o potencial do inimigo natural em diversas situações, estando fundamentada em dois parâmetros básicos: o tempo de manipulação da presa (Th), que envolve o encontro, morte e ingestão da presa, e a taxa de ataque (a), que representa a eficiência de procura da presa. A resposta funcional como avaliação da predação foi utilizada, por exemplo, para Podisus maculiventris (Say) sobre Epilachna varivestis (Mulsant), Spodoptera exigua (Hübner) e Leptinotarsa decemlineata (Say) (O'Neil 1988, Wiedenmann & O'Neil 1991, De Clercq & Degheele 1994, 1997) e para P. nigrispinus sobre S. exigua (Mohaghegh 1999). O modelo de resposta funcional avalia o comportamento de predação do predador, que pode ser influenciado pela sua idade e status de acasalamento, tipo e idade da presa, planta hospedeira da presa e condições climáticas (Southwood 1978, Coll & Ridgway 1995). Assim, o objetivo deste trabalho foi determinar os parâmetros da resposta funcional de fêmeas acasaladas e sem acasalar de P. nigrispinus empregando-se como presa lagartas de A. argillacea sob plantas de algodoeiro, em condições de laboratório e de campo.

Material e Métodos

Os experimentos foram conduzidos no Laboratório de Controle Biológico de Insetos e, no campo, na área experimental da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Recife, PE. Em laboratório, usaram-se câmaras climatizadas tipo B.O.D. ajustada a 27 ± 1oC, 60 ± 10% de UR e 14h de luz/dia. Em campo, as condições climáticas, monitoradas com termohigrógrafo Sato Keiryoki MFG Co., Ltd. foram de 29,0 ± 7,2oC e de 68,9 ± 26,9% de UR.

Algodoeiros (G. hirsutum var. latifolium) cultivar CNPA Precoce 1, foram cultivados no campo com espaçamento de 0,2 x 0,8 m. O solo foi corrigido com calcário, adubado e realizadas capinas e irrigações sempre que necessário. Foram realizados plantios escalonados com intervalos de 15 dias para obtenção de folhas adequadas para a manutenção da criação do curuquerê e realização dos experimentos de laboratório e campo.

Criação de manutenção. Fêmeas de P. nigrispinus da 23a geração foram obtidas da criação, mantida no laboratório de Controle Biológico de Insetos (UFRPE), de acordo com metodologia proposta por Torres et al. (1996), a 28 ± 1oC, 53 ± 5% de UR e fotoperíodo de 14:10 (L:E). Como presa alternativa foram empregadas larvas e pupas de Tenebrio molitor L. (Coleoptera: Tenebrionidae).

A criação do curuquerê foi iniciada a partir de pupas cedidas pela Unidade de Controle Biológico, Embrapa/Centro Nacional de Pesquisa do Algodão, Campina Grande, PB, e mantidas no laboratório sob condições climáticas semelhantes àquelas do predador. Foram usadas gaiolas de PVC medindo 21,5 cm de altura e 14,5 cm de diâmetro, forradas com papel ofício, tendo a parte superior fechada com tecido tipo organza e a base apoiada sobre um prato plástico forrado com papel filtro. Cada gaiola recebeu cinco casais de A. argillacea. Os adultos foram alimentados com solução de mel a 30%, através de pedaços de espumas de 1,0 cm de espessura dispostas em tampas plástica de refrigerante tipo PET. A água foi fornecida através de um chumaço de algodão umedecido e preso a um vidro de 10 ml. Diariamente, durante o período de oviposição, o papel e o tecido contendo posturas eram transferidos para gaiolas iguais àquelas usadas para manutenção dos adultos. Após dois dias, esse material contendo ovos foi depositado sobre as folhas de algodão acondicionadas em vidros com água. As pupas, após a sexagem, eram transferidas para placas de Petri (9 x 1,5 cm) e, após seis dias, acondicionadas nas gaiolas, para emergência de adultos e posterior coleta de posturas.

Experimento de Laboratório. O experimento foi conduzido com fêmeas de P. nigrispinus acasaladas com cinco a 10 dias de idade, ou virgens com até cinco dias de idade. Os insetos eram individualizados em potes plástico de 500 ml, deixados sem alimentação por 24h e pesados antes da liberação. Em seguida, foi introduzida uma folha de algodoeiro e as lagartas de A. argillacea já pesadas, nas densidades de uma, duas, quatro, oito e 16 lagartas/pote (peso médio das lagartas = 50 ± 10 mg), com 13 repetições por densidade. As avaliações foram realizadas em intervalos de quinze minutos durante as primeiras 12h, para estimar o tempo de manipulação da presa, e avaliação final após 24h para computar o número de lagartas predadas e o peso das fêmeas. Para cada densidade foram conduzidas três repetições, sem predador, para se avaliar a mortalidade natural do curuquerê.

Experimento de Campo. No campo foram liberadas fêmeas acasaladas de P. nigrispinus com cinco a 10 dias de idade, bem como fêmeas virgens com até cinco dias de idade, mantidas sem alimento por 24h. Simultaneamente, foram selecionados algodoeiros no campo, com dossel foliar representativo e isentas de pragas e predadores. As plantas foram envolvidas por gaiolas cilíndricas (1,2 x 0,8 m), cobertas com tecido de organza. As gaiolas foram dispostas ao acaso, cobrindo um ou dois algodoeiros na fase de florescimento. As lagartas do curuquerê foram liberadas nas folhas superiores no mínimo duas horas antes da liberação dos predadores, empregando-se as densidades de uma, duas, quatro, oito e 16 lagartas (peso médio das lagartas = 50 ± 10 mg) por gaiola com 13, 13, 13, 10 e 10 repetições por densidade, respectivamente. Os predadores foram pesados e liberados por uma abertura na parte superior da gaiola. Paralelamente, foi mantida uma repetição por tratamento sem liberação de predadores para avaliar a mortalidade natural. A avaliação foi realizada após 24h, contando-se o número de lagartas vivas e pesando-se as fêmeas. Em seguida, as plantas foram colhidas para determinar a área foliar de ambas as faces utilizando-se o medidor de área foliar Li-Corâ, modelo LI-3000A.

Análises. Os resultados foram submetidos à análise de variância múltipla pelo procedimento ANOVAF do SAEG versão 5.0 (Gomes 1985), visando a interação das variáveis: condição experimental (laboratório e campo), densidade de lagartas e condição de acasalamento das fêmeas, sobre variações de peso de fêmeas pré-predação, pós-predação, variação de peso e número de lagartas predadas. A área foliar explorada pelas fêmeas foi estimada pela fórmula proposta por O'Neil (1988), a partir da relação da taxa de procura e predação: Na/Nt = s/A, onde Na representa o número de lagartas predadas; Nt, número total de lagartas exposta à predação; s, área procurada e A, área foliar determinada considerando ambas as faces da folha. O tipo de resposta funcional apresentada pelas fêmeas do predador em ambas as condições foi determinado através da equação cúbica da proporção de lagartas predadas pela densidade de lagartas (Na/Nt versus Nt) (Trexler et al. 1988). Empregou-se a equação de resposta funcional proposta por Rogers (1972), conhecida como "equação aleatória", pois as lagartas predadas não foram substituídas durante o experimento. Os parâmetros taxa de ataque (a) e tempo de manipulação (Th), para a construção da equação de resposta funcional, foram determinados a partir da linearização da proporção de lagartas vivas remanescentes versus Na (Rogers 1972).

Resultados

Na ausência do predador, as lagartas do curuquerê apresentaram sobrevivência superior a 96% no campo e de 98% em laboratório, não sendo por isto necessário realizar a correção da mortalidade.

O peso de fêmeas após a predação, a variação de peso e o número de lagartas predadas diferiram significativamente (P < 0,001) em condições de campo de de laboratório. A densidade de lagartas também exerceu influência sobre a variação de peso, o número de lagartas predadas (P < 0,001) e o peso das fêmeas pós-predação (P < 0,05). Já o status de acasalamento afetou apenas o peso das fêmeas pré- e pós-predação (P < 0,001). As interações de dois ou três fatores não mostraram influência significativa nas variáveis analisadas (Tabela 1). O status de acasalamento das fêmeas não afetou a taxa de predação, pois fêmeas acasaladas ou não aumentaram igualmente a taxa de predação com o aumento da densidade da presa, tanto em laboratório (P < 0,001) quanto no campo (P < 0,001). Este número variou, em média, de 1,0 a 5,9 lagartas em laboratório e de 0,3 a 3,4 lagartas em campo, para a menor e a maior densidade, respectivamente.

No laboratório, o peso das fêmeas de P. nigrispinus após 24h não foi afetado pela disponibilidade da presa (P > 0,05), porém o ganho de peso foi significativamente menor na menor densidade de lagartas (P < 0,05). Em campo, o peso de fêmeas após 24h foi afetado pela disponibilidade de lagartas (P < 0,05). Fêmeas submetidas a densidades de uma a quatro lagartas por planta apresentaram menor peso do que aquelas submetidas a 16 lagartas por planta (Gl = 4, 45; F = 9,19; P <0,001). Fêmeas de P. nigrispinus com menor disponibilidade de presas por planta (uma, duas e quatro lagartas) perderam peso (Tabela 2), com número médio de lagartas predadas/dia variando de 0,3 a 1. O ganho de peso das fêmeas somente é observado na densidade de oito lagartas por planta, quando constata-se a taxa de predação de 1,1 lagarta/predador.

A área foliar explorada pelo predador no laboratório foi constante (P>0,05) em decorrência da sua limitação. Entretanto, no campo observou-se diferença significativa nesse parâmetro (P < 0,05), sendo de 94,7% e 21,2% da área foliar disponível na maior e menor densidade de presa, respectivamente. A taxa estimada de ataque (a) e o tempo estimado de manipulação (Th) foram de 0,076 ± 0,013h-1 e de 3,37 ± 0,82h em laboratório e de 0,017 ± 0,003h-1 e 3,33 ± 0,93h no campo (Tabela 3). O Th estimado em laboratório e no campo foram próximos daquele observado em laboratório, considerando-se a primeira e a segunda presa atacada (3,33 ± 1,99h, n = 39). Os parâmetros Th e a foram determinados após a regressão cúbica ter apresentado coeficiente linear negativo, o que caracteriza o tipo II como resposta para ambos locais (Fig. 1). A partir do Th, pode-se verificar que fêmeas de P. nigrispinus manipulam no máximo 7,1 e 7,2 lagartas em 24h, em laboratório e campo, respectivamente. O máximo observado foi de nove e sete lagartas, respectivamente, em laboratório e campo, em uma das repetições da densidade 16 lagartas (Fig. 1). Baseado na "equação aleatória" de Rogers (1972), estima-se uma taxa de predação de 0,74 a 6,70 e de 0,32 a 3,10 lagartas de A. argillacea por fêmea de P. nigrispinus, em laboratório e campo, respectivamente. Esses valores originados pelo modelo de resposta funcional, tanto no laboratório como no campo, correlacionaram-se com os dados observados de 1,0 a 5,9 lagartas, em laboratório (r2 = 0,78; P < 0,001), e de 0,3 a 3,4 lagartas, em campo (r2 = 0,70; P < 0,001).


Discussão

Os menores pesos de fêmeas submetidas a menores densidades da presa (uma a quatro lagartas por planta) no campo eram esperados e estão relacionados com a menor taxa de predação, de 0,31 a 1,0 lagarta por predador, caracterizando uma situação de escassez de presas. A taxa de predação de Podisus spp., normalmente apresentada sobre várias presas em campo, varia de 0,43 a 1,1 ataques por fêmea (O'Neil 1989, Saavedra et al. 1997). No entanto, é provável que P. nigrispinus, submetida às condições de campo com baixas densidades da praga, gaste mais energia procurando sua presa e, em conseqüência, tenha redução de peso (Evans 1982, Legaspi & O'Neil 1993). Essa hipótese é corroborada pela maior área foliar explorada no campo nos tratamentos com menores densidades de lagartas, quando a taxa de ataque (a) foi 4,5 vezes menor do que aquela obtida em laboratório (Tabela 2). Além disso, em baixas densidades, aproximadamente, 100% da área disponível foi explorada. Esses resultados mostram que o predador necessita explorar o máximo de área foliar para encontrar sua presa, e que a taxa de predação aumenta com o aumento da densidade da presa (Tabela 3). Maiores taxas de ataque em laboratório podem ser atribuídas às condições testadas, pois as presas estavam mais expostas ao predador, consequentemente explorando uma área menor. Tanto no laboratório como no campo, o aumento da densidade da presa permitiu que o predador P. nigrispinus a localizasse com maior facilidade. Com 16 lagartas por gaiola, no campo, estima-se uma densidade média de 27,6 lagartas/m2 de área foliar. Neste caso, embora esses predadores sejam considerados forrageadores ao acaso (Wiedenmann & O'Neil 1991), tal comportamento pode ter sido afetado pela alta densidade de lagartas, o que proporcionou incremento médio de uma lagarta predada na densidade quatro lagartas/planta para 3,4 lagartas na densidade de 16 (Fig. 1). Percevejos predadores, em geral, podem localizar as presas através de suas fezes, por sinais visuais a pequenas distâncias ou por estímulos vibratórios, emitidos durante o processo de alimentação da lagarta na superfície foliar (McLain 1979, Heimpel & Hough-Goldstein 1994, Pfannestiel et al. 1995). Assim a localização da presa pode ter sido facilitada nos tratamentos com altas densidades da presa. Alguns percevejos predadores mais específicos como Perillus bioculatus (F.) sobre Leptinotarsa decemlineata (Say) (Heimpel & Hough-Goldstein 1994) e Oecanthecona furcelata (Wolff) sobre Spodoptera litura (Fabricius) (Yasuda 1997), conseguem localizar suas presas por estímulos olfativos. No entanto, esse fato deve ser pouco importante para espécies de Podisus devido à gama de presas atacadas por este predador.

A baixa eficiência de ataque de P. nigrispinus em baixas densidades da presa resulta de uma maior área a ser explorada. Isto constitui um dos fatores mais importantes que podem afetar a taxa de predação (O'Neil 1988, 1989). Além disso, De Clercq & Degheele (1994) afirmam que altas densidades de presas condicionam os predadores a abandonar uma determinada presa antes que seja totalmente consumida para atacar outra. Isto justifica o fato de que, em altas infestações, pela facilidade do encontro entre predador e presa e subseqüente saciação, ocorre, mesmo que temporariamente, maior taxa de predação. No entanto, percevejos predadores apresentam resposta funcional do tipo II por limitação de tempo e pela sua saciação (Heimpel & Hough-Goldstein 1994, Cohen & Tang 1997).

A taxa de predação não foi afetada pelo status de acasalamento do predador, dado que fêmeas virgens ou acasaladas com até 10 dias de idade apresentaram potencial semelhante de predação. No entanto, outros estudos têm mostrado que fêmeas virgens de percevejos predadores apresentam menor taxa de predação que as acasaladas (De Clerq & Degheele 1997). Esses autores verificaram que fêmeas virgens e acasaladas de P. maculiventris, no pico de reprodução aos 21 dias de idade, predaram 1,1 e 4,1 lagartas por dia de S. exigua em laboratório, mostrando que, possivelmente, fêmeas acasaladas desse predador demandam maior quantidade de energia para a reprodução e podem, por isto, ter maior taxa de predação. Como neste estudo, as fêmeas de P. nigrispinus estavam no início da sua atividade reprodutiva, pois P. nigrispinus apresenta, na maioria dos estudos, período de pré-oviposição variando de três a seis dias; este fato pode ter mascarado o efeito do status de acasalamento sobre a taxa de predação.

A taxa de ataque no campo de 0,3 a 1,0 lagartas de A. argillacea, nas densidade de uma a quatro lagartas por planta, corrobora resultados de outros autores. Saavedra et al. (1997) observaram que fêmeas de P. nigrispinus em laboratório predaram de quatro a seis lagartas de terceiro instar de Anticarsia gemmatalis (Hubner) em placas de Petri durante 30 min., porém em casa-de-vegetação predaram no máximo 1,1 lagartas por dia, em uma área foliar de 10558,20 cm2 com 10 lagartas. O'Neil (1989) relatou a taxa de predação de 4,40 larvas de E. varivestis durante 24h em laboratório e de 0,43 larvas em campo por P. maculiventris. Entretanto, Wiedenmann & O'Neil (1991), com o mesmo predador e a mesma presa, observaram menor taxa de predação em baixa densidade (uma e duas larvas); nenhum ataque do predador foi observado na primeira hora. No entanto, com o aumento da densidade da presa (oito a 16 larvas), o número médio de ataque foi de até 1,4 larvas. O tipo de planta pode também afetar a taxa de ataque e o tempo de manipulação de presa por percevejos predadores (Coll & Ridgway 1995). Mohaghegh (1999) relatou um tempo de manipulação de 5,63h para P. nigrispinus predando S. exigua em plantas de tomate, de 3,25h em plantas de pimentão e de 3,05h sobre plantas de beringela. O autor verificou, ainda, que a temperatura pode influenciar o tempo de manipulação de presa, pois este tempo foi de 3,82h a 18oC e de 1,61h a 27oC para P. maculiventris predando S. exigua. Outro fator que deve, também, ser considerado é o tamanho da presa, pois a capacidade predatória de espécies de Podisus diminui como o aumento do tamanho das mesmas (Waddill & Shepard 1975, Santos et al. 1995). Assim, devem-se comparar taxas de predação entre condições diferentes, mesmo com o mesmo predador, pois esta é influenciada por características da planta, da presa e pela temperatura.

O efeito da densidade da presa sobre a taxa de predação de P. nigrispinus foi semelhante no laboratório e no campo (Tabela 1). Em altas densidades, o predador teve maior facilidade de encontrar sua presa (Holling 1961), e a partir da densidade de oito lagartas de A. argillacea, houve uma tendência à estabilização da taxa de predação nas duas condições estudadas (Fig. 1). Essa estabilização é proveniente da limitação do predador em não conseguir aumentar sua taxa de predação, devido à redução do tempo para procura e manipulação da presa, bem como da sua saciação. Assim, tanto em laboratório como em campo, caracterizou-se um modelo de resposta funcional do tipo II (Fig. 1) para a taxa de predação de A. argillacea por P. nigrispinus. Mohaghegh (1999) mostrou, também, resposta funcional do tipo II para P. nigrispinus com temperatura entre 18 a 23oC, e do tipo III a 27oC. O autor justifica que a mudança do tipo de resposta pode ser resultado do comportamento alimentar dos insetos a diferentes temperaturas, pois os predadores gastam mais tempo manipulando sua presa em temperaturas mais baixas. Assim, em baixas densidades de presa, P. nigrispinus pode apresentar taxa de predação positivamente dependente da densidade (Tipo III), o que pode ser observado em campo, nas densidades que permitem ao predador encontrar presa até sua saciação (oito lagartas/planta), cessando o ataque posteriormente. Por isto, conclusões baseadas na resposta funcional devem ser cautelosas, pois pela teoria a resposta funcional tipo III indicaria que o predador manteria sua taxa de ataque relacionada à densidade da presa, portanto controlando-a.

Agradecimentos

À CAPES e ao CNPq, pelas bolsas concedidas, a Walter S. Evangelista Júnior pela manutenção da colônia do predador e ao Dr. Francisco de S. Ramalho (Embrapa Algodão) pelo constante apoio.

Literatura Citada

Received 30/10/00. Accepted 10/08/01.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jun 2002
  • Data do Fascículo
    Dez 2001

Histórico

  • Recebido
    30 Out 2000
  • Aceito
    10 Ago 2001
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