Acessibilidade / Reportar erro

Ocorrência de Euetheola humilis (Burmeister) (Coleoptera: Scarabaeidae) em Eucalyptus saligna Smith (Myrtaceae), no Rio Grande do Sul

Occurrence of Euetheola humilis (Burmeister) (Coleoptera: Scarabaeidae) in Eucalyptus saligna Smith (Myrtaceae), in Rio Grande do Sul State, Brazil

Resumos

Euetheola humilis (Burmeister) é um escarabeídeo praga das culturas do arroz, cana-de-açucar e milho, que ataca as cultura na fase larval e na adulta. A ocorrência de E. humilis foi observada em área florestada com Eucalyptus saligna Smith, pertencente a Votorantim Celulose & Papel (Fazenda Aroeira), no município de Candiota, RS. Plantas de aproximadamente 1m de altura foram danificadas por insetos adultos de E. humilis na região próxima ao colo, desfiando seu córtex, levando algumas à morte. Verificou-se ataque em torno de 10% das plantas de eucalipto, em uma área de aproximadamente 30 ha.

Coró; cascudo-preto; inseto-praga; florestamento; eucalipto


Euetheola humilis (Burmeister) is a scarabaeid pest of rice, sugarcane and corn cultures, that attacks the crops during both larval and adult phase. The occurrence of E. humilis was observed in a forest area with Eucalyptus saligna Smith, from Votorantim Celulose & Papel (Fazenda Aroeira), in the Municipality of Candiota, Rio Grande do Sul State. Plants approximately 1m high were damaged by E. humilis adult insects near the stem base, what unraveled its cortex and led some of them to death. The attack was verified in about 10% of the eucalypts plants, in an area of approximately 30 ha.

Grub; black beetle; insect-pest; forestation; eucalypt


SCIENTIFIC NOTE

Ocorrência de Euetheola humilis (Burmeister) (Coleoptera: Scarabaeidae) em Eucalyptus saligna Smith (Myrtaceae), no Rio Grande do Sul

Occurrence of Euetheola humilis (Burmeister) (Coleoptera: Scarabaeidae) in Eucalyptus saligna Smith (Myrtaceae), in Rio Grande do Sul State, Brazil

Oderlei BernardiI; Mauro S. GarciaI; Uemerson S. da CunhaI; Evandro C.U. BackI; Daniel BernardiI; Glodoaldo A. RamiroII; Elder FinkenauerII

IDepto. Fitossanidade da Faculdade de Agronomia "Eliseu Maciel", FAEM-UFPel. C. postal 354, 96001-970 Pelotas, RS oderleibernardi@yahoo.com.br

IIVotorantim Celulose & Papel. Rua Gonçalves Chaves, 3798, 96015-560, Pelotas, RS

RESUMO

Euetheola humilis (Burmeister) é um escarabeídeo praga das culturas do arroz, cana-de-açucar e milho, que ataca as cultura na fase larval e na adulta. A ocorrência de E. humilis foi observada em área florestada com Eucalyptus saligna Smith, pertencente a Votorantim Celulose & Papel (Fazenda Aroeira), no município de Candiota, RS. Plantas de aproximadamente 1m de altura foram danificadas por insetos adultos de E. humilis na região próxima ao colo, desfiando seu córtex, levando algumas à morte. Verificou-se ataque em torno de 10% das plantas de eucalipto, em uma área de aproximadamente 30 ha.

Palavras-chave: Coró, cascudo-preto, inseto-praga, florestamento, eucalipto

ABSTRACT

Euetheola humilis (Burmeister) is a scarabaeid pest of rice, sugarcane and corn cultures, that attacks the crops during both larval and adult phase. The occurrence of E. humilis was observed in a forest area with Eucalyptus saligna Smith, from Votorantim Celulose & Papel (Fazenda Aroeira), in the Municipality of Candiota, Rio Grande do Sul State. Plants approximately 1m high were damaged by E. humilis adult insects near the stem base, what unraveled its cortex and led some of them to death. The attack was verified in about 10% of the eucalypts plants, in an area of approximately 30 ha.

Key words: Grub, black beetle, insect-pest, forestation, eucalypt

O gênero Eucalyptus, com origem na Austrália, foi introduzido no Brasil na década de 40, e plantios em larga escala passaram a ser efetuados após a década de 60. No entanto, em 2005, o Brasil contava com 3,4 milhões de ha florestados com o gênero, sendo 31% destes em Minas Gerais. O Rio Grande do Sul, com 179.690 ha cultivados com eucalipto, ocupa a sétima maior área com a cultura no país (ABRAF 2006).

O fato de os plantios florestais serem, normalmente, constituídos de monoculturas em vastas extensões de terra, e cultivados por longos períodos, tem favorecido as espécies-praga, principalmente as formigas cortadeiras, dos lepidópteros-desfolhadores e coleópteros, que constituem sérios problemas para a eucaliptocultura nacional (Anjos et al. 1986). Os coleópteros são o terceiro grupo mais importante de insetos-praga de eucalipto no Brasil, principalmente espécies das famílias Scolytidae, Cerambycidae, Scarabaeidae, Chrysomelidae, Curculionidae, Buprestidae e Platypodidae (Pedrosa-Macedo 1993, Zanuncio et al. 1993). Nas regiões onde o eucalipto é nativo, os Scarabaeidae, Chrysomelidae e Curculionidae estão entre os insetos mais importantes dessa essência (Ohmart & Edwards 1991).

Dentre outros países, é na Austrália que os escarabeídeos assumem maior importância como pragas do eucalipto. De acordo com Ohmart & Edwards (1991), o escarabeídeo conhecido como besouro-de-natal, Anaplognathus spp. é praga importante no litoral e costa leste do país. Os adultos alimentam-se de folhas de plantas jovens de eucalipto, podendo causar danos severos, enquanto suas larvas desenvolvem-se no solo, alimentando-se de matéria orgânica. Além dessa praga, o besouro-preto-africano Heteronychus arator (Fabricius), e os besouros-primaveris Liparetrus spp. e Heteronyx spp., assumem certa relevância à eucaliptocultura australiana, em razão, principalmente, de os danos causados serem associados à ineficiência do controle através do método químico (Calm 1990). Estes besouros também ocorrem em pastagens, porém, em razão da baixa população, não causam danos significativos. Entretanto, atacam várias culturas que substituem as pastagens, como batata (Matthiessen & Learmonth 1995) e Eucalyptus globulus Labillardière ssp. globulus Kirk. (Calm 1990, Abbott 1993).

No Brasil existem poucos relatos de escarabeídeos capazes de danificar o eucalipto. Segundo Anjos et al. (1986) um Scarabaeidae que se destaca como praga de eucalipto é o besouro-pardo Bolax flavolineatus (Mann.), sendo necessário, em alguns casos, o controle químico. Segundo Zanuncio et al. (1993), B. flavolineatus causa perfurações e rendilhamento das folhas, constituindo problema em plantios jovens de eucalipto.

De acordo com Salvadori & Silva (2004), no Rio Grande do Sul existem várias espécies de escarabeídeos associados a diferentes culturas. No Sul do estado destaca-se Euetheola humilis (Burmeister), conhecida vulgarmente por cascudo-preto, na cultura do arroz irrigado cultivado em áreas de várzea (Martins et al. 2004). Também há relatos de ocorrência dessa espécie no México, Panamá e Venezuela (Blackwelder 1944).

O adulto é um besouro de coloração marrom-escura a preta, com 15 mm de comprimento (Fig. 1A). A oviposição é feita no solo e as larvas, logo após a eclosão, medem 3 mm de comprimento. Na entressafra, os insetos encontram-se no solo na fase larval, em campos nativos ou áreas em pousio. As larvas, do tipo escarabeiforme, apresentam a cabeça de cor marrom-clara e extremidade do abdome escura, podendo atingir 50 mm de comprimento. A fase larval pode durar até 20 meses sendo que a transformação em pupas se dá em câmaras, construídas no solo (Martins et al. 2000).



No arroz irrigado, o ataque desse inseto se dá no período que antecede a entrada de água na lavoura. Suas larvas, conhecidas como pão-de-galinha ou coró, alimentam-se de matéria orgânica e raízes (Martins et al. 2004), podendo provocar definhamento (com amarelecimento) ou, até mesmo a morte de plantas. O ataque de adultos caracteriza-se pela destruição da base das plantas no período pré-inundação. Considerado praga aguda, o inseto tem assumido maior importância econômica na região da Campanha do Rio Grande do Sul, como também no estado do Tocantins, na região Central do Brasil (Martins et al. 2004).

Embora em menor grau de importância, E. humilis ocorre também nas culturas da cana-de-açúcar, na qual o inseto adulto broqueia os toletes recém-plantados (Gallo et al. 2002) e no milho, onde as larvas danificam as sementes após o plantio prejudicando sua germinação e também alimentam-se de raízes provocando definhamento e morte das plantas (Viana et al. 2006). Além dessas, há relato da associação de E. humilis com as seguintes culturas: aveia, beterraba, couve, gramíneas, hortaliças, trigo, repolho e soja (Silva et al. 1968).

Neste trabalho é relatada a primeira ocorrência do escarabeídeo E. humilis atacando plantas de Eucalyptus saligna Smith no Sul do Rio Grande do Sul.

Em fevereiro de 2006, em área pertencente a Votorantim Celulose & Papel (Fazenda Aroeira), município de Candiota, RS, constataram-se cerca de 10% de plantas de eucalipto atacadas por adultos de E. humilis em aproximadamente 30 ha. Essa área era ocupada por campo nativo e atualmente estava sendo conduzida no sistema de agrosilvicultura, associando E. saligna com sorgo.

Exemplares da espécie foram identificados e depositados no Museu Entomológico Ceslau Biezanko do Departamento de Fitossanidade da Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel, Universidade Federal de Pelotas, RS.

O ataque de adultos de E. humilis ocorreu em plantas de eucalipto de aproximadamente 1m de altura, próximo à região do colo da planta (Fig. 1B-C), onde se observou o córtex parcial ou totalmente "desfiado", o que levou algumas plantas à morte (Fig. 1D). Não foram detectados ataques ao sistema radicular, embora tenham sido observados, em algumas plantas, até dois insetos adultos.

Os danos ocasionados por E. humilis às plantas de eucalipto diferenciam-se daqueles observados para outros escarabeídeos, como Heteronyx spp. e Liparetrus spp., cujos adultos alimentam-se preferencialmente de folhas jovens, sendo as plantações novas mais vulneráveis a danos (Phillips 1993). As larvas de Heteronyx spp. causam danos severos às raízes de E. g. globulus (Phillips 1993). No entanto, danos semelhantes aos de E. humilis são ocasionados por adultos de H. arator, os quais danificam o talo de mudas pequenas logo abaixo do nível do solo, podendo ocasionar crescimento deficiente ou a morte de plantas (Calm 1990, Abbott 1993).

Móron (2004) afirma que a maior parte das espécies de Melolonthidae edafícolas deve estar se adaptando às condições de ecótonos e de agroecossistemas de cultivo, sendo também provável o aumento de espécies originalmente associadas a ambientes silvestres que possam se adaptar às condições de monocultivo e que, sob determinadas circunstâncias ecológicas, possam causar danos às plantas cultivadas.

Levando-se em consideração que o incremento da área reflorestada com essências exóticas tem levado ao aumento de problemas com insetos-praga, em razão das modificações ambientais(Santos et al. 1982, Zanuncio et al. 1994), nas monoculturas, que levam ao empobrecimento geral da fauna, há possibilidade de que E. humilis venha a se estabelecer na cultura do eucalipto, no Sul do estado, ocasionando danos significativos em plantas jovens em determinadas épocas, à semelhança do que ocorre na cultura do arroz irrigado.

Na cultura do arroz, o controle curativo desse inseto é ineficiente por meio de inseticidas, granulados ou líquidos (King & Saunders 1984). De modo semelhante, no caso de a espécie E. humilis vir a se estabelecer em eucalipto, seu controle através de inseticidas também poderá ser pouco eficiente, pelo fato de seu ataque ser direcionado ao colo das plantas e os sintomas se manifestarem quando estas já estão bastante danificadas.

Agradecimento

Ao Eng. Agr. Dr. Eduardo José Ely e Silva, curador do Museu Entomológico Ceslau Biezanko do Depto. de Fitossanidade da FAEM-UFPel, pela identificação dos exemplares de E. humilis.

Received 11/X/06. Accepted 05/V/07.

  • Abbott I. 1993. Insect pest problems of eucalypt plantations in Australia. 6. Western Australia. Aust. For. 56: 381-4.
  • Anjos, N., G.P. Santos & J.C. Zanuncio. 1986. Pragas do eucalipto e seu controle. Inf. Agropec. 12: 50-58.
  • Abraf. 2006. Associação brasileira de produtores de florestas plantadas. Anuário estatístico 2006 (Ano base 2005). Disponível em: <http://www.abraflor.org.br/estatística.asp Acesso em 15 set. 2006.
  • Blackwelder, R.E. 1944. Checklist of the coleopterous insects of Mexico, Central America, the West Indians and South America. Washington, Smithsonian Institute (United States National Museum. Bulletin, 185).
  • Calm (1990). CALM Insect Manual. CALM, Perth. Western Australian Department of Conservation and Land Management 110p.
  • Gallo, D., O. Nakano, S.S. Neto, R.P.L. Carvalho, G.C. de Baptista, E.B. Filho, J.R.P. Parra, R.A. Zucchi, S.B. Alves, J.D. Vendramim, L.C. Marchini, J.R.S. Lopes & C. Omoto. 2002. (eds.), Entomologia agrícola. Piracicaba, FEALQ, 920p.
  • King, A.B.S. & J.L. Saunders. 1984. The invertebrate pests of annual food crops in Central America. London, Overseas Development Administration, 166p.
  • Martins, J.F. da S., A.D. Grutzmacher & U. da S. Cunha. 2004. Descrição e manejo integrado de insetos-praga em arroz irrigado, p.635-675. In A.S. Gomes & A.M. Magalhães Jr. (eds.). Arroz irrigado no Sul do Brasil. Pelotas, Embrapa Clima Temperado. Brasília, Embrapa Informação Tecnológica. 899p.
  • Martins, J.F. da S., U.S. da Cunha, J.V. Oliveira & H.F. Prando. 2000. Controle de insetos na cultura do arroz irrigado, p.137-153. In J.C. Guedes, I.F.D. Costa & E. Castiglioni (orgs.). Bases e técnicas do manejo de insetos. Santa Maria, Pallotti, v.1, 248p.
  • Matthiessen J.N. & S.E. Learmonth. 1995. Impact of the soil insects African black beetle, Heteronychus arator (Coleoptera: Scarabaeidae) and whitefringed weevil, Graphognathus leucoloma (Coleoptera: Curculionidae), on potatoes and effects of soil insecticide treatments in south-western Australia. Bull. Entomol. Res. 85: 101-11.
  • Morón, M.A. 2004. Melolontídeos edafícolas, p.133-166. In J.R. Salvadori, C.J. Ávila & M.T.B. da Silva (eds.), Pragas de solo no Brasil. Passo Fundo, Embrapa Trigo. Dourados, Embrapa Agropecuária Oeste. Cruz Alta, Fundacep Fecotrigo. 544p.
  • Ohmart, C.P. & P.B. Edwards. 1991. Insect herbivory on Eucalyptus Annu. Rev. Entomol. 36: 637-657.
  • Pedrosa-Macedo, J.H. 1993. Pragas florestais do Sul do Brasil. Manual de pragas em florestas, v.2, Viçosa, SIF/IPEF, 112p.
  • Phillips, C.L. 1993. Insect pest problems of eucalypt plantations in Australia. 5. South Australia. Aust. For. 56: 378-80.
  • Santos, G.P., J.C. Zanuncio & N. Anjos. 1982. Novos resultados sobre a biologia de Psorocampa denticulata Schaus (Lepidoptera: Notodontidae), desfolhadora de eucalipto. Rev. Árvore 6: 121-132.
  • Salvadori, J.R. & M.T.B. da Silva. 2004. Coró-do-trigo, p.211-232. In J.R. Salvadori, C.J. Ávila & M.T.B. da Silva (eds.), Pragas de solo no Brasil. Passo Fundo, Embrapa Trigo. Dourados, Embrapa Agropecuária Oeste. Cruz Alta, Fundacep Fecotrigo, 544p.
  • Silva, A.G.dA., C.R. Gonçalves, D.M. Galvão, A.J.L. Gonçalves, J. Gomes, M.N. Silva & L. Simoni. 1968. Quarto catálogo e os insetos que vivem nas plantas do Brasil. Seus parasitos e predadores. Lab. Central Patologia Vegetal, MA ed., 1ş. Tomo, Parte II, Ministério da Agricultura, Rio de Janeiro, 622p.
  • Viana, P.A., I. Cruz & J.M. Waquil. 2006. Pragas. In Cruz, I., R.P. Versiani, M.T.R. Ferreira (eds.) Cultivo do milho. Disponível em <http://sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/FontesHTML/Milho/CultivodoMilho/pragas.htm>. Acesso em 30 ago. 2006.
  • Zanuncio, J.C., E.C. Nascimento, J.F. Garcia & T.V. Zanuncio. 1994. Major lepidopterous defoliators of eucalypt in southeast Brazil. For. Ecol. Manag. 65: 53-63.
  • Zanuncio, J.C., M.A.L. Bragança, A.L. Laranjeiro & M. Fagundes. 1993. Coleópteros associados à eucaliptocultura nas regiões de São Mateus e Aracruz, Espírito Santo. Rev. Ceres 41: 584-590.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Mar 2008
  • Data do Fascículo
    Fev 2008
Sociedade Entomológica do Brasil Sociedade Entomológica do Brasil, R. Harry Prochet, 55, 86047-040 Londrina PR Brasil, Tel.: (55 43) 3342 3987 - Londrina - PR - Brazil
E-mail: editor@seb.org.br