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Polinização entomófila de abobrinha, Cucurbita moschata (Cucurbitaceae)

Entomophilic pollination of squash, Cucurbita moschata (Cucurbitaceae)

Resumo

The objectives of this work were to determine the squash entomofauna in the region of Viçosa, Minas Gerais state, to study their behavior on flowers and their importance for pollination, verifying the role of each pollinator. The most common species were Trigona spinipes (Fabricius), Trigona hyalinata (Lepeletier), Apis mellifera (L.) and Melipona quadrifasciata (Lepeletier). The visitation behavior of A. mellifera, M. quadrifasciata, and Bombus morio (Swederus) were similar. They visited flowers for nectar collection, positioning themselves vertically between the corolla and the sexual structures of the flowers, with the back directed toward the floral axis, which permitted the removal of pollen from the anthers of flowers with stamens and its deposition on the stigma of flowers with pistils, being considered therefore effective pollinators. Trigona spinipes and T. hyalinata foraged in groups, preventing other species from landing on the flowers which they occupied. Due to their small body size and only infrequent contact with the sexual structures of the flowers, these species are considered occasional pollinators. The number of fruits produced differed between freely visited flowers, those prevented from receiving visits and those visited only a single time by M. quadrifasciata, B. morio, A. mellifera, T. hyalinata or T. spinipes. Flowers prevented from receiving visits or visited only once by T. spinipes did not produce fruits. The remaining pollination systems led to fruitification, with open pollination or a single visit from either M. quadrifasciata or B. morio leading to most fruit production.

Apidae; melittophily; effective pollinator; pollination efficiency; foraging behavior


Apidae; melittophily; effective pollinator; pollination efficiency; foraging behavior

ECOLOGY, BEHAVIOR AND BIONOMICS

Polinização entomófila de abobrinha, Cucurbita moschata (Cucurbitaceae)

Entomophilic pollination of squash, Cucurbita moschata (Cucurbitaceae)

Bruna D V Serra; Lucio A de O Campos

Depto Biologia Animal, Univ Federal de Viçosa, Av. P. H. Rholfs, s/n, 36570-000, Viçosa, MG, Brasil; bruazul@yahoo.com.br, lcampos@ufv.br

ABSTRACT

The objectives of this work were to determine the squash entomofauna in the region of Viçosa, Minas Gerais state, to study their behavior on flowers and their importance for pollination, verifying the role of each pollinator. The most common species were Trigona spinipes (Fabricius), Trigona hyalinata (Lepeletier), Apis mellifera (L.) and Melipona quadrifasciata (Lepeletier). The visitation behavior of A. mellifera, M. quadrifasciata, and Bombus morio (Swederus) were similar. They visited flowers for nectar collection, positioning themselves vertically between the corolla and the sexual structures of the flowers, with the back directed toward the floral axis, which permitted the removal of pollen from the anthers of flowers with stamens and its deposition on the stigma of flowers with pistils, being considered therefore effective pollinators. Trigona spinipes and T. hyalinata foraged in groups, preventing other species from landing on the flowers which they occupied. Due to their small body size and only infrequent contact with the sexual structures of the flowers, these species are considered occasional pollinators. The number of fruits produced differed between freely visited flowers, those prevented from receiving visits and those visited only a single time by M. quadrifasciata, B. morio, A. mellifera, T. hyalinata or T. spinipes. Flowers prevented from receiving visits or visited only once by T. spinipes did not produce fruits. The remaining pollination systems led to fruitification, with open pollination or a single visit from either M. quadrifasciata or B. morio leading to most fruit production.

Key words: Apidae, melittophily, effective pollinator, pollination efficiency, foraging behavior

A polinização é fundamental na condução de muitas culturas agrícolas (Shepherd et al 2003, Mayer 2004). Entre os vários agentes polinizadores, os insetos apresentam, para a maioria das plantas, maior eficiência tanto pelo seu número na natureza quanto por sua melhor adaptação às, muitas vezes, complexas estruturas florais (Nogueira-Couto et al 1990). Diversas plantas de interesse econômico, cultivadas comercialmente, apresentam total dependência dos insetos para sua polinização, sem os quais não ocorre produção de frutos (Biesmeijer et al 2006).

A família Cucurbitaceae, com cerca de 90 gêneros e 750 espécies adaptadas às regiões tropicais e subtropicais de ambos os hemisférios, possui diversas espécies de importância econômica e alimentar (Saturnino et al 1982, Bee & Barros 1999), como por exemplo, Cucurbita moschata. As espécies do gênero Cucurbita são monóicas e dependentes de vetores bióticos para assegurar a polinização (McGregor 1976, Nepi & Pacini 1993, Passarelli 2002).

Os frutos de cultivares de C. moschata são utilizados para consumo em diferentes estágios de maturação, incluindo frutos imaturos (Camargo 1984). No Brasil, é explorada em todas as grandes regiões, destacando-se economicamente no abastecimento nacional. Entretanto, é na Região Sudeste que sua produção está mais concentrada; em 2005, foram comercializadas 34.892 toneladas na CEAGESP, no estado de São Paulo (Agrianual 2007).

Os requerimentos de polinização para a produção máxima de diferentes espécies de Cucurbita não são claros e, os produtores frequentemente questionam sobre reduções na taxa de frutos estabelecidos (Wien et al 1989). Um dos fatores restritivos para a produção dessas espécies e também de outras plantas cultivadas é a falta de polinizadores, recentemente verificada em populações de abelhas nativas (Cane & Tepedino 2001, Steffan-Dewenter et al 2005, Villanueva et al 2005).

As ameaças às populações de polinizadores advêem da fragmentação de seus habitats causada pelo desmatamento, o que reduz a disponibilidade de plantas utilizadas como fonte de alimento e local para construção de ninhos (Cane & Tepedino 2001, Ruijter 2002, Shepherd et al 2003, Potts et al 2005); uso de produtos químicos na agricultura, principalmente pesticidas, que repelem e matam os insetos; introdução de plantas exóticas que não oferecem recursos necessários às populações de polinizadores e são cultivadas extensivamente, e introdução de animais exóticos que atuam como competidores das populações nativas (Brown & Mitchell 2001, Chittka & Schürkens 2001, Robinson & Sutherland 2002, Tscharntke et al 2002, 2005).

Uma alternativa viável para solucionar o déficit de polinização de diversas espécies vegetais cultiváveis é a realização de estudos sobre a entomofauna polinizadora. Esses estudos permitem desenvolver estratégias específicas envolvendo proteção e restauração do habitat dos polinizadores (Shuler et al 2005), ou mesmo, sua criação em condições controladas e introdução nas áreas agrícolas, de modo a garantir a polinização da cultura em questão (Slaa et al 2006). Com o propósito de contribuir para a melhor compreensão da polinização de C. moschata, o presente trabalho teve por objetivo verificar a entomofauna visitante das flores da cultura na região de Viçosa, MG e estudar seu comportamento nas flores, além de avaliar sua eficiência como insetos polinizadores.

Material e Métodos

Áreas de estudo. Os dados foram coletados em plantios de C. moschata var. Menina Brasileira nos municípios de Viçosa e Paula Cândido, MG, de setembro de 2006 a fevereiro de 2007, em três áreas: Comunidade dos Barros (S 20º 50. 316'; W 042º 55. 417"), no município de Paula Cândido, Paraíso (S 20º 47. 535'; W 042º 52. 779") e Córrego do Engenho (S 20º 49. 154'; W 042º 53. 093") em Viçosa. A área plantada na Comunidade dos Barros possuía 1000 covas; Córrego do Engenho 700 covas e, Paraíso, 600 covas. A vegetação da região está inserida nos domínios da Floresta Atlântica (Rizzini 1992) e foi classificada, por Veloso et al (1991), como Floresta Estacional Semidecidual Submontana. O clima é caracterizado por temperatura média anual de 19ºC, índices pluviométricos anuais de 1300 mm a 1400 mm, com o período de maior precipitação entre os meses de outubro a março, e umidade relativa do ar média de 80% a 85%.

Biologia floral. As flores estaminadas e pistiladas são pentâmeras e possuem cor amarelo intenso (Paris 2001). A flor estaminada possui cinco estames com filetes e anteras unidos; a flor pistilada tem ovário ínfero desenvolvido, estilete espesso e, normalmente, três lóbulos estigmáticos (Free 1993). As flores de Cucurbita sp. abrem-se antes ou logo após o nascer do sol e duram somente um dia (Winsor et al 2000, Nepi et al 2001). Nos locais de estudo as flores já estavam abertas às 5:00h da manhã e fechavam-se entre 11:00h e 12:00h. A flor pistilada produz néctar como recurso aos polinizadores e a estaminada pólen e néctar. Na flor estaminada, o nectário está localizado internamente ao tubo de filetes e o acesso ao néctar se dá por três orifícios localizados entre os filetes; na flor pistilada, o nectário forma um anel circular em torno da base do estilete (Pesson & Louveaux 1984).

Visitantes florais. As abelhas foram coletadas ao acaso percorrendo-se todo o plantio, utilizando-se rede entomológica e pinça durante 10 min a cada hora, das 5:00h às 12:00h. As coletas foram realizadas durante três dias em cada área de estudo, totalizando um esforço de 24h por área amostrada. As abelhas coletadas foram depositadas na coleção entomológica da Universidade Federal de Viçosa e identificadas por especialistas. O comportamento de visita das espécies de abelhas mais frequentes e daquelas que, por seu comportamento, poderiam ser consideradas polinizadoras eficientes, foi registrado a partir de observações visuais diretas e fotográficas. Foram medidas as distâncias intertégula de 15 indivíduos de cada uma dessas espécies para avaliar seu tamanho.

Eficiência de polinização. Verificou-se o estabelecimento de frutos após uma única visita dos principais polinizadores às flores. Para isso, 100 flores pistiladas foram selecionadas ao acaso, protegidas na pré-antese com sacos de poliéster, e desprotegidas após a antese para permitir uma visita de abelhas: Apis mellifera (L.) (n = 20), Bombus morio (Swederus) (n = 19), Melipona quadrifasciata (Lepeletier) (n = 21), Trigona hyalinata (Lepeletier) (n = 20) e Trigona spinipes (Fabricius) (n = 20). Após as visitas, as flores eram novamente protegidas, etiquetadas e o estabelecimento dos frutos avaliado. Vinte flores pistiladas ensacadas na pré-antese foram utilizadas como controle para verificar a formação de frutos na ausência de visitação por insetos. As flores permaneceram ensacadas por mais de 24h para evitar visitas de abelhas e outros insetos, sendo então retirados os sacos de proteção.

Verificou-se ainda, a frutificação em flores expostas à visitação (polinização aberta), marcando-se 20 flores pistiladas de 20 indivíduos que permaneceram sem proteção. Após as visitas, as flores eram etiquetadas e o estabelecimento dos frutos avaliado. Os frutos provenientes dos tratamentos foram colhidos verdes, cinco dias após a realização das polinizações, nas condições de comercialização e consumo. Diferenças nas porcentagens de frutificação foram testadas utilizando-se o teste do qui-quadrado, adotando-se nível de significância de 5% (Zar 1999).

Resultados

Visitantes florais.Trigona spinipes, T. hyalinata, A. mellifera e M. quadrifasciata foram os visitantes mais frequentes de flores de C. moschata (Tabela 1). As demais espécies de abelhas, apesar de serem observadas em menor proporção, forrageavam a procura de néctar.

O comportamento de visita das espécies de abelhas maiores, A. mellifera, M. quadrifasciata e B. morio (Tabela 2), foi semelhante. Pousavam nas pétalas das flores e caminhavam até o tubo da corola para acessar o néctar. Nas flores estaminadas o acesso ao nectário se dava por introdução da glossa em um dos três orifícios localizados entre os filetes. O visitante frequentemente introduzia a glossa em mais de um orifício a cada visita, deslocando-se no interior da corola e contatando diferentes regiões do eixo floral. Na flor pistilada, o néctar acumulava-se em torno da base do estilete e o acesso era feito utilizando a glossa. Ao coletarem néctar, posicionavam o corpo verticalmente entre a corola e as estruturas sexuais das flores. Nessa posição, com o dorso voltado para o eixo floral ao visitarem as flores estaminadas, tocavam as anteras e o pólen aderia ao seu corpo e, ao visitarem flores pistiladas, este pólen era depositado sobre o estigma. Após a coleta do néctar, abandonavam a flor repetindo o mesmo comportamento em outras flores do mesmo indivíduo ou de plantas diferentes. Devido ao seu tamanho corporal, ao chegarem ao nectário, tocavam as partes reprodutivas da flor, sendo consideradas polinizadoras efetivas.

Em algumas ocasiões, verificou-se indivíduos de A. mellifera e M. quadrifasciata removendo pólen de seus corpos durante o vôo ou pousados sobre as pétalas das flores.

Trigona spinipes e T. hyalinata, abelhas de menor porte, pousavam na pétala e em seguida dirigiam-se para o tubo da corola, frequentemente, sem contatar os órgãos reprodutivos florais (Tabela 2). Nesse caso, ao coletarem néctar, atuavam como furtadoras. Outras vezes, pousavam diretamente sobre o eixo da flor estaminada ou pistilada e após o pouso dirigiam-se para a base da corola onde coletavam néctar. Nesse caso, foi verificada presença de pólen em seus corpos que se aderiam ao pousarem diretamente nos estames. Essas espécies deslocavam-se pelas pétalas, estames ou estigma, aparentemente de forma desordenada. Forrageavam em grupo e monopolizavam as fontes de alimento, afugentando outras espécies que tentassem pousar nas flores que ocupavam. Devido ao pequeno tamanho corporal e o contato apenas ocasional com as estruturas sexuais das flores, essas espécies são consideradas polinizadoras ocasionais e furtadoras de néctar.

De modo geral, todas as abelhas visitavam as flores apenas para coleta de néctar, não sendo observada coleta de pólen, embora muitas vezes seus corpos ficassem repletos de grãos após visitas às flores estaminadas.

Eficiência de polinização. O número de frutos produzidos diferiu entre flores visitadas livremente (polinização aberta), flores impedidas de receber visitas (controle) e flores visitadas uma única vez por M. quadrifasciata, B. morio, A. mellifera, T. hyalinata ou T. spinipes2 = 43,33; gl = 6; P < 0,05) (Tabela 3). Com exceção das flores impedidas de receber visitas dos insetos e daquelas visitadas uma única vez por T. spinipes, os demais sistemas de polinização promoveram formação de frutos, sendo a polinização aberta e uma visita de M. quadrifasciata ou B. morio os que propiciaram maior frutificação.

Discussão

As abelhas mais frequentes em flores de C. moschata foram espécies eusociais. Essas espécies possuem colônias populosas, com centenas a milhares de indivíduos (Wille & Michener 1973, Michener 1974, Wille 1983, Winston 1992), e a maioria possui sistemas eficientes de comunicação (Barth et al 2008). A comunicação sobre a localização de fontes de alimento permite que um grande número de operárias de uma mesma colônia visite flores de uma mesma planta para, no caso de C. moschata, coletar néctar utilizado na alimentação dos indivíduos da colônia.

Como as abelhas sociais mantêm reservas de alimento estocadas no ninho e elevada taxa de produção de prole, as operárias precisam coletar muito alimento, além de suas necessidades imediatas, o que resulta em intensa visitação às flores (Heard 1999, Ramalho et al 2007). Outra característica importante é que essas abelhas apresentam fidelidade floral, tendendo a visitar apenas uma espécie de flor em uma viagem de coleta (Roubik 1989), o que nesse caso, asseguraria a fecundação e produção de frutos de C. moschata, além de apresentarem colônias perenes, ativas durante todo o ano (Roubik 1989).

O modo de vida social dos principais visitantes florais da abobrinha proporciona, portanto, maior confiabilidade em sua polinização, tanto pela visitação intensa, fidelidade floral quanto pela perenidade das colônias, fornecendo polinizadores ininterruptamente. Ainda, as abelhas sociais têm preferência por recursos florais adensados (Ginsberg 1983), como é o caso dos plantios de abobrinha, o que facilita seu forrageamento. Esta característica associada às suas estratégias de comunicação, maximiza a coleta de néctar nas flores de C. moschata.

As diferenças nas frequências das diferentes espécies de abelhas nas flores de C. moschata em áreas relativamente próximas, especialmente no que se refere às espécies sociais, refletem a frequência de ninhos próximos às áreas de plantio. A presença de um ninho de T. spinipes ou T. hyalinata próximo a uma área, por exemplo, aumenta muito a frequência dessas abelhas nas flores visto que seus ninhos são muito populosos, com 5.000 a 180.000 indivíduos (Kerr 1951).

A elevada frequência de espécies de Trigona, principalmente T. spinipes, juntamente com A. mellifera em flores de Cucurbita, já tinha sido constatada por outros pesquisadores(Amaral & Mitidieri 1966, Lopes & Casali 1982, Ávila 1987, Gomes 1991), assim como Bombus spp. e representantes dafamília Halictidae (Ávila 1987, Kirkpatrick & Wilson 1988, Nogueira-Couto et al 1990, Gomes 1991, Nepi & Pacini 1993). Entretanto, a presença de M. quadrifasciata, Schwarziana quadripunctata (Lepeletier), Eulaema cingulata (Fabricius) e E. nigrita (Lepeletier) como visitantes florais de Cucurbita ainda não havia sido relatada.

O comportamento agressivo e monopolista de espécies de Trigona verificado neste trabalho, já era conhecido (Johnson & Hubbell 1974, Hubbell & Johnson 1977). Operárias de T. spinipes forrageiam em "bando", várias operárias monopolizando as flores (Almeida & Laroca 1988, Sazima & Sazima 1989), apresentam vôo lento e mimetizam vespas e abelhas agressivas que possuem acúleos desenvolvidos, como espécies de Tetrapedia e Paratetrapedia (Kerr 1951).

A ausência de formação de frutos em flores de C. moschata impedidas de receberem visitas de insetos já havia sido observada por Amaral & Mitidieri (1966), que verificaram ausência de formação de frutos em plantas de C. pepo mantidas no interior de gaiolas (sem contato com inseto).

A polinização natural não sofreu restrições de agentes polinizadores nas áreas estudadas, visto que a porcentagem de frutificação foi de 90% no tratamento em que as flores permaneceram expostas à visitação. Essa elevada taxa de frutificação, garantida pela presença de polinizadores nas áreas de cultivo, pode estar associada à existência de matas no entorno dos plantios, o que assegura boas condições de nidificação, materiais para construção de ninhos e recursos alimentares para a fauna de abelhas locais. Segundo Heard (1999), a vegetação natural pode influenciar a abundância de abelhas da tribo Meliponini. De Marco Jr & Coelho (2004), em trabalho realizado em cafezais na região de Viçosa, constataram maior produção nos plantios próximos ou adjacentes a fragmentos de florestas. Isso mostra a importância da preservação de matas nativas próximas às áreas de cultivo, especialmente no caso de C. moschata, que obrigatoriamente necessita de vetores bióticos que assegurem sua polinização.

A maior porcentagem de frutos obtidos em flores visitadas uma vez por M. quadrifasciata ou B. morio, em relação às flores visitadas por A. mellifera, T. hyalinata ou T. spinipes, deve estar relacionada aos seus tamanhos corporais maiores. Essa característica resulta em melhor ocupação do espaço entre a corola e as estruturas sexuais das flores, de tal modo que a remoção e a deposição de pólen são mais eficientes.

A baixa frutificação em flores visitadas uma única vez por A. mellifera, quando comparada à frutificação obtida após uma visita de M. quadrifasciata ou B. morio, pode ser atribuída a uma carga de pólen insuficiente no corpo das operárias por terem visitado poucas flores estaminadas antes de visitarem as flores pistiladas. Apis mellifera era mais frequente em flores C. moschata no início da manhã, provavelmente devido a poucas espécies com flores estarem abertas muito cedo e C. moschata ser o recurso disponível. Após a abertura das flores de outras espécies, ocorreu o deslocamento de A. mellifera para fontes de alimento adjacentes. Na área de estudo, foram observados indivíduos de A. mellifera visitando flores de Sinapis arvensis e inflorescências de Bidens pilosa e Sonchus oleraceus circundantes aos plantios logo após visitarem flores de C. moschata. Passarelli (2002) relatou a atração que a flora circundante ao cultivo de C. maxima exerce sobre A. mellifera. Esse autor verificou que as plantas das famílias Asteraceae e Fabaceae são especialmente importantes, pois afetam negativamente a polinização de C. maxima.

A ausência de frutificação em flores visitadas uma única vez por T. spinipes e a baixa frutificação encontrada no caso de T. hyalinata podem estar associadas a uma carga de pólen insuficiente nas operárias. Outro fator relevante é que devido ao seu pequeno tamanho corporal essas abelhas tocam os estames e estigmas apenas ocasionalmente e, ao se permitir a visita de apenas um indivíduo à flor, eliminou-se o comportamento de visita em "bando", padrão de forrageamento característico dessas espécies. Assim, Trigona spp. são consideradas polinizadoras ocasionais de C. moschata, pouco contribuindo para produção de frutos na referida cultura.

A polinização após uma única visita depende do número de flores estaminadas visitadas pelas abelhas antes de visitarem uma flor pistilada. Nesse estudo além da grande quantidade de recursos, 600 a 1000 covas de C. moschata, as flores estaminadas possuem pedúnculos longos e estão aproximadamente no mesmo nível da parte superior das folhas e as flores pistiladas possuem pedúnculos curtos e ficam sob as folhas. Isso aumenta as chances de que as abelhas visitem primeiramente as flores mais visíveis (estaminadas), facilitando a polinização cruzada (Free 1993). Assim, ao ocorrer uma única visita à flor pistilada, a probabilidade de os polinizadores conterem grãos de pólen aderidos a seus corpos e promoverem frutificação é maior. Ainda, a grande produção de flores durante várias semanas, observada em C. moschata, pode ser considerada uma estratégia que garante a atração de número elevado de polinizadores, o que aumenta a probabilidade de sucesso reprodutivo dessa espécie de planta.

Entre as diferentes comunidades de abelhas encontradas nas áreas de estudo considera-se que a visitação associada de M. quadrifasciata e B. morio possa promover produções ótimas de C. moschata. Melipona quadrifasciata é uma abelha abundante na região e pode ser criada racionalmente com obtenção de colônias por meio de divisões, tornando-a mais frequente no campo e favorecendo ainda mais os níveis de produção de C. moschata. Bombus morio é ativa durante todo o ano em regiões tropicais (Cortopassi-Laurino et al 2003), forrageando mesmo em temperaturas e luminosidade relativamente baixas, sofrendo menor influência da chuva e do vento que outras espécies visitantes das flores de C. moschata (Heinrich 2004) e tornando uma boa alternativa como polinizadora durante os meses de inverno. Desta forma, apenas o conjunto de espécies polinizadoras proporcionaria o completo serviço de polinização para C. moschata.

Para assegurar os serviços dessa associação de polinizadores com a produção de abobrinhas seria necessário ainda identificar práticas de manejo que minimizassem os impactos negativos sobre estes insetos, permitindo sua conservação e a manutenção da diversidade. Ainda seria necessária a conservação e restauração de áreas naturais necessárias para otimizar a atividade de polinização desses insetos em ecossistemas agrícolas. A existência de condições que propiciem o estabelecimento e a permanência de fauna de abelhas diversificada beneficiará não apenas a produção de abobrinha, como a produção de outras culturas que dependam da atividade de polinizadores para a produção de frutos e sementes.

Nosso estudo demonstra, portanto, a importância da fauna de abelhas nativas para a polinização de C. moschata. Os resultados levam a supor que a preservação de comunidades de abelhas nativas, em especial M. quadrifasciata e B. morio é necessária para assegurar a polinização de C. moschata.

Agradecimentos

Agradecemos aos proprietários dos plantios, pelo acesso à área experimental; aos professores Fernando A da Silveira (UFMG), Eduardo A B de Almeida (UFPR) e André Nemésio (UFMG) pela identificação das abelhas; à profª Milene F Vieira, Drª Darci de O Cruz e Ms Viviane C Pires pela leitura e sugestões ao manuscrito; ao Profº Simon L Elliot pela tradução do resumo; a Amanda Soares Miranda, Ana F B Rosa, Íris R Stanciola, Lila V Teixeira e Tatiana M Teixeira pela colaboração em campo; a Flávia M Coelho pelo auxílio na análise dos dados e à CAPES pela bolsa de mestrado concedida à primeira autora.

Received 11/IX/07.

Accepted 21/I/10.

Edited by Og de Souza - UFV

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Maio 2010
  • Data do Fascículo
    Abr 2010

Histórico

  • Aceito
    21 Jan 2010
  • Recebido
    11 Set 2007
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