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Biologia de Tetranychus mexicanus (McGregor) (Acari: Tetranychidae) em três espécies de Annonaceae

Biology of Tetranychus mexicanus (McGregor) (Acari: Tetranychidae) on Three Species of Annonaceae

Resumo

The mite Tetranychus mexicanus (McGregor) is considered a pest of a variety of plant species in the Americas. Although this mite apparently causes economic damage to Annonaceae, little is known about its biology. Here we studied the biology of T. mexicanus on soursop (Annona muricata), sweetsop (Annona squamosa) and araticum (Annona coriaceae). The first two species are the most important economical Annonaceae species in northeast Brazil; araticum is commonly found in the region, but not commercially explored. The mites were collected in the field from leaves of A. muricata and maintained in the laboratory for six months on detached leaves of A. muricata, A. squamosa and A. coriaceae, respectively, before observations started. Tetranychus mexicanus developed more slowly on A. squamosa than on the two other hosts, but oviposition was considerably lower on A. coriaceae. As indicated by the calculated life table parameters, biotic potential was higher on A. muricata than on the other hosts. Despite the observed differences in the T. mexicanus biology on the different evaluated hosts, development and reproduction were satisfactory in all of the hosts used.

Mite; tetranychid; Annona; life table


Mite; tetranychid; Annona; life table

ECOLOGY, BEHAVIOR AND BIONOMICS

Biologia de Tetranychus mexicanus (McGregor) (Acari: Tetranychidae) em três espécies de Annonaceae

Biology of Tetranychus mexicanus (McGregor) (Acari: Tetranychidae) on Three Species of Annonaceae

Josilene M de SousaI; Manoel G C Gondim JrI; Antônio C LofegoII

IDepto de Agronomia, Área Fitossanidade, Univ Federal Rural de Pernambuco, Av Dom Manoel de Medeiros s/n, Dois Irmãos, 52171-900 Recife, PE, Brasil; mguedes@depa.ufrpe.br

IIDepto de Zoologia e Botânica, Univ Estadual Paulista, Rua Cristovão Colombo 2265, 15054-000 São José do Rio Preto, SP, Brasil; aclofego@ig.com.br

ABSTRACT

The mite Tetranychus mexicanus (McGregor) is considered a pest of a variety of plant species in the Americas. Although this mite apparently causes economic damage to Annonaceae, little is known about its biology. Here we studied the biology of T. mexicanus on soursop (Annona muricata), sweetsop (Annona squamosa) and araticum (Annona coriaceae). The first two species are the most important economical Annonaceae species in northeast Brazil; araticum is commonly found in the region, but not commercially explored. The mites were collected in the field from leaves of A. muricata and maintained in the laboratory for six months on detached leaves of A. muricata, A. squamosa and A. coriaceae, respectively, before observations started. Tetranychus mexicanus developed more slowly on A. squamosa than on the two other hosts, but oviposition was considerably lower on A. coriaceae. As indicated by the calculated life table parameters, biotic potential was higher on A. muricata than on the other hosts. Despite the observed differences in the T. mexicanus biology on the different evaluated hosts, development and reproduction were satisfactory in all of the hosts used.

Key words: Mite, tetranychid, Annona, life table

O ácaro Tetranychus mexicanus (McGregor) tem sido relatado apenas nas Américas atacando diversas espécies de plantas, incluindo as anonáceas Annona coriaceae (araticum), A. crassiflora, A. muricata (graviola), A. purpurea, A. reticulata e A. squamosa (pinha) (Bolland et al 1998). No Brasil, além de A. muricata e A. coriaceae, o ácaro é relatado em outros 15 hospedeiros (Flechtmann 1967, Paschoal 1968, Paschoal & Reis 1968, Bolland et al 1998, Azevedo & Vieira 2002, Moraes & Flechtmann 2008).

As poucas informações na literatura sobre aspectos biológicos de T. mexicanus foram obtidas por Paschoal (1968) em Citrus aurantifolia (limão galego). Estudos realizados em Pernambuco mostram a ocorrência frequente de T. mexicanus em anonáceas, sugerindo que esse ácaro possa causar dano econômico a esse grupo de plantas (Sousa 2008).

Neste trabalho, estudou-se o desenvolvimento, reprodução e preferência alimentar e de oviposição de T. mexicanus em algumas espécies de anonáceas de importância para a Região Nordeste do Brasil, com o objetivo de avaliar em qual dessas culturas esse tetraniquídeo apresenta maior potencial de se tornar praga.

Material e Métodos

As observações foram realizadas em condições controladas (27 ± 1ºC, 75% ± 10% UR e fotofase 12h).

Obtenção e criação de T. mexicanus. Os ácaros foram obtidos de frutos de graviola no município de Água Preta, PE (08º42'25"S, 35º31'51"W), em outubro de 2005. Fêmeas e machos adultos foram transferidos para unidades de criação, cada uma constituída por uma folha de uma anonácea colocada com a face ventral para cima, sobre um disco de espuma de polietileno contida em uma placa de Petri; a espuma era mantida permanentemente úmida pela adição diária de água destilada; as margens de cada folha foram cobertas com uma faixa de algodão hidrófi lo para manter a turgidez da mesma. Foram utilizadas folhas de A. muricata, A. squamosa e A. coriaceae. Semanalmente, os ácaros foram transferidos para novas unidades, sendo os ácaros assim mantidos durante seis meses, antes do início dos experimentos.

Avaliação do potencial biótico. Trinta fêmeas adultas provenientes de cada unidade de criação foram transferidas para novas unidades dos respectivos hospedeiros, sendo quatro repetições para cada hospedeiro. Vinte e quatro horas mais tarde, estas foram removidas. A partir de então, os ovos depositados foram observados a cada 12h para determinação da viabilidade e duração da fase de ovo. Após a eclosão, as larvas foram individualizadas em unidades experimentais cada uma constituída de um quadrado (5 x 5 cm) de folha da mesma espécie vegetal em que estavam sendo mantidos seus ancestrais, colocado sobre um pedaço de espuma de polietileno em uma placa de Petri (16 cm de diâmetro). Os ácaros continuaram sendo observados a cada 12h para determinação da sobrevivência e duração dos estágios de larva, protoninfa e deutoninfa. Após a emergência, os machos permaneceram isolados, mas as fêmeas foram acasaladas com machos da criação de manutenção, sendo que os machos mortos eram substituídos por outros da mesma fonte, até a morte da fêmea. A sobrevivência e a oviposição das fêmeas foram observadas diariamente. A geração subsequente de cada fêmea foi criada separadamente até a fase adulta para determinação da razão sexual.

A variabilidade para o cálculo da sobrevivência dos estágios imaturos foi calculada utilizando-se a sobrevivência total de cada estágio dos indivíduos em cada uma das quatro arenas separadamente. Os experimentos foram conduzidos assumindo delineamento inteiramente casualizado, com três tratamentos, cada um correspondendo a uma espécie de anonácea. Os dados foram submetidos à análise de variância, sendo as médias comparadas pelo teste de Tukey a 5% de significância, utilizando-se do programa SAS (SAS Institute 1999-2001).

Para a elaboração da tabela de vida de fertilidade, os parâmetros foram calculados baseando-se em Birch (1948). Os dados foram processados via SAS (SAS Institute 1999-2001), adaptando o modelo descrito por Maia et al (2000), o qual utiliza o método "Jackknife" para estimar intervalos de confiança das médias dos tratamentos e permite comparações entre pares de tratamentos empregando-se o teste t.

Avaliação da preferência alimentar. Teste em branco. Foram montadas arenas contendo dois discos de folhas de uma mesma espécie vegetal (graviola, pinha ou araticum), de 7 cm de diâmetro, unidos por uma lamínula quadrada de 18 mm de lado. Todo o conjunto foi colocado sobre um disco de papel de filtro e este sobre um disco de polietileno no interior de uma placa de Petri de 16 cm de diâmetro; a espuma foi mantida permanentemente úmida pela adição diária de água destilada; os bordos dos discos de folha foram cobertos com algodão hidrófilo para evitar a fuga dos ácaros. Dez unidades foram montadas para cada espécie de anonácea estudada. Dez fêmeas de T. mexicanus tomadas da unidade de criação correspondente à mesma espécie vegetal foram liberadas na lamínula. Após períodos de 15 min, 30 min, 1h, 2h, 4h, 8h, 24h e 48h, contou-se o número de ácaros sobre cada um dos discos. Nas duas últimas avaliações, contou-se também o número de ovos de T. mexicanus em cada disco.

Avaliação da preferência alimentar. Teste de livre escolha. O mesmo procedimento foi utilizado, exceto que neste caso cada conjunto era constituído por hospedeiros diferentes, considerando-se todas as possíveis combinações entre eles. Para cada combinação, conduziram-se testes separados com ácaros provenientes de cada uma das espécies vegetais consideradas. Cada teste foi conduzido em 10 repetições para cada combinação de espécies vegetais e procedência dos ácaros. Os dados foram analisados utilizando-se o programa computacional SAS (SAS Institute 1999-2001), aplicando-se o teste de χ2 a 5% de probabilidade.

Resultados e Discussão

Potencial biótico. Em nenhuma das espécies vegetais as durações dos distintos estágios imaturos foram consistentemente maiores ou menores. No entanto, considerando-se todos os estágios imaturos conjuntamente (ovo-adulto), o período de desenvolvimento foi maior em pinha e menor em graviola e araticum (F2,149 = 43,20; P < 0,0001) (Tabela 1). O mesmo foi observado para a sobrevivência, sendo a fase imatura como um todo (ovo-adulto) (F2,194 = 9,05; P < 0,0002), menor em pinha e maior para graviola e araticum.

O período de oviposição foi maior (Tabela 2) em pinha que em araticum, enquanto a duração desse período em graviola não diferiu daquele nas outras espécies (F2,99= 3,28; P < 0,0419). Contudo, não houve diferença na longevidade de fêmea (F2,99 = 2,97; P < 0,0559). O número total de ovos por fêmea foi diferente entre os três tratamentos, sendo maior em graviola e menor em araticum (F2,99 = 27,27; P < 0,0001). Já a longevidade do macho foi maior em graviola que em araticum, enquanto a longevidade em pinha não diferiu daquela nas outras espécies (F2,31 = 6,14; P < 0,0057). Como esperado, nenhuma diferença foi observada em relação à razão sexual.

A duração média de uma geração foi menor em araticum que nos outros dois hospedeiros, que não diferiram entre si. Para os parâmetros relacionados ao aumento populacional (R0,rm, e λ ), os valores foram sempre maiores em graviola e menores em pinha, exceto em relação a R0, que não diferiu estatisticamente entre pinha e araticum (Tabela 3).

Preferência alimentar. Nos testes em branco realizados com as três espécies vegetais, não foram observadas diferenças estatísticas em relação ao número de fêmeas adultas e em relação ao número de ovos postos por estas entre os dois lados da arena (P > 0,05). Nos testes de livre escolha, o ácaro quase sempre preferiu se alimentar e ovipositar na anonácea em que havia sido criado durante os seis últimos meses (Figs 1 e 2). As únicas exceções referiram-se a preferência alimentar e oviposição a 24h e 48h, quando o ácaro foi criado em A. muricata e submetido a esta e a A. coriaceae, e a oviposição do ácaro em 48h quando criado em A. muricata e submetido a esta e a A. squamosa.



Entre as anonáceas estudadas, graviola foi a planta em que T. mexicanus apresentou melhores resultados quanto ao desenvolvimento e reprodução; porém, quando o tetraniquídeo foi criado durante várias gerações nas outras anonáceas, os ácaros frequentemente preferiram se alimentar e ovipositar na planta em que foram criados anteriormente. Esse resultado concorda com o princípio de condicionamento pré-imaginal demonstrado inicialmente por Hopkins para Dendroctonus monticolae Hopk. (Coleoptera: Scolytidae) (Barron 2001) e também verificado para outros insetos (Barron 1999), e ainda não demonstrado para Tetranychidae. Embora tenham sido encontradas diferenças signifi cativas no desenvolvimento e reprodução de T. mexicanus em relação aos diferentes hospedeiros, as diferenças foram pequenas, observando-se os parâmetros isoladamente. Contudo, essas pequenas diferenças contrastam com o observado nos parâmetros da tabela de vida de fertilidade, como indicado pelo R0 que foi muito maior para graviola.

No Nordeste do Brasil, as anonácaes são produzidas principalmente por pequenos e médios agricultores, sendo as pragas controladas usualmente por métodos não químicos, como ensacamento de frutos e destruição de frutos atacados (Araújo 2003). Essas práticas de controle têm, aparentemente, possibilitado uma condição de equilíbrio na fauna de ácaros nas anonáceas, sobretudo pelo uso reduzido de inseticidas e acaricidas. Contudo, o uso intensivo desses produtos pode causar surtos de ácaros, e o desequilíbrio pode ser promovido pela eliminação de ácaros predadores. Nessa situação, é possível que T. mexicanus atinja o nível de dano econômico nas anonáceas estudadas, que parecem ser hospedeiros adequados ao seu desenvolvimento e reprodução.

Os resultados obtidos no presente trabalho, aparentemente indicam ser a graviola o melhor hospedeiro para T. mexicanus. Contudo, a população utilizada no estudo foi coletada originalmente em campo de graviola. É possível que a criação do ácaro por seis meses em outras plantas tenha permitido apenas uma adaptação parcial a estas, e que a população estudada tenha passado por uma seleção mais longa no decorrer do tempo em campo, resultando em algum tipo de adaptação relacionada a mudanças genéticas que não puderam ser revertidas totalmente durante o período de seis meses em que os ácaros ficaram expostos aos novos hospedeiros. Segundo Sousa (2008), T. mexicanus é frequentemente encontrada em Pernambuco em Annonaceae, mas apenas ocasionalmente causa injúrias à gravioleira, sendo frequentemente encontrada em baixas populações nas folhas e frutos. Segundo o autor, isso provavelmente se deve ao fato de que T. mexicanus esteja sob eficiente controle biológico natural, uma vez que os produtores, normalmente, conduzem a cultura sem agrotóxicos.

Os valores de R0 (85,45) e rm (0,24) para T. mexicanus em graviola assemelham-se aos obtidos para outras espécies de ácaros considerados pragas com elevados potenciais bióticos, como Tetranychus urticae Koch, Tetranychus desertorum Banks, Tetranychus neocaledonicus André e Tetranychus pacificus McGregor (Sabelis 1985). Portanto, com parâmetros de aumento populacional, como os verificados neste trabalho, é provável que em situações de desequilíbrio na cultura de graviola, sobretudo causado pela eliminação dos predadores, T. mexicanus venha a causar dano econômico nessa cultura.

Agradecimentos

A Gilberto J de Moraes, Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Universidade de São Paulo, pelas sugestões apresentadas na elaboração deste manuscrito. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela concessão de bolsa de doutorado à primeira autora, possibilitando a realização deste trabalho. Ao CNPq pela bolsa de Produtividade em pesquisa ao segundo autor.

Received 30/XII/08.

Accepted 06/II/10.

Edited by Gilberto J de Moraes - ESALQ/USP

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2010
  • Data do Fascículo
    Jun 2010

Histórico

  • Aceito
    06 Fev 2010
  • Recebido
    30 Dez 2008
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