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A Teoria Crítica entre Marx e Honneth

Critical Theory between Marx and Honneth

Teoría Crítica entre Marx y Honneth

Resumo:

Neste artigo considerarei as principais objeções marxistas ao modelo de Honneth para uma Teoria Crítica da sociedade e também as objeções centrais de Honneth aos modelos inspirados em Marx. Depois tentarei esboçar uma reaproximação entre ambas posições ao mostrar como o conceito normativo de reconhecimento de Honneth não é oposto a argumentos funcionalistas, e sim que ele contém uma dimensão socioteórica: a ideia de que a reprodução social e a evolução social revolvem ao redor de lutas pela interpretação de normas sociais centrais. Ao iluminar o lado socioteórico do reconhecimento, é possível esboçar um modelo de Teoria Crítica da sociedade que, de fato, corresponda às características descritivas e normativa delineadas pelo próprio Marx. No entanto, o preço desta reaproximação para a Teoria Crítica de Honneth é uma ênfase maior na divisão do trabalho como o mecanismo central da reprodução social.

Palavras-chave:
Marx; Honneth; Teoria Crítica; Reconhecimento; Funcionalismo; Trabalho social; Divisão do trabalho

Abstract:

In this paper, I consider the main Marxist objections to Honneth's model of critical social theory, and Honneth's key objections to Marx-inspired models. I then seek to outline a rapprochement between the two positions, by showing how Honneth's normative concept of recognition is not antithetical to functionalist arguments, but in fact contains a social-theoretical dimension, the idea that social reproduction and social evolution revolve around struggles around the interpretation of core societal norms. By highlighting the social theoretical side of recognition, one can outline a model of critical social theory that in fact corresponds to the descriptive and normative features outlined by Marx himself. However, the price of this rapprochement for Honnethian critical theory is a greater emphasis on the division of labour as the central mechanism of social reproduction.

Keywords:
Marx; Honneth; Critical theory; Recognition; Functionalism; Social labour; Division of labour

Resumen:

En este artículo consideraré las principales objeciones marxistas al modelo de Honneth para una Teoría Crítica de la sociedad y también las objeciones centrales de Honneth a los modelos inspirados en Marx. Después intentaré esbozar una aproximación entre ambas posiciones al mostrar cómo el concepto normativo de reconocimiento de Honneth no es opuesto a argumentos funcionalistas, sino que contiene una dimensión socio-teórica: la idea de que la reproducción social y la evolución social giran alrededor de luchas por la interpretación de normas sociales centrales. Al iluminar el lado socio-teórico del reconocimiento, es posible esbozar un modelo de Teoría Crítica de la sociedad que, de hecho, corresponda a las características descriptivas y normativas delineadas por el propio Marx. Sin embargo, el precio de este acercamiento a la Teoría Crítica de Honneth es un énfasis mayor en la división del trabajo como el mecanismo central de la reproducción social.

Palabras clave:
Marx; Honneth; Teoría Crítica; Reconocimiento; Funcionalismo; Trabajo social; División del trabajo

Introdução

Este artigo investiga a possibilidade de encontrar algum terreno comum entre uma perspectiva marxista e uma perspectiva honnethiana em um projeto contemporâneo de Teoria Crítica. À primeira vista, a teoria social de Honneth parece ser consideravelmente distante de projetos críticos inclinados a argumentos marxistas. De fato, a teoria do reconhecimento de Honneth é fundada sobre, e de fato cresce a partir de, uma rejeição explícita de algumas das premissas chave de Marx (Honneth, 1995aHONNETH, Axel. The struggle for recognition. The moral grammar of social conflict. Cambridge: Polity, 1995a.; 1995bHONNETH, Axel. Domination and moral struggle. The philosophical heritage of Marxism revisited. In: Axel Honneth. The fragmented world of the social: essays in social and political philosophy. New York: State University of New York Press, 1995b. p. 3-14.; 1995cHONNETH, Axel. Work and instrumental action: on the normative basis of critical theory. In: Axel Honneth. The fragmented world of the social: essays in social and political philosophy. New York: State University of New York Press, 1995c. p. 15-49.; 2007bHONNETH, Axel. The social dynamics of disrespect: on the location of critical theory today. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity, 2007b. p. 63-79.). Em sua obra mais recente, Honneth reiterou e desenvolveu ainda mais sua crítica aos métodos e argumentos marxistas (Honneth, 2014HONNETH, Axel. The right of freedom. The social foundations of democratic life. Oxford: Polity, 2014.; 2017aHONNETH, Axel. The idea of socialism. A renewal. Oxford: Polity, 2017a.; 2017bHONNETH, Axel. Hegel and Marx: a reassessment after one century. In: Banu Bargu; Chiara Bottici (eds.). Feminism, capitalism and critique. New York: Columbia Universty Press, 2017b.). Por outro lado, a maioria dos autores contemporâneos que fazem uso positivo de argumentos marxistas são desdenhosos do modelo de Honneth. A tarefa de encontrar algum terreno comum “entre Marx e Honneth” para um projeto de Teoria Crítica contemporânea, portanto, parece condenado desde o começo.

As coisas são, contudo, mais complicadas do que parecem. Existiram, a bem da verdade, algumas poucas propostas importantes de filosofia social e política, principalmente vindas da França, que ambicionam perseguir o programa da Teoria Crítica e, com este propósito, combinaram de modos diferentes referências positivas simultâneas a Honneth e a Marx. Este artigo inspira-se nestas propostas e tenta expandi-las a fim de mostrar como tropos marxistas e honnethianos podem ser combinados para um programa efetivo de Teoria Crítica contemporânea.

A fim de explorar a plausibilidade e a forma potencial de uma tal integração, começo por brevemente estabelecer os pontos em questão que parecem fazer esta integração impossível. Eu lido com os argumentos marxistas contra Honneth na primeira seção e com a rejeição de Honneth à linha marxista clássica na segunda seção.

A terceira seção começa sumarizando o modo como os novos projetos de Teoria Crítica mencionados há pouco se valem de ambas referências. Nestes projetos, a teoria do reconhecimento é considerada como provedora de ferramentas conceituais, notavelmente uma gramática normativa, que suplementam análises funcionalistas e explicações sistêmicas com considerações da dimensão subjetiva da vida social. Estas dimensões subjetivas são tidas como necessárias para uma análise crítica completa da ordem social. Eu tento mostrar, contudo, que a contribuição da teoria do reconhecimento vai além da gramática usada para descrever o impacto subjetivo de desordens sociais ou as motivações para a luta social. A teoria do reconhecimento também pode oferecer uma perspectiva inovadora para a análise de desenvolvimentos econômicos e sociais se nós iluminarmos o papel funcional que a “luta por reconhecimento” de Honneth desempenha nesses desenvolvimentos. Um casamento entre argumentos marxistas e honnethianos, então, se torna possível e até mesmo útil, se se puder mostrar que a teoria do reconhecimento, longe de reduzir a Teoria Crítica da Sociedade a considerações morais ou psicológicas, de fato pode caber dentro de um esquema marxista amplamente construído e, aliás, pode vantajosamente enriquecer aquele esquema.

Objeções marxistas ao modelo de reconhecimento de Honneth

Dois artigos em particular expressaram objeções explícitas ao modelo de reconhecimento de Honneth a partir de uma perspectiva marxista (Dufour e Pineault, 2009; Borman, 2009BORMAN, David A. Labour, exchange and recognition: Marx contra Honneth. Philosophy & Social Criticism, v. 35, n. 8, p. 935-959, 2009 <10.1177/0191453709340637>.
https://doi.org/10.1177/0191453709340637...
). Dufour e Pineault, em particular, articulam uma série de substantivos pontos críticos no espírito da crítica seminal de Moishe Postone à primeira geração e à versão habermasiana da Teoria Crítica (Postone, 1993POSTONE, Moishe. Time, labor and social domination: a reinterpretation of Marx's critical theory. Cambridge: Cambridge University Press, 1993.). Sua intervenção provê uma linha útil para identificar algumas das principais preocupações que uma teoria social crítica inspirada em Marx poderia levantar contra o modelo de Honneth.

O maior ponto sensível obviamente se relaciona ao lugar da dimensão econômica no modelo teórico crítico. A este respeito, o debate “político-filosófico” entre Honneth e Fraser já havia tocado no que seria a principal preocupação marxista quanto ao modelo de reconhecimento de Honneth (Fraser e Honneth, 2003FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or recognition? A political-philosophical exchange. London: Verso, 2003.). Dado o papel fundamental desempenhado pelas relações de produção e pela organização da produção nos diagnósticos críticos de Marx, a percepção de que Honneth opera uma “redução culturalista” do fator econômico e parece fazê-lo dependente da ordem normativa definitivamente condena seu modelo aos olhos marxistas. Este problema básico está no coração de todas as outras críticas.

De uma perspectiva marxista clássica, a chave para entender a sociedade moderna (capitalista) como uma formação patológica começa com a análise da estrutura fundamental no núcleo daquela sociedade: o capital como uma relação social desigual através da qual a força de trabalho da maioria lhe é arrancada e explorada por uma minoria com a finalidade de valorização. Todas as descrições socioteóricas, diagnósticos críticos e explorações de uma possível emancipação têm de ser articulados com referência a esta hipótese fundamental. A relação salarial, como uma relação que é inerentemente desigual e injusta – uma relação de exploração e dominação – tem de ser a chave de uma Teoria Crítica da sociedade contemporânea. Nas palavras de Dufour e Pineault (2009, p. 89):

a Teoria Crítica pode derivar desta teoria um modelo geral de polarização social que contrasta com uma análise em termos de desprezo social e denegação de reconhecimento. Este modelo entende relações de dominação como formas de subjetivação ligadas à acumulação capitalista. Estas relações não estão à margem do mundo moderno, mas constituem sua matriz mesma.

O conceito de “subjetivação” é central aqui, pois ele substitui o conceito de reconhecimento. Ele aponta para a ideia de que o capital, como uma formação social total, estrutura o contexto social de uma tal forma que ele predetermina as posições subjetivas que podem ser tomadas pelos indivíduos. Esta linha também foi advogada de forma particularmente aguda e expansiva por Michael Thompson em publicações recentes (Thompson, 2014THOMPSON, Michael J. Axel Honneth and the neo-idealist turn in contemporary critical theory. Philosophy and Social Criticism, v. 40, n. 8, p. 779-797, 2014.; 2016THOMPSON, Michael J. The Domestication of Critical Theory. London: Palgrave, 2016.). Naquele modelo é correto falar de relações de reconhecimento como constitutivas da sociedade moderna, mas apenas se se acrescentar que estas relações são epifenômenos subjetivos baseados em relações desiguais de dominação, numa “dialética inigualitária” que é internalizada pelos atores sociais. Reconhecimento aqui significa um processo de socialização que assegura a ordem de dominação.

Um entendimento diferente do reconhecimento é, porém, possível e também provê uma diferente posição estratégica de crítica sobre a sociedade capitalista. Como Dufour e Pineault argumentam, a referência hegeliana adequada para isso não é a descrição irônica do reconhecimento nos textos de Jena, que teria sido desconhecida para Marx, na qual o amor basicamente forma o exemplo paradigmático e que conduz a um esquema do reconhecimento como fundamentalmente igualitário e recíproco. Antes, a referência chave a Hegel é a Fenomenologia do espírito, um texto que Marx comentou longamente e que informou seu pensamento até O capital. No segundo modelo do reconhecimento, como é tão bem sabido, Hegel já havia demonstrado que é através do trabalho que a “consciência servil” é apta a educar a si mesma e superar a dominação do mestre (Dufour e Pineault, 2009, p. 86-93). O significado alternativo de reconhecimento aqui tem uma dimensão cognitiva central. Ele aponta para a compreensão contrafactual, de parte dos dominados, através de sua experiência na vida social, da interdependência que os liga ao senhor – e consequentemente da dominação e alienação reais a que a ordem presente os submete. Deste duplo ponto de vista (reconhecimento como socialização alienante e reconhecimento crítico como visão contrafactual da essência real da vida social), o conceito antropológico de reconhecimento de Honneth, essencialmente mútuo e igualitário, parece superficial. Ele falha em se conectar significativamente ao contexto histórico da sociedade moderna, na qual formas de reconhecimento são sempre já predeterminadas por estruturas sociais assimétricas e polarizadas nas quais elas são instanciadas.

A falha em ver a sociedade capitalista como uma formação social organizada ao redor da dominação do trabalho e a falha em ver relações de reconhecimento nas sociedades modernas como intrinsecamente desiguais são dois aspectos da mesma cegueira teórica. Esta cegueira socioteórica produz descrições e críticas que capturam apenas fenômenos superficiais, que são incapazes de alcançar as reais causas de crises e patologias, que identificam erroneamente seus efeitos mais sérios e negligenciam soluções políticas que poderiam efetivamente abordar a injustiça real e o sofrimento social. Em outras palavras, ela leva a uma Teoria Crítica truncada, grosseira ou “domesticada” (Thompson, 2016THOMPSON, Michael J. The Domestication of Critical Theory. London: Palgrave, 2016.).

No nível categorial, o problema da injustiça econômica é reduzido ao problema da redistribuição, como claramente aparece no debate entre Fraser e Honneth. Desigualdades redistributivas deveriam ser vistas como tendo sua premissa em desigualdades de apropriação (do trabalho social) e em assimetrias na organização da produção. Análises de injustiça que negligenciam a organização real da produção e focam, ao invés disso, no desequilíbrio de poder entre grupos de status simplesmente refletem na teoria o movimento real da expansão capitalista, que vê o impulso à constante valorização através da exploração de força de trabalho e de recursos naturais ser exportada para as margens do ocidente.

Em segundo lugar, na interseção entre teoria social e história, Honneth entende a modernidade como conduzindo a novos princípios normativos gradualmente alargados em seu bojo e enriquecidos em seu conteúdo por meio de lutas por reconhecimento, levando, então, a uma forma de “progresso moral” (Fraser e Honneth, 2003FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or recognition? A political-philosophical exchange. London: Verso, 2003., p. 182-189). Tal visão otimista da modernidade negligencia as tensões e contradições constituídas na lógica capitalista. A análise das evoluções modernas deveria focar em momentos de crise e interpretá-las como adaptações a imperativos capitalistas que apenas evitam uma forma de desequilíbrio sistêmico para criar uma nova. Potenciais normativos deveriam ser aceitos, mas em muitos casos novos direitos e liberdades são insuficientes para gerar uma avaliação normativa completa: estes direitos têm sido consistentemente amarrados a relações de propriedade, que são assimetricamente distribuídas.

Em terceiro lugar, o foco de Honneth nas lutas por reconhecimento como os motores do progresso histórico parecem superficiais quando comparado a análises que focam a organização da estrutura econômica. As transformações históricas das sociedades modernas só podem ser apropriadamente descritas em termos de conflitos entre grupos se estes últimos forem descritos como o produto da polarização social produzida pela estrutura capitalista. Uma sociologia inspirada por Marx pode mostrar que esta polarização é, de fato, ao mesmo tempo o produto e um dos motores da acumulação capitalista. Não se pode entender apropriadamente a nova constelação surgida após a morte do compromisso fordista sem considerá-la a resposta à crise no regime de acumulação e, assim, como um novo estágio na relação entre capital e trabalho, onde o primeiro, na forma do acionista ou do gerente corporativo, novamente leva vantagem. Honneth implicitamente se apoia nesta interpretação do neoliberalismo em sua própria análise das patologias socais, mas as dimensões diagnóstica e explicativa de suas considerações não parecem ser internamente conectadas (Honneth, 2004HONNETH, Axel. Organised self-realisation. Some paradoxes of individualization. European Journal of Social Theory, v. 7, n. 4, p. 463-478, 2004 <10.1177/1368431004046703>.
https://doi.org/10.1177/1368431004046703...
; Hartmann e Honneth, 2006HARTMANN, Martin; HONNETH, Axel. Paradoxes of capitalism. Constellations, v. 13, n. 1, p. 41-58, 2006 <10.1111/j.1351-0487.2006.00439.x>.
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).

Uma crítica similar pode ser expressa quanto à interpretação do Estado de bem-estar social (Hartmann e Honneth, 2006HARTMANN, Martin; HONNETH, Axel. Paradoxes of capitalism. Constellations, v. 13, n. 1, p. 41-58, 2006 <10.1111/j.1351-0487.2006.00439.x>.
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), já que Honneth negligencia as contradições que infestam a formação capitalista naquele período. Ele admite ambiguidades na implementação de princípios normativos centrais, mas em geral o período do welfare state é visto como uma expansão do reconhecimento. Mas a análise de tensões estruturais internas ao processo de acumulação capitalista naquele período não é esgotada pela ideia de uma aplicação incompleta ou ideológica do princípio do mérito (Hartmann e Honneth, 2006HARTMANN, Martin; HONNETH, Axel. Paradoxes of capitalism. Constellations, v. 13, n. 1, p. 41-58, 2006 <10.1111/j.1351-0487.2006.00439.x>.
https://doi.org/10.1111/j.1351-0487.2006...
).

Finalmente, somente uma análise com premissas na lógica da acumulação capitalista pode fazer justiça ao alcance global e à dimensão internacional da injustiça e das patologias sociais (Harvey, 2007HARVEY, David. The limits to capital. London: Verso, 2007.). É essencial olhar por cima das fronteiras das nações desenvolvidas para encontrar as formas mais sérias de injustiça e sofrimento social contemporâneas. Em nações desenvolvidas, o foco na realidade da economia recoloca o olhar crítico sobre fenômenos como pobreza e exclusão como resultado de desemprego ou de patologias do trabalho, para os empregados. Estas formas de sofrimento socialmente causado são bem documentadas na maioria dos países desenvolvidos e, mesmo assim, são frequentemente negligenciadas por análises sociais críticas. Tipicamente, em seus textos do final dos anos 1990 estudando os “paradoxos do capitalismo”, Honneth os menciona apenas de passagem, para focar em outras formas, psicológicas, de mal-estar. Levando em consideração textos mais recentes sobre o capitalismo (Honneth, 2014HONNETH, Axel. The right of freedom. The social foundations of democratic life. Oxford: Polity, 2014.; 2017aHONNETH, Axel. The idea of socialism. A renewal. Oxford: Polity, 2017a.), criticas marxistas podem conceder que ele expande o bojo das patologias causadas pelo capitalismo moderno, mas tipicamente restringe seu foco para nações da Europa Ocidental, precisamente porque seu modelo não pode fazer uma ligação sistemática entre a organização da produção nas nações ocidentais e aquilo que ocorre em outras partes do mundo. E enquanto aquelas partes criticamente descritivas de seus textos recentes identificam mais consequências nefastas da organização capitalista, porque ele se recusa a analisá-las do ponto de vista desta última, as causas reais e os mecanismos que levam a estas patologias permanecem no escuro. Para uma Teoria Crítica da sociedade, esta é uma falha grave.

Em resumo, para aqueles que querem seguir o projeto de uma Teoria Crítica com referência direta ao esquema de Marx, o modelo de Honneth, baseado na conceitualização do reconhecimento, sofre de uma fraqueza não redimível no nível descritivo, uma fraqueza enraizada em sua escolha por abandonar o foco político-econômico. Para teóricos críticos inspirados em Marx, somente tal foco provê ferramentas conceituais suficientemente robustas e que permitam abertura a diferentes análises que façam justiça à complexidade e à largura dos fenômenos sociais causados pelas transformações capitalistas.

No entanto, assim como o modo de Honneth conduzir uma Teoria Crítica imediatamente parece aos marxistas fraco e desconectado dos aspectos centrais da modernidade capitalista, também o modo marxista parece a Honneth cheio de falhas conceituais e normativas. Vejamos quais são as mais sérias destas falhas, segundo Honneth, antes de nos perguntarmos se qualquer mediação realista entre ambas perspectivas pode ser alcançada.

Objeções honnethianas a uma perspectiva marxista na Teoria Crítica

De uma perspectiva honnethiana, o problema mais imediato com qualquer perspectiva que mantenha uma referência não-mediada a Marx é sua falta de plausibilidade descritiva, empírica. Isso se deve ao fato de que este tipo de perspectiva tende a negligenciar o crescimento em complexidade nas sociedades modernas, como os desenvolvimentos relativamente autônomos de esferas institucionais separadas tende a ser hipostasiado sob a lógica singular do trabalho abstrato. Em particular, o mercado tende a ser discutido em termos não realistas, como se sociedades modernas pudessem de algum jeito coordenar ações econômicas sem usar mecanismos de mercado.

Naquele que é para ele um exemplo particularmente revelador, Honneth (2008)HONNETH, Axel. Reification. A new look at an old idea. Oxford: Oxford University Press, 2008. mostra como a aplicação que Lukács faz do conceito de reificação a todas as áreas da sociedade moderna sofre de uma falta de perspicácia crítica e da implausibilidade da tese que a sustenta, a saber, a ideia de que todos os aspectos da experiência social e todas as esferas sociais estão sob a influência de uma lógica reificante proveniente da abstração capitalista do trabalho. Esta tendência a ultrapassar os limites nas descrições sociológicas e psicológicas e a sacrificar a perspicácia crítica é, para Honneth, típica da primeira geração da Teoria Crítica, precisamente por causa de confiança inquestionada em um esquema analítico marxista clássico (Honneth, 1993HONNETH, Axel. Max Horkheimer and the sociological deficit of critical theory. In: Seyla Benhabib; Wolfgang Bonss; John McCole (orgs.). On Max Horkheimer: new perspectives. Cambridge: MIT Press, 1993. p. 187-214.; 1995dHONNETH, Axel. Critical theory. In: Axel Honneth. The fragmented world of the social: essays in social and political philosophy. New York: State University of New York Press, 1995d. p. 61-91.).

Ligada a isso está a incapacidade de muitas críticas sociais inspiradas em Marx em admitir seriamente os avanços normativos da modernidade. Do ponto de vista de Honneth, por mais crítico que se deva ser em relação a tendências sociais e políticas específicas, é impossível negar que novos avanços normativos são feitos na história moderna, os quais as forças de dominação podem apenas contornar através de justificações ideológicas que não podem evitar contestação. Muitas das críticas ao “progresso moral” se apoiam em uma confusão entre os níveis de análise, entre o normativo e o empírico. A ideia de “progresso moral” deve ser entendida de maneira hegeliana, não como uma descrição generalizada de toda a história moderna, mas apontando para potenciais normativos que são gradualmente destravados e se colocam à disposição de grupos buscando justiça.

Estas diferenças na visão da sociedade moderna escondem outras sérias preocupações sobre as ambiguidades categoriais e normativas implicadas em muitas referências a Marx. Estas ambiguidades têm de ser corrigidas se se quiser seriamente tentar manter o programa clássico da Teoria Crítica (Schmidt am Busch, 2009SCHMIDT AM BUSCH, Hans-Christoph. Can the goals of critical theory be achieved by the theory of recognition? In: Hans-Christoph Schmidt am Busch; Christopher F. Zurn (orgs.). The philosophy of recognition. Historical and philosophical perspectives. Lanham: Lexington Books, 2009. p. 257-283.).

O problema categorial chave diz respeito ao papel explicativo central assegurado ao trabalho social (Honneth, 1995bHONNETH, Axel. Domination and moral struggle. The philosophical heritage of Marxism revisited. In: Axel Honneth. The fragmented world of the social: essays in social and political philosophy. New York: State University of New York Press, 1995b. p. 3-14.; 1995cHONNETH, Axel. Work and instrumental action: on the normative basis of critical theory. In: Axel Honneth. The fragmented world of the social: essays in social and political philosophy. New York: State University of New York Press, 1995c. p. 15-49.; 2007bHONNETH, Axel. The social dynamics of disrespect: on the location of critical theory today. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity, 2007b. p. 63-79.; 2017aHONNETH, Axel. The idea of socialism. A renewal. Oxford: Polity, 2017a.). Para Honneth, é mesmo o princípio metodológico do próprio Marx – identificar a possibilidade da emancipação nos pressupostos da vida social – que joga dúvidas sobre a adequação do conceito de trabalho social, pois ele falha em fornecer a ponte conceitual requerida entre a descrição da organização social e a teoria da emancipação. Um número de dificuldades bem conhecidas no estudo de Marx se relaciona a isso. Primeiro, há o problema clássico de juntar duas teorias da transformação social, uma a explicando como resultando da contradição sistêmica inerente a formações capitalistas, outra focando na luta de classes (Holloway, 2002HOLLOWAY, John. Change the world without taking power: the meaning of revolution today. London: Pluto Press, 2002.; Honneth, 2017aHONNETH, Axel. The idea of socialism. A renewal. Oxford: Polity, 2017a., p. 44-45; Honneth, 2017bHONNETH, Axel. Hegel and Marx: a reassessment after one century. In: Banu Bargu; Chiara Bottici (eds.). Feminism, capitalism and critique. New York: Columbia Universty Press, 2017b.). Segundo, o problema da aparente multiplicidade de significados do conceito de trabalho ao longo dos escritos de Marx e como conceitos diferentes de trabalho deveriam amarrar a descrição socioteórica à crítica social e à ideia de emancipação. Não se pode simplesmente dissimular as discrepâncias entre estes modelos (Honneth, 1995cHONNETH, Axel. Work and instrumental action: on the normative basis of critical theory. In: Axel Honneth. The fragmented world of the social: essays in social and political philosophy. New York: State University of New York Press, 1995c. p. 15-49.; Renault, 2011RENAULT, Emmanuel. Comment Marx se réfère-t-il au travail et à la domination? Actuel Marx. v. 49, n. 1, p. 15-31, 2011 <10.3917/amx.049.0015>.
https://doi.org/10.3917/amx.049.0015...
). A teoria madura do reconhecimento de Honneth resulta em larga medida da tentativa de perseguir a forma de teoria social e política exemplificada por Marx, mas com outras ferramentas conceituais (Honneth, 1995bHONNETH, Axel. Domination and moral struggle. The philosophical heritage of Marxism revisited. In: Axel Honneth. The fragmented world of the social: essays in social and political philosophy. New York: State University of New York Press, 1995b. p. 3-14.).1 1 Este artigo é particularmente relevante, pois nele Honneth deixa claro que rejeita a noção de “trabalho social” precisamente porque ela não é adequada ao programa teórico que Marx havia estabelecido para si mesmo: “conectar as demandas de uma teoria da emancipação ao objetivo de uma análise da sociedade”. A conceitualização do reconhecimento é desenvolvida como um caminho melhor de realizar precisamente este programa: “um paradigma do reconhecimento […] poderia, em minha visão, ser um sucessor valioso, em nível mais abstrato, é claro, do paradigma do trabalho de Marx. Nele a teoria da emancipação e a análise da sociedade podem ser conectadas novamente em uma teoria da ação”. O reconhecimento torna possível, seguindo Hegel, caracterizar a estrutura do laço social e descrever a sociedade como o resultado da ação social e, simultaneamente, descrever o “excedente” normativo que é requerido para a crítica imanente e para uma teoria imanente da emancipação.

O papel desempenhado pelo trabalho social no pensamento marxista clássico pode levar a uma orientação redutora ou confusa em relação a lutas sociais que não são diretamente lutas relacionadas ao trabalho. Lutas contra discriminação de raça ou gênero ou demandas por direitos democráticos podem se conectar de um modo ou de outro a aspectos da organização do trabalho (Honneth, 2007bHONNETH, Axel. The social dynamics of disrespect: on the location of critical theory today. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity, 2007b. p. 63-79.). Mas é obviamente um erro categorial interpretá-las como decorrentes diretamente da organização capitalista da produção. De um ponto de vista honnethiano é espantoso ainda ver marxistas que se contentam em usar frases vagas ou metafóricas quando tentam simultaneamente entender formas de dominação não originadas na estrutura econômica e, ao mesmo tempo, manter o primado da lógica capitalista como o motivo último, e não somente o contexto, da injustiça (Dufour e Pineault, 2009, p. 88-89).

Honneth, em contraste, desenvolveu a conceitualização do reconhecimento com a finalidade de prover uma interpretação mais consistente das lutas objetivando emancipação. Para Honneth, assim como para muitos teóricos, o estudo seminal de E. P. Thompson sobre as lutas da classe operária inglesa mostrou vividamente as pré-condições de experiência, culturais e morais das lutas proletárias (Honneth 1995aHONNETH, Axel. The struggle for recognition. The moral grammar of social conflict. Cambridge: Polity, 1995a., p. 166-7; 2007bHONNETH, Axel. The social dynamics of disrespect: on the location of critical theory today. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity, 2007b. p. 63-79.). A análise de condições materiais não é suficiente para entender os modos como a injustiça é experimentada e as formas como grupos sofrendo injustiças aspiram, baseados naquela experiência, a denunciá-la e rejeitá-la. O trabalho de Honneth pode ser visto como uma tentativa de prover um modelo teórico consistente que estenda o ponto crucial exposto pelo estudo seminal de Thompson. As três esferas do reconhecimento e, na recente recalibragem feita por Honneth em seu modelo, as diferentes formas institucionais assumidas pelas liberdades individual e social repousam sobre leituras típico-ideais e normativas da modernidade. A maior motivação por trás de tais delineamentos é talvez distinguir e caracterizar os diferentes tipos de demandas implícitas em conflitos sociais, dadas as estruturas morais específicas das sociedades modernas. A natureza formal das esferas de reconhecimento e a plasticidade das esferas institucionais da liberdade as tornam disponíveis a muitos tipos de luta social. Esta é, para Honneth, uma vantagem decisiva de seu método, que se prova flexível e aberto o bastante para ser aplicado a uma grande diversidade de situações empíricas e históricas.

O foco de Honneth na “gramática” normativa mobilizada pelos conflitos sociais tem uma dimensão histórica intrínseca, como acabamos de ver. Ela é baseada na premissa de que modernidade é sinônimo do destravamento de novas dimensões normativas como o resultado de uma mudança crucial que vê a progressiva liberação dos indivíduos de seus laços tradicionais (Honneth, 2007eHONNETH, Axel. Post-traditional communities: a conceptual proposal. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity Press, 2007e. p. 254-262.). As esferas do reconhecimento ou de liberdade institucionalizada traduzem na linguagem da teoria social a ideia básica de que a sociedade moderna corresponde à emergência de novos direitos (civis, políticos, sociais) e liberdades (negativa e positiva), que gradualmente invadem mundos da vida, são canonizadas em códigos legais, instituições e processos políticos e fornecem o vocabulário fundamental das modernas lutas contra a injustiça e a dominação. Esta visão leva a um rigoroso questionamento de posições marxistas clássicas. Devido a seu foco nas relações de produção como o berço de todas as relações sociais, o último tende a ver a ênfase em ganhos em liberdades legais e políticas com suspeita. Liberdades formais “burguesas” são vistas como abstrações, como não se relacionando às causas reais de injustiça ou mesmo como retirando atenção destas e como justificando uma ordem injusta (Honneth, 2017bHONNETH, Axel. Hegel and Marx: a reassessment after one century. In: Banu Bargu; Chiara Bottici (eds.). Feminism, capitalism and critique. New York: Columbia Universty Press, 2017b.). Por outro lado, no entanto, a realidade histórica dos movimentos sociais que lutaram para ter assegurados tais direitos e liberdades é tão esmagadora e os ganhos emancipatórios envolvidos tão óbvios, que marxistas tradicionais somente podem reconhecer sua validade normativa. Uma vagueza estratégica frequentemente surge neste preciso momento, para esconder a dificuldade de assumir ambas posições simultaneamente.

O modelo de Honneth retém algumas das suspeitas marxistas fundamentais a respeito de normas legais abstratas e políticas. Honneth consistentemente argumenta que é metodologicamente equivocado e praticamente deletério conceber normas legais e políticos abstraindo-se a realidade social na qual elas serão aplicadas (Honneth, 2007dHONNETH, Axel. Democracy as reflexive cooperation: John Dewey and theory of democracy today. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity Press, 2007d. p. 218-239.; 2014HONNETH, Axel. The right of freedom. The social foundations of democratic life. Oxford: Polity, 2014.). Democracia, por exemplo, permanece um conceito largamente vazio se se refere somente a um conjunto de procedimentos formais ou aponta apenas para um conjunto de princípios morais deduzidos a priori (Honneth, 2007dHONNETH, Axel. Democracy as reflexive cooperation: John Dewey and theory of democracy today. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity Press, 2007d. p. 218-239.). Ao manter esta percepção fundamental, contudo, Honneth não é confrontado com o dilema clássico que infesta perspectivas marxistas clássicas. Isso porque o modelo do reconhecimento e, mais recentemente, o da liberdade social também têm significado socioteórico: identificar dimensões normativas centrais na estrutura das relações sociais modernas também ajuda a descrever tais relações. Como resultado, a ligação entre normas legais e políticas e a realidade social é mais facilmente demonstrável do que quando se vê a sociedade primariamente como uma ordem de produção e se tenta, nesta base, dizer no que a justiça e a injustiça consistem. Honneth também está na posição de desenvolver perspectivas críticas das medidas políticas que falham em se relacionar a injustiças sociais reais, mas porque sua crítica é formulada em termos de falsas formas de reconhecimento, que são prometidas mas ainda não são socialmente preenchidas, seu próprio estilo de crítica da ideologia não encontra o dilema entre a pluralidade de demandas por justiça e a univocidade da referência ao trabalho abstrato.

Honneth com Marx

Dois conjuntos de problemas emergiram como os pontos sensíveis decisivos para uma integração de argumentos marxistas e honnethianos: um conjunto de questões descritivas e um conjunto de questões normativas, como a questão categorial conectando ambas. A fraqueza do modelo de reconhecimento de Honneth parece ser descritiva, pois ele parece perder de vista o poder da lógica capitalista de moldar o mundo social (e natural) em suas dimensões objetiva e subjetiva. A fraqueza das perspectivas marxistas, em contraste, é seu pouco desenvolvimento normativo, ligada à referência monotemática ao trabalho abstrato como o referente explicativo exclusivo. A mediação entre ambas posições, então, pareceria demandar que se explore a possibilidade de casar o poder descritivo da teoria social marxista com o detalhismo normativo do modelo de reconhecimento de Honneth. Há programas teóricos significativos sendo realizados atualmente que tentam fazer exatamente isso e ambicionam combinar uma referência positiva ao trabalho de Honneth dentro de um paradigma geralmente marxista.

Em seus escritos recentes, por exemplo, Stéphane Haber (2007HABER, Stéphane. L'aliénation: vie sociale et expérience de la dépossession. Paris: Presses Universitaires de France, 2007.; 2009HABER, Stéphane. L'homme dépossédé: une tradition critique de Marx à Honneth. Paris: Presses du CNRS, 2009.; 2013)HABER, Stéphane. Penser le néocapitalisme: vie, capital et aliénation. Paris: Les Prairies ordinaires, 2013. tenta desenvolver uma fenomenologia crítica que faria a crítica social adequada à realidade de patologias sociais contemporâneas tanto em termos empíricos, descritivos, quanto conceituais. Haber desenvolve uma noção revisada e expandida de alienação como a categoria central da crítica contemporânea. Neste projeto, a despeito de suas carências descritivas, o conceito de reconhecimento de Honneth, e mais recentemente o de reificação, como seu oposto, são vistos como valiosos desenvolvimentos conceituais em teoria social contemporânea, indicando o papel constitutivo de diferentes formas de os seres humanos constituírem ligações (ao mundo, aos outros e a si mesmos). Aqui, os escritos de Honneth são referenciados positivamente como permitindo que Teoria Crítica ilumine e expanda a base antropológica implícita de crítica marxista, particularmente em relação às patologias sociais.

Em um influente manifesto, Franck Fischbach (2009a)FISCHBACH, Franck. Manifeste pour une philosophie sociale. Paris: La Découverte, 2009a. procurou defender e estender o programa de “filosofia social” como definido por Honneth 20 anos atrás (Honneth, 2007aHONNETH, Axel. Pathologies of the social: the past and present of social philosophy. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity, 2007a. p. 3-48.), mostrando como o reconhecimento se alinha a ilustres conceitos críticos que tiveram seu impacto não apenas na filosofia, mas igualmente no discurso social e, de fato, público.2 2 Ver a própria tentativa de Fischbach de rejuvenescer a categoria de alienação (2007; 2009b). Os comentadores franceses propõem uma interpretação dos famosos manuscritos que é marcadamente original, insistindo particularmente na influência de Feuerbach e Hess mais do que de Hegel sobre o jovem Marx (Renault, 2008). Outros trabalhos recentes a respeito do jovem Marx (Chitty, 2009; Brudney 2010; Ikäheimo, 2011; Quante, 2011), em contraste, focam mais especificamente na relação Hegel-Marx. Aqui, os escritos de Honneth são defendidos como uma tentativa exemplar de continuar o ambicioso e difícil programa da “filosofia social” como um empreendimento interdisciplinar entre a filosofia e as ciências sociais.

Emmanuel Renault, em vários livros importantes e numerosos artigos (2004; 2007; 2008; 2009; 2017a; 2017b), buscou integrar argumentos de uma teoria do reconhecimento em uma análise crítica do capitalismo mais ampla. Para Renault, a teoria do reconhecimento de Honneth é uma adição indispensável a perspectivas estruturalistas e funcionalistas de desenvolvimentos recentes do capitalismo. Ela provê ferramentas analíticas e normativas que são desejáveis nessas perspectivas e que são ainda necessárias para incluir o aspecto subjetivo da injustiça social das políticas que tentam corrigi-la, como na experiência de injustiça socialmente causada e nas motivações para a luta social. Uma premissa chave neste argumento é que a inclusão da dimensão subjetiva é uma parte essencial de qualquer crítica bem sucedida do capitalismo contemporâneo. De fato, a integração de argumentos marxistas e honnethianos é uma via de mão dupla, segundo Renault, e beneficia ambos os lados. Os conceitos subjetivistas de Marx (alienação, reificação, a luta contra a degradação proletária) foram plenamente incluídos em sua crítica da economia política (até n’O Capital) e ajudaram a expandir o arsenal de categorias críticas ao lado daquelas que derivam do reconhecimento de Honneth (Deranty e Renault, 2007DERANTY, Jean-Philippe; RENAULT, Emmanuel. Politicising Honneth's ethics of recognition. Thesis Eleven, v. 88, n. 1, p. 92-111, 2007 <10.1177/0725513607072459>.
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). Por outro lado, o reconhecimento de Honneth não é só um conceito de filosofia moral ou um conceito psicológico, descrevendo experiências subjetivas ou dando relatos normativos das motivações para a revolta; ele pode ser usado como um recurso conceitual importante para especificar o conteúdo de políticas de emancipação, uma área na qual os escritos de Marx provêm informação insuficiente.

Minha própria proposta de mediação entre a Teoria Crítica de Marx e a de Honneth se situa no campo aberto por estes projetos (Deranty, 2005DERANTY, Jean-Philippe. Les horizons marxistes de l’éthique de la reconnaissance. Actuel Marx, v. 28, n. 2, p. 159-178, 2005 <10.3917/amx.038.0159>.
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; 2009aDERANTY, Jean-Philippe. Beyond communication. A critical study of Axel Honneth's social philosophy. Leiden: Brill, 2009a.; 2009bDERANTY, Jean-Philippe. Critique of political economy and contemporary critical theory. In: Hans-Christoph Schmidt am Busch; Christopher F. Zurn (orgs.). The philosophy of recognition. Historical and philosophical perspectives. Lanham: Lexington Books, 2009b. p. 285-317.). Todavia, ao invés de limitar a contribuição do reconhecimento honnethiano à dimensão subjetiva da crítica social, eu argumentaria que a integração também pode ser atingida no lado objetivo. Em outras palavras, o reconhecimento honnethiano pode ajudar a complementar uma Teoria Crítica contemporânea de espírito marxista também no lado socioteórico. Isso acarreta adicionar, ou tornar explícita, uma dimensão funcionalista no modelo de reconhecimento sem esquecer da forte objeção de Honneth contra qualquer tentativa banal de retomar o paradigma do trabalho social.

Para ver como isso é possível, é importante retornar ao comentário feito antes a respeito da origem e do escopo da teoria do reconhecimento de Honneth. Apesar de aparências em contrário, o modelo do reconhecimento não se limita à tarefa de iluminação normativa ou diagnóstico psicológico. Ainda que Honneth não tenha tentado desenvolver uma teoria social da modernidade comparada em alcance àquelas de Marx ou Habermas, sua ênfase no reconhecimento origina-se de intuições substantivas em teoria social, e seus impactos sobre aquela retornam significativamente (Deranty, 2009aDERANTY, Jean-Philippe. Beyond communication. A critical study of Axel Honneth's social philosophy. Leiden: Brill, 2009a.). Reconhecimento em Honneth nomeia não apenas o conceito geral que abarca diferentes princípios normativos aplicáveis a diferentes instituições. Reconhecimento também é – aliás, primordialmente – a característica central do laço social. Ele designa as condições sociais de individualização e socialização. De fato, o mais famoso uso normativo do reconhecimento, através do delineamento das três esferas de reconhecimento e mais recentemente das instituições da liberdade, se baseiam no sentido “sócio-ontológico” do conceito. O argumento de Honneth é de tipo transcendental: é porque a individuação ocorre através da socialização, e a socialização envolve uma série de atitudes afirmativas do ambiente social (formas de reconhecimento permitindo liberdade social plena), que nós podemos delinear um número de eixos normativos que são todos perpassados pelo conceito de reconhecimento.3 3 A falha em notar o uso transcendental que Honneth faz da ontologia do reconhecimento leva à crítica infundada de que seu “monismo” é redutivista, tanto em termos descritivos (teoria social) quanto em termos de conceitos para a crítica social (Bader, 2007).

Este senso sócio-ontológico fundamental do reconhecimento é, em si mesmo, parte de uma imagem sócio-ontológica mais geral, que pode ser sumarizada em duas teses chave. Estas teses estão no coração da crítica de Honneth da política marxista, da teoria de Habermas sobre a colonização dos mundos da vida e das teorias estruturalistas (Honneth, 1994HONNETH, Axel. History and interaction. In: Gregory Elliott (ed.). Althusser: a critical reader. Oxford: Blackwell, 1994. p. 73-91.). A primeira tese é que a reprodução social se assenta em uma ordem normativa implícita negociada entre grupos sob a forma de um antagonismo mais ou menos latente, revolvendo ao redor não apenas de autointeresses materiais, mas também, e de fato primariamente, ao redor da interpretação de princípios chave, valores e normas. Esta negociação normativa é inerentemente antagonística: ela envolve grupos sociais portando poder social desigual e posicionados de modo assimétrico no campo social. A imagem básica é próxima à teoria de Bourdieu dos campos sociais, com a exceção de que Honneth insiste no fato de que os parâmetros da luta social não se limitam à distribuição de capital social, mas ocorrem crucialmente ao redor da interpretação de normas sociais e envolvem posições morais (Honneth, 2007cHONNETH, Axel. Moral consciousness and class domination: some problems in the analysis of hidden morality. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity, 2007c. p. 80-96.). É a isto que corresponde a luta por reconhecimento em termos socioteóricos (Honneth, 1995eHONNETH, Axel. The fragmented world of symbolic forms: reflections on Pierre Bourdieu's sociology of culture. In: Axel Honneth. The fragmented world of the social: essays in social and political philosophy. New York: State University of New York Press, 1995e. p. 184-201.). O que é crucial a se enfatizar aqui é o papel de integração social delegado ao antagonismo normativo, o que nós poderíamos chamar de antagonismo do reconhecimento. Tal antagonismo do reconhecimento leva a tensões e discordâncias dentro do social, mas também descreve o fato de que o social inclui os diferentes grupos em tensão.

Esta primeira percepção implica uma segunda ideia chave, a saber: que a evolução social não é só um produto da evolução das condições materiais e da lógica institucional, mas também – e isso é tão importante quanto – de mudanças nas relações de poder entre grupos e classes, uma mudança que é expressa em mudanças na interpretação das normas, princípios e valores estruturantes. Honneth se recusa a ver a evolução social resultando apenas das lógicas autônomas de sistemas funcionais autopoiéticos. Grupos sociais desempenham um papel influenciando estes desenvolvimentos através das ações que desempenham no mutável balanço de poder entre si.

As dimensões socioteóricas do modelo de reconhecimento de Honneth mostram que é possível acomodar explicações funcionalistas e considerações sistêmicas, que são necessárias para preservar a sagacidade descritiva de perspectivas marxistas, com as intuições normativas de Honneth. Isto é possível se se iluminar o papel funcional que o antagonismo de classe normativamente mediado desempenha na reprodução social e na evolução social. A partir deste ponto, apenas um passo adicional de clarificação conceitual é requerido para mostrar como a teoria do reconhecimento de Honneth pode ser integrada em um esquema socioteórico mais amplo de espírito marxista. De fato, a intervalos regulares em sua obra, Honneth aludiu a esta possibilidade, sem jamais dar-lhe uma articulação completa e explícita (Honneth, 1991HONNETH, Axel. The critique of power. Reflective stages in a critical social theory. Cambridge: MIT Press, 1991., p. 195; 2014HONNETH, Axel. The right of freedom. The social foundations of democratic life. Oxford: Polity, 2014., p. 195; 2017bHONNETH, Axel. Hegel and Marx: a reassessment after one century. In: Banu Bargu; Chiara Bottici (eds.). Feminism, capitalism and critique. New York: Columbia Universty Press, 2017b., p. 200).

Deixe-nos mostrar, primeiramente, como a luta por reconhecimento, como antagonismo a respeito da interpretação de princípios sociais centrais, pode desempenhar um papel funcional e impactar efeitos sistêmicos. De uma perspectiva marxista, renunciar ao escopo analítico e aos detalhes fornecidos pelas críticas de Marx à economia política é um custo grande demais. A Teoria Crítica certamente quer continuar em uma posição onde tenha uma visão das causas e fatores das grandes tendências de crise, onde esteja apta a captar o escopo completo de transformações sociais inter-relacionadas, em particular onde mantenha uma dimensão global de crítica social; onde mostre como patologias separadas são interconectadas, em particular como a crise ambiental é diretamente ligada ao modo de produção (Haber, 2013HABER, Stéphane. Penser le néocapitalisme: vie, capital et aliénation. Paris: Les Prairies ordinaires, 2013.). Tendo uma visão clara do escopo das patologias sociais e das interconexões ligando fenômenos disparatados é indispensável mesmo para considerações “normativas”, a fim de medir e entender com precisão a realidade do sofrimento e da injustiça e para ver o que é realisticamente possível, mas também requerido, por lutas contra a injustiça em qualquer contexto dado. E não parece plausível prover tal plenitude descritiva sem retornar a argumentos funcionalistas e sistêmicos. Em particular parece impossível descrever muitas das patologias causadas pela organização social atual sem referência ao imperativo capitalista da valorização infinita. Mas a fim de satisfazer os pré-requisitos da teoria social de Honneth, o que é requerido não é rejeitar todos os argumentos funcionalistas ou sistêmicos na parte descritiva do empreendimento teórico crítico. Antes, duas coisas devem ser feitas. A primeira é rejeitar perspectivas exclusivamente funcionalistas ou sistêmicas, em particular perspectivas que personificam a categoria do capital como se este fora um poder transcendente com sua própria intencionalidade. E em segundo lugar, correlatamente, tem-se que mostrar como explicações e descrições de evoluções sociais também devem incluir o elemento de contestação social como fator decisivo, co-constitutivo, explanatório.

Assim, o ponto de discordância não diz respeito à referência a condicionamentos sistêmicos ou funcionalistas para explicar características da evolução social. A discordância diz respeito ao modo como estes condicionamentos são interpretados. A perspectiva honnethiana simplesmente insiste que argumentos funcionalistas não deveriam ser tratados meramente em termos de teorias dos sistemas e que seus componentes normativos e os antagonismos entre grupos que se inflamam ao redor de interpretações destes componentes são incluídos na descrição crítica. O que queremos evitar é uma descrição de evoluções sociais como causadas pela lógica da valorização em termos que fariam desta última uma força quase divina, agindo de longe e sem relação com as intenções e experiências dos atores, acessível somente a uns poucos escolhidos (os teóricos, que de algum modo podem acessar uma visão de fora do sistema social). A visão alternativa vê as evoluções capitalistas efetivamente seguindo linhas de desenvolvimento determinadas e condicionadas por condições materiais implícitas, pelas organizações da produção vigente e conduzidas pelo processo de valorização. As modalidades de acesso a recursos, estado dos instrumentos tecnológicos e do conhecimento científico, micro e macroestruturas, a situação geopolítica, tudo isso precisa ser incluído na descrição. Mas o núcleo mesmo do modo de produção, o modo como a divisão do trabalho é organizada nos sentidos material, social, legal e econômico do termo (quem trabalha para quem, para qual propósito exatamente, e como), este elemento central não pode ser exaustivamente explicado por aquelas condições materiais implícitas ou só pela lógica de valorização. Antes, este elemento central do sistema deve ser visto como o produto de frágeis e indeterminados compromissos entre grupos e classes, compromissos baseados em relações de poder assimétricas, que podem sempre ser contestadas e transformadas. A consequência decisiva desta visão é a seguinte: dado que a definição socialmente negociada da divisão do trabalho forma o coração do modo de produção, já que provê os parâmetros básicos da estrutura econômica, ela impacta também nas condições estruturais, em alguma medida. Estas condições estruturais não condicionam em um modo absolutamente determinista. Elas mesmas são abertas à interpretação e à negociação sociais. Há muitos modos de organizar socialmente a escassez, a falta ou abundância de oportunidades de emprego, o emprego de tecnologias e de conhecimento científico para finalidades produtivas e assim por diante. O erro de perspectivas marxistas clássicas é tomar literalmente a linguagem de Marx n’O capital, o que a faz soar como se o imperativo capitalista agisse como o espírito do mundo em Hegel: pelas costas dos atores. Estas perspectivas se esquecem que o próprio Marx queria propor uma crítica da economia capitalista entendida como economia política. Há um elemento inerentemente político no coração da economia, em seu funcionamento mesmo: esta é a compreensão honnethiana que nos permite entender a necessidade de incluir elementos funcionalistas e sistêmicos sem renunciar aos normativos e relativos à teoria da ação.

Como resultado, como o próprio Honneth sugere ao longo de seu trabalho (1991; 2017aHONNETH, Axel. The idea of socialism. A renewal. Oxford: Polity, 2017a., p. 199), um dado período da história moderna pode ser visto como uma ordem de dominação (a face negativa da moeda socioteórica de Honneth, cujo lado positivo é o reconhecimento), de modo que a dominação social canaliza uma multiplicidade de evoluções institucionais e materiais paralelas e as força a operar em uma direção, a direção, a saber, que tende a reforçar a dominação de algumas classes sobre outras e, em particular, a dominação de alguns sobre o trabalho de outros. Consequências inesperadas, efeitos sistêmicos, determinações funcionais, lógicas institucionais separadas, autônomas não são negadas por esta perspectiva. Mas parece realista argumentar que grupos dominantes, de várias formas diferentes, podem influenciar, utilizar e, em alguns casos, diretamente moldar, ou ao menos tentar moldar, aqueles desenvolvimentos para sua própria vantagem e, em particular, mais uma vez, a estrutura da divisão do trabalho. Há muitos modos pelos quais circuitos de retorno entre o funcional, o sistêmico e o institucional, de um lado, e o relativo à teoria da ação, do outro, podem ocorrer: algumas decisões políticas diretamente favorecem algumas classes ao custo de outras (por exemplo, impostos ou políticas de bem-estar) independentemente de considerações sistêmicas; conhecimento especializado que estuda efeitos sistêmicos e consequências inesperadas pode ser mobilizado para alcançar certos efeitos; conhecimento reflexivo, elaborando consequências após um efeito sistêmico ter ocorrido, pode ser adquirido e usado para vantagens própria, por exemplo para acelerar ainda mais ou remediar um efeito sistêmico; determinações funcionais podem sempre ser tratadas de modo mais ou menos imparcial, e por aí vai.

Armados com este modelo semifuncionalista, é possível estudar fenômenos disparatados ocorrendo em diferentes pontos do mundo social e mostrar que eles se combinam para produzir um certo tipo de estrutura econômica beneficiando a alguns: por exemplo, mudanças no enquadramento legal de relações industriais, nas regulações estatais do mercado de trabalho, na taxação, mas também na linguagem normativa usada para explicar os princípios que guiam estas mudanças legais e institucionais, tudo isso acaba criando um mundo em que trabalhadores podem organizar-se menos facilmente, o trabalho é intensificado e o lucro dos acionistas domina a lógica da produção. Pode-se relacionar a esta figura mudanças institucionais e filosóficas no setor educacional e também mudanças culturais na esfera íntima ou no conteúdo de produções culturais, como relacionadas à tendência geral. As lentes da teoria da ação fazem interpretar estas mudanças e suas inter-relações como restauradoras, como a conclusão global de uma multiplicidade de transformações institucionais e desdobramentos sistêmicos, do poder das classes dominantes no uso do trabalho e de seus produtos.4 4 Uma interpretação marxista influente do pós-Fordismo como aquela proposta por Gérard Duménil e Dominique Levy (2004), que David Harvey endossou, é então compatível com a abordagem honnethiana das evoluções capitalistas sugerida aqui (Harvey, 2005). Esta figura, é claro, incluiria todas as áreas onde este efeito global é atrasado ou revertido ou ainda pretendido onde mecanismos de retorno falham.

Implícita a esta abordagem, é claro, é a premissa da “teoria da ação” de acordo com a qual os agentes sociais não são apenas marionetes manipuladas pelo “sistema”. A abordagem semifuncionalista abre espaço para determinações funcionais e institucionais da experiência subjetiva, do conhecimento e da ação. Mas ela preserva a capacidade de grupos e indivíduos formarem seu próprio conhecimento reflexivo de seu lugar na ordem social e da própria estrutura da ordem social, notavelmente do modo como ela os afeta.

Este modelo de análise social crítica sugere que é possível integrar o tipo de argumentos funcionais e sistêmicos que são a marca de perspectivas marxistas com os requerimentos normativos e ligados à teoria da ação da teoria social honnethiana. Basicamente, mostra que, no nível descritivo pelo menos, não é necessário escolher entre Marx e Honneth, ou ao menos entre argumentos marxistas e alguma versão de uma teoria social honnethiana.

Mas compatibilidade descritiva é apenas um passo para estabelecer a compatibilidade dos argumentos marxista e honnethiano. Mais importante, devemos checar se o que parece ser uma contradição intratável no nível fundamental das categorias centrais e da linguagem conceitual empregada permanece intransponível. Claramente a confrontação entre as duas posições requer alguma alteração em ambas. A questão é se estas alterações são compatíveis com as respectivas premissas básicas destas teorias. Eu argumentaria que são e que estas alterações seriam efetivamente bem-vindas.

No lado marxista, o modelo semifuncionalista recém-esboçado nos reassegura que a organização da produção mantém um papel central na análise e crítica da sociedade. A introdução da normatividade como um elemento socioteórico com valor próprio significa que a luta de classes se transforma novamente num fator explicativo chave, contrariamente a uma escola inteira de exegese marxista, notavelmente a tentativa seminal de Postone de redirecionar a Teoria Crítica em trilhos marxistas clássicos. Mas isto significa tomar posição dentro de debates marxistas, sem se excluir daquele campo. O benefício desta alteração é que a introdução da gramática do reconhecimento dá acesso a um sofisticado instrumental conceitual que torna possível discutir de modo diferente e com uma sofisticada fundação filosófica as várias formas de luta social, bem como o impacto (psicológico e social) das evoluções capitalistas.

No lado honnethiano, o problema espinhoso concerne à relação entre reconhecimento e a organização do trabalho. Como vimos, a conceitualidade do reconhecimento foi desenvolvida por Honneth para corrigir o que ele considerava a natureza unilateral do paradigma do “trabalho social”. Pode parecer que a análise “semifuncionalista” esboçada acima retorna àquele antigo paradigma, pois coloca a luta pelas normas sustentando a divisão do trabalho no coração da reprodução social. Mas o movimento sugerido aqui é bem diferente do modo como Honneth descrevera a adoção do trabalho social como a categoria nuclear da teoria social no modelo marxista clássico. É verdade que para fazer a teoria social normativa de Honneth compatível com um esquema marxista, é preciso pôr mais ênfase na organização do trabalho e na experiência do trabalho, ainda que em alguns de seus textos de juventude o próprio Honneth enfatizasse a importância deste último para a filosofia social (Honneth, 1995aHONNETH, Axel. The struggle for recognition. The moral grammar of social conflict. Cambridge: Polity, 1995a.; 1995bHONNETH, Axel. Domination and moral struggle. The philosophical heritage of Marxism revisited. In: Axel Honneth. The fragmented world of the social: essays in social and political philosophy. New York: State University of New York Press, 1995b. p. 3-14.; 2007bHONNETH, Axel. The social dynamics of disrespect: on the location of critical theory today. In: Axel Honneth. Disrespect. The normative foundations of critical theory. Cambridge: Polity, 2007b. p. 63-79.). Mas o modelo esboçado acima mostrou que isto pode ser feito sem renunciar às principais premissas da teoria social de Honneth, isto é, o núcleo normativo da integração social e a complexidade institucional da sociedade moderna. Tudo isso é requerido para adequadamente enfatizar que a importância funcional do trabalho é iluminar as fortes interconexões entre diferentes formas de dominação social e a organização do trabalho, sem reduzir a primeira à última. O próprio Honneth sugeriu algo próximo a isso em Critique of power, quando ele pareceu se apropriar da teoria de Horkheimer da “ação cultural”. A tese resultante desta alteração poderia ser sumarizada assim: a dominação social (a contrapartida negativa do reconhecimento) é expressa e arraigada mais eminentemente na e através da mediação da divisão do trabalho e da organização da produção. Ou: a dominação social está comumente relacionada de algum modo à dominação no trabalho e à dominação através do trabalho (através da necessidade de trabalhar e, no capitalismo, da necessidade de trabalhar para o benefício e sob o comando de outros). Por exemplo, a dominação geral dos homens sobre as mulheres, que obviamente é refratada em todas as outras instituições da sociedade – na lei, no sistema educacional, mas também nas representações culturais – esta dominação se expressa e é arraigada mais particularmente na divisão sexual do trabalho. Trabalho é tanto uma expressão como um critério chave da dominação dos homens sobre as mulheres. Naquele modelo, então, o trabalho se torna central novamente, não ao custo de negligenciar outras instituições e suas lógicas específicas (funcional e normativa), mas porque é geralmente na experiência do trabalho e na forma como o trabalho é socialmente organizado que a dominação e as lutas contra a dominação têm seus maiores impactos (Deranty, 2008DERANTY, Jean-Philippe. Work and the precarisation of existence. European Journal of Social Theory, v. 11, n. 4, p. 443-463, 2008 <10.1177/1368431008097011>.
https://doi.org/10.1177/1368431008097011...
; Dejours e Deranty, 2010DEJOURS, Christophe; DERANTY, Jean-Philippe. The centrality of work. Critical Horizons, v. 11, n. 2, p. 167-180, 2010 <10.1558/crit.v11i2.167>.
https://doi.org/10.1558/crit.v11i2.167...
). É claro, direitos democráticos, direitos culturais, direitos sociais e assim por diante também se aplicam e podem ser objeto de disputa fora da esfera do trabalho. Mas no grande esquema da vida social, experiências de desrespeito e lutas por reconhecimento tendem a ter alguma relação com a experiência do trabalho e da organização da produção. A luta pela extensão de direitos políticos foi, em larga medida, uma luta contra uma franquia baseada na propriedade; uma parte importante da luta pela igualdade feminina é uma luta por pagamento igualitário e pelo reconhecimento completo de atividades usualmente realizadas por mulheres, notavelmente aquelas que se encontram fora das representações existentes de emprego assalariado; as lutas de imigrantes e refugiados são largamente a luta daqueles que vieram a algum lugar para trabalhar mas não possuem voz lá.

Muitos marxistas e honnethianos vão provavelmente pensar que o modelo para uma integração de Marx e Honneth sugerido aqui continua a dissimular diferenças categoriais centrais. Eu penso que a discrepância permanece intransponível apenas enquanto se lê apenas alguns capítulos de Luta por reconhecimento ou se foca apenas nas passagens de escritos recentes em que Honneth critica Marx, e quando se toma uma visão dogmática da teoria social de Marx, em particular d’O capital. Se, por outro lado, toma-se a totalidade dos escritos de Marx e de Honneth, se se aceita a ideia de que Marx pode ser complementado no lado normativo e Honneth no lado descritivo, então eu sugeriria que em suas intenções e intuições fundamentais, a teoria social honnethiana, ou digamos: uma teoria social inspirada nos escritos de juventude de Honneth, de fato, pode ser lida como rearticulando muitas das intuições chave de Marx. A intuição antropológica central no coração do modelo de Honneth, dependência intersubjetiva, também é a de Marx; a gramática normativa que Honneth delineia sobre esta base, justiça social e autonomia individual plena, também é a de Marx; e o tipo de teoria política que deriva disto, uma política não proceduralista, socialmente baseada e fundamentada na luta contra o sofrimento e a injustiça, também era a visão de Marx a respeito da política.

  • 1
    Este artigo é particularmente relevante, pois nele Honneth deixa claro que rejeita a noção de “trabalho social” precisamente porque ela não é adequada ao programa teórico que Marx havia estabelecido para si mesmo: “conectar as demandas de uma teoria da emancipação ao objetivo de uma análise da sociedade”. A conceitualização do reconhecimento é desenvolvida como um caminho melhor de realizar precisamente este programa: “um paradigma do reconhecimento […] poderia, em minha visão, ser um sucessor valioso, em nível mais abstrato, é claro, do paradigma do trabalho de Marx. Nele a teoria da emancipação e a análise da sociedade podem ser conectadas novamente em uma teoria da ação”.
  • 2
    Ver a própria tentativa de Fischbach de rejuvenescer a categoria de alienação (2007FISCHBACH, Franck. Les manuscrits economico-philosophiques de 1844. Paris: Vrin, 2007.; 2009b)FISCHBACH, Franck. Sans objet: capitalisme, subjectivité, Aliénation. Paris: Vrin, 2009b.. Os comentadores franceses propõem uma interpretação dos famosos manuscritos que é marcadamente original, insistindo particularmente na influência de Feuerbach e Hess mais do que de Hegel sobre o jovem Marx (Renault, 2008RENAULT, Emmanuel. Lire les Manuscrits de 1844. Paris: Presses Universitaires de France, 2008.). Outros trabalhos recentes a respeito do jovem Marx (Chitty, 2009CHITTY, Andrew. Species-being and capital. In: Andrew Chitty; Martin McIvor (orgs.). Karl Marx and contemporary philosophy. London: Palgrave McMillan, 2009. p. 123-142.; Brudney 2010BRUDNEY, Daniel. Producing for others. In: Hans-Christoph Schmidt am Busch; Christopher F. Zurn (Orgs.). The philosophy of recognition. Historical and philosophical perspectives. Lanham: Lexington Books, 2010. p. 151-188.; Ikäheimo, 2011IKÄHEIMO, Heikki. Holism and normative essentialism in Hegel's social ontology. In: Heikki Ikäheimo; Arto Laitinen (orgs.). Recognition and social ontology. Leiden: Brill, 2011. p. 145-209.; Quante, 2011QUANTE, Michael. Recognition as the social grammar of species being in Marx. In: Heikki Ikäheimo; Arto Laitinen (orgs.). Recognition and social ontology. Leiden: Brill, 2011. p. 239-267.), em contraste, focam mais especificamente na relação Hegel-Marx.
  • 3
    A falha em notar o uso transcendental que Honneth faz da ontologia do reconhecimento leva à crítica infundada de que seu “monismo” é redutivista, tanto em termos descritivos (teoria social) quanto em termos de conceitos para a crítica social (Bader, 2007BADER, Veit. Misrecognition, power and democracy. In: Bart van den Brink; David Owen (orgs.). Recognition and power. Axel Honneth and the tradition of critical social theory. Cambridge: Cambridge University Press, 2007. p. 238-269.).
  • 4
    Uma interpretação marxista influente do pós-Fordismo como aquela proposta por Gérard Duménil e Dominique Levy (2004)DUMÉNIL, Gérard; LÉVY, Dominique. Capital resurgent. Roots of the neoliberal revolution. Cambridge: Harvard University Press, 2004., que David Harvey endossou, é então compatível com a abordagem honnethiana das evoluções capitalistas sugerida aqui (Harvey, 2005HARVEY, David. A brief history of liberalism. Oxford: Oxford University Press, 2005.).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2018
  • Aceito
    27 Set 2018
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