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As estratégias de recomposição e rearticulação das elites do grupo étnico alemão no Brasil pós-Estado Novo: uma análise à luz da Sociologia Histórica e da Sociologia das Elites

The strategies of recomposition and rearticulation of the elites of the German ethnic group in post-Estado Novo Brazil: an analysis in the light of Historical Sociology and Sociology of Elites

Las estrategias de recomposición y rearticulación de las élites del grupo étnico alemán en Brasil después del Estado Novo: un análisis a la luz de la Sociología Histórica y de la Sociología de las Élites

Resumo:

Este artigo, embasado nas perspectivas teórico-metodológicas da Sociologia Histórica e da Sociologia das Elites, tem por objetivo analisar a recomposição e as rearticulações das elites do grupo étnico alemão no Brasil após o Estado Novo (pós-1945). A pesquisa baseia-se em revisão de literatura histórica, entrevistas e análise documental. Em um primeiro momento, analiso o Estado Novo e as campanhas de nacionalização como um “acontecimento”, responsável pela produção de mudanças e transformações nas práticas associadas à “germanidade” no Brasil. A seguir, apresento algumas das iniciativas de rearticulação das elites do grupo étnico alemão no Brasil pós-Estado Novo: o Comitê de Socorro à Europa Faminta, a reestruturação da Igreja Luterana, a rearticulação do Movimento 25 de Julho, a fundação de Centros Culturais 25 de Julho e da Federação dos Centros Culturais 25 de Julho. Por fim, analiso o “outcome ” de tal processo histórico, a saber, a sistematização e a institucionalização de um “espaço de práticas do folclore ‘alemão’ no Brasil”, a partir da década de 1980. A discussão possibilitou o estabelecimento de uma relação de causalidade entre as campanhas de nacionalização e as iniciativas de rearticulação das elites étnicas e de promoção da etnicidade germânica no Brasil.

Palavras-chave
Estado Novo; Germanidade; Elites; Sociologia Histórica; Sociologia das Elites

Abstract:

This article, based on the theoretical-methodological perspectives of Historical Sociology and Sociology of Elites, aims to analyze the recomposition and rearticulation of the elites of the German ethnic group in Brazil after the Estado Novo (post-1945). The research is based on historical literature review, interviews and document analysis. At first, I analyze the Estado Novo and nationalization campaigns as an “event”, responsible for producing changes and transformations in the practices associated with “Germanness” in Brazil. In the following, I present some of the initiatives of rearticulation of the elites of the German ethnic group in post-Estado Novo Brazil: the Comitê de Socorro à Europa Faminta, the restructuring of the Lutheran Church, the rearticulation of 25th of July Movement, the foundation of 25th of July Cultural Centers and the Federation of 25th of July Cultural Centers. Finally, I analyze the “outcome” of this historical process, that is, the systematization and institutionalization of a “space of practices of ‘German’ folklore in Brazil”, in the 1980s. The discussion made it possible to establish a causal relationship between the nationalization campaigns and the initiatives of rearticulation of ethnic elites and promotion of German ethnicity in Brazil.

Keywords
Estado Novo; Germanness; Elites; Historical Sociology; Sociology of Elites

Resumen:

Este artículo, basado en las perspectivas teórico-metodológicas de la Sociología Histórica y de la Sociología de las Élites, tiene como objetivo analizar la recomposición y la rearticulación de las élites del grupo étnico alemán en Brasil después del Estado Novo (posterior a 1945). La investigación se basa en revisión de literatura histórica, entrevistas y análisis de documentos. Inicialmente, analizo el Estado Novo y las campañas de nacionalización como un “evento”, responsable de producir cambios y transformaciones en las prácticas asociadas con la “germanidad” en Brasil. A continuación, presento algunas de las iniciativas de rearticulación de las élites del grupo étnico alemán en Brasil después del Estado Novo: el Comitê de Socorro à Europa Faminta, la reestructuración de la Iglesia Luterana, la rearticulación del Movimiento del 25 de Julio, la fundación de los Centros Culturales del 25 de Julio y de la Federación de los Centros Culturales del 25 de Julio. Finalmente, analizo el “outcome ” de tal proceso histórico, es decir, la sistematización y la institucionalización de un “espacio de prácticas del folklore ‘alemán’ en Brasil”, desde la década de 1980. La discusión permitió establecer una relación causal entre las campañas de nacionalización y las iniciativas de rearticulación de las élites étnicas y de promoción de la etnicidad germánica en Brasil.

Palabras clave
Estado Novo; Germanidad; Élites; Sociología Histórica; Sociología de las Élites

O Estado Novo e as campanhas de nacionalização como “acontecimento”2 2 O artigo consiste em uma reelaboração de algumas discussões apresentadas previamente na dissertação de mestrado do autor (Voigt 2018b). Uma versão preliminar foi apresentada no 19.º Congresso Brasileiro de Sociologia. A pesquisa contou com o apoio do CNPq, mediante a concessão de uma bolsa de mestrado.

William H. Sewell Jr., um dos expoentes da Nova Sociologia Histórica – campo subdisciplinar originado no contexto americano a partir de fins da década de 1960 –,3 3 Para um apanhado sobre a constituição e o desenvolvimento de tal campo teórico-metodológico, seu estado da arte e os principais temas e enfoques analíticos atuais, ver Calhoun (2003) e Monsma, Salla e Teixeira (2018). formula a proposta de uma “sociologia acontecimental” (eventful sociology). Tal perspectiva encara o “[…] curso da história como determinado por uma sucessão de acontecimentos basicamente contingentes” (Sewell 2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,, 93). Segundo Sewell, os acontecimentos “podem ser definidos como aquela subclasse rara de eventos que transforma significativamente as estruturas. Uma concepção acontecimental de temporalidade, portanto, é a que leva em conta a transformação das estruturas por acontecimentos” (Sewell 2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,, 109). Em diálogo com Marshall Sahlins, Sewell argumenta que se os acontecimentos históricos são transformações de estruturas, por extensão, a “[…] estrutura é o resultado cumulativo de acontecimentos passados” (Sewell 2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,, 204). Portanto, os acontecimentos produzem “ocorrências que têm consequências importantes, que em algum sentido ‘mudam o curso da história’” (Sewell 2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,, 229), levando os processos históricos a uma direção imprevista e, em última instância, produzindo rupturas com as estruturas prévias.

À nossa discussão, é pertinente apresentarmos alguns dos traços constitutivos da sociologia acontecimental de Sewell e da própria noção de “acontecimento”. Podemos apontar quatro características centrais de tal perspectiva (Sewell 2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,). Por um lado, adquire centralidade a ideia de path dependence (“dependência do caminho”), isto é, de que uma sequência de acontecimentos depende irremediavelmente do passado e de acontecimentos prévios. Por outro lado, é central reter que os acontecimentos transformam as categorias culturais, sociais e políticas que estruturam a agência humana. Ambas as assertivas marcam uma crítica e um distanciamento da sociologia acontecimental em relação às concepções “experimentais” de temporalidade, representadas de modo exemplar pelo trabalho de Theda Skocpol (Sewell 2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,).

Sewell (2017)Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes, apresenta uma crítica à célebre obra de Skocpol, Estados e Revoluções Sociais, na qual a autora elabora uma análise comparativa das três grandes revoluções sociais modernas (a francesa, a russa e a chinesa). Para Skocpol, a análise comparativa das três revoluções depende da suposição de que elas sejam governadas por leis causais idênticas; na visão de Sewell, isso é falacioso, na medida em que ao longo do tempo surgem novas classes e instituições políticas, que interferem no processo histórico. Ademais, as revoluções analisadas por Skocpol não podem ser consideradas fenômenos independentes, haja vista que elas são, ao contrário, influenciáveis, isto é, revoluções anteriores certamente irão influenciar revoluções posteriores. Para Sewell, enquanto a noção de path dependence problematiza a suposição de independência causal dos eventos – isto é, da independência de uma sequência de ocorrências em relação a uma sequência de ocorrências anterior –, a ideia de que acontecimentos transformam categorias culturais implica uma crítica à suposição de uniformidade das leis causais ao longo do tempo.

As outras duas características definidoras da concepção de temporalidade acontecimental visam contrastá-la com a concepção “teleológica” de temporalidade, contida nos trabalhos de Immanuel Wallerstein e de Charles Tilly (Sewell 2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,). Segundo Sewell, ainda que as concepções acontecimental e teleológica partilhem da ideia de path dependence, a primeira diferencia-se por assumir uma heterogeneidade temporal e por afirmar a generalidade da contingência. Por um lado, a assunção de uma “contingência radical” supõe uma crítica a todas as formas teóricas que postulam a “necessidade histórica”, isto é, a suposição de um desenvolvimento histórico linear que levaria inevitavelmente a um telos predeterminado por uma causação original. Por outro lado, a heterogeneidade temporal representa uma crítica à suposição teleológica de que uma única causa seja a origem dos processos históricos, isto é, de que haja uma “homogeneidade temporal”.

Neste artigo, sustento que o Estado Novo (1937-1945) – regime ditatorial implantado no Brasil por Getúlio Vargas mediante um golpe de Estado em 1937 – pode ser analisado de modo profícuo à luz da noção de “acontecimento”, seguindo as formulações propostas por William Sewell. Ao enquadrar o Estado Novo como um acontecimento, interessa-me aqui analisar as relações, os impactos e as transformações imputadas por tal regime político no tocante ao grupo étnico alemão no Brasil, às práticas sociais levadas a cabo por suas elites e desenvolvidas no contexto das colônias alemãs. Desta forma, minha análise volta-se mais especificamente a um enquadramento das “campanhas de nacionalização” como um acontecimento.

Ao realizarmos pesquisas sobre o fenômeno da germanidade no Brasil ou sobre a “teuto-brasilidade”, é extremamente recorrente nos depararmos com dois fenômenos inter-relacionados: por um lado, o contexto histórico e os impactos da Segunda Guerra Mundial e da ascensão do nacional-socialismo na Alemanha; por outro, o Estado Novo (1937-1945), talvez o marco temporal mais importante na história da germanidade no Brasil, um marco divisor, responsável por criar uma história anterior e posterior às chamadas “campanhas de nacionalização”.

As campanhas de nacionalização podem ser compreendidas como um turning point – isto é, um ponto de virada, de inflexão – na história da germanidade no Brasil. Na visão de Abbott (2001)Abbott, Andrew. 2001. On the concept of turning point. In Time matters: on theory and method, organizado por Andrew Abbott, 240-260. Chicago: The University of Chicago Press., turning point é um conceito essencialmente narrativo. O ponto de virada produz uma mudança em determinada trajetória, criando dois pontos no tempo (um “antes” e um “depois”, um “passado” e um “futuro”), que são ligados precisamente por esse ponto de fracionamento e transição, a “virada”. O turning point produz, assim, um redirecionamento e uma alteração na tendência de uma biografia ou processo, produzindo uma reorientação de determinada trajetória. Nas palavras de Abbott (2001Abbott, Andrew. 2001. On the concept of turning point. In Time matters: on theory and method, organizado por Andrew Abbott, 240-260. Chicago: The University of Chicago Press., 258):

Turning points are best envisioned as short, consequential shifts that redirect a process. The concept is inevitably a narrative one, for a turning point cannot be conceived without a new reality or direction being established, a judgment that requires at least two temporally separate observations. Not all sudden changes are turning points, but only those which are succeeded by a period evincing a new regime.4 4 Tradução livre: “Os pontos de virada são mais bem compreendidos como mudanças curtas e consequenciais que redirecionam um processo. O conceito é inevitavelmente narrativo, pois um ponto de virada não pode ser concebido sem que uma nova realidade ou direção seja estabelecida, um julgamento que requer ao menos duas observações temporalmente separadas. Nem todas as mudanças repentinas são pontos de virada, mas apenas aquelas que são sucedidas por um período que evidencia um novo regime”.

As campanhas de nacionalização, levadas a cabo entre os anos de 1938 e 1945, perpetraram uma assimilação violenta das comunidades de origem germânica no Brasil, justificada com base no temor de uma possível influência da propaganda nazista nos núcleos de colonização. Além disso, o Estado Novo valeu-se de um sentimento disseminado de antigermanismo, responsável por uma associação generalizada e despropositada – despropositada, pois generalizada – entre os imigrantes e os descendentes de alemães radicados no Brasil e o nazismo.

As campanhas de nacionalização foram embasadas em discursos nacionalistas e antigermanistas disseminados no Brasil desde o início do século 20, notadamente a partir da Primeira Guerra Mundial. O contexto geopolítico da Segunda Guerra Mundial contribuiu para um recrudescimento do sentimento antigermanista, produzindo um contexto hostil às expressões culturais “alemãs” no território nacional, que passaram a ser perseguidas sistematicamente por meio de políticas de Estado. Dentre as políticas levadas a cabo pelo Governo Vargas, algumas das mais significativas são: a proibição do uso de línguas estrangeiras no território nacional, a proibição do ensino e da imprensa em língua estrangeira, além da perseguição e do cerceamento às práticas e atividades de clubes, centros culturais e sociedades esportivas que evocassem de algum modo elementos relacionados à “cultura alemã”.5 5 Não há espaço para uma reconstituição histórica detalhada das campanhas de nacionalização. De todo o modo, o tema é bastante conhecido pela literatura pertinente. Ver, por exemplo, Geraldo (2009), Fáveri (2002) e Voigt (2017, 139-147). Para uma análise das elites do Estado Novo, nos marcos da Sociologia das Elites, ver os importantes trabalhos de Adriano Codato sobre as elites políticas e burocráticas (Codato 2008) e as elites intelectuais (Codato e Guandalini Jr. 2003) estado-novistas. Ainda que o tema da política nacionalista do Estado Novo seja caro aos trabalhos do autor, ele se expressa através de uma reflexão sobre a centralização do poder e as dinâmicas entre Vargas e as oligarquias regionais, bem como acerca do papel do nacionalismo para a organização política do Estado. A questão da etnicidade e da nacionalização de grupos imigrantes escapa às reflexões do autor.

O Estado Novo – ou, mais precisamente, suas relações e impactos no tocante ao grupo étnico alemão no Brasil, isto é, as “campanhas de nacionalização” – podem ser compreendidos como um “acontecimento”, na acepção formulada por William Sewell (Sewell 2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,), por três razões. Primeiro, tal acontecimento é marcado por um alto grau de contingência. Na inexistência de fenômenos contingentes e impremeditados como o advento da Segunda Guerra Mundial, a projeção geopolítica e militar obtida pela Alemanha em fins da década de 1930, as tendências expansionistas e pangermanistas do III Reich, e o posicionamento tomado pelo Estado brasileiro na Segunda Guerra – com a declaração de guerra aos países do Eixo em 1942 –, dificilmente um conjunto de discursos antigermanistas já existentes pelo menos desde a Primeira Guerra Mundial teria se potencializado e alcançado tamanha influência e projeção no debate público brasileiro, transformando-se propriamente em políticas de nacionalização a partir de 1938, sendo intensificadas a partir de 1942. Dito de outro modo, a reação antigermanista ao grupo étnico alemão no Brasil – isto é, as campanhas de nacionalização – só foi possível pelo advento de um fenômeno altamente contingente, a Segunda Guerra Mundial.

Em segundo lugar, como argumenta Sewell (2017)Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,, os acontecimentos possuem uma temporalidade heterogênea e produzem mudanças nas categorias culturais. A ideia de causalidade temporalmente heterogênea implica, por um lado, a negação de causas únicas para a origem de processos históricos e, por outro, a negação da uniformidade causal durante o tempo – haja vista que as categorias culturais, políticas e sociais se transformam no decorrer da história. No que tange às campanhas de nacionalização, podemos identificar múltiplas causas para a sua origem: os discursos antigermanistas acerca do “perigo alemão” latentes no debate intelectual e político brasileiro na primeira metade do século 20, o autogolpe de Vargas em 1937, o contexto geopolítico da Segunda Guerra Mundial, o temor do governo brasileiro em relação às políticas pangermanistas e expansionistas do III Reich e o medo da influência da propaganda nazista nos núcleos de colonização. Mais importante, podemos sustentar que as campanhas de nacionalização produzem uma transformação nas categorias culturais vigentes na sociedade brasileira em relação à presença do elemento “germânico” no território nacional: de uma alta carga valorativa associada ao imigrante alemão, enquanto elemento introdutor do progresso e da possibilidade de embranquecimento racial (Andrews 2007Andrews, George R. 2007. Uma transfusão de sangue melhor. O branqueamento, 1880-1930. In América Afro-Latina 1800-2000, organizado por George R. Andrews, 151-186. São Carlos: Editora UFSCar.), os alemães e seus descendentes transformam-se em uma “quinta coluna” infiltrada em território brasileiro, constituindo uma ameaça e sendo alvo de todo o tipo de suspeita e de hostilidade. Verifica-se, assim, uma desvalorização da influência cultural, “racial” e civilizadora do elemento germânico no país. Em síntese, o Estado Novo operou uma transformação nas categorias culturais associadas ao elemento germânico no Brasil, que foi bastante negativizado.

Em terceiro lugar, o Estado Novo e suas campanhas de nacionalização podem ser concebidos enquanto um acontecimento, na medida em que produziram uma reação por parte do grupo étnico alemão no Brasil e suas elites. Dito de outro modo, podemos verificar um conjunto de iniciativas de recomposição das elites do grupo étnico alemão pós-1945, constituídas em uma path dependence (Sewell 2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,) – isto é, por uma “dependência do caminho” – em relação às políticas de nacionalização do Estado Novo. Em última instância, o Estado Novo produziu uma transformação e reestruturação das práticas associadas à “germanidade” no Brasil; tais práticas, originadas pós-campanhas de nacionalização, são largamente influenciadas pelos eventos desenrolados durante o Estado Novo. Assim, constata-se uma “dependência do caminho”, isto é, a influência e o impacto de acontecimentos anteriores em toda uma sequência de ocorrências posteriores.

Por fim, é possível uma reflexão acerca das transformações “estruturais” produzidas pelo Estado Novo e pelas campanhas de nacionalização. Inspirado pela ideia de dualidade da estrutura de Anthony Giddens, Sewell (2017)Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes, argumenta que a estrutura é composta por esquemas ou regras (de ordem virtual) e por recursos (de existência material). Em tal perspectiva, as estruturas simultaneamente restringem e possibilitam a agência. No que tange ao Estado Novo e às campanhas de nacionalização, é possível argumentar que os “recursos” empregados na perseguição de alemães no Brasil produziram, como consequência, uma ressignificação nos “esquemas” vigentes na sociedade brasileira em relação ao elemento germânico, bem como nos “recursos” próprios ao grupo étnico alemão. A transformação nos esquemas associados aos alemães – isto é, sua negativização e desvalorização cultural – e, de modo correlato, a transformação nos seus recursos via perseguição política – afetando os recursos de poder, a projeção pública, a imprensa, as atividades culturais, isto é, as suas “práticas” em sentido amplo – implicam, após o Estado Novo, o surgimento de um conjunto de iniciativas de reorganização e de rearticulação do grupo étnico alemão visando à retomada de tais recursos. Tais iniciativas, por sua vez, transformam os esquemas culturais do próprio grupo étnico alemão, alterando os sentidos e as definições de “germanidade” e redefinindo as práticas e as expressões culturais que a integram. Essa é, em última instância, a transformação estrutural produzida pelo acontecimento do Estado Novo e das campanhas de nacionalização na história da germanidade no Brasil.

As estratégias de recomposição e de rearticulação das elites do grupo étnico alemão no Brasil pós-1945

A questão central a ser levada em conta em uma análise de um acontecimento é a mudança, isto é, a transformação das estruturas pela ação social. O desenvolvimento da Nova Sociologia Histórica – isto é, a “virada histórica” na Sociologia na década de 1960 – foi orientado, no seu substrato, por uma indagação sobre o problema da mudança social. Assumindo a mudança como o apanágio definidor e mais importante do acontecimento, cabe-nos o seguinte questionamento: qual a mudança produzida pelo Estado Novo em relação à “germanidade” no Brasil? Como um acontecimento tal como as campanhas de nacionalização produziu transformações nas práticas levadas a cabo pelo grupo étnico alemão, com destaque às suas elites?

A mudança mais óbvia produzida pelo Estado Novo foi aquela ocorrida no próprio intervalo histórico compreendido pelas campanhas de nacionalização – cujo período mais intenso abrangeu os anos de 1942 a 1945 –, isto é, o cerceamento e a supressão de toda e qualquer manifestação pública associada à “germanidade” no Brasil. Contudo, interessa-me aqui analisar outro conjunto de modificações históricas desenvolvidas no contexto das práticas sociais do grupo étnico alemão no Brasil, a saber, aquelas que começam a ser desenvolvidas imediatamente após o término do Estado Novo.6 6 Segundo Gertz (2013), verifica-se uma abundância de estudos sobre as colônias alemãs compreendendo a época do Estado Novo e da Segunda Guerra, e um número reduzido de estudos sobre a germanidade no período posterior. Este artigo se insere no esforço que visa suprir tal deficiência da bibliografia sobre o tema.

O Estado Novo produziu, ao seu término, um conjunto de práticas e iniciativas de recomposição7 7 O tema da recomposição dos grupos dirigentes é caro à Sociologia das Elites. Para uma análise nesses marcos, ver, por exemplo, Saint Martin (2008). Para um apanhado do desenvolvimento histórico e do estado da arte de tal corpo teórico-metodológico, ver Seidl (2013). Para apontamentos metodológicos sobre o estudo de elites, ver Perissinotto e Codato (2015). e de rearticulação das elites do grupo étnico alemão no Brasil. A análise sobre mudança proposta neste artigo, assim, enfocará as transformações decorrentes do Estado Novo para as práticas associadas à “germanidade” no Brasil, após 1945. Para empregarmos o vocabulário de Sewell (2017Sewell, William H. 2017. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes,, 255), os “acontecimentos históricos produzem mais acontecimentos”. Meu objetivo, neste artigo, é analisar detalhadamente tais acontecimentos e desdobramentos.

O que se verifica na década do pós-guerra nas áreas de colonização alemã no Brasil é todo um contexto de rearticulação, recomposição e reinserção das elites do grupo étnico alemão – elites inseridas nas esferas da política, da economia, da religião, da imprensa, da intelectualidade e da “cultura” de modo geral. Tais iniciativas representam um esforço de reorganização das práticas do grupo étnico alemão no Brasil, fortemente abaladas e colocadas em suspenso pelas campanhas de nacionalização levadas a cabo durante o governo Vargas. Algumas das expressões desse investimento de rearticulação das elites germânicas brasileiras são: o Comitê de Socorro à Europa Faminta (1946-1949); a reestruturação e a reorganização levada a cabo na Igreja Luterana (que culmina com a fundação da Federação Sinodal, em 1949); a reinserção de alemães na política verificada nas eleições de 1947; e a retomada das celebrações do “25 de Julho” por meio da reestruturação do Movimento 25 de Julho (a partir de 1947, atingindo seu ápice em 1953). Todo esse contexto histórico-social constitui os antecedentes que possibilitaram o surgimento e a fundação de entidades voltadas à promoção da cultura alemã no início da década de 1950, os Centros Culturais 25 de Julho, bem como a criação da Federação dos Centros Culturais 25 de Julho, em 1951. Essa Federação foi responsável pela fundação, em 1965, da Casa da Juventude. No seio de tal entidade, duas décadas mais tarde, veremos o surgimento da prática do folclore “alemão” no Brasil.8 8 A discussão desenvolvida no artigo baseia-se em uma triangulação entre três tipos de técnica de pesquisa: revisão de literatura histórica; entrevistas realizadas com “especialistas em folclore” – agentes envolvidos em alguns dos acontecimentos históricos analisados – que, dentre outros temas, visaram à obtenção de informações e indicações acerca da história do folclore “alemão” no Brasil; e análise documental, especialmente no que tange à Casa da Juventude e à Federação dos Centros Culturais 25 de Julho. Para uma listagem das fontes que embasaram a pesquisa, ver Voigt (2018b).

O Comitê de Socorro à Europa Faminta

Além das campanhas de nacionalização, temos um segundo acontecimento histórico da maior importância – também associado à Segunda Guerra Mundial – para a estruturação das práticas ligadas à “germanidade” no Brasil pós-1945: o desfecho militar e político da Segunda Guerra, com a destruição e a desolação da Alemanha derrotada e a ocupação do seu território por parte dos Aliados. É nesse contexto histórico que surgirá nas zonas de colonização alemã no Brasil um movimento conhecido como Socorro à Europa Faminta (SEF). Conforme argumenta Goodman (2015)Goodman, Glen S. 2015. The enduring politics of German-Brazilian ethnicity. German History 33 (3): 423-438. https://doi.org/10.1093/gerhis/ghv083.
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, essa é a primeira organização teuto-brasileira a emergir no período pós-guerra.

O Comitê de Socorro à Europa Faminta foi uma organização filantrópica, articulada em várias cidades das regiões Sul e Sudeste do país (Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro), visando o fornecimento de ajuda humanitária e material à Alemanha e à Áustria, à época em que tais países se encontravam destruídos no pós-guerra. De acordo com Fernandes (2005)Fernandes, Evandro. 2005. S.O.S Europa Faminta. Comitê de Socorro à Europa Faminta – SEF. Dissertação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, Brasil., o SEF atuou entre 1946 e 1949, envolvendo agentes destacados e representativos do grupo étnico alemão no Brasil. Segundo o levantamento do autor, foram enviadas pelo SEF dez remessas, compostas por gêneros de primeira necessidade – como alimentos, vestuário e medicamentos –, totalizando aproximadamente 4.200 toneladas de donativos (Fernandes 2005Fernandes, Evandro. 2005. S.O.S Europa Faminta. Comitê de Socorro à Europa Faminta – SEF. Dissertação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, Brasil.).

O Comitê de Socorro à Europa Faminta foi composto por membros amplamente reconhecidos nas comunidades alemãs. Compuseram a diretoria do comitê: os padres jesuítas Henrique Pauquet (diretor) e Balduino Rambo (secretário), os pastores luteranos Ernesto Schlieper (delegado do Sínodo Rio-Grandense) e Paulo Evers (delegado do Sínodo Missouri), o proprietário de gráfica Willy Siegmann (tesoureiro), o jornalista Friedel Emunds e J. Fernando Coutinho (Fernandes 2005Fernandes, Evandro. 2005. S.O.S Europa Faminta. Comitê de Socorro à Europa Faminta – SEF. Dissertação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, Brasil.).

De acordo com Fernandes (2005)Fernandes, Evandro. 2005. S.O.S Europa Faminta. Comitê de Socorro à Europa Faminta – SEF. Dissertação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, Brasil., uma elite no contexto do grupo étnico alemão foi a responsável pela organização do SEF, com membros oriundos de diversas esferas de atuação, isto é, agentes que integravam as elites intelectuais – lideranças eclesiásticas extremamente cultas e letradas –, as elites econômicas – empresários e comerciantes que atuaram no fornecimento de donativos –, e membros destacados da imprensa, jornalistas e donos de gráficas – atuando na divulgação da campanha.

Pode-se afirmar que membros das elites intelectual e econômica foram os principais responsáveis pela existência do SEF. São membros do que Fernandes (2005)Fernandes, Evandro. 2005. S.O.S Europa Faminta. Comitê de Socorro à Europa Faminta – SEF. Dissertação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, Brasil. define acertadamente como “elites do grupo étnico alemão”. Embora o trabalho de Fernandes (2005)Fernandes, Evandro. 2005. S.O.S Europa Faminta. Comitê de Socorro à Europa Faminta – SEF. Dissertação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, Brasil. não apresente, de um ponto de vista teórico-metodológico, uma reflexão aprofundada sobre a questão das “elites”, o estudo colige um conjunto abundante de informações empíricas sobre a questão, especialmente no que tange aos quadros dirigentes da esfera eclesiástica que tiveram atuação no SEF.

Os responsáveis pela articulação e direção do SEF eram, em grande maioria, agentes pertencentes ao clero católico e aos sínodos luteranos no Brasil. O SEF não possuía vinculação direta ou institucional com nenhuma igreja ou confissão religiosa – tratava-se de um movimento biconfessional –, embora a influência e a atuação de eclesiásticos na organização sejam notáveis: dos sete integrantes da primeira diretoria do SEF, quatro deles eram sacerdotes.

No que tange às elites econômicas, pode-se afirmar que um grande número de empresas teuto-brasileiras contribuiu com donativos ao SEF, dentre as quais podemos mencionar a Renner, a Varig, a Hering e a Hemmer. De acordo com Fernandes (2005)Fernandes, Evandro. 2005. S.O.S Europa Faminta. Comitê de Socorro à Europa Faminta – SEF. Dissertação em História, Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, Brasil., os primeiros donativos ao SEF na região de Porto Alegre foram realizados pela Firma Renner, de propriedade de Anton Jacob Renner. No contexto catarinense, a primeira contribuição significativa ao SEF foi realizada pelo industrial e político Marcos Konder, que ocupou os cargos de prefeito de Itajaí e deputado estadual.

Deste modo, pode-se afirmar que o movimento Socorro à Europa Faminta, consequência direta das campanhas de nacionalização do Estado Novo e promovido como uma reação às políticas de nacionalização direcionadas aos chamados “quistos étnicos”, representou a primeira tentativa de rearticulação das elites do grupo étnico alemão no Brasil após o fim da Segunda Guerra Mundial. Assim, o Comitê de Socorro à Europa Faminta representa um esforço de recomposição de elites, visando reaproximar membros destacados do grupo étnico alemão aos círculos do poder. Do mesmo modo, o SEF representa um esforço para a reconstrução da germanidade no Brasil – tratava-se, nos termos de Goodman (2015Goodman, Glen S. 2015. The enduring politics of German-Brazilian ethnicity. German History 33 (3): 423-438. https://doi.org/10.1093/gerhis/ghv083.
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, 431), de uma organização filantrópica que era, ao mesmo tempo, uma “organização étnica clandestina” –, reestabelecendo os laços culturais entre os imigrantes e descendentes de alemães no Brasil e a Alemanha, rompidos pela guerra e pelo Estado Novo.

A reestruturação da Igreja Luterana

Algumas das lideranças eclesiásticas com atuação de destaque no movimento Socorro à Europa Faminta e que, posteriormente, atuarão também na fundação e organização da Federação dos Centros Culturais 25 de Julho, tinham formação escolar e/ou atuação profissional como docentes no Instituto Pré-Teológico (IPT).

O IPT teve início em 1921 em Cachoeira do Sul, sendo transferido para São Leopoldo – e oficialmente fundado – em 1927. A partir de 1931, passa a funcionar com sede própria no Morro do Espelho, na cidade de São Leopoldo. A fundação do Instituto foi um processo capitaneado pelo pastor Hermann Gottlieb Dohms (1887-1956), presidente do Sínodo Rio-Grandense entre os anos de 1935 e 1956, que foi também o primeiro diretor do Instituto (Lehnen 1995Lehnen, Doraci. 1995. Escola Superior de Teologia da IECLB. In História dos cursos de teologia no Rio Grande do Sul, organizado por Zeno Hastenteufel, 46-76. Porto Alegre: Edipucrs.). Além do pastor Dohms, o pastor Ernesto Theophilo Schlieper (1909-1969) – delegado do Sínodo Rio-Grandense para o SEF – também era egresso e um dos membros do corpo docente do IPT.9 9 Dreher, Martin N. 1999. Ernesto Theophilo Schlieper, um pai da IECLB, acessado em 18 jan. 2017, http://www.luteranos.com.br/conteudo/ernesto-theophilo-schlieper-um-pai-da-ieclb. O pastor Schlieper assumiu a presidência da Federação Sinodal em 1958, após o falecimento de Hermann Dohms.

O IPT se constituía como uma escola propedêutica para futuros pastores – oferecendo os cursos “ginasial” e “colegial” –, preparando jovens que depois iriam realizar os estudos superiores em teologia. Em 1946, foi criado também o curso superior de teologia em São Leopoldo, sob o nome de Escola de Teologia (ou Faculdade de Teologia), atualmente denominada Escola Superior de Teologia (EST) (Lehnen 1995Lehnen, Doraci. 1995. Escola Superior de Teologia da IECLB. In História dos cursos de teologia no Rio Grande do Sul, organizado por Zeno Hastenteufel, 46-76. Porto Alegre: Edipucrs.; Gertz 2001Gertz, René E. 2001. Os luteranos no Brasil. Rev. de História Regional 6 (2): 9-33.).

Ao evocar o termo “Igreja Luterana”, refiro-me às comunidades, paróquias e sínodos ligados à confissão luterana no Brasil. A religião luterana no Brasil organiza-se através de organizações sinodais (agrupamento de comunidades e paróquias luteranas), em um modelo de estruturação bem menos hierárquico se comparado a outras instituições religiosas, notadamente a Igreja Católica. Uma das principais instituições fundadas com o objetivo de congregar os praticantes dessa confissão religiosa foi a Federação Sinodal, criada em 1949, e composta inicialmente por quatro Sínodos: o Sínodo Rio-Grandense – o mais influente –, o Sínodo Evangélico-Luterano de Santa Catarina, Paraná e outros Estados do Brasil, a Associação Evangélica de Comunidades de Santa Catarina e o Sínodo Brasil Central. Em 1968, a Federação Sinodal foi reestruturada como Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB). Desta forma, os Sínodos perdem centralidade administrativa, e a religião luterana no Brasil assume propriamente o caráter de igreja (Wachholz 2003Wachholz, Wilhelm. 2003. “IECLB”: caminhos de uma confessionalidade (diagnósticos e prognósticos). Estudos Teológicos 43 (1): 14-28.http://dx.doi.org/10.22351/et.v43i1.580.
http://dx.doi.org/10.22351/et.v43i1.580...
). A fundação da IECLB representa também o ápice do processo de institucionalização do luteranismo no Brasil, e sua relativa autonomização em relação ao luteranismo na Alemanha.

No que tange à Igreja Luterana, podemos apontar um processo de reestruturação e de reinserção social, característico da década do pós-guerra para o grupo étnico alemão no Brasil. Segundo Gertz (2013)Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo., pode-se afirmar que a parcela da população germânica no Brasil mais visada durante as campanhas de nacionalização foram os luteranos, especialmente aqueles com vinculação ao Sínodo Rio-Grandense. A Igreja Luterana e o Sínodo Rio-Grandense operavam uma reconhecida vinculação entre “igreja” e “germanidade”. Neste sentido, a supramencionada fundação da Escola de Teologia em 1946 visava eliminar o caráter pouco brasileiro do Sínodo, por meio da criação de um curso de teologia autóctone, que propiciasse formação teológica de pastores em território nacional – até então, os pastores luteranos eram alemães ou teuto-brasileiros que possuíam formação na Alemanha.

Esse período do luteranismo brasileiro é marcado por críticas ao isolamento da Igreja, que evitava estabelecer contato com as instituições oficiais brasileiras. Em reação a tal postura isolacionista, foi fundada em 1949 a Federação Sinodal, que visou congregar os sínodos luteranos brasileiros, e que representou a criação de uma entidade organizativa do luteranismo no Brasil, integrada à sociedade e à legislação nacional (Gertz 2013Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo.). Neste sentido, a Federação Sinodal pode ser compreendida como uma rearticulação e recomposição das elites eclesiásticas alemãs de confissão luterana, no período posterior à Segunda Guerra Mundial e às campanhas de nacionalização do Estado Novo, tendo em mente a superação do isolacionismo e da posição “marginal” ocupada pelo luteranismo no Brasil.

Os Centros Culturais 25 de Julho

Como consequência direta e imediata da rearticulação das elites do grupo étnico alemão principiada com o movimento de Socorro à Europa Faminta, foram fundados em vários municípios da região Sul e Sudeste os chamados Centros Culturais 25 de Julho. Há menções à existência de Centros Culturais 25 de Julho nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro – isto é, nos estados onde se verificou a atuação do SEF –, embora atualmente tais instituições subsistam essencialmente no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina.

A partir da articulação, dos contatos e das redes de sociabilidade criadas ou restabelecidas por meio do movimento Socorro à Europa Faminta – que se encerrou em 1949, quando a Alemanha e a Áustria não necessitavam mais de ajuda humanitária –, lideranças do grupo étnico alemão decidiram preservar, redirecionar e institucionalizar o conjunto de práticas sociais originadas no movimento SEF, por meio da criação de instituições direcionadas à preservação e à promoção da “herança” e da “cultura” alemã no Brasil. Os Centros Culturais 25 de Julho eram clubes para lazer e sociabilidade de elites locais, que promoviam atividades comunitárias, esportivas e culturais a seus associados – com destaque à promoção de bailes e festas, ao canto coral, ao teatro e, posteriormente, à dança folclórica.10 10 Inexistem estudos monográficos sobre o movimento dos Centros Culturais 25 de Julho e sua posterior federalização. As melhores referências sobre o tema são os trabalhos de Gertz (2013; 1987) e Weber (2013).

Podemos mencionar, de modo não exaustivo, a existência de Centros Culturais 25 de Julho nas cidades de: Porto Alegre (RS, fundado em 07/08/1951), Blumenau (SC, 01/05/1954), Santa Cruz do Sul (RS, 25/07/1986), Ijuí (RS, 09/05/1987), Erechim (RS, 25/07/1952), Porto União (SC, 1952), Maravilha (SC, 25/07/1961), Cerro Largo (RS, 1952), Frederico Westphalen (RS, 17/07/1991), Coronel de Barros (RS, 1983), Santa Rosa (RS, 05/04/1992), Arroio do Tigre (RS, ca. 1966), Panambi (RS, 1951), São Martinho (RS), Três Passos (RS), Taió (SC), Braço do Trombudo (SC), Augusto Pestana (RS), Teutônia (RS) e Cunha Porã (SC).

É interessante atentarmos para as datas de fundação dos Centros Culturais. Verificamos, grosso modo, dois períodos característicos e distintos: primeiro, um período que vai até a primeira metade da década de 1950 e, segundo, um período que compreende o ínterim de meados da década de 1980 até o início da década de 1990. Os Centros Culturais fundados na década de 1950, imediatamente após o fim do movimento SEF, são consequência direta do término dessa organização e do contexto mais amplo de reestruturação de práticas culturais levada a cabo por membros da elite do grupo étnico alemão, logo após o Estado Novo. Os Centros Culturais com período de fundação datado a partir dos anos de 1980, se inserem em um contexto que coincide com a época de criação das Oktoberfesten em vários municípios brasileiros – a primeira Oktoberfest ocorreu em Itapiranga em 1978 e a primeira Oktoberfest em Blumenau ocorreu em 1984 –, e ao período que marca a gênese da prática da dança folclórica “alemã” no Brasil – que atingiu seu ápice no início dos anos 1990 –, período caracterizado por um ímpeto generalizado de “reavivamento” e “resgate” da tradição e da herança alemã no Sul do Brasil.

O Movimento 25 de Julho e a Federação dos Centros Culturais 25 de Julho

A data “25 de Julho” foi escolhida para dar nome a tais Centros Culturais por dois motivos. Primeiro, a data é tida como marco histórico e simbólico da imigração alemã no Brasil, quando ocorreu a fixação dos primeiros colonos em São Leopoldo (RS), em 1824. Em segundo lugar, trata-se de um nome relativamente neutro. Os Centros Culturais foram fundados pouco tempo após o término do Estado Novo, em um contexto em que o grupo étnico alemão ainda vivenciava medo e receio em afirmar a germanidade, em decorrência das campanhas de nacionalização que, dentre outras medidas, impuseram a substituição de nomes de entidades que empregassem palavras da língua alemã ou fossem denominadas em homenagem a imigrantes ou descendentes de alemães.

No ano de 1924, foram promovidas em São Leopoldo articulações e iniciativas visando à organização de celebrações do “25 de Julho”, no contexto do centenário da imigração alemã (Weber 2013Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo.). Tais comemorações envolviam a promoção de festividades e eventos públicos, além da publicação de notas exaltando o “25 de Julho” na imprensa.

A promoção dos festejos do 25 de Julho e sua posterior institucionalização como feriado foram resultado da atuação da “Comissão Pró 25 de Julho” (Arbeitsgemeinschaft 25. Juli), presidida por Fritz Rotermund, e composta também por Leopoldo Oscar Muench, Willy Klohs e Benno Mentz (Weber 2013Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo.). A Comissão Pró 25 de Julho foi criada em 1934, visando à ampliação dos festejos do “25 de Julho” (Gertz 1987Gertz, René E. 1987. O fascismo no sul do Brasil: germanismo, nazismo, integralismo. Porto Alegre: Mercado Aberto.). Em 16 de maio de 1934, a Comissão Pró 25 de Julho encaminhou um memorando ao então interventor gaúcho Flores da Cunha, solicitando a instituição do dia 25 de Julho como feriado em âmbito estadual. A data foi institucionalizada como feriado em 23 de maio de 1934, sob o título de “Dia do Colono”.

Segundo Gertz (1987)Gertz, René E. 1987. O fascismo no sul do Brasil: germanismo, nazismo, integralismo. Porto Alegre: Mercado Aberto., a elevação do 25 de Julho a feriado estadual no Rio Grande do Sul deu grande impulso ao movimento; em 1935, ele foi decretado feriado também em Santa Catarina. De acordo com Gertz (1987)Gertz, René E. 1987. O fascismo no sul do Brasil: germanismo, nazismo, integralismo. Porto Alegre: Mercado Aberto. e Weber (2013Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo.), em 3 de maio de 1936, com o apoio do grupo brasileiro do NSDAP e da representação diplomática alemã, foi fundada uma entidade cultural denominada Federação 25 de Julho – substituindo e visando aperfeiçoar o trabalho da Comissão Pró 25 de Julho –, que tinha por objetivo ampliar os festejos do dia 25 de Julho para todo o território brasileiro, elevando a data a feriado nacional.

Nos meses seguintes, os trabalhos da Federação se direcionaram para a organização e a estruturação da entidade, embora tenham sido pouco efetivos, pois em 1938 já surgiram as primeiras medidas de nacionalização (Gertz 1987Gertz, René E. 1987. O fascismo no sul do Brasil: germanismo, nazismo, integralismo. Porto Alegre: Mercado Aberto.). De acordo com Gertz (2013)Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo., os festejos do dia 25 de Julho só voltarão a ser celebrados em 1947. Segundo Weber (2013Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo.), nesse ano voltou-se a constituir uma “comissão pró-festejos do 25 de julho”.

Deste modo, pode-se afirmar que a rearticulação do Movimento 25 de Julho e a retomada dos festejos associados à data são outra iniciativa de recomposição do grupo étnico alemão na década do pós-guerra. Além disso, verificou-se uma reinserção de teuto-brasileiros na política. Nas eleições de 1947 no Rio Grande do Sul, foram eleitos vários deputados estaduais de origem alemã (Gertz 2013Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo.; Weber 2013Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo.). Em 1947, o deputado Bruno Born volta a pronunciar um discurso na Assembleia Legislativa rememorando e enaltecendo o “25 de Julho”. Em 1949, na ocasião dos 125 anos da imigração alemã para o Rio Grande do Sul, já ocorrem festejos oficiais em São Leopoldo. Segundo Gertz (2013)Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo., os festejos de 25 de Julho atingiram seu ápice no ano de 1953.

A partir do início da década de 1950, o Movimento 25 de Julho se institucionalizará por meio da criação dos Centros Culturais 25 de Julho e, posteriormente, será federalizado por meio da Federação dos Centros Culturais 25 de Julho. Segundo Kleine (2008Kleine, Gerhard. 2008. A Associação Cultural Gramado – Casa da Juventude como pólo cultural no sul do Brasil e seu projeto de preservação do patrimônio histórico e cultural. Anais do 6º Encontro das Comunidades Alemãs da América Latina. Juiz de Fora. s.p.):

Em 1951 o senhor Fritz Rotermund, conhecido como o “Pai do Movimento 25 de Julho”, de São Leopoldo, o Major Leopoldo Petry, de Novo Hamburgo, Carlos Oscar Kortz, comerciante de Porto Alegre, o industrial portoalegrense Otto Renner, o deputado Bruno Born de Lajeado, o Dr. Wolfram Metzler de São Leopoldo, o historiador Dr. Klaus Becker de Canoas, o Padre Balduino Rambo, como representante da igreja católica, o professor Theo Kleine, representando a igreja evangélica, entre outros, reuniram-se para fundar um órgão congregador dos centros culturais, a “FEDERAÇÃO DOS CENTROS CULTURAIS 25 DE JULHO”, cujo primeiro presidente foi o sr. Leopoldo Petry e o Secretário Geral o prof. Theo Kleine, cargo que ocupou durante 37 anos.11 11 Segundo o que me foi alertado recentemente por René Gertz (a quem agradeço pela indicação), a secretaria-geral da entidade foi ocupada inicialmente por Fritz Rotermund, até o ano de 1955.

As principais atividades da Federação (re)fundada em 1951 eram:12 12 Para uma análise sobre as relações da Federação 25 de Julho com a representação diplomática alemã no Brasil e com o governo da Alemanha Ocidental, especialmente no que tange ao financiamento de atividades da instituição, ver o interessante trabalho de Goodman (2015). promover a intercomunicação entre os Centros 25 de Julho e, assim, “federalizá-los”; a disseminação de notícias e de informações através do jornal da entidade, o Mitteilungsblatt; e a elaboração de produtos culturais que contribuíssem para subsidiar as práticas culturais desenvolvidas nos Centros – tais como cartilhas de canto coral e a publicação de textos e literatura “teuto-brasileira”.13 13 Nos anos de 1990, a entidade transformou-se na Federação dos Centros de Cultura Alemã no Brasil (FECAB), tendo existência até os dias atuais.

O espaço de práticas do folclore “alemão” no Brasil como outcome processual

A discussão acerca das estratégias de recomposição das elites do grupo étnico alemão no Brasil teve como finalidade, originalmente, explicar a “sociogênese” (Bourdieu 1996Bourdieu, Pierre. 1996. As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário. São Paulo: Companhia das Letras.) de um espaço de práticas do folclore “alemão” no Brasil, que se constituiu como o objeto de um estudo monográfico elaborado por este autor (Voigt 2018bVoigt, Lucas. 2018b. O espaço de práticas do folclore “alemão” autêntico no Brasil: um estudo de sociologia da cultura e das elites. Dissertação em Sociologia Política, Universidade Federal de Santa Catarina, Ufsc, Florianópolis, Brasil.). Neste sentido, o surgimento de um espaço de práticas do folclore “alemão” no Brasil pode ser considerado como um dos outcomes do conjunto de iniciativas de rearticulação e de recomposição das elites do grupo étnico alemão no Brasil, desenroladas ao fim do Estado Novo.14 14 Como aponta Seyferth (2005), o “folclore alemão” possuía pouca importância antes das campanhas de nacionalização.

Abbott (2016)Abbott, Andrew. 2016. The idea of outcome. In Processual sociology, organizado por Andrew Abbott, 165-197. Chicago: The University of Chicago Press. desenvolve uma maquinaria conceitual para a análise dos outcomes da vida social. Na concepção do autor, o outcome – isto é, o “resultado”, o “desfecho” – pode ser concebido como a resultante de um processo ou de um conjunto de acontecimentos. Mais importante, na visão de Abbott, a sociologia deveria se desprender da centralidade do “outcome final” – isto é, do resultado último –, para enfocar os processos e as transformações. Ademais, o autor irá apontar um desinteresse pelo “passado” nas ciências sociais.

É com inspiração em tal crítica ao “presentismo” das ciências sociais que o presente trabalho atribuiu centralidade à narrativa dos acontecimentos históricos que culminaram com o surgimento do folclore “alemão” no Brasil. Com base em uma perspectiva histórico-processual, inspirada largamente nos trabalhos de Elias (1994; 1997), procurou-se analisar o processo histórico de desenvolvimento de um conjunto de práticas que, décadas mais tarde, terão como consequência o surgimento do folclore “alemão” no Brasil, nosso objeto último de análise. É nesse sentido que adquire centralidade a reconstituição dos processos de recomposição e rearticulação das elites do grupo étnico alemão, como narrativa causal do folclore “alemão” no Brasil.

O presente trabalho empregou uma “abordagem genética”, visando identificar uma relação de causalidade através da análise sistemática de processos generativos, de emergência ou de produção (Ermakoff 2019Ermakoff, Ivan. 2019. Causality and history: modes of causal investigation in Historical Social Sciences. Annual Review of Sociology 45: 581-606. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073117-041140.
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). Para tanto, foi realizado um process tracing (“rastreamento de processo”), técnica que visa à reconstituição de uma sequência temporal de ações e de processos que levam a uma mudança (Ermakoff 2019Ermakoff, Ivan. 2019. Causality and history: modes of causal investigation in Historical Social Sciences. Annual Review of Sociology 45: 581-606. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073117-041140.
https://doi.org/10.1146/annurev-soc-0731...
; Mahoney 2015Mahoney, James. 2015. Process tracing and historical explanation. Security Studies 24: 200-218. https://doi.org/10.1080/09636412.2015.1036610.
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). Associada a esse tipo de abordagem está, via de regra, a identificação de mecanismos causais, que podem ser compreendidos como uma “especificação analítica da efetuação da mudança” (Ermakoff 2019Ermakoff, Ivan. 2019. Causality and history: modes of causal investigation in Historical Social Sciences. Annual Review of Sociology 45: 581-606. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073117-041140.
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, 592, grifo meu). A literatura sociológica sobre os processos históricos tem enfocado os mecanismos causais, com vistas à realização de generalizações a partir da análise histórica, ímpeto que distinguiria os campos da sociologia e da história – essa última, centrada na análise de contextos empíricos singulares e específicos (Ermakoff 2019Ermakoff, Ivan. 2019. Causality and history: modes of causal investigation in Historical Social Sciences. Annual Review of Sociology 45: 581-606. https://doi.org/10.1146/annurev-soc-073117-041140.
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; Kirschbaum 2013Kirschbaum, Charles. 2013. Decisões entre pesquisas quali e quanti sob a perspectiva de mecanismos causais. Rev. Brasileira de Ciências Sociais 28 (82): 179-193. https://doi.org/10.1590/S0102-69092013000200011.
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).

O mecanismo causal, ainda que esteja desprovido de uma definição consensual por parte da literatura especializada, pode ser compreendido como o elemento que intervém e situa-se entre uma causa e um efeito, isto é, como um aspecto ou padrão específico – analítica e teoricamente definido – que afeta um determinado outcome (Mahoney 2015Mahoney, James. 2015. Process tracing and historical explanation. Security Studies 24: 200-218. https://doi.org/10.1080/09636412.2015.1036610.
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). No caso aqui em análise, através do rastreamento de processos generativos, é possível argumentar que o Estado Novo e suas campanhas de nacionalização foram responsáveis por causar um conjunto de iniciativas de rearticulação das elites alemãs e de promoção étnica; dentre elas, a última a ter surgimento é a prática do folclore “alemão” no Brasil. Neste sentido, podemos identificar o mecanismo causal que intervém entre as campanhas de nacionalização e os processos resultantes de recomposição de elites e de promoção de etnicidade em suas múltiplas formas e iniciativas, a saber, a perseguição étnica. A perseguição étnica, especificação analítica das campanhas de nacionalização (1938-1945) – isto é, uma abstração teórica de um processo empírico singular –, é o mecanismo causal que intervém entre, de um lado, o Estado Novo (1937-1945) e, de outro, as iniciativas de rearticulação das elites do grupo étnico alemão e de promoção da etnicidade germânica após 1945, que acabarão por produzir um espaço de práticas do folclore “alemão” no Brasil, a partir da década de 1980.15 15 Embora se constitua como um mecanismo causal contributivo à rearticulação de elites, à promoção étnica e ao surgimento de um espaço de práticas do folclore “alemão” no Brasil, a “perseguição étnica” não parece representar um mecanismo causal suficiente para a produção reativa de práticas de afirmação e promoção de etnicidade por parte de elites étnicas. Considere-se, por exemplo, o caso da perseguição étnica à elite imigrante alemã na Índia no contexto histórico da Primeira Guerra Mundial, analisado por Panayi (2017). Em função do número pouco expressivo de imigrantes alemães no país – constituído principalmente de missionários, não de colonos –, a perseguição ao grupo imigrante não causou uma reação em termos de promoção e reafirmação étnica por parte das elites imigrantes; ao contrário, a maior parte dos imigrantes acabou por retornar ao seu país de origem.

Tendo sido realizada a exposição dos acontecimentos que constituem as origens históricas mais longínquas do folclore “alemão”, meu objetivo na parte final deste artigo é completar a reconstituição da narrativa histórica do processo responsável pela causação do folclore “alemão” no Brasil. Dito de outro modo, procuro demonstrar de que forma as iniciativas de rearticulação do grupo étnico alemão no Brasil produzem um outcome processual tal como a institucionalização do espaço de práticas do folclore “alemão”.

Em 1961, no III Congresso da Federação dos Centros Culturais 25 de Julho, realizado em Curitiba, os representantes das diversas entidades que compunham a Federação constataram a necessidade de formação de quadros engajados com a promoção de práticas culturais no contexto dos Centros Culturais. Assim, resolve-se constituir um espaço próprio para a formação de “jovens lideranças”, uma “casa” que oferecesse formação cultural a lideranças germânicas.

Neste contexto tem surgimento o projeto da “Casa da Juventude”. Essa entidade é oficialmente fundada em 1965, sob a denominação de “Associação Cultural Gramado”, na cidade de Gramado (RS). O processo de obtenção de recursos para a construção da entidade – terreno para a sede, recursos materiais e econômicos para a sua construção, tanto no Brasil como na Alemanha – foi capitaneado por Theodor Kleine, secretário-geral da Federação (entre 1955-1988) e, posteriormente, o primeiro diretor da Casa da Juventude (entre 1965-1969).

Alguns meses após a inauguração da entidade, no início de 1966, começam a ser ministrados os primeiros cursos, voltados à formação de professores de alemão, monitoras de jardim de infância e de lideranças culturais. Atuavam como professores de tais cursos, dentre outros agentes, professores ligados ao Instituto Pré-Teológico e/ou à Igreja Luterana. O curso mais importante, em tal contexto, é o de Jugendleiter (“lideranças jovens”), coordenado inicialmente pelo alemão Elmar Götz. Tais cursos envolviam a formação em práticas como o canto coral, a música, o teatro e a língua alemã. Em tais cursos, ademais, a prática da dança folclórica começa a ser introduzida de modo incipiente.

Em 1983, a Casa da Juventude começa a promover cursos específicos de dança folclórica, respondendo a uma demanda dos Centros 25 de Julho, haja vista que tal prática começava a ganhar visibilidade e a despertar interesse nos círculos germanistas. Tais cursos eram constituídos no formato de “seminários”, em que um conjunto de folcloristas decodificava os registros folclóricos históricos de danças – as chamadas Tanzbeschreibungen –, com o intuito de performá-las, garantindo sua “autenticidade”. A “autenticidade” de uma dança folclórica germânica, na visão dóxica do espaço, reside precisamente na sua correspondência com registros históricos (Voigt 2018bVoigt, Lucas. 2018b. O espaço de práticas do folclore “alemão” autêntico no Brasil: um estudo de sociologia da cultura e das elites. Dissertação em Sociologia Política, Universidade Federal de Santa Catarina, Ufsc, Florianópolis, Brasil.).

No ano de 1989, Theodor Kleine deixa a secretaria da Federação 25 de Julho e, no mesmo ano, os cursos de dança da Casa da Juventude perdem o caráter de “seminário”, passando a ser ministrados por professores europeus. A formação sistemática em folclore “alemão” ofertada pela Casa da Juventude, iniciada em 1983 e reorientada em 1989, terá um papel crucial para a disseminação e a sistematização de tal prática no contexto brasileiro. Em 1991, é fundado um departamento especializado em danças na Casa da Juventude, que integrava 120 grupos folclóricos, processo capitaneado pelo folclorista Beno Heumann. Tal acontecimento pode ser definido como o marco temporal de surgimento de um “espaço de práticas do folclore ‘alemão’ autêntico no Brasil”.

Por “espaço de práticas” (Saint Martin 2002Saint Martin, Monique de. 2002. Coesão e diversificação: os descendentes da nobreza na França, no final do século XX. Mana 8 (2): 127-149. https://doi.org/10.1590/S0104-93132002000200005.
https://doi.org/10.1590/S0104-9313200200...
) do folclore “alemão”, refiro-me a um microcosmo social, estruturado e hierarquizado, relativamente autônomo, composto por um conjunto de agentes individuais e institucionais relacionados, engajados com a prática da dança e a utilização de indumentárias típicas, historicamente fidedignas. Nas bases, tal espaço é formado por “grupos folclóricos”, de atuação municipal, agremiações de dançarinos, dirigidos por um “coordenador”. Existem atualmente ao menos 200 entidades desse tipo no país, em sete estados da federação. Em âmbito nacional, como principal instituição do espaço, temos a Casa da Juventude, a mais expressiva entidade formadora e representativa de folcloristas no país. Entre os dois níveis, situam-se “associações regionais de folclore”, sete no total, que intermediam as relações entre a Casa da Juventude e os grupos folclóricos, ofertando formação em folclore em âmbito regional. Os agentes individuais que ocupam as principais posições no espaço formam uma elite cultural do folclore “alemão” no Brasil, responsável pelo trabalho de mediação cultural e de legitimação de tal prática no contexto brasileiro, com vistas à garantia da sua “autenticidade” (Voigt 2018aVoigt, Lucas. 2018a. A elite cultural do folclore “alemão” autêntico no Brasil: perfil social, mediação cultural, estratégias de legitimação. Anais do 42º Encontro Anual da Anpocs. Caxambu: Anpocs.).

Considerações finais

Pode-se atestar que as iniciativas de recomposição e de rearticulação das elites do grupo étnico alemão levadas a cabo após o término do Estado Novo, com expressões nas esferas da filantropia, da religião e da cultura – o Comitê de Socorro à Europa Faminta, a reestruturação da Igreja Luterana e a retomada do Movimento 25 de Julho –, que resultaram na fundação de entidades promotoras da germanidade e da cultura alemã – tais como os Centros Culturais 25 de Julho e a Federação 25 de Julho –, tiveram como consequência a criação de uma entidade que, cerca de duas décadas mais tarde, promoverá a prática de um folclore “alemão” no Brasil, formando especialistas em folclore e institucionalizando um espaço de práticas, composto por agentes engajados na promoção da germanidade e que, em última instância, desenvolvem práticas culturais voltadas ao estabelecimento de laços históricos, culturais e identitários com a Alemanha, promovendo a etnicidade “teuto-brasileira” (Voigt 2018cVoigt, Lucas. 2018c. O folclore “alemão” como prática identitária: o papel das danças e dos trajes folclóricos na construção de laços culturais e históricos com a Alemanha. In Migrações: perspectivas e avanços teórico-metodológicos, organizado por Isabel C. Arendt, Jorge L. Cunha, Rodrigo L. Santos, 924-940. São Leopoldo: Oikos.).

Dito de outro modo, a necessidade de formação de lideranças étnicas para a promoção da cultura germânica, postulada por entidades originadas do esforço de rearticulação das elites teuto-brasileiras pós-1945, terá como outcome, a partir da década de 1980, a formação de lideranças de folclore e a institucionalização de uma prática cultural de grande visibilidade no país – a dança folclórica –, constituída segundo um investimento que encara o folclore como símbolo da imigração alemã, de afirmação étnica e de promoção da germanidade, da cultura e da “herança” alemãs no Brasil.

Em última instância, com base na discussão apresentada no artigo, é possível estabelecer e sustentar a existência de uma relação de causalidade entre as campanhas de nacionalização desenroladas durante o Estado Novo na década de 1940 – com a “perseguição étnica” operando enquanto mecanismo causal – e as iniciativas de rearticulação das elites étnicas alemãs e de promoção da etnicidade germânica pós-1945, que terão como um dos outcomes o surgimento e a institucionalização de um espaço de práticas do folclore “alemão” no Brasil, a partir dos anos 1980.

Por fim, um último comentário, que visa oferecer indicações a estudos futuros. Como foi sinalizado, diferentemente do que pode ser constatado em relação aos demais processos históricos analisados no trabalho, a literatura específica carece de estudos que analisem de modo aprofundado os Centros Culturais 25 de Julho e a sua Federação. Assim, ainda está por ser realizado um estudo monográfico em profundidade a respeito dos Centros Culturais 25 de Julho e da Federação dos Centros Culturais 25 de Julho, que colija fontes tais como documentos e atas de fundação de tais entidades, bem como a sua divulgação na imprensa. Neste sentido, espera-se que as informações apresentadas neste trabalho acerca das principais características de tais instituições, sobre a história e os agentes envolvidos em sua fundação, possam contribuir como indicativos para o desenvolvimento de novos trabalhos.

  • 2
    O artigo consiste em uma reelaboração de algumas discussões apresentadas previamente na dissertação de mestrado do autor (Voigt 2018bVoigt, Lucas. 2018b. O espaço de práticas do folclore “alemão” autêntico no Brasil: um estudo de sociologia da cultura e das elites. Dissertação em Sociologia Política, Universidade Federal de Santa Catarina, Ufsc, Florianópolis, Brasil.). Uma versão preliminar foi apresentada no 19.º Congresso Brasileiro de Sociologia. A pesquisa contou com o apoio do CNPq, mediante a concessão de uma bolsa de mestrado.
  • 3
    Para um apanhado sobre a constituição e o desenvolvimento de tal campo teórico-metodológico, seu estado da arte e os principais temas e enfoques analíticos atuais, ver Calhoun (2003)Calhoun, Craig. 2003. Why Historical Sociology? In Handbook of Historical Sociology, organizado por Gerard Delanty e Engin F. Isin, 383-393. London: Sage. e Monsma, Salla e Teixeira (2018).
  • 4
    Tradução livre: “Os pontos de virada são mais bem compreendidos como mudanças curtas e consequenciais que redirecionam um processo. O conceito é inevitavelmente narrativo, pois um ponto de virada não pode ser concebido sem que uma nova realidade ou direção seja estabelecida, um julgamento que requer ao menos duas observações temporalmente separadas. Nem todas as mudanças repentinas são pontos de virada, mas apenas aquelas que são sucedidas por um período que evidencia um novo regime”.
  • 5
    Não há espaço para uma reconstituição histórica detalhada das campanhas de nacionalização. De todo o modo, o tema é bastante conhecido pela literatura pertinente. Ver, por exemplo, Geraldo (2009)Geraldo, Endrica. 2009. O combate contra os “quistos étnicos”: identidade, assimilação e política imigratória no Estado Novo. Locus 15 (1): 171-187. https://doi.org/10.34019/2594-8296.2009.v15.31799.
    https://doi.org/10.34019/2594-8296.2009....
    , Fáveri (2002)Fáveri, Marlene de. 2002. Memórias de uma (outra) guerra: cotidiano e medo durante a segunda guerra em Santa Catarina. Tese em História, Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, Florianópolis, Brasil. e Voigt (2017Voigt, Lucas. 2017. O devir e os sentidos das memórias de descendentes de alemães em Santa Catarina: um esboço de sociologia da memória. Porto Alegre: Multifoco - Luminária Academia., 139-147). Para uma análise das elites do Estado Novo, nos marcos da Sociologia das Elites, ver os importantes trabalhos de Adriano Codato sobre as elites políticas e burocráticas (Codato 2008Codato, Adriano N. 2008. Elites e instituições no Brasil: uma análise contextual do Estado Novo. Tese em Ciência Política, Universidade Estadual de Campinas, Unicamp, Campinas, Brasil.) e as elites intelectuais (Codato e Guandalini Jr. 2003Calhoun, Craig. 2003. Why Historical Sociology? In Handbook of Historical Sociology, organizado por Gerard Delanty e Engin F. Isin, 383-393. London: Sage.) estado-novistas. Ainda que o tema da política nacionalista do Estado Novo seja caro aos trabalhos do autor, ele se expressa através de uma reflexão sobre a centralização do poder e as dinâmicas entre Vargas e as oligarquias regionais, bem como acerca do papel do nacionalismo para a organização política do Estado. A questão da etnicidade e da nacionalização de grupos imigrantes escapa às reflexões do autor.
  • 6
    Segundo Gertz (2013)Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo., verifica-se uma abundância de estudos sobre as colônias alemãs compreendendo a época do Estado Novo e da Segunda Guerra, e um número reduzido de estudos sobre a germanidade no período posterior. Este artigo se insere no esforço que visa suprir tal deficiência da bibliografia sobre o tema.
  • 7
    O tema da recomposição dos grupos dirigentes é caro à Sociologia das Elites. Para uma análise nesses marcos, ver, por exemplo, Saint Martin (2008)Saint Martin, Monique de. 2008. Da reprodução à recomposição das elites: as elites administrativas, econômicas e políticas na França. Tomo 13: 43-73. https://doi.org/10.21669/tomo.v0i13.467.
    https://doi.org/10.21669/tomo.v0i13.467...
    . Para um apanhado do desenvolvimento histórico e do estado da arte de tal corpo teórico-metodológico, ver Seidl (2013)Seidl, Ernesto. 2013. Estudar os poderosos: a sociologia do poder e das elites. In As ciências sociais e os espaços da política no Brasil, organizado por Ernesto Seidl e Igor G. Grill, 179-226. Rio de Janeiro: Editora FGV.. Para apontamentos metodológicos sobre o estudo de elites, ver Perissinotto e Codato (2015Perissinotto, Renato e Adriano Codato, orgs. 2015. Como estudar elites. Curitiba: Ed. UFPR.).
  • 8
    A discussão desenvolvida no artigo baseia-se em uma triangulação entre três tipos de técnica de pesquisa: revisão de literatura histórica; entrevistas realizadas com “especialistas em folclore” – agentes envolvidos em alguns dos acontecimentos históricos analisados – que, dentre outros temas, visaram à obtenção de informações e indicações acerca da história do folclore “alemão” no Brasil; e análise documental, especialmente no que tange à Casa da Juventude e à Federação dos Centros Culturais 25 de Julho. Para uma listagem das fontes que embasaram a pesquisa, ver Voigt (2018b)Voigt, Lucas. 2018b. O espaço de práticas do folclore “alemão” autêntico no Brasil: um estudo de sociologia da cultura e das elites. Dissertação em Sociologia Política, Universidade Federal de Santa Catarina, Ufsc, Florianópolis, Brasil..
  • 9
    Dreher, Martin N. 1999. Ernesto Theophilo Schlieper, um pai da IECLB, acessado em 18 jan. 2017, http://www.luteranos.com.br/conteudo/ernesto-theophilo-schlieper-um-pai-da-ieclb.
  • 10
    Inexistem estudos monográficos sobre o movimento dos Centros Culturais 25 de Julho e sua posterior federalização. As melhores referências sobre o tema são os trabalhos de Gertz (2013Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo.; 1987Gertz, René E. 1987. O fascismo no sul do Brasil: germanismo, nazismo, integralismo. Porto Alegre: Mercado Aberto.) e Weber (2013Gertz, René E. 2013. A guerra que ainda não terminou: a população de origem alemã no Rio Grande do Sul após a Segunda Guerra Mundial. Anais do 2º Congresso Internacional de História Regional. Passo Fundo: Universidade de Passo Fundo.).
  • 11
    Segundo o que me foi alertado recentemente por René Gertz (a quem agradeço pela indicação), a secretaria-geral da entidade foi ocupada inicialmente por Fritz Rotermund, até o ano de 1955.
  • 12
    Para uma análise sobre as relações da Federação 25 de Julho com a representação diplomática alemã no Brasil e com o governo da Alemanha Ocidental, especialmente no que tange ao financiamento de atividades da instituição, ver o interessante trabalho de Goodman (2015)Goodman, Glen S. 2015. The enduring politics of German-Brazilian ethnicity. German History 33 (3): 423-438. https://doi.org/10.1093/gerhis/ghv083.
    https://doi.org/10.1093/gerhis/ghv083...
    .
  • 13
    Nos anos de 1990, a entidade transformou-se na Federação dos Centros de Cultura Alemã no Brasil (FECAB), tendo existência até os dias atuais.
  • 14
    Como aponta Seyferth (2005)Seyferth, Giralda. 2005. Imigração e etnicidade no Vale do Itajaí (SC). Anais do 10º Encontro de Geógrafos da América Latina. São Paulo: Universidade de São Paulo., o “folclore alemão” possuía pouca importância antes das campanhas de nacionalização.
  • 15
    Embora se constitua como um mecanismo causal contributivo à rearticulação de elites, à promoção étnica e ao surgimento de um espaço de práticas do folclore “alemão” no Brasil, a “perseguição étnica” não parece representar um mecanismo causal suficiente para a produção reativa de práticas de afirmação e promoção de etnicidade por parte de elites étnicas. Considere-se, por exemplo, o caso da perseguição étnica à elite imigrante alemã na Índia no contexto histórico da Primeira Guerra Mundial, analisado por Panayi (2017)Panayi, Panikos. 2017. The Germans in India: elite European migrants in the British Empire. Manchester: Manchester University Press.. Em função do número pouco expressivo de imigrantes alemães no país – constituído principalmente de missionários, não de colonos –, a perseguição ao grupo imigrante não causou uma reação em termos de promoção e reafirmação étnica por parte das elites imigrantes; ao contrário, a maior parte dos imigrantes acabou por retornar ao seu país de origem.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2021

Histórico

  • Recebido
    02 Dez 2019
  • Aceito
    11 Jun 2020
  • Publicado
    07 Maio 2021
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