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Retomando o futuro: a reconstrução de si por meio de grupos de apoio

Retaking the future: rebuilding the self through support groups

Reanudar el futuro: reconstruirse a través de grupos de apoyo

Resumo:

Neste artigo, por meio de uma pesquisa qualitativa envolvendo observações e entrevistas, analiso dois “grupos de apoio” na cidade do Rio de Janeiro que assistem a pessoas que tiveram um grave contato com a morte, direta ou indiretamente. Partindo de uma abordagem sociológica pragmática, proponho um modelo específico de reconexão de passado e futuro para pessoas em luto que almejam retomar suas narrativas biográficas para além da experiência de vitimização. Assim, exploro como os grupos de suporte analisados buscam “dessingularizar” as experiências pessoais de contato com a morte, promover a troca de “energias emocionais” (pela empatia) e ressignificar “lembranças dolorosas” no intuito de mostrar o futuro como uma temporalidade possível para os assistidos. Mostro como pode ser reconstruído um poder íntimo de ação visando efetivar uma definição de situação não ligada à experiência extrema, mas almejando recuperar a potência agêntica sobre a própria vida.

Palavras-chave:
Grupos de apoio; Futuro; Empatia; Memória; Sociologia pragmática

Abstract:

In this article, through a qualitative research involving observations and interviews, I analyze two “support groups” in the city of Rio de Janeiro assisting people who had a severe near contact with death, directly or indirectly. From a pragmatic sociological approach, I propose a specific model of reconnecting past and future for people in mourning and aiming to resume their biographical narratives beyond the experience of victimization. Hence, I explore how the support groups seek to “desingularize” personal experiences of near contact with death, promote the exchange of “emotional energies” (through empathy) and resignify “painful souvenirs” in order to show the future as a possible temporality for those assisted. I show how an intimate power of action can be reconstructed in order to effectuate a definition of situation not linked to extreme experiences but aiming to recover the agentic potency over their own lives.

Keywords:
Support groups; Future; Empathy; Memory; Pragmatic sociology

Resumen:

En este artículo, a través de una investigación cualitativa que incluye observaciones y entrevistas, analizo dos “grupos de apoyo” en la ciudad de Río de Janeiro que atienden a personas que tuvieron un contacto grave con la muerte, directa o indirectamente. Partiendo de un enfoque sociológico pragmático, propongo un modelo específico de reconexión de pasado y futuro para las personas en luto que pretenden retomar sus narrativas biográficas más allá de la experiencia de victimización. Así, exploro cómo buscan “desingularizar” experiencias personales de contacto con la muerte, promover el intercambio de “energías emocionales” (a través de la empatía) y resignificar “recuerdos dolorosos” para mostrar el futuro como una temporalidad posible a los asistidos. Muestro cómo se puede reconstruir un poder íntimo de acción para efectuar una definición de situación no ligada a la experiencia extrema, sino que desea recuperar la potencia agentica sobre la propria vida.

Palabras clave:
Grupos de apoyo; Futuro; Empatía; Memoria; Sociología pragmática

Introdução2 2 Este artigo é resultado de reflexões no âmbito de uma pesquisa de doutorado financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Código 001; e de uma pesquisa de pós-doutorado financiada pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (processo E-26/202.009/2020).

Roberta perdeu seu companheiro de três décadas em um atropelamento por motocicletas na Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro. Seu luto e sua dor eram compostos, entre outros elementos, por lembranças pujantes de seu ente querido vivo e pela sensação corrente de que foi brutalmente arrancado de sua vida. Tendo decidido frequentar um grupo de apoio, ela foi estimulada pelos psicólogos do dispositivo escolhido a conversar com pessoas enlutadas por motivos semelhantes (também por ele assistidas) e a lembrar dos “momentos de alegria” com seu companheiro. O intuito seria tornar o presente menos marcado pelo sofrimento e pelas lembranças do acidente e a abrir para novas possibilidades de futuro.3 3 A fim de preservar as identidades dos pesquisados, utilizo apenas nomes fictícios.

Neste artigo, examino as vivências de pessoas assistidas em dois grupos de apoio, o Núcleo de apoio à vítima de trânsito do Departamento de Trânsito do Estado do Rio de Janeiro (Navi-Detran) e o Renascer, Servir e Proteger, que funciona em uma unidade da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (Pmerj). Em ambos, encontram-se pessoas com uma experiência em comum: todas vivenciaram situações de contato concreto com a morte (Talone 2020aTalone, Vittorio. 2020a. A força da memória: lembranças de situações de ferimento, tensão e morte. Tese em Sociologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.) – direta ou indiretamente – causado por terceiros, seja no âmbito daquilo comumente representado como “violência urbana”, envolvendo signos como trocas de tiro e balas perdidas (Machado da Silva 1993Machado da Silva, Luiz Antônio. 1993. Violência urbana: representação de uma ordem social. In Brasil urbano: cenário da ordem e da desordem, organizado por Elimar Pinheiro Nascimento e Irlys Barreira, 131-142. Rio de Janeiro: Notrya.; Misse 1999Misse, Michel. 1999. Malandros, marginais e vagabundos: a acumulação social da violência no Rio de Janeiro. Tese Sociologia, Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro.; Porto 2006Porto, Maria S. G. 2006. Crenças, valores e representações sociais da violência. Sociologias 16: 250-273. https://doi.org/10.1590/S1517-45222006000200010.
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; Grillo e Martins, 2020Grillo, Carolina e Luana Martins. 2020. Indo até o problema: roubo e circulação na cidade do Rio de Janeiro. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito Controle Social. 13 (3): 565-590. https://doi.org/10.17648/dilemas.v13n3.32078.
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), ou da chamada “violência no trânsito” (Russo 2012Russo, Maurício B. 2012. Violência no trânsito à moda brasileira: insegurança, letalidade e impunidade. Tese em Sociologia, Universidade Federal do Ceará.), englobando atropelamentos e colisões de meios de transporte nas vias urbanas.

O trabalho desses grupos de apoio4 4 Para um breve histórico sobre paradigmas de reparação de infortúnios e injustiças, ver Barbot e Dodier (2015). é voltado para aqueles que enfrentam/enfrentaram os “piores momentos de suas vidas”, seja: (1) por perderem entes queridos que amavam e davam sentido a suas existências (como colocam muitas participantes do Navi); (2) por terem seus corpos e mentes alterados de forma abrupta (como no caso de ex-policiais e civis tornados paraplégicos ou tetraplégicos após algum confronto armado ou acidente), forçando-os a se repensar – e também suas rotinas e a relação com ambientes e pessoas.

Nos dois grupos são empreendidos esforços coletivos. O Navi promove reuniões entre as assistidas e atividades auxiliando o que chamo de projeção de ações futuras “de superação”, envolvendo um trabalho sobre a memória (lembranças recorrentes dos acidentes) e seus efeitos vigentes (como a depressão). No Renascer, buscam-se mudanças por meio de conversas em grupo e pela prática de esportes no espaço do projeto, apresentando aos assistidos uma gama de atividades e desafios a seu alcance. O trabalho empírico nos dois grupos foi efetivado por uma análise simétrica (Latour e Woolgar 1997Latour, Bruno e Steve Woolgar. 1997. A vida de laboratório. A produção dos fatos científicos. Rio de Janeiro: Relume Dumará., 23-24): para além da comparação, esse tipo de análise coloca os mundos empíricos dos dois grupos sob análise a partir do mesmo ferramental analítico visando à compreensão da fenomenologia comum observada a partir deles.5 5 O trabalho de campo consistiu em visitas aos dois grupos entre abril e dezembro de 2017, e em entrevistas ao longo do mesmo período, e realizadas até março de 2018. Realizei observação participante, estabelecendo conversas também com os psicólogos/coordenadores, e “entrevistas compreensivas” (Kauffman 2013) com assistidos/as.

Parto de uma abordagem sociológica pragmática (Boltanski e Thévenot 1991 [2020]Boltanski, Luc e Laurent Thévenot. 2020 [1991]. A justificação: sobre as economias da grandeza. Rio de Janeiro: Editora UFRJ.; Barthes et al. 2016Barthes, Yannick, Catherine Rémy, Danny Trom, Dominique Linhardt, Damien de Blic, Jean-Philippe Heurtin, Éric Lagneau, Cédric Moreau de Bellaing e Cyril Lemieux. 2016. Sociologia pragmática: guia do usuário. Sociologias 41: 84-129. https://doi.org/10.1590/15174522-018004104.
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), influenciado também pela filosofia pragmatista. Dessa forma, levo a sério a constatação dos efeitos (Peirce 1998Peirce, Charles S. 1998. The essential Peirce, vol. 2. Indianapolis: Indiana University Press.; James 1907James, William. 1907. Pragmatism: a new name for some old ways of thinking. Cambridge: Harvard University.) diversos gerados pelas situações de ferimento/de morte e pelas situações de ressignificação da vida/construção de possibilidades de futuro como concebidos pelos atores estudados.6 6 A análise das situações é uma forma privilegiada de entender o social, pois nelas ele propriamente se faz (Thomas 1923; Werneck 2022). Werneck (2022) destaca a situação como “uma circunscrição no espaço e no tempo na qual se pode reconhecer que algo definido está acontecendo ali, [em que] se fundem o decurso de uma ação [...], os envolvidos tanto em sua operacionalização quanto em sua avaliação/interpelação de sentido [...] e elementos do mundo ali capturados e relacionados a esses processos e em relação com essas pessoas”. As situações de ferimento e morte tanto foram acessadas e analisadas reconstitutivamente (pelas narrativas oferecidas), como as pensei em articulação com situações de “retomada do futuro” nos grupos de apoio: os efeitos do ferimento/da morte são pensados e reavaliados também segundo os efeitos do apoio nas projeções das pessoas. Opero igualmente uma sociologia reflexiva do self e de suas transformações (Corrêa e Talone 2021Corrêa, Diogo e Vittorio Talone. 2021. An outline of a pragmatist theory on reflexivity: exploring the pathways of the concept through social theory. Sociedade e Estado 36 (2): 407-431. https://doi.org/10.1590/s0102-6992-202136020003.
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): as pessoas buscam atenuar “definições de situação” marcadas pelo sofrimento e reencontrar uma potência projetiva da definição de si e de sua vida.7 7 Em uma breve definição próxima daquela com que trabalho, pensada na herança de contribuições pragmatistas, Werneck e Porto (2021, 565) escrevem: “o self é uma unidade de individuação sígnica formada por outras unidades sígnicas (o eu – sua dimensão mais íntima e constante, referente aos comportamentos assumidos e criados pelo indivíduo diante de reações sociais formalizadas – e o mim – a mais variante, já que concerne à reprodução das reações socialmente construídas e às perspectivas aprendidas sobre si mesmo com os outros significativos, o que ocorre em conformidade com as mais diversas situações nas quais os indivíduos se encontram no decorrer de suas trajetórias). Partindo dessa premissa, tomamos os diferentes momentos e contextos da vida dos atores como configurações produtoras, muitas vezes, de selves distintos”.

Analiso a colocação em comum das experiências de contato com a morte, diretas ou indiretas, mostrando o trabalho de dessingularização promovido por esses grupos por meio da empatia (Clark 1997Clark, Candace. 1997. Misery and company. Sympathy in everyday life. Chicago: The University of Chicago Press.) entre os próprios assistidos. Busca-se fazer com que esses aprendam a redirecionar sensações “negativas”, canalizando a energia em ações de conscientização no trânsito ou práticas de esporte. A empatia se reflete na “energia emocional individual” (Collins 2004Collins, Randall. 2004. Interaction ritual chains. Princeton: Princeton University Press., 38), alterando a perspectiva de futuro da pessoa.8 8 Collins (2004, 38) explora como energias emocionais são transmitidas pelas interações face-a-face: “O ‘tipo de eletricidade’ que Durkheim metaforicamente atribui ao grupo em seu estado de alto excitamento é armazenado em [espécies de] baterias [...]. A participação no ritual dá ao indivíduo uma espécie especial de energia”. A mudança que um grupo busca e a emergência da energia emocional é um sentimento de convicção e potência de agir, sendo uma energia “moralmente transbordada”, ou seja, ela teria um efeito motivante intenso sobre o indivíduo.

Francis Chateauraynaud (2011)Chateauraynaud, Francis. 2011. Argumenter dans un champ de forces: essai de balistique sociologique. Paris: Pétra. propõe levarmos a sério os processos pelos quais são elaborados cenários e visões do futuro, compreendendo a mobilização de histórias, de configurações atuais e a descrição de “ângulos de futuro” que se abrem ou se fecham. Proponho mapear a confecção de um futuro segundo os projetos de reengajamento de si. Pessoas em luto podem se sentir presas à experiência de morte ou de ferimento vivenciada, dando forma à sensação de uma temporalidade circular. O objetivo dos grupos é romper com esse ciclo, possibilitando a própria ideia de se ter um futuro ou um bom futuro. Dessa forma, o ponto central do artigo é pensar um modelo específico de estabelecer novas conexões entre passado e futuro para pessoas em luto. Mostro como é reconstruído um poder íntimo de ação visando efetivar uma definição de situação não ligada à experiência extrema (Pollak 1990Pollak, Michael. 1990. L’experience concentracinnaire: essai sur le maintien de l’identité sociale. Paris: Métailié.; Talone 2019Talone, Vittorio. 2019. A memória actancial: as consequências de situações de ferimento, tensão e morte. In Sociologia, crítica e pragmatismo: diálogos entre França e Brasil, organizado por Rodrigo Cantu, Sayonara Leal, Diogo Corrêa e Laura Chartain, 387-492. Campinas: Pontes., 2020aTalone, Vittorio. 2020a. A força da memória: lembranças de situações de ferimento, tensão e morte. Tese em Sociologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.), mas almejando recuperar a potência de agir sobre a própria vida.

Divido o texto em três dimensões dispositivas,9 9 Falo em dispositivo no sentido daquilo que visa dar uma base às pessoas para sustentar suas ações, “representando um instrumento para o melhor empreendimento possível da autonomia dos atores” (Peeters e Charlier 1999, 18). Eles se definem em uma função de suporte, de baliza, de quadro organizador da ação, colocando em ordem a ação do indivíduo. no sentido de serem momentos em que os dispositivos destacados a seguir comparecem como elementos fortes da situação: (1) o estar em comum proporcionado pelos grupos a partir da dessingularização da experiência; (2) a empatia e a “troca” de energias e emoções; e (3) a ressignificação das lembranças e a proposição de um futuro possível. Essa divisão visa destacar organizadamente os elementos substantivos da “construção de uma nova pessoa” por meio dos âmbitos (intimamente imbricados) social-prático, afetivo e temporal.

Estar em comum: a dessingularização da experiência

No momento de realização da pesquisa, o Navi era formado por cinco psicólogos: quatro estagiários e uma supervisora, essa também coordenadora do grupo. As vítimas indiretas são maioria, consistindo principalmente em mães que perderam filhos(as). As mães, como se denominam, e outros participantes relatam lidar com a perda de uma parte de si mesmos no falecimento de um ente querido, tendo de “reaprender” a viver, ressignificando suas experiências.

“Ressignificar” é um termo muito mobilizado. Diz respeito a alcançar uma mudança na forma de pensar (no sentido de “definir” para si) e se sentir em relação à experiência de morte, possibilitando o auxílio a outras pessoas em luto e o engajamento em ações de conscientização/educação no trânsito, entre outras possibilidades. A atuação de psicólogos e de vítimas em condições de oferecer apoio10 10 Pessoas cujas perdas são mais longevas, tendo já elaborado substantivamente sobre a morte (o que não significa uma aceitação ou menor sofrimento em relação a ela), apresentando maior “força” para auxiliar, conversar e prestar apoio a outros participantes. visaria dar um suporte pontual e/ou contínuo àqueles que vivenciaram situações de ferimento/perda recentes.

O projeto Renascer11 11 Coordenado por uma subtenente da Pmerj auxiliada por outros PMs na ativa. Todos são praças, categoria englobando os cargos mais baixos da hierarquia na instituição. visa atender a PMs e a não policiais que, no decorrer de suas vidas, sofreram algum incidente resultando em uma mudança da estrutura de seus corpos. Em sua maioria, são pessoas alvejadas por tiros em confrontos no exercício de uma profissão (PMs e seguranças) ou atingidas por balas perdidas na cidade (civis). Os participantes do grupo relatam a dificuldade em aceitar/entender o próprio corpo em suas mudanças imediatamente após o incidente, também tendo de reformular como vivem suas vidas cotidianas e as atividades exercidas. A “reabilitação” é operada pelo esporte e pelas rodas de conversa. O objetivo é promover a resiliência: mostrar à pessoa que ela ainda conta com um grande leque de possibilidades de ação na vida e força para buscá-las, levando-a a se engajar em diferentes atividades no grupo e, com isso, passar a ajudar a outros.

O “estar junto” e o partilhar experiências em comum dizem respeito à colocação de narrativas/de biografias marcadas pelo contato com a morte ao escrutínio da definição do coletivo (Pollak 1990Pollak, Michael. 1990. L’experience concentracinnaire: essai sur le maintien de l’identité sociale. Paris: Métailié.). O coletivo (conjunto de psicólogos/coordenadores e de assistidos) passa a ser um importante actante12 12 Aquele ou aquilo que pratica ou sofre um ato, seres ou coisas a participar de um processo (Greimas; Courtés 1979), fazendo diferença na narrativa. Trata-se de um ente (podendo ser uma pessoa, uma ideia, grupo(s), coisa(s), entre outros elementos) dotado da capacidade de influenciar as ações de outros. Assim, diz respeito à potencialidade de um ser não simplesmente em termos de decisão (e, nesse sentido, de agência), mas de influência no quadro situacional. É algo a demonstrar efetividade (Werneck 2012). na relação, tendo agência sobre as pessoas e influindo em suas narrativas – e.g., classificando cuidadosamente certas lembranças como saudáveis/positivas ou que devam ser reelaboradas ou evitadas.

Joana, uma assistida que perdeu a sua filha em um atropelamento em frente ao local de seu trabalho, em 2011, sendo, na época da pesquisa, uma das mães mais ativas no grupo, coloca:

[Tem] pessoas que falam assim, ó: “Ué, mas o grupo? Mas você já tem seis anos e [ainda] frequenta o grupo?”. Frequento. Por quê? Porque eu tô recebendo, acolhendo outras mães também, eu tô ajudando o Navi. O Navi ele sabe a parte psicológica, né? Eu sei na pele, na prática, né? [..]) [Mães recém-chegadas] veem as histórias, olham para mim, veem: “Nossa, como ela tá bem”. [...] E se identificam. E de repente toca meu telefone, é uma pessoa: “[Joana], é a fulana. Se lembra de mim? Ah, como foi essa fase assim com você? Como que é isso quando...”. Então, é bom porque existe uma troca, né, de experiências. (Joana, com. pess., maio. 2017).

Melissa (cadeirante assistida no projeto Renascer) coloca que frequentar as atividades do grupo a fez perceber “não ser a única” passando pelos problemas enfrentados devido a seu acidente. Deixou de lado a ideia de que um “castigo” ocorreu com ela. Os grupos atuam pela dessingularização das experiências por meio da ressonância entre seus integrantes. Eles conduzem à “generalidade do problema” e do sofrimento (Boltanski 2000Boltanski, Luc. 2000. El amor y la justicia como competencias: tres ensayos de sociología de la acción. Madrid: Amorrortu.) pelas rodas de conversas e reuniões, normalmente as direcionando para ações de conscientização e de apoio. Essas dinâmicas exploram o potencial dos selves pela sintonia e compartilhamento de afetos (Rosa 2017Rosa, Hartmut. 2017. Dynamic stabilization, the Triple A. Approach to the good life, and the resonance conception. Questions de communication 31: 437-456.). Esse estímulo, pelos coordenadores e assistidos de longa data, de entrar em ressonância com outrem visa a uma mudança “positiva”, como a transformação de si pela alteração da expectativa sobre o futuro.

Nos grupos, é delineado um “mal a ser combatido” (Boltanski e Claverie 2007Boltanski, Luc e Elisabeth Claverie. 2007. Du monde social en tant que scène d’un procès. In Affaires, scandales et grandes causes: de Socrate à Pinochet, organizado por Nicolas Offenstadt e Stéphane Van Damme, 395-452. Paris: Stock). Esse “mal” se traduz nas “violências” (urbana e/ou de trânsito) rememoradas obstruindo o prosseguir de muitas vidas e nos desrespeitos prejudicando a saúde emocional e física de diversas pessoas. Mas ele é demonstrado como reparável (Boltanski e Claverie 2007Boltanski, Luc e Elisabeth Claverie. 2007. Du monde social en tant que scène d’un procès. In Affaires, scandales et grandes causes: de Socrate à Pinochet, organizado por Nicolas Offenstadt e Stéphane Van Damme, 395-452. Paris: Stock), ou seja, são identificadas as razões da violação, os responsáveis por ela e suas vítimas, e são definidas formas para impedi-la de se repetir (ações de conscientização, por exemplo). Destaco essa construção devido às afinidades das ações do Navi e do Renascer: para serem eficazes, buscam constituir uma grande força composta pela convergência de forças individuais – uma mobilização (seja pela prática de esportes ou pelas ações de educação no trânsito, por exemplo).13 13 Tais ações envolvem: apresentação dos atletas paraolímpicos em universidades (Renascer); conversas abertas na mídia sobre as dificuldades enfrentadas (Navi e Renascer); distribuição de panfletos sobre segurança no trânsito pelas assistidas no Dia das Mães, com fotos de seus entes falecidos em suas camisas (Navi); aulas de educação no trânsito para motoristas infratores (Navi) etc. A reunião de diferentes pessoas associadas ao mesmo tipo de experiência extrema, por suas composições de memória e pela maneira como definem situações tensionadas “negativamente” pelas reminiscências, é essencial à causa. O engajamento é potencializado pelo compartilhamento de uma mesma indignação (Boltanski 2000Boltanski, Luc. 2000. El amor y la justicia como competencias: tres ensayos de sociología de la acción. Madrid: Amorrortu.; Thévenot 2006Thévenot, Laurent. 2006. L’action au pluriel: Sociologie des regimes d’engagement. Paris: Découverte.).

Esses núcleos aproximam-se dos “grupos circunstanciais” (Vilain e Lemieux 1998Vilain, Jean-Paul e Cyril Lemieux. 1998. La mobilisation des victimes d’accidents collectifs. Vers la notion de “groupe circonstanciel”. Politix 11 (44): 135-160. https://doi.org/10.3406/polix.1998.1764.
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). Neles, o vínculo não se baseia na pré-existência de relações, mas na constituição de solidariedades geradas no próprio engajamento devido às experiências de sofrimento.14 14 Os autores propõem o conceito tendo em mente pessoas que estiveram envolvidas em um mesmo evento, resultando em ações judiciais coletivas. Portanto, é diferente dos casos aqui apresentados, em que os integrantes dos núcleos experienciaram um mesmo tipo de situação, mas em espaço e tempo distintos. Redefinições de self podem acontecer pelo envolvimento no coletivo e na sua continuidade, que ganha maior relevância em relação a demais filiações dos assistidos.

A psicóloga criadora do Navi, em 2003, que três anos antes perdera sua mãe e sua filha única em um mesmo acidente de trânsito, diz que a existência a partir de experiências negativas deve estar orientada à “luta” por uma causa (uma pauta que contemple a outros). Assim, a energia da dor e a potência da situação de morte vivenciada devem ser convertidas em ações, seja de suporte cotidiano às vítimas ou judiciais:

[Você] pode escolher, entendeu? Continuar chorando a vida inteira ou você pode transformar o seu sofrimento em ação, entendeu? Chegar em algum lugar e não por você. Mais do que você, [para] ajudar a humanidade. Porque, a partir do momento que esses movimentos são criados, né, é um ponto importante não para mim somente, mas para também ensinar o caminho a essas pessoas. Então é sair realmente dessa situação para que você possa se fortalecer através de uma luta, através de uma pauta. (Criadora do Navi, com. pess., mar. 2018).

No Renascer, a “luta” está mais voltada à prática de esportes, ao afastamento da depressão e do suicídio, ao combate contra os desrespeitos diversos enfrentados no dia a dia e, em geral, à acessibilidade física nos ambientes. Como a coordenadora explica sobre o grupo:

Tem gente que vem para cá e nem gosta de fazer esporte, não é o estilo da pessoa. Mas gosta é da conversa, da troca de experiência, de jogar papo fora, ver os colegas conseguirem algo. [...] Muda as perspectivas [da pessoa], o sentido que ela dá à vida. É a promoção de resiliência. É dar um futuro a essas pessoas. Isso que fazemos no grupo, pelo esporte e pelas conversas. [...] [É] para os dois lados. Aquele que tá mais experiente se sente bem ajudando o outro a encontrar a luz no fim do túnel. E aquele que está chegando adora encontrar uma luz no fim do túnel. (Coordenadora do Renascer, com. pess., 2º semestre de 2017).

Os assistidos atribuem novas motivações a suas vidas. É como produto das práticas e dos resultados nos esportes que ocorrem as ações para chamar atenção a suas causas: civis e militares feridos na “violência urbana” (um “mal”) e “esquecidos pela sociedade”, necessitando enormemente de suporte físico, financeiro e psicológico. Tal qual tem lugar no Navi, o contato com membros mais “fortalecidos” e as rodas de conversa visam transmutar as energias emocionais “negativas” (traduzidas, e.g., na apatia, no sofrimento incapacitante para atividades diárias, na atmosfera de medo e de ansiedade no deslocamento pela cidade) em força e resiliência por uma nova vida.

Do âmbito afetivo

Empatia

As pessoas não apenas identificam semelhanças entre os tipos de experiências, como também localizam tipificações em relação a outras pessoas e contextos (Emirbayer e Mische 1998Emirbayer, Mustafa e Ann Mische. 1998. What is agency? American Journal of Sociology 103 (4): 962-1023. https://doi.org/10.1086/231294.
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), conectando-se a eles pelas sensações. A empatia – como abordada por Schmitt e Clark (2006)Schmitt, Christopher e Candace Clark. 2006. Sympathy. In Handbook of the Sociology of Emotions, organizado por Jan E. Stets e Jonathan H. Turner, 467-492. Boston: Springer. – é um dos dispositivos dando forma ao social. Ela envolve ao menos o simpatizante (aqueles a mais tempo no grupo), que se preocupa com um “outro”, e o simpatizado (os recém-chegados e em “dor aguda”). Há uma série de compreensões e significados trocados entre eles. A empatia estabiliza e reforça relações sociais construídas no grupo, o que tem um significativo valor social e moral para os assistidos, que passam a partilhar deles – como combater um “mal”.

Três elementos seriam centrais (Schmitt e Clark 2006Schmitt, Christopher e Candace Clark. 2006. Sympathy. In Handbook of the Sociology of Emotions, organizado por Jan E. Stets e Jonathan H. Turner, 467-492. Boston: Springer.): a empatia como colocação de si no lugar do outro, compreendendo seu problema e tomando atitudes para ajudá-lo objetivamente; a experimentação de emoções similares às daquele em apuros; e a mobilização de ações e comportamentos adequados/discerníveis transmitindo preocupação com o sofrimento alheio. Assim se efetivam ações “empáticas”.

Para Roberta, por exemplo, encontrar-se com outras assistidas e partilhar experiências com elas não diz respeito apenas a comunicar tristezas, mas a buscar formas de se sentir positivamente:

É muito bom porque, nós que já estamos lá há algum tempo, podemos passar para [as recém-chegadas] o aprendizado que nós tivemos e o aprendizado que nós temos até hoje. Mostrar a elas que aquelas reuniões [...] não é reunião só para você ficar chorando, ficar recordando, ficar se lamentando, não. Você também passa boas experiências para ela. E você passa também um pouco de carinho, você passa um pouco de apoio para elas, entendeu? [..] [É] bom que nós estamos um pouco mais fortalecidas que elas. Aí, nós podemos passar um pouco mais de carinho, de atenção, de força. (Roberta, com. pess., jun. 2017).

Fred – um ex-PM e, agora, atleta medalhista em uma modalidade paraolímpica – explica que o Renascer e os atletas mais consolidados podem proporcionar atividades não imaginadas como possíveis por muitos cadeirantes. Em uma roda de conversas que presenciei, um rapaz que fazia exercícios contou ter sido chamado por uma repórter para assistir a um jogo de futebol no Maracanã. A intenção da profissional era acompanhá-lo em sua jornada até o estádio como cadeirante. Alguns acharam isso uma “besteira”, pois ela não seria uma pessoa interessada no Renascer e em de fato prestar suporte; outros – como o próprio Fred – o apoiaram a participar da reportagem, pois seria filmado, frequentaria o camarote do estádio e se divertiria. O cuidado e a compreensão com seu colega teriam o intuito de o deixar aberto para novas atividades, potencialmente deixando-o aberto para oportunidades – se não transformadoras, ao menos agradáveis e novas.

Demais assistidos(as) também exaltam a roda de conversas com seus colegas, em que a verbalização de um problema e a compreensão “na pele” daqueles que passaram por algo similar podem torná-lo “menos dramático” em suas futuras narrativas sobre si mesmos, direcionando-o a uma resolução/alívio e/ou dando perspectivas de futuro.

Energia emocional

Portanto, há trocas ritualizadas de emoções (Clark 1997Clark, Candace. 1997. Misery and company. Sympathy in everyday life. Chicago: The University of Chicago Press.).15 15 Esse âmbito de análise nem sempre é central em abordagens pragmáticas. O afeto e a emoção, sua passagem para ação e a relação com a cognição, não me parecem ter força consolidada ou tratamento substantivo em pesquisas por esses modelos de análise. Para mais elaborações sobre esse tema, ver Livet e Thévenot (1997), Quéré (2018) e Talone (2020a). “Energias emocionais” em ressonância nos grupos tensionam lembranças pessoais na direção de “definições de situação” (Thomas 1923Thomas, William I. 1923. The unadjusted girl: with cases and standpoint for behaviour analysis. Monclair: Patterson Smith., 42) específicas. Ou seja, um cadeirante que sempre pensava com tristeza nas consequências de seu acidente ao se deslocar pela rua, pode começar a pensar com orgulho e felicidade sobre sua trajetória em atividades correntes – como outros assistidos o estimulam. De acordo com Collins (2004Collins, Randall. 2004. Interaction ritual chains. Princeton: Princeton University Press., 7), certos rituais são “mecanismos de emoção e de atenção mutuamente concentradas produzindo uma realidade momentaneamente compartilhada” e intensificada. Essa forma de “intensificar” experiências também se dá pela partilha e ressonância de emoções.

Claudia, uma assistida do Navi que perdeu seu filho caçula em um acidente de moto, afirma que apenas no núcleo encontrou pessoas compreendendo de fato a magnitude de sua tristeza. Outros poderiam “imaginar que é difícil”, mas apenas quem sofreu “na pele” saberia partilhar da dor e conseguir ajudá-la. E seria essa dor aquilo canalizado e transformado em força para as ações de engajamento e de conscientização no trânsito. Lucas – um segurança alvejado várias vezes durante um roubo – descreve os efeitos do projeto no mesmo sentido: o foco é a troca de experiências, de sentimentos e de auxílios no dia a dia. Isso o fez querer desenvolver seu próprio projeto de esporte, mostrando para todos como é possível um cadeirante realizar qualquer atividade. Como mostra Collins (2004Collins, Randall. 2004. Interaction ritual chains. Princeton: Princeton University Press., 35), a atenção coletiva realça a emoção compartilhada; e, por sua vez, essa age para intensificar movimentos coletivos e o sentido de intersubjetividade. A causa torna-se o foco em que se investem os afetos e as emoções (Talone 2020aTalone, Vittorio. 2020a. A força da memória: lembranças de situações de ferimento, tensão e morte. Tese em Sociologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.).

De volta para o futuro

Relendo o passado

Trabalhando com pessoas cujas histórias envolvem a violação física de si ou de um ente próximo, os grupos buscam compreender a gravidade dessas experiências em suas vidas, mas também as desvincular da narrativa pessoal central. Há um trabalho sobre a memória visando a reinterpretação de lembranças – e.g., recordar dos momentos com o ente querido com alegria por ter sido mãe e não com tristeza devido ao posterior falecimento; pensar nas situações após o acidente focando na superação, não nas limitações. A abertura possível para o futuro é também definida pelo acesso e pela reelaboração de reminiscências a respeito das experiências passadas. Sobretudo por meio das rodas de conversa, busca-se colocar os assistidos como “narrativas em andamento”/“páginas a serem escritas”, anulando a noção de uma história trágica finalizada.

Joana diz que antes era inviável falar sobre a morte de sua filha devido à dor que a acometia. Hoje, ela conta com uma forma definida, mais ou menos padronizada, para narrar seu passado quando participa, por exemplo, de palestras para grupos de motoristas imprudentes no trânsito, visando os fazer sentir o máximo possível “na pele” o que podem causar na vida de outrem e nas suas próprias. Seria uma forma de mobilizar a experiência de contato com a morte para fazer diferença no mundo.

Logo após a morte de seu filho, Cláudia deixou de se alimentar como antes fazia. Ficou por três anos e três meses apenas comendo pão e biscoito e bebendo água, dizendo ter sido um teste para ver se “merecia morrer”. Apenas ao frequentar o Navi por quase um ano, ela decidiu voltar a se alimentar adequadamente. Ela busca retomar suas lembranças pelo orgulho de ter sido mãe, contando sua história em ações de conscientização. Sobre sua experiência, ela comenta: “Se eu fiquei três anos e três meses sem comer e continuei de pé, é porque Deus tinha um propósito muito bom na minha vida”. Lembrar que sobreviveu quando não se alimentava adequadamente tornou-se actante na sua rotina e projeção de situações futuras. Ou seja, ela pensa ativamente (e não apenas como lembrança contemplativa) em sua superação quando vive momentos de dor. Fred coloca o mesmo: apesar de ter sido alvejado por tiros como policial, ele conseguiu permanecer vivo. Então, agora busca não mais pensar nesse momento de sua vida, senão para celebrar sua sobrevivência.

A narrativa aberta

Como vimos, o futuro é algo/aquilo “perdido” após vivências de experiências extremas. Deixar de se projetar constantemente nas situações passadas de contato com a morte é, nesse sentido, uma reconquista da possibilidade de uma biografia em andamento (Pollak 1990Pollak, Michael. 1990. L’experience concentracinnaire: essai sur le maintien de l’identité sociale. Paris: Métailié.). A pessoa volta a ter um projeto de si, a ter um engajamento no plano de seu próprio self (Thévenot 2006Thévenot, Laurent. 2006. L’action au pluriel: Sociologie des regimes d’engagement. Paris: Découverte.; Talone 2020aTalone, Vittorio. 2020a. A força da memória: lembranças de situações de ferimento, tensão e morte. Tese em Sociologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.) – ela consegue projetar um futuro não determinado pelo ferimento ou pela perda de alguém. Mas diferentes entes embarcam na fabricação de futuros possíveis, incluindo os psicólogos e coordenadores dos núcleos.16 16 Diferentes estudos, como Vilain e Lemieux (1998), Pollak (1990), Das (2007) e Talone (2020a), mostram como as experiências extremas não têm em si uma interpretação última: há maneiras múltiplas de dar sentido ao “evento violento”. “Ao não recorrer ao acervo de interpretações disponíveis, as vítimas [...] na sua maioria, produzem e procuram impor a sua própria definição da situação” (Vilain e Lemixeu 1998, 159). E, deixando o “singular”, o sofrimento torna-se a base de equivalência entre as pessoas de um grupo, fundando um vínculo entre elas (Vilain e Lemixeu 1998, 159). Conseguir vislumbrar um futuro é fundamental nos grupos. Como Fred conclui em uma de nossas conversas:

[Tem] esporte, pódio e tudo mais, mas a verdade mesmo é que esse é um projeto de salvar vidas. [...] Eu digo porque eu passei por isso. A [coordenadora] me achou e me tirou do buraco. Eu tava muito mal. [...] Agora eu tô treinando, eu tô outro, meu casamento tá outro. A vida continua, mas a gente precisa saber disso. Eu não quero ser só um número. Eu preciso levar isso para quem está passando pela mesma coisa. Imagina, um cara fica sem andar, [ainda] novo. Tem muito policial aí com arma na mão. Ele vai se matar. [...] A gente quer salvar vidas, retribuir o que aconteceu comigo mesmo. Eu já consegui tirar um [da depressão]. Graças a Deus. E quero continuar contribuindo. Esse grupo é para a vida. O grupo é para mostrar que ainda tem coisas para serem feitas. Muitos acham que a vida acabou depois do acidente. Isso é verdade. Olha para mim, olha isso [aponta para as pernas], não posso usar. É como um pássaro na gaiola que quer voar, mas não dá para voar. O grupo ajuda a encontrar uma forma. (Fred, com. pess., nov. 2017).

O Renascer o auxiliou nessa transformação, “convertendo” seus afetos/emoções em energia para a prática de esporte e de suporte aos outros. A coordenação do Renascer se pensa em relação às variadas perspectivas de futuro observadas nas rodas de conversa e “canalização de energias”:

Com todos os problemas, você dá à pessoa uma perspectiva de futuro. [...] [Um] menino [que chegou a pensar em] suicídio, ele hoje pensa assim: “Em novembro eu resolvo o pagamento da minha casa, o dinheiro que sobrar, vou tirar uma habilitação”. [...] Então, assim, ele tá tendo uma perspectiva de construção para frente que ele não tinha. O que que fez isso? O grupo social. Ele ter convivido em situações que fez ele perceber que tem possibilidades de viver. [É] o esporte e essas ações assim de inclusão para colocar as pessoas juntas, que dê perspectiva nova a eles, [que] transformam. (Coordenadora do Navi, com. pess., 2º semestre. 2017).

As possibilidades de futuro seriam proficuamente ampliadas pelas convivências com colegas no Renascer e no Navi.17 17 Optei por abordar apenas os pontos que apareceram constantemente nas conversas a respeito de “resiliência” e de “ressignificação”. Mas, claro, diversos outros fatores podem atuar (e se somar) no suporte a essas pessoas: participação em grupos religiosos; apoio de alguns membros da família ou colegas; terapia particular etc. O potencial de ação das pessoas toma forma também na possibilidade da orientação para o futuro (capacidade projetiva) e para o presente (capacidade prático-avaliativa), contextualizando hábitos passados dentro das contingências do momento (Emirbayer e Mische 1998Emirbayer, Mustafa e Ann Mische. 1998. What is agency? American Journal of Sociology 103 (4): 962-1023. https://doi.org/10.1086/231294.
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).

Essa experiência humana da temporalidade, segundo Mead (1932)Mead, George H. 1932. The philosophy of the present. Londres: The Open Court Company., se baseia no caráter social da emergência, ou seja, na passagem do antigo para o novo e nas mudanças inter-relacionadas ocorridas nos vários contextos situacionais nos quais os seres humanos estão inseridos. Como vimos, as pessoas estudadas buscam possibilidades de responder aos ambientes, reconstruindo continuamente sua visão do passado na tentativa de compreender o presente emergente, moldando suas respostas para um futuro possível. Trata-se da capacidade de “se apossar das condições da conduta futura, pois são encontradas nas respostas organizadas que formamos e, assim, construímos nossos passados em antecipação a esse futuro” (Mead 1932Mead, George H. 1932. The philosophy of the present. Londres: The Open Court Company., 76).

Nesse sentido, recupero a reflexão de Krishan Kumar (1997)Kumar, Krishan. 1997. Da sociedade pós-industrial à pós-moderna. Novas teorias sobre o mundo contemporâneo. Rio de Janeiro: Zahar. sobre temporalidade. O autor comenta como, ao longo de nossa história, o futuro já foi concebido em função do passado: pelo desejo da recuperação de formas mais antigas do pensamento e dos costumes. Trata-se de uma ideia cíclica de mudança. Aqui o elo com o futuro é tido como possível apenas como obra da providência, não resultando de ação humana ativa. Os assistidos nos grupos de apoio justamente sentem-se presos à própria história passada (marcada pela experiência de contato com a morte); permanecendo em um loop (pelas lembranças) dos momentos de rompimento. Seria uma das fases mais difíceis do luto, como diz a psicóloga-coordenadora do Navi. Mas Kumar também comenta a respeito de um modelo de temporalidade concedendo especial urgência e importância ao “estágio mais recente”, significando a quebra com o passado e um novo começo baseado em novos princípios. A autoridade do passado é abolida e temos o ingresso em um tempo futuro.

O passado pode se tornar o lócus para o qual um assistido sempre volta: seja por não ter mais a presença em vida de um ente querido ou por não ter mais certos movimentos no corpo. Assim, o presente e o futuro são definidos pelos sofrimentos de eventos passados e suas consequências A pessoa pode deixar de se alimentar, de trabalhar, de sair de casa, de lidar com demais parentes, de cuidar da própria saúde etc. É justamente pela reinterpretação de certas lembranças, engajamento em uma causa e ressonância afetiva que os grupos buscam abrir os assistidos para um futuro de novas e positivas possibilidades.

Considerações finais

Os grupos de apoio analisados oferecem aos assistidos a retomada da agência sobre o tempo. Por meio da empatia e da troca de energias, pode-se “assumir o outro” e o ajudar a definir suas experiências de uma nova forma, em termos do que significam e do que pressagiam. Reconectando passado e futuro, iluminam-se as possibilidades de ação, potencializando a transformação da experiência e das coisas esperadas (Mead 1932Mead, George H. 1932. The philosophy of the present. Londres: The Open Court Company.).

O isolamento, a depressão, o desrespeito e as “violências” que os geraram, por exemplo, são definidas como um “mal” a ser combatido por meio das rodas de conversa e da prática de esporte. Isso se assemelha ao que Pollak (1990Pollak, Michael. 1990. L’experience concentracinnaire: essai sur le maintien de l’identité sociale. Paris: Métailié., 244) destaca do trabalho de Maurice Halbwachs como “comunidade afetiva”: grupo cujo efeito é atenuar, nas lembranças individuais, o isolamento e os “traumatismos” provocados pelas experiências extremas seguidas de processos judiciais/criminais, angústia para com outros e recusa de contato com terceiros após a proximidade com a morte. Engajados nos grupos de apoio, como vimos com os grupos circunstanciais, as pessoas buscam estender sua existência para além de si, visando ajudar a outros, construindo motivações para a vida futura.

O “retorno à vida” é um reengajamento em um projeto de si mesmo em reconexão com o futuro. Um dos efeitos da atuação dos grupos de apoio para os seres está no auxílio da estabilização de novos e de antigos selves, no desenvolvimento de novas crenças/hábitos (cf. Peirce 1877Peirce, Charles S. 1877. The fixation of belief. Popular Science Monthly 12: 1-15.) e no rompimento com as “visões de pior mundo possível” (Talone 2020aTalone, Vittorio. 2020a. A força da memória: lembranças de situações de ferimento, tensão e morte. Tese em Sociologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro., 2020bTalone, Vittorio. 2020b. O contágio como a distopia realizada mais urgente. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social 1-13. https://www.reflexpandemia.org/texto-22.
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). A força dessa passagem se dá pela dessingularização do sofrimento e da dor, mas no sentido não de dilatá-los como “mais uma história dentre outras”, e sim no de partilhá-los. A história pessoal, a lembrança particular, ainda é aquilo que move as pessoas, o que tem maior relevância para elas, mas se torna possível abandonar a temporalidade circular em torno da morte. O grupo, pela partilha das lembranças e de sentimentos, pela troca de empatia e dessingularização do sofrimento, busca gerar lembranças positivas/edificantes permitindo as pessoas tomarem o futuro como algo possível.

  • 2
    Este artigo é resultado de reflexões no âmbito de uma pesquisa de doutorado financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Código 001; e de uma pesquisa de pós-doutorado financiada pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (processo E-26/202.009/2020).
  • 3
    A fim de preservar as identidades dos pesquisados, utilizo apenas nomes fictícios.
  • 4
    Para um breve histórico sobre paradigmas de reparação de infortúnios e injustiças, ver Barbot e Dodier (2015)Barbot, Janine e Nicolas Dodier. 2015. Face à l’extension des indemnisations non judiciaires. Le cas des victimes d’un drame de santé publique. Droit et société 89 (1): 89-103. https://doi.org/10.3917/drs.089.0089.
    https://doi.org/10.3917/drs.089.0089...
    .
  • 5
    O trabalho de campo consistiu em visitas aos dois grupos entre abril e dezembro de 2017, e em entrevistas ao longo do mesmo período, e realizadas até março de 2018. Realizei observação participante, estabelecendo conversas também com os psicólogos/coordenadores, e “entrevistas compreensivas” (Kauffman 2013Kaufmann, Jean-Claude. 2013. A entrevista compreensiva: um guia para pesquisa de campo. Petrópolis: Vozes.) com assistidos/as.
  • 6
    A análise das situações é uma forma privilegiada de entender o social, pois nelas ele propriamente se faz (Thomas 1923Thomas, William I. 1923. The unadjusted girl: with cases and standpoint for behaviour analysis. Monclair: Patterson Smith.; Werneck 2022Werneck, Alexandre. 2022 (no prelo). Apontamentos para uma sociologia da efetivação (isto é, uma sociologia pragmática). In Construção conceitual nas ciências sociais, organizado por Fabrício Neves, Diogo Corrêa, e Gabriel Peters. Rio de Janeiro: Telha.). Werneck (2022)Werneck, Alexandre. 2022 (no prelo). Apontamentos para uma sociologia da efetivação (isto é, uma sociologia pragmática). In Construção conceitual nas ciências sociais, organizado por Fabrício Neves, Diogo Corrêa, e Gabriel Peters. Rio de Janeiro: Telha. destaca a situação como “uma circunscrição no espaço e no tempo na qual se pode reconhecer que algo definido está acontecendo ali, [em que] se fundem o decurso de uma ação [...], os envolvidos tanto em sua operacionalização quanto em sua avaliação/interpelação de sentido [...] e elementos do mundo ali capturados e relacionados a esses processos e em relação com essas pessoas”. As situações de ferimento e morte tanto foram acessadas e analisadas reconstitutivamente (pelas narrativas oferecidas), como as pensei em articulação com situações de “retomada do futuro” nos grupos de apoio: os efeitos do ferimento/da morte são pensados e reavaliados também segundo os efeitos do apoio nas projeções das pessoas.
  • 7
    Em uma breve definição próxima daquela com que trabalho, pensada na herança de contribuições pragmatistas, Werneck e Porto (2021Werneck, Alexandre e Camille Porto. 2021. O valor de uma existência: uma análise pragmática de valorizações da vida humana em situações envolvendo dinheiro. Sociedade e Estado 36 (2): 563-589. https://doi.org/10.1590/s0102-6992-202136020009.
    https://doi.org/10.1590/s0102-6992-20213...
    , 565) escrevem: “o self é uma unidade de individuação sígnica formada por outras unidades sígnicas (o eu – sua dimensão mais íntima e constante, referente aos comportamentos assumidos e criados pelo indivíduo diante de reações sociais formalizadas – e o mim – a mais variante, já que concerne à reprodução das reações socialmente construídas e às perspectivas aprendidas sobre si mesmo com os outros significativos, o que ocorre em conformidade com as mais diversas situações nas quais os indivíduos se encontram no decorrer de suas trajetórias). Partindo dessa premissa, tomamos os diferentes momentos e contextos da vida dos atores como configurações produtoras, muitas vezes, de selves distintos”.
  • 8
    Collins (2004Collins, Randall. 2004. Interaction ritual chains. Princeton: Princeton University Press., 38) explora como energias emocionais são transmitidas pelas interações face-a-face: “O ‘tipo de eletricidade’ que Durkheim metaforicamente atribui ao grupo em seu estado de alto excitamento é armazenado em [espécies de] baterias [...]. A participação no ritual dá ao indivíduo uma espécie especial de energia”. A mudança que um grupo busca e a emergência da energia emocional é um sentimento de convicção e potência de agir, sendo uma energia “moralmente transbordada”, ou seja, ela teria um efeito motivante intenso sobre o indivíduo.
  • 9
    Falo em dispositivo no sentido daquilo que visa dar uma base às pessoas para sustentar suas ações, “representando um instrumento para o melhor empreendimento possível da autonomia dos atores” (Peeters e Charlier 1999Peeters, Hugues e Philippe Charlier. 1999. Contributions à une théorie du dispositif. Hermès 25: 15-23. https://doi.org/10.4267/2042/14969.
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    , 18). Eles se definem em uma função de suporte, de baliza, de quadro organizador da ação, colocando em ordem a ação do indivíduo.
  • 10
    Pessoas cujas perdas são mais longevas, tendo já elaborado substantivamente sobre a morte (o que não significa uma aceitação ou menor sofrimento em relação a ela), apresentando maior “força” para auxiliar, conversar e prestar apoio a outros participantes.
  • 11
    Coordenado por uma subtenente da Pmerj auxiliada por outros PMs na ativa. Todos são praças, categoria englobando os cargos mais baixos da hierarquia na instituição.
  • 12
    Aquele ou aquilo que pratica ou sofre um ato, seres ou coisas a participar de um processo (Greimas; Courtés 1979Greimas, Algirdas J. e Joseph Courtés. 1979. Dicionário de Semiótica. São Paulo: Cultrix.), fazendo diferença na narrativa. Trata-se de um ente (podendo ser uma pessoa, uma ideia, grupo(s), coisa(s), entre outros elementos) dotado da capacidade de influenciar as ações de outros. Assim, diz respeito à potencialidade de um ser não simplesmente em termos de decisão (e, nesse sentido, de agência), mas de influência no quadro situacional. É algo a demonstrar efetividade (Werneck 2012Werneck, Alexandre. 2012. A desculpa: as circunstâncias e a moral das relações sociais. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.).
  • 13
    Tais ações envolvem: apresentação dos atletas paraolímpicos em universidades (Renascer); conversas abertas na mídia sobre as dificuldades enfrentadas (Navi e Renascer); distribuição de panfletos sobre segurança no trânsito pelas assistidas no Dia das Mães, com fotos de seus entes falecidos em suas camisas (Navi); aulas de educação no trânsito para motoristas infratores (Navi) etc.
  • 14
    Os autores propõem o conceito tendo em mente pessoas que estiveram envolvidas em um mesmo evento, resultando em ações judiciais coletivas. Portanto, é diferente dos casos aqui apresentados, em que os integrantes dos núcleos experienciaram um mesmo tipo de situação, mas em espaço e tempo distintos.
  • 15
    Esse âmbito de análise nem sempre é central em abordagens pragmáticas. O afeto e a emoção, sua passagem para ação e a relação com a cognição, não me parecem ter força consolidada ou tratamento substantivo em pesquisas por esses modelos de análise. Para mais elaborações sobre esse tema, ver Livet e Thévenot (1997)Livet, Pierre e Laurent Thévenot. 1997. Modes d’action collective et construction éthique: les émotions dans l’évaluation. In Coloque de Cerisy: les limites de la racionalité, tome 1. Rationalité éthique et cognition, organizado por Jean-Pierre Dupuy e Pierre Livet, 412-439. Paris: La Decouverte., Quéré (2018)Quéré, Louis. 2018. L’émotion comme facteur de complétude et d’unité dans l’expérience. La théorie de l’émotion de John Dewey. Pragmata 1: 10-59. e Talone (2020a)Talone, Vittorio. 2020a. A força da memória: lembranças de situações de ferimento, tensão e morte. Tese em Sociologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro..
  • 16
    Diferentes estudos, como Vilain e Lemieux (1998)Vilain, Jean-Paul e Cyril Lemieux. 1998. La mobilisation des victimes d’accidents collectifs. Vers la notion de “groupe circonstanciel”. Politix 11 (44): 135-160. https://doi.org/10.3406/polix.1998.1764.
    https://doi.org/10.3406/polix.1998.1764...
    , Pollak (1990)Pollak, Michael. 1990. L’experience concentracinnaire: essai sur le maintien de l’identité sociale. Paris: Métailié., Das (2007)Das, Veena. 2007. Life and words. Violence and the descent into the ordinary. Berkeley: University of California Press. e Talone (2020a)Talone, Vittorio. 2020a. A força da memória: lembranças de situações de ferimento, tensão e morte. Tese em Sociologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro., mostram como as experiências extremas não têm em si uma interpretação última: há maneiras múltiplas de dar sentido ao “evento violento”. “Ao não recorrer ao acervo de interpretações disponíveis, as vítimas [...] na sua maioria, produzem e procuram impor a sua própria definição da situação” (Vilain e Lemixeu 1998Vilain, Jean-Paul e Cyril Lemieux. 1998. La mobilisation des victimes d’accidents collectifs. Vers la notion de “groupe circonstanciel”. Politix 11 (44): 135-160. https://doi.org/10.3406/polix.1998.1764.
    https://doi.org/10.3406/polix.1998.1764...
    , 159). E, deixando o “singular”, o sofrimento torna-se a base de equivalência entre as pessoas de um grupo, fundando um vínculo entre elas (Vilain e Lemixeu 1998Vilain, Jean-Paul e Cyril Lemieux. 1998. La mobilisation des victimes d’accidents collectifs. Vers la notion de “groupe circonstanciel”. Politix 11 (44): 135-160. https://doi.org/10.3406/polix.1998.1764.
    https://doi.org/10.3406/polix.1998.1764...
    , 159).
  • 17
    Optei por abordar apenas os pontos que apareceram constantemente nas conversas a respeito de “resiliência” e de “ressignificação”. Mas, claro, diversos outros fatores podem atuar (e se somar) no suporte a essas pessoas: participação em grupos religiosos; apoio de alguns membros da família ou colegas; terapia particular etc.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    05 Abr 2021
  • Aceito
    25 Abr 2022
  • Publicado
    30 Nov 2022
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