Acessibilidade / Reportar erro

O Fator de Risco Lucro/Preço em Modelos de Precificação de Ativos Financeiros* * Artigo apresentado na BALAS Annual Conference 2014, Port of Spain, Trinidad e Tobago, 2014.

Resumos

Este artigo integra as ideias de duas linhas de pesquisa sobre custo de capital próprio e precificação de ativos: modelos multifatoriais e modelos ex ante. Utilizamos o índice lucro/preço como um indicador para o custo de capital próprio ex ante, a fim de explicar os retornos realizados por empresas brasileiras no período de 1995 a 2013. O achado inicial foi que as ações com altos (baixos) índices lucro/preço têm maiores (menores) retornos realizados ajustados ao risco, controlados pelo beta do CAPM. Os resultados mostram que a seleção de ações com base em altos índices lucro/preço levou a retornos ajustados ao risco significativamente maiores no mercado brasileiro, com retornos anormais médios próximos a 1,3% ao mês. Desenvolvemos modelos de precificação que incluem um fator de risco lucro/preço, com base no modelo de três fatores de Fama e French. Concluímos que tal fator de risco é relevante para explicar os retornos das carteiras, mesmo quando controlado pelo porte e pelo índice valor de mercado/patrimônio líquido. Os modelos que incluem o fator de risco lucro/preço foram superiores para explicar os retornos de ações no Brasil quando comparados ao CAPM e ao modelo de três fatores de Fama e French, apresentando o menor número de interceptos significativos. Esses resultados podem decorrer do impacto da inflação historicamente elevada no Brasil, que reduz o conteúdo informativo do valor do patrimônio líquido, tornando, assim, os modelos baseados em índices lucro/ preço superiores. Tais resultados são diferentes dos obtidos em mercados mais desenvolvidos e a superioridade do índice lucro/preço para precificação de ativos também pode existir em outros mercados emergentes.

Custo de capital próprio; Precificação de ativos; Modelos multifatoriais


This article integrates the ideas from two major lines of research on cost of equity and asset pricing: multi-factor models and ex ante accounting models. The earnings/price ratio is used as a proxy for the ex ante cost of equity, in order to explain realized returns of Brazilian companies within the period from 1995 to 2013. The initial finding was that stocks with high (low) earnings/price ratios have higher (lower) risk-adjusted realized returns, already controlled by the capital asset pricing model's beta. The results show that selecting stocks based on high earnings/price ratios has led to significantly higher risk-adjusted returns in the Brazilian market, with average abnormal returns close to 1.3% per month. We design asset pricing models including an earnings/price risk factor, i.e. high earnings minus low earnings, based on the Fama and French three-factor model. We conclude that such a risk factor is significant to explain returns on portfolios, even when controlled by size and market/book ratios. Models including the high earnings minus low earnings risk factor were better to explain stock returns in Brazil when compared to the capital asset pricing model and to the Fama and French three-factor model, having the lowest number of significant intercepts. These findings may be due to the impact of historically high inflation rates, which reduce the information content of book values, thus making the models based on earnings/price ratios better than those based on market/book ratios. Such results are different from those obtained in more developed markets and the superiority of the earnings/price ratio for asset pricing may also exist in other emerging markets.

Cost of equity; Asset pricing; Multi-factor models


1 INTRODUÇÃO

A estimativa do custo de capital próprio é um tópico amplamente estudado em finanças e, ao mesmo tempo, oferece bastante espaço para novos desenvolvimentos. De fato, segundo Cochrane (2010)Cochrane, J. H. (2010). Presidential address: discount rates. The Journal of Finance, 66(4), 1047-1108., as teorias sobre a formação das taxas de desconto são controversas e ainda estão em sua infância.

Estudos recentes procuram criar modelos mais precisos de precificação de ativos ao adicionar outros fatores além do risco de mercado do Capital Asset Pricing Model (CAPM), como os desenvolvidos e aplicados por Fama e French (1992)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465. , Fama e French (1993)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465., Carhart (1997)Carhart, M. M. (1997). On persistence in mutual fund performance. The Journal of Finance, 52(1), 57-82. e Fama e French (2012)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465..

Outra linha de pesquisa visa a estimar o custo de capital próprio ex ante ou implícito, com base, principalmente, na relação entre o valor de mercado do patrimônio líquido de uma empresa e sua expectativa de fluxo de caixa futuro, que é mensurada de acordo com as estimativas de lucro e/ou dividendos.

Estudos utilizando esse tipo de metodologia foram realizados por Claus e Thomas (2001)Claus, J., & Thomas, J. (2001). Equity premia as low as three percent? Evidence from analysts' earnings forecasts for domestic and international stock markets. The Journal of Finance, 56(5), 1629-1665., Fama e French (2002)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465., Ohlson e Juettner-Nauroth (2005)Ohlson, J. A., & Juettner-Nauroth, B. E. (2000). Expected EPS and EPS growth as determinants of value. Review of Accounting Studies, 10(2-3), 349-365. e Easton (2004)Easton, P. D. (2004). PE ratios, PEG ratios, and estimating the implied expected rate of return on equity capital. The Accounting Review, 79(1), 73-95.. Geralmente, tais modelos são baseados em preços correntes e expectativa de lucro. Especificamente, nos modelos mais avançados de Ohlson e Juettner-Nauroth (2005) e Easton (2004)Easton, P. D. (2004). PE ratios, PEG ratios, and estimating the implied expected rate of return on equity capital. The Accounting Review, 79(1), 73-95., o custo de capital próprio ex ante é igual ao índice lucro/preço (L/P) quando não há lucro anormal. Assim, o índice L/P pode ser um indicador do custo de capital próprio implícito que, por sua vez, pode ser um fator explicativo dos retornos realizados, como identificado por Basu (1977)Basu, S. (1977). Investment performance of common stocks in relation to their price-earnings ratios: atest of the efficient market hypothesis. The Journal of Finance, 32(3), 663-682..

Utilizando elementos de ambas as abordagens, os objetivos deste estudo são, com base em uma amostra brasileira, (i) verificar se os retornos realizados das carteiras formadas com base no índice L/P das ações são significativamente diferentes dos previstos pelo CAPM, com base no alfa de Jensen; e (ii) testar modelos de precificação de ativos baseados no CAPM e no modelo de três fatores de Fama e French com a adição de um fator de risco relacionado ao índice L/P, ou seja, alto lucro menos baixo lucro (high earnings minus low earnings - HEMLE), como variável explicativa dos retornos realizados.

A seleção de uma amostra brasileira pode ter duas vantagens ao analisar o poder explicativo do fator de risco L/P. Em primeiro lugar, o Brasil tem uma taxa de inflação mais elevada quando comparada a mercados mais desenvolvidos, como os EUA. A consequência é que o poder explicativo do fator de risco relacionado ao índice patrimônio líquido/valor de mercado do capital (high minus low - HML) de Fama e French pode ser menor, uma vez que os valores contábeis podem ser seriamente influenciados pela idade dos ativos. Com isso, os índices patrimônio líquido/valor de mercado do capital (PL/VM) tornam-se menos significativos. Portanto, o índice L/P pode ser uma medida superior ou, pelo menos, complementar a identificação de ativos "baratos" e "caros". Em segundo lugar, o mercado brasileiro pode ser considerado menos líquido e eficiente, com imperfeições mais evidentes na precificação de ativos.

As principais hipóteses são que (i) as carteiras de ativos com altos (baixos) índices L/P tendem a ter retornos mais altos (mais baixos) que os previstos pelo CAPM; e (ii) o fator de risco L/P é significativo para explicar os retornos realizados pelas carteiras.

Este estudo amplia outros estudos realizados no mercado brasileiro, tanto adicionando o fator de risco HEMLE e ampliando a amostra e o período de análise, como sugerido por Costa Jr. e Neves (2000)Costa Jr., N., & Neves, M. (2000). Variáveis fundamentalistas e os retornos das ações. Revista Brasileira de Economia, 1, 123-137., além de testar os alfas de Jensen das carteiras formadas com base nos índices lucro/preço das ações.

Ambas as hipóteses são confirmadas, concluindo-se que as ações com altos (baixos) índices L/P, ou seja, com alto (baixo) custo de capital próprio implícito, têm retornos maiores (menores), que não são explicados pelo CAPM, bem como que o fator de risco HEMLE é significativo para explicar os retornos das carteiras de ações brasileiras, mesmo quando controlados pelos fatores de risco relacionado ao porte (SMB) e HML de Fama e French. Os modelos que incluem o fator de risco HEMLE também apresentaram maior poder explicativo e foram capazes de eliminar a mais interceptos nas regressões, ou seja, os retornos anormais não explicados.

Corroborando a ideia de que os índices VM/PL são menos significativos no Brasil para identificar ações "baratas" e "caras", devido à inflação mais elevada, os resultados também mostram que as carteiras classificadas por tais índices não apresentaram retornos anormais.

Este estudo estrutura-se da seguinte forma: após esta breve introdução, apresentamos o referencial teórico na seção 2; A seção 3 consiste na descrição da metodologia e da amostra; A seção 4 contém os resultados e sua análise e, por fim, as conclusões são tecidas na seção 5.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 O CAPM

Inspirado pela teoria da carteira desenvolvida por Markowitz (1952)Markowitz, H. (1952). Portfolio selection. The Journal of Finance, 7(1), 77-91., que é baseada na otimização da relação entre risco e retorno, Sharpe (1964)Sharpe, W. F. (1964). Capital asset prices: atheory of market equilibrium under conditions of risk. The Journal of Finance, 19(3), 425-442. e Lintner (1965)Lintner, J. (1965). Security prices, risks and maximal gains from diversification. The Journal of Finance, 20(4), 587-615. desenvolveram o CAPM, sugerindo que, sob condições de equilíbrio de mercado, a expectativa de retorno sobre determinado ativo acima da taxa livre de risco deve ser proporcional ao seu risco não diversificável, ou risco de mercado, mensurado por β:

Onde Rt é o retorno sobre determinado ativo no período t, RFt é a taxa livre de risco ou o retorno sobre um ativo com β = 0, β é a medida do risco não diversificável de determinado ativo e RMt é o retorno da carteira de mercado. E[.] é o operador de esperança.

O CAPM prevê que a carteira de mercado será composta por todos os ativos disponíveis, cada um com peso proporcional ao seu valor de mercado, e que o fator de risco mercado, ou seja, RM-RF, é o único fator capaz de explicar os retornos dos ativos.

2.2 O modelo de três fatores de Fama e French

Fama e French (1993)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465. testaram diversos modelos explicativos dos retornos realizados nos EUA, incluindo ações e títulos de renda fixa. Para as ações, os autores utilizam os seguintes fatores de risco: (i) RM-RF, que representa o fator de risco mercado; (ii) SMB, representando o fator de risco porte; e (iii) HML, representando um fator de risco relacionado ao índice patrimônio líquido/valor de mercado do capital (PL/VM).

Os autores utilizam os retornos adicionais à taxa livre de risco de 25 carteiras, Rt - RFt, como variáveis dependentes. Essas carteiras são formadas com base em quintis de porte, mensurados pela capitalização de mercado, e quintis de índices PL/VM. Formalmente, as regressões em séries temporais utilizadas pelos autores são:

Onde a, b, s, h são os coeficientes de regressão e RM-RF, SMB e HML são fatores de risco explicativos, como descrito acima.

Fama e French (1993)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465. concluem que os fatores RM-RF, SMB e HML são significativos para explicar os retornos das carteiras, acrescentando poder explicativo aos modelos de precificação de ativos, mensurado pelo R² significativamente maior quando comparado a modelos com menor número de fatores. O R² dos modelos é superior a 90% para a maioria das carteiras.

2.3 A relevância do fator de risco lucro/preço para explicar retornos e modelos ex ante

Basu (1977)Basu, S. (1977). Investment performance of common stocks in relation to their price-earnings ratios: atest of the efficient market hypothesis. The Journal of Finance, 32(3), 663-682. realizou um estudo seminal relacionando índices preço/lucro (P/L) aos retornos realizados de ações. O autor utilizou uma amostra de 500 empresas negociadas na Bolsa de Valores de Nova York (NYSE), no período de 1956 a 1969, agrupando-as em 5 carteiras de acordo com seus índices P/L. O autor realizou uma regressão cuja variável dependente foi o retorno sobre determinada carteira e a variável independente foi o fator de risco mercado:

Onde o intercepto, α, é o alfa de Jensen (Jensen, 1968Jensen, M. (1968). The performance of mutual funds in the period 1945-1964. The Journal of Finance, 23(2), 389-416.).

Basu (1977)Basu, S. (1977). Investment performance of common stocks in relation to their price-earnings ratios: atest of the efficient market hypothesis. The Journal of Finance, 32(3), 663-682. identificou alfas positivos e significativos para as 2 carteiras formadas por ações com baixos índices P/L e alfas negativos para as 2 carteiras formadas por ações com altos índices P/L, concluindo que o índice P/L pode ter sido um fator relevante para explicar os retornos e que esse fato pode ser uma indicação de ineficiências de mercado.

Os principais modelos para o cálculo do custo de capital próprio ex ante também utilizam o preço das ações e o lucro para estimar as expectativas de retorno. Gebhardt, Lee e Swaminathan (2001)Gebhardt, W. R., Lee, C. M. C., & Swaminathan, B. (2001). Toward an implied cost of capital. Journal of Accounting Research, 39(1), 135-176., por exemplo, utilizam um modelo de lucro anormal, onde o custo de capital próprio, ou a expectativa de retorno, é uma função do valor de mercado, da expectativa de lucro e do valor contábil do patrimônio líquido:

Onde Vt é o valor de mercado no período t, Bt é o valor contábil do patrimônio líquido no período t, Et é o lucro líquido no período t e r é o custo de capital próprio.

Claus and Thomas (2001)Claus, J., & Thomas, J. (2001). Equity premia as low as three percent? Evidence from analysts' earnings forecasts for domestic and international stock markets. The Journal of Finance, 56(5), 1629-1665., com o objetivo de estimar o prêmio pelo risco de mercado ex ante, utilizam um modelo semelhante ao desenvolvido por Gebhardt et al. (2001)Gebhardt, W. R., Lee, C. M. C., & Swaminathan, B. (2001). Toward an implied cost of capital. Journal of Accounting Research, 39(1), 135-176., adotando o conceito de lucro anormal como aquele que excede o valor contábil do patrimônio líquido multiplicado pelo custo de capital próprio. Ambos os modelos são baseados na metodologia do clean surplus accounting (Feltham & Ohlson, 1995Feltham, G. A., & Ohlson, J. A. (1995). Valuation and clean surplus accounting for operating and financial activities. Contemporary Accounting Research, 11(2), 689-731.).

Ohlson e Juettner-Nauroth (2005) desenvolveram um modelo relacionando preço, lucro, lucro anormal, e custo de capital próprio:

Onde Pt é o preço das ações no período t, k é o custo de capital próprio, K = 1+k, epst é o lucro por ação no período t e dpst é o dividendo por ação no período t.

Easton (2004)Easton, P. D. (2004). PE ratios, PEG ratios, and estimating the implied expected rate of return on equity capital. The Accounting Review, 79(1), 73-95. desenvolveu um modelo baseado em Ohlson e Juettner-Nauroth (2000), que é o precursor de Ohlson e Juettner-Nauroth (2005):

Onde Pt é o preço por ação no período t, epst é o lucro por ação no período t, k é o custo de capital próprio, e agr é o crescimento anormal do lucro, definido da seguinte forma:

Onde dpst é o dividendo por ação no período t.

Quando as empresas não têm lucro anormal, ou agr = 0, o modelo de Easton é reduzido para:

Nesse cenário, o custo de capital próprio implícito é equivalente ao índice lucro/preço, ou L/P:

Portanto, na ausência de lucro anormal, o índice L/P é equivalente à expectativa de retornos.

Os modelos ex ante são utilizados como base para muitos estudos posteriores, como os de Attig, Guedhami e Mishra (2008) e Hail e Leuz (2009)Hail, L., & Leuz, C. (2009). Cost of capital effects and changes in growth expectations around US cross-listings. Journal of Financial Economics, 93(3), 428-454..

2.4 A relação entre índices L/P e PL/VM

Alguns estudos testam a relação entre índices L/P e outros fatores de risco na precificação de ativos. Fama e French (1995)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465., com base no modelo de três fatores de Fama e French, argumentam que (i) duas variáveis, o valor de mercado do patrimônio líquido e os índices PL/VM, captam grande parte da variância da seção transversal dos retornos médios das ações; e (ii) tais variáveis são capazes de prever a evolução da rentabilidade das empresas listadas. Os autores concluem que empresas com altos índices PL/VM tendem a apresentar dificuldades financeiras e apresentar baixa lucratividade futura. Fama e French (1996)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465., em um estudo relacionado, aplicam o modelo de três fatores de Fama e French para carteiras classificadas separadamente por decis de PL/VM, L/P, fluxo de caixa/preço (FC/P) e crescimento de vendas em 5 anos (CV). Os autores mostram que, enquanto há uma forte relação positiva entre o retorno médio e PL/VM, L/P, C/P e CV, o modelo de três fatores é capaz de explicar tais "anomalias", com interceptos que são consistentemente pequenos.

2.5 Estudos brasileiros

Costa Jr. e Neves (2000)Costa Jr., N., & Neves, M. (2000). Variáveis fundamentalistas e os retornos das ações. Revista Brasileira de Economia, 1, 123-137. testaram a influência das variáveis fundamentalistas nos retornos das carteiras que consistem em ações negociadas no mercado brasileiro de março de 1987 a fevereiro de 1996, utilizando o estimador de regressão aparentemente não relacionada (SUR). Os autores encontraram coeficientes significativos e negativos para as variáveis P/L e o logaritmo natural do valor de mercado (VM) das empresas e coeficientes positivos e significativos para a variável valor contábil por ação/preço por ação (VPA/P). Eles também concluíram que o beta estimado por meio do índice Bovespa é a variável mais relevante para explicar retornos. Além disso, os autores sugerem a realização de estudos semelhantes em períodos de maior estabilidade econômica e baixa inflação.

Málaga e Securato (2004)Málaga, F. K., & Securato, J. R. (2004). Aplicação do modelo de três fatores de Fama e French no mercado acionário brasileiro: um estudo empírico no período 1995-2003. In Encontro Anual da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, 28. Curitiba: Anpad. confirmam que o modelo de três fatores é superior ao CAPM para explicar os retornos brasileiros sobre ações.

Mussa, Santos e Famá (2007)Mussa, A., Rogers, P., & Securato, J. R. (2009). Modelos de retornos esperados no mercado brasileiro: testes empíricos utilizando metodologia preditiva. Revista de Ciências da Administração, 11(23), 192-216. utilizam uma metodologia semelhante, também para uma amostra de ações listadas na Bovespa, no período de 1995 a 2003. Ela é testada pelos autores adicionando o fator de risco momento de mercado ao modelo de três fatores, como proposto por Carhart (1997)Carhart, M. M. (1997). On persistence in mutual fund performance. The Journal of Finance, 52(1), 57-82., concluindo que há superioridade do modelo proposto de quatro fatores no mercado brasileiro, tanto em relação ao modelo de três fatores como ao CAPM.

Mussa, Rogers e Securato (2009)Mussa, A., Rogers, P., & Securato, J. R. (2009). Modelos de retornos esperados no mercado brasileiro: testes empíricos utilizando metodologia preditiva. Revista de Ciências da Administração, 11(23), 192-216. dão um passo adiante, a fim de testar a capacidade preditiva dos modelos. Para tanto, os autores realizam um estudo em duas etapas, a primeira de modo semelhante ao estudo realizado por Mussa et al. (2007)Mussa, A., Rogers, P., & Securato, J. R. (2009). Modelos de retornos esperados no mercado brasileiro: testes empíricos utilizando metodologia preditiva. Revista de Ciências da Administração, 11(23), 192-216. e a segunda com base na metodologia proposta por Fama e MacBeth (1973)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465., que consiste em regressões em seção transversal utilizando parâmetros de risco estimados no período anterior. Os autores concluem que nenhum dos modelos testados (CAPM, de três fatores e de quatro fatores) foi eficiente para prever os retornos de ações brasileiras, uma vez que foram identificados interceptos significativos.

Por fim, Yoshino e Santos (2009)Yoshino, J., & Santos, E. E. (2009). Is the CAPM dead or alive in the Brazilian market? Review of Applied Economics, 5(1-2), 127-142. testaram os fatores de risco mercado, porte, PL/VM, P/L e dividend yield, utilizando regressões com base no estimador por mínimos quadrados ordinários integralmente modificado em painel (FMOLS), a fim de testar a validade da CAPM no Brasil. Os autores concluíram que esses fatores foram capazes de explicar os retornos sobre ações no Brasil, em conjunto com o fator mercado.

3 METODOLOGIA

3.1 Amostra

A amostra é constituída por todas as companhias listadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), no período de janeiro de 1995 a março de 2013. Utilizamos retornos mensais, resultando em 219 períodos. Em cada período, foram excluídas as ações que não tinham ao menos uma das seguintes informações: preço da ação, valor contábil do patrimônio líquido, lucro líquido e valor de mercado do patrimônio líquido. O número médio de ações utilizadas por período foi de 187.

3.2 Variáveis

De modo semelhante a Fama e French (1993)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465., utilizamos regressões em séries temporais, nas quais as variáveis dependentes são os retornos mensais de carteiras de ações adicionais à taxa livre de risco, ou seja, Ri,t - RFt, e as variáveis explicativas são um vetor de fatores de risco.

3.3 Formação de carteiras

Utilizamos como variáveis dependentes os retornos de carteiras com base em: (i) o valor de mercado (VM) do patrimônio líquido, como medida de porte da empresa; (ii) o índice valor contábil do patrimônio líquido/valor de mercado do patrimônio líquido (PL/VM); e (iii) o índice lucro/preço (L/P).

Os fatores de risco foram utilizados como variáveis explicativas, que incluem os seguintes: mercado (RM - RF), SMB, HML e HEMLE. As variáveis são definidas na Tabela 1, enquanto a definção das carteiras é feita na Tabela 2.

Tabela 1
Metodologia de cálculo das variáveis

Tabela 2
Classificação das ações

Em seguida, as ações são classificadas segundo VM, PL/VM e L/P e agrupados em carteiras. Cada ação pertence a três carteiras: uma por porte, uma por PL/VM e uma por L/P, como mostrado na Tabela 2.

As carteiras finais que serão utilizadas como variáveis dependentes são baseadas simultaneamente nos 3 critérios, em junho de cada ano, permanecendo com composição constante pelos próximos 12 meses. Como resultado, as 18 (2 x 3 x 3) carteiras seguintes serão criadas, como mostrado na Tabela 3. Nesse caso, cada ação pertencerá a uma única carteira.

Tabela 3
Carteiras formadas

3.4 Retornos a explicar

Os retornos sobre cada carteira i são calculados para cada mês t, Ri,t, com base nos retornos médios ponderados das ações:

Onde MVa, t é o valor do patrimônio líquido da empresa a no período t, Ra, t é o retorno sobre a ação a no período t, n é o número de ativos pertencentes à carteira i e MVi, t é o valor de mercado da carteira i, igual à soma da capitalização de mercado de todas as ações incluídas na carteira i.

3.5 Especificação dos modelos

Para atingir o primeiro objetivo, ou seja, verificar se as carteiras formadas pelos índices L/P apresentam retornos significativamente diferentes dos previstos pelo CAPM, utilizamos a metodologia desenvolvida por Jensen (1968)Jensen, M. (1968). The performance of mutual funds in the period 1945-1964. The Journal of Finance, 23(2), 389-416., na qual o intercepto da regressão, o alfa de Jensen, é considerado o desempenho anormal do ativo i.

Onde R i, t é o retorno sobre a carteira i no mês t, a é o alfa de Jensen e RM t - RF t é o retorno sobre a carteira de mercado que supera a taxa livre de risco no mês t, como definido na Tabela 1.

Para essas regressões, utilizamos como variáveis dependentes os retornos mensais sobre as carteiras extremas formadas por um único critério (HE e LE). Para fins ilustrativos, além dos retornos sobre carteiras formadas com base em índices L/P, também testamos os retornos sobre as carteiras extremas com base nos critérios porte e PL/VM.

A hipótese associada à Equação 1 é que as carteiras baseadas em índices L/P devem ter interceptos significativos - positivos para a carteira com alto L/P e negativos para a carteira com baixo L/P. Isso se deve ao fato de que as ações com alto (baixo) L/P tendem a apresentar altas (baixas) expectativas de retorno, como no modelo ex ante de Easton (2004)Easton, P. D. (2004). PE ratios, PEG ratios, and estimating the implied expected rate of return on equity capital. The Accounting Review, 79(1), 73-95., e presumimos que os retornos realizados são uma função da expectativa de retornos. Mais formalmente:

H10: ai = 0

H1a1: ai > 0, quando i = HE

H1a2: ai < 0, quando i = LE

Para testar os modelos de precificação de ativos que incluem o fator de risco HEMLE como uma variável explicativa para os retornos, utilizamos regressões semelhantes às desenvolvidas por Fama e French (1993)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465.. Os modelos utilizados são os seguintes:

Para essas regressões, utilizamos retornos mensais sobre 18 carteiras formadas pelos critérios porte, PL/VM e L/P como variáveis dependentes (Ri,t), como descrito na Tabela 1.

Nossa hipótese central é que o fator de risco de L/P, HEMLE, deve ser relevante para explicar retornos nos cinco modelos [Equações (2) a (6)].

H20: ki = 0

H2a: ki ≠ 0

Todas as regressões utilizaram o estimador de mínimos quadrados ordinários (OLS) com os erros robustos à heterocedasticidade, como proposto por White (1980)White, H. (1980). A heteroskedasticity-consistent covariance matrix estimator and a direct test for heteroskedasticity. Econometrica, 48(4), 817-838.. Presumimos retornos i.i.d., sem correção para correlação serial, bem como regressores exógenos.

4 RESULTADOS

4.1 Alfas de Jensen de carteiras baseadas em um único fator de risco

A Tabela 4 mostra que, como esperado, o coeficiente do fator de risco mercado, b, foi positivo e significativamente diferente de zero para todas as carteiras extremas com critério único (S, B, H, L, HE, ME), corroborando os resultados obtidos por Fama e French (1993)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465..

Tabela 4
Alfas de Jensen estimados

O coeficiente a (alfa de Jensen) foi positivo e significativo com p < 1% para a carteira HE, ou seja, é evidente que as empresas com alto L/P apresentaram retornos realizados consistentemente maiores que os previstos pelo CAPM no Brasil. Tais resultados são qualitativamente semelhantes aos achados obtidos por Basu (1977)Basu, S. (1977). Investment performance of common stocks in relation to their price-earnings ratios: atest of the efficient market hypothesis. The Journal of Finance, 32(3), 663-682. e Costa Jr. e Neves (2000)Costa Jr., N., & Neves, M. (2000). Variáveis fundamentalistas e os retornos das ações. Revista Brasileira de Economia, 1, 123-137.. De forma consistente, a carteira LE apresentou um alfa negativo. Esses resultados confirmam a primeira hipótese.

Análises semelhantes foram repetidas em carteiras não ponderadas pelo valor de mercado das ações, ou seja, igualmente ponderadas. O alfa da carteira HE permanece positivo e significativo e o da carteira LE permanece negativo e significativo, reforçando a robustez dos resultados.

A Tabela 4 também mostra que o coeficiente b (beta do CAPM) para a carteira de grandes empresas (B) está próximo a 1 e o R² é próximo a 100%. Esse fato é esperado, uma vez que a carteira de mercado é ponderada pelo valor de mercado das empresas, com 96% de toda a capitalização de mercado no Brasil derivados de empresas da carteira B.

Em contrapartida, a carteira composta por pequenas empresas (S) apresenta um beta menor e alfa de Jensen positivo. O baixo beta origina-se de dois fatos. Em primeiro lugar, da baixa correlação com a carteira de grandes empresas (B), cujos retornos são semelhantes aos da carteira de mercado. Tal correlação é necessariamente menor que 1. Em segundo lugar, o desvio padrão da carteira S também é menor que o de B, devido à baixa liquidez das ações de pequenas empresas, cujos preços tendem a permanecer inalterados por um número relativamente grande de dias de negociação. O alfa da carteira S é positivo e significativo, compensando o efeito do baixo beta da carteira.

Como uma verificação da robustez, a análise foi repetida com os retornos da carteira de mercado calculados sem ponderação pelo valor de mercado, ou seja, os retornos do mercado igualmente ponderados. Nesse caso, os betas das carteiras S e B estão mais próximos a 1 e os alfas estão mais próximos a zero.

Além disso, a carteira L apresentou um beta significativamente menor que 1, algo consistente com a maior parte da literatura, que considera que as ações de empresas com menor PL/VM (growth) apresentam retornos consistentemente menores aos valores ao alto PL/VM (value) (Fama & French, 1996, 1998Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465.; Yoshino & Santos, 2009Yoshino, J., & Santos, E. E. (2009). Is the CAPM dead or alive in the Brazilian market? Review of Applied Economics, 5(1-2), 127-142.).

4.2 Modelos de um fator: mercado

À semelhança de outros estudos brasileiros, como Málaga e Securato (2004)Málaga, F. K., & Securato, J. R. (2004). Aplicação do modelo de três fatores de Fama e French no mercado acionário brasileiro: um estudo empírico no período 1995-2003. In Encontro Anual da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, 28. Curitiba: Anpad. e Mussa et al. (2007)Mussa, A., Rogers, P., & Securato, J. R. (2009). Modelos de retornos esperados no mercado brasileiro: testes empíricos utilizando metodologia preditiva. Revista de Ciências da Administração, 11(23), 192-216., tal como esperado, identificamos que o fator de risco mercado foi relevante para explicar o retorno sobre todas as carteiras, com o coeficiente b mostrando-se positivo e altamente significativo. Os coeficientes a (alfa de Jensen) foram significativos para 5 das 18 carteiras, o que sugere que o fator de risco mercado, embora relevante, não foi suficiente para explicar os retornos realizados das carteiras, contrariando as previsões do CAPM. A Tabela 5 apresenta esses resultados.

Tabela 5
Parâmetros estimados para o modelo de um fator Retornos mensais sobre as carteiras com base na capitalização do mercado de ações, índices L/P e PL/VM, para uma amostra de ações brasileiras de janeiro de 1995 a março de 2013. Retorno da carteira ponderado pelo valor de mercado. Taxa Selic mensal.

Para facilitar a interpretação da Tabela 5, a Tabela 6 apresenta um resumo contendo apenas os sinais e os níveis de significância dos interceptos das 18 regressões.

Tabela 6
Significância dos interceptos das carteiras

Não surpreende o fato de que as carteiras de ações que são "baratas" de acordo com os dois critérios (H por PL/VM e HE por L/P), que podem ser classificadas como ações de valor, apresentaram retornos mais elevados, enquanto as carteiras "caras" apresentaram retornos menores. Esse efeito torna-se mais forte por meio do porte das empresas, que tende a gerar interceptos positivos para as carteiras de empresas menores e interceptos negativos para empresas maiores. Especificamente, as "ações baratas" das carteiras S_H_HE, S_M_HE, B_M_HE e S_M_ME apresentaram interceptos positivos e significativos, com predominância das carteiras compostas por empresas pequenas (S), ao passo que a carteira de "ações caras" B_L_LE apresentou um intercepto negativo e significativo.

4.3 Modelos de dois fatores: mercado e lucro/preço

Como mostrado na Tabela 7, o fator de risco HEMLE mostrou-se significativo para explicar os retornos sobre a maioria das carteiras, acrescentando poder explicativo ao modelo de um fator. Isso é consistente com o resultado esperado para o segundo teste de hipóteses. A adição do fator de risco HEMLE também reduziu o número de carteiras onde o intercepto (a) foi significativo: somente 2 das 18 carteiras, em comparação com 5 no modelo de um fator. Novamente, o fator mercado foi altamente significativo para todas as carteiras.

Tabela 7
Parâmetros estimados para o modelo de dois fatores Retornos mensais sobre as carteiras com base na capitalização do mercado de ações, índices L/P e PL/VM, para uma amostra de ações brasileiras de janeiro de 1995 a março de 2013. Retorno da carteira ponderado pelo valor de mercado. Taxa Selic mensal. Retorno mensal sobre a carteira alto L/P menos retorno mensal sobre a carteira baixo L/P.

4.4 O modelo de três fatores de Fama e French

Os três fatores propostos por Fama e French (1993)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465. foram relevantes para explicar os retornos sobre as carteiras, embora não estatisticamente significativos em algumas delas. Duas carteiras apresentaram alfas de Jensen significativos com p < 0,05, sugerindo que o modelo de três fatores ainda carece de poder explicativo. Esses resultados são semelhantes aos encontrados por outros estudos brasileiros, entre eles Málaga e Securato (2004)Málaga, F. K., & Securato, J. R. (2004). Aplicação do modelo de três fatores de Fama e French no mercado acionário brasileiro: um estudo empírico no período 1995-2003. In Encontro Anual da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, 28. Curitiba: Anpad., Mussa et al. (2007)Mussa, A., Rogers, P., & Securato, J. R. (2009). Modelos de retornos esperados no mercado brasileiro: testes empíricos utilizando metodologia preditiva. Revista de Ciências da Administração, 11(23), 192-216. e Mussa et al. (2009)Mussa, A., Rogers, P., & Securato, J. R. (2009). Modelos de retornos esperados no mercado brasileiro: testes empíricos utilizando metodologia preditiva. Revista de Ciências da Administração, 11(23), 192-216..

Curiosamente, os interceptos foram negativos e estatisticamente significativos para as carteiras com baixos índices L/P. Esses resultados são apresentados na Tabela 8.

Tabela 8
Parâmetros estimados para o modelo de três fatores de Fama e French Retornos mensais das carteiras com base na capitalização do mercado de ações, índices L/P e PL/VM, para uma amostra de ações brasileiras de janeiro de 1995 a março de 2013. Retorno da carteira ponderado pelo valor de mercado. Taxa Selic mensal. Retorno mensal sobre a carteira a carteira de pequenas ações menos o retorno mensal sobre a carteira de grandes ações. Retorno mensal sobre a carteira de alto PL/VM menos o retorno mensal sobre a carteira de baixo PL/VM.

4.5 Modelo de três fatores com mercado, porte e lucro/preço

A Tabela 9 mostra que o modelo de três fatores proposto, que substitui HML por HEMLE, provou ser superior ao modelo de três fatores de Fama e French tradicional no mercado brasileiro, apresentando somente um intercepto com p < 0,05. O coeficiente k foi significativo com p < 0,05 em 9 das 18 regressões, em comparação com 6 regressões para o coeficiente h no modelo de três fatores de Fama e French.

Tabela 9
Parâmetros estimados para o modelo de três fatores de lucro/preço Retornos mensais sobre as carteiras com base na capitalização do mercado de ações, índices L/P e PL/VM, para uma amostra de ações brasileiras de janeiro de 1995 a março de 2013. Retorno da carteira ponderado pelo valor de mercado. Taxa Selic mensal. Retorno mensal sobre a carteira de pequenas ações menos retorno mensal sobre a carteira de grandes ações. Retorno mensal sobre a carteira de alto L/P menos retorno mensal sobre a carteira de baixo L/P.

4.6 Modelos de quatro fatores

O fator de risco HEMLE provou ser significativo para explicar os retornos sobre as carteiras mesmo quando utilizado junto com os três outros fatores de risco - RM-RF, SMB e HML, como mostra a Tabela 10. Duas das dezoito carteiras, no entanto, ainda apresentavam interceptos significativos com p < 0,10, algo que pode ser uma indicação de que há outros fatores que explicam os retornos não incluídos no modelo.

Tabela 10
Parâmetros estimados para o modelo de quatro fatores Retornos mensais sobre as carteiras com base na capitalização do mercado de ações, índices L/P e PL/VM, para uma amostra de ações brasileiras de janeiro de 1995 a março de 2013. Retorno da carteira ponderado pelo valor de mercado. Taxa Selic mensal. Retorno mensal sobre a carteira de pequenas ações menos retorno mensal sobre a carteira de grandes ações. Retorno mensal sobre a carteira de alto PL/VM menos retorno mensal sobre a carteira de baixo PL/VM. Retorno mensal sobre a carteira de alto L/P menos o retorno mensal sobre a carteira de baixo L/P.

No entanto, o modelo de quatro fatores foi o mais eficiente para remover interceptos: apenas uma carteira apresentou alfa de Jensen significativo com p < 0,05, quando comparado com dois interceptos significativos no modelo de três fatores.

Tais resultados reforçam a ideia de que o índice L/P é relevante para explicar os retornos sobre ativos e pode ser utilizado para definir estratégias de investimento. Como mostrado na Tabela 4, a carteira de alto L/P superou o mercado em cerca de 1,3% ao mês depois de ser controlada pelo risco de mercado do CAPM. A importância do índice L/P persiste após o controle por três fatores: como mostra a Tabela 8, duas carteiras compostas por ações de baixo L/P apresentaram interceptos negativos.

4.7 Análise da significância dos interceptos

Em um artigo seminal, Fama e French (1993)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465. demonstram que seu modelo de três fatores realiza um bom trabalho ao explicar a seção transversal dos retornos médios das ações porque gera interceptos não significativamente distintos de zero.

Em nossa amostra brasileira, os modelos que utilizam o fator de risco HEMLE foram os mais eficientes para eliminar interceptos. Todos os três modelos que incluem tal fator de risco resultaram em somente um intercepto significativo com p < 5% cada, em comparação aos dois do modelo de três fatores de Fama e French e aos quatro do modelo de um fator (CAPM).

Os resultados indicam que qualquer um dos modelos que incluem o fator de risco HEMLE, mesmo o de dois fatores, são mais eficientes que o modelo de três fatores de Fama e French para explicar retornos no mercado brasileiro, como mostra a Tabela 11.

Tabela 11
Análise sobre a significância dos interceptos Número de interceptos significativos. Cada modelo foi aplicado às 18 carteiras.

5 CONCLUSÃO

Este estudo testou os retornos realizados das carteiras formadas com base no índice L/P de ações negociadas no Brasil, assim como a adição do fator de risco HEMLE nos modelos de precificação de ativos. O fator de risco HEMLE pode ser entendido como um prêmio de risco ou de retorno para ações com alto índice L/P, o qual pode ser uma boa estimativa para o custo de capital implícito, corroborando os modelos propostos por Gebhardt et al. (2001)Gebhardt, W. R., Lee, C. M. C., & Swaminathan, B. (2001). Toward an implied cost of capital. Journal of Accounting Research, 39(1), 135-176., Claus e Thomas (2001)Claus, J., & Thomas, J. (2001). Equity premia as low as three percent? Evidence from analysts' earnings forecasts for domestic and international stock markets. The Journal of Finance, 56(5), 1629-1665., Easton (2004)Easton, P. D. (2004). PE ratios, PEG ratios, and estimating the implied expected rate of return on equity capital. The Accounting Review, 79(1), 73-95. e Ohlson e Juettner-Nauroth (2005).

Portanto, os resultados obtidos por este estudo podem ser entendidos como uma convergência de duas grandes linhas de pesquisa sobre custo de capital próprio e precificação de ativos: utilizar modelos multifatoriais ex post com maior número de fatores de risco e adotar modelos ex ante. Os resultados mostram que os ativos com alto custo de capital próprio implícito, mensurado pelos altos índices L/P, também apresentaram retornos realizados superiores, assim como que o fator de risco relacionado ao alto custo de capital implícito, HEMLE, é significativo para explicar retornos de ações no Brasil.

Também concluímos que, no Brasil, o índice L/P pode ser mais eficaz para identificar ações "baratas" ou "de valor", quando comparado a índices PL/VM. Enquanto as carteiras baseadas em índices L/P apresentaram retornos ajustados ao risco anormais, as carteiras formadas pelos índices PL/VM não apresentaram interceptos significativos. Tais resultados são diferentes dos obtidos por Fama e French (1995)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465. e Fama e French (1996)Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465., que demonstram que o modelo de três fatores pode explicar os retornos sobre carteiras formadas com base em índices L/P. Isso pode dever-se à elevada taxa de inflação do Brasil, que faz com que os valores contábeis das empresas sejam menos significativos, em especial para as empresas com ativos mais antigos.

De modo mais geral, os resultados também mostram que a utilização de índices L/P no Brasil para selecionar ações de valor resultou em desempenho ajustado ao risco significativamente superior para os investidores, mesmo quando controlado pelo fator de risco mercado. Enquanto a carteira de mercado gerou um retorno médio mensal de 0,6% acima da taxa livre de risco, a carteira composta por ações com alto L/P apresentou um excesso de retorno mensal de 1,8%, com beta um pouco menor, resultando em um excesso de retorno mensal ajustado ao risco próximo a 1,3%, como mostrado na Tabela 4.

Mais formalmente, este estudo confirma a hipótese de que (i) as ações com altos (baixos) índices L/P, ou seja, com um custo de capital próprio implícito potencialmente alto (baixo), apresentaram retornos realizados anormalmente altos (baixos) não capturados pelo CAPM, e (ii) o fator de risco HEMLE foi significativo para explicar os retornos sobre ações, tanto em modelos controlados pelo fator risco de mercado como em modelos controlados conjuntamente pelos fatores risco de mercado, prêmio pelo risco de porte (SMB) e o prêmio de risco relacionado ao índice PL/VM (HML).

Concluímos, também, que os modelos que utilizam o fator de risco HEMLE resultaram em maior capacidade de eliminar os interceptos nas regressões. O modelo de dois fatores (mercado e HEMLE), o modelo de três fatores (mercado, SMB e HEMLE) e o modelo de quatro fatores (mercado, SMB, HML e HEMLE) mostraram interceptos menos significativos quando comparados ao modelo de três fatores de Fama e French.

Uma limitação deste estudo é que a amostra, apesar de acreditarmos ser a maior em número de ativos e em período de tempo utilizada no Brasil, ainda se mostra bastante limitada quando comparada às utilizadas por estudos internacionais.

Os resultados podem estimular estudos avaliando o poder explicativo do fator de risco HEMLE em outros mercados, em especial aqueles com inflação mais elevada ou menor desenvolvimento quando comparados com o mercado dos EUA, onde os modelos mais relevantes foram concebidos. Outra extensão possível é verificar se índices L/P constituem fatores explicativos superiores para os retornos em outros países com taxas de inflação historicamente elevadas e se índices PL/VM são mais adequados para países com taxas de inflação historicamente baixas.

  • Attig, N., Guedhami, O., & Mishra, D. (2008). Multiple large shareholders, control contests, and implied cost of equity. Journal of Corporate Finance, 14(5), 721-737.
  • Basu, S. (1977). Investment performance of common stocks in relation to their price-earnings ratios: atest of the efficient market hypothesis. The Journal of Finance, 32(3), 663-682.
  • Carhart, M. M. (1997). On persistence in mutual fund performance. The Journal of Finance, 52(1), 57-82.
  • Claus, J., & Thomas, J. (2001). Equity premia as low as three percent? Evidence from analysts' earnings forecasts for domestic and international stock markets. The Journal of Finance, 56(5), 1629-1665.
  • Cochrane, J. H. (2010). Presidential address: discount rates. The Journal of Finance, 66(4), 1047-1108.
  • Costa Jr., N., & Neves, M. (2000). Variáveis fundamentalistas e os retornos das ações. Revista Brasileira de Economia, 1, 123-137.
  • Easton, P. D. (2004). PE ratios, PEG ratios, and estimating the implied expected rate of return on equity capital. The Accounting Review, 79(1), 73-95.
  • Fama, E. F., & French, K. R. (1992). The cross-section of expected stock returns. The Journal of Finance, 47(2), 427-465.
  • Fama, E. F., & French, K. R. (1993). Common risk factors in the returns on stocks and bonds. Journal of Financial Economics, 33, 3-56.
  • Fama, E. F., & French, K. R. (1995). Size and book-to-market factors in earnings and returns. The Journal of Finance, 50(1), 131-155.
  • Fama, E. F., & French, K. R. (1996). Multifactor explanations of asset pricing anomalies. The Journal of Finance, 51(1), 55-84.
  • Fama, E. F., & French, K. R. (1998). Value versus growth: the international evidence. The Journal of Finance, 53(6), 1975-1999.
  • Fama, E. F., & French, K. R. (2002). The equity premium. The Journal of Finance, 57(2), 637-659.
  • Fama, E. F., & French, K. R. (2012). Size, value, and momentum in international stock returns. Journal of Financial Economics, 105(3), 457-472.
  • Fama, E. F., & MacBeth, J. D. (1973). Risk, return and equilibrium: empirical tests. The Journal of Political Economy, 81(3), 607-636.
  • Feltham, G. A., & Ohlson, J. A. (1995). Valuation and clean surplus accounting for operating and financial activities. Contemporary Accounting Research, 11(2), 689-731.
  • Gebhardt, W. R., Lee, C. M. C., & Swaminathan, B. (2001). Toward an implied cost of capital. Journal of Accounting Research, 39(1), 135-176.
  • Hail, L., & Leuz, C. (2009). Cost of capital effects and changes in growth expectations around US cross-listings. Journal of Financial Economics, 93(3), 428-454.
  • Jensen, M. (1968). The performance of mutual funds in the period 1945-1964. The Journal of Finance, 23(2), 389-416.
  • Lintner, J. (1965). Security prices, risks and maximal gains from diversification. The Journal of Finance, 20(4), 587-615.
  • Málaga, F. K., & Securato, J. R. (2004). Aplicação do modelo de três fatores de Fama e French no mercado acionário brasileiro: um estudo empírico no período 1995-2003. In Encontro Anual da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, 28. Curitiba: Anpad.
  • Markowitz, H. (1952). Portfolio selection. The Journal of Finance, 7(1), 77-91.
  • Mussa, A., Rogers, P., & Securato, J. R. (2009). Modelos de retornos esperados no mercado brasileiro: testes empíricos utilizando metodologia preditiva. Revista de Ciências da Administração, 11(23), 192-216.
  • Mussa, A., Santos, J. O., & Famá, R. (2007). A adição do fator de risco momento ao modelo de precificação de ativos dos três fatores de Fama & French, aplicado ao mercado acionário brasileiro. In Congresso USP de Controladoria e Contabilidade, 7. São Paulo: USP.
  • Ohlson, J. A., & Juettner-Nauroth, B. E. (2000). Expected EPS and EPS growth as determinants of value. Review of Accounting Studies, 10(2-3), 349-365.
  • Ohlson, J. A., & Juettner-Nauroth, B. E. (2005). Expected EPS and EPS growth as determinants of value. Review of Accounting Studies, 10, 349-365.
  • Sharpe, W. F. (1964). Capital asset prices: atheory of market equilibrium under conditions of risk. The Journal of Finance, 19(3), 425-442.
  • White, H. (1980). A heteroskedasticity-consistent covariance matrix estimator and a direct test for heteroskedasticity. Econometrica, 48(4), 817-838.
  • Yoshino, J., & Santos, E. E. (2009). Is the CAPM dead or alive in the Brazilian market? Review of Applied Economics, 5(1-2), 127-142.
  • *
    Artigo apresentado na BALAS Annual Conference 2014, Port of Spain, Trinidad e Tobago, 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Fev 2015
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    11 Jan 2013
  • Aceito
    11 Dez 2013
Universidade de São Paulo, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Departamento de Contabilidade e Atuária Av. Prof. Luciano Gualberto, 908 - prédio 3 - sala 118, 05508 - 010 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: (55 11) 2648-6320, Tel.: (55 11) 2648-6321, Fax: (55 11) 3813-0120 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: recont@usp.br