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A ciclicidade da provisão para créditos de liquidação duvidosa sob três diferentes modelos contábeis: Reino Unido, Espanha e Brasil

RESUMO

Uma polêmica envolvendo a provisão para créditos de liquidação duvidosa em bancos refere-se à sua relação com os ciclos econômicos. Enquanto os padrões contábeis internacionais para o reconhecimento da provisão (modelo de perda incorrida) seriam presumivelmente pró-cíclicos, acentuando os efeitos do ciclo econômico vigente, um modelo alternativo, o modelo de perda esperada, teria características anticíclicas, atuando como uma espécie de amortecedor dos desequilíbrios econômicos próprios das fases de expansão e de contração da economia. No Brasil, vigora um modelo contábil misto, cujo comportamento não se sabe ser pró-cíclico ou anticíclico. Identificar o comportamento desses modelos contábeis frente aos ciclos econômicos, por meio de um modelo econométrico composto por variáveis contábeis e macroeconômicas, foi o objetivo desta pesquisa. O estudo contempla uma discussão sobre o impacto do comportamento do risco de crédito, do gerenciamento de resultados, do gerenciamento de capital, do comportamento do Produto Interno Bruto (PIB) e do comportamento da taxa de desemprego sobre a provisão, em países que utilizam os distintos modelos contábeis. Foram utilizados dados de bancos comerciais do Reino Unido (perda incorrida), da Espanha (perda esperada) e do Brasil (modelo misto), no período de 2001 a 2012. Os resultados revelaram que os modelos contábeis dos três países, apesar de serem formados por regras de natureza bastante distinta no que diz respeito a um eventual efeito sobre os ciclos econômicos, apresentaram comportamento pró-cíclico, indicando que, quando o PIB está em ascensão, as provisões tendem a cair e vice-versa. Os resultados revelaram também outros elementos que podem estar influenciando o comportamento da provisão, como a prática de gerenciamento de resultados.

Palavras-chave:
provisões; ciclicidade; ciclos econômicos; operações de crédito; bancos comerciais

ABSTRACT

A controversy involving loan loss provisions in banks concerns their relationship with the business cycle. While international accounting standards for recognizing provisions (incurred loss model) would presumably be pro-cyclical, accentuating the effects of the current economic cycle, an alternative model, the expected loss model, has countercyclical characteristics, acting as a buffer against economic imbalances caused by expansionary or contractionary phases in the economy. In Brazil, a mixed accounting model exists, whose behavior is not known to be pro-cyclical or countercyclical. The aim of this research is to analyze the behavior of these accounting models in relation to the business cycle, using an econometric model consisting of financial and macroeconomic variables. The study allowed us to identify the impact of credit risk behavior, earnings management, capital management, Gross Domestic Product (GDP) behavior, and the behavior of the unemployment rate on provisions in countries that use different accounting models. Data from commercial banks in the United Kingdom (incurred loss), in Spain (expected loss), and in Brazil (mixed model) were used, covering the period from 2001 to 2012. Despite the accounting models of the three countries being formed by very different rules regarding possible effects on the business cycles, the results revealed a pro-cyclical behavior of provisions in each country, indicating that when GDP grows, provisions tend to fall and vice versa. The results also revealed other factors influencing the behavior of loan loss provisions, such as earning management.

Keywords:
provisions; cyclicality; economic cycles; credit operations; commercial banks

1. INTRODUÇÃO

Segundo Longbrake e Rossi (2011Longbrake, W. A., & Rossi, C. V. (2011, July). Procyclical versus countercyclical policy effects on financial markets. Study prepared for the Anthony T. Cluff Fund. The Financial Services Roundtable. Financing America’s Economy. Retrieved from http://www.fsround.org/fsr/pdfs/cluff/CountercyclicalPE.pdf.
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), muitas das regras que regulam os mercados financeiros contribuíram para aprofundar a crise que vitimou a economia mundial no período 2007-2009, alimentando o debate acerca da forma como o sistema financeiro estaria acentuando os efeitos decorrentes das fases de expansão e de contração da economia. No cerne da afirmação, a preocupação com a pró-ciclicidade, que representa o comovimento positivo entre uma determinada variável e a atividade econômica (Bebczuk & Sangiácomo, 2010Bebczuk, R., Carrera, J., & Sangiácomo, M. (2010). A new look into credit procyclicality: International panel evidence. In BIS Consultative Council for the Americas Conference on “systemic risk, bank behavior and regulation over the business cycle”. Buenos Aires, Argentina.).

Para Harrald e Sandal (2010Harrald, P., & Sandal, T. (2010, October). Addressing pro-cyclicality. Asia-Risk, 70-72. Retrieved from htttp://www.risk.net. ), a pró-ciclicidade é a forma pela qual o sistema bancário interage com a economia real no sentido de acentuar os efeitos de um ciclo econômico. Decorre dos incentivos para a aceleração da concessão de empréstimos em períodos de expansão econômica e para sua contração em momentos de crise.

Segundo Longbrake e Rossi (2011Longbrake, W. A., & Rossi, C. V. (2011, July). Procyclical versus countercyclical policy effects on financial markets. Study prepared for the Anthony T. Cluff Fund. The Financial Services Roundtable. Financing America’s Economy. Retrieved from http://www.fsround.org/fsr/pdfs/cluff/CountercyclicalPE.pdf.
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), o sistema financeiro deveria, idealmente, amortecer, e não amplificar os ciclos econômicos. A pró-ciclicidade se revela especialmente um problema quando acentua o efeito da queda do ciclo econômico, favorecendo o agravamento da crise. Nesse sentido, regras anticíclicas, que reduzem os desequilíbrios econômicos, diminuindo a amplitude dos ciclos econômicos, são bem-vindas.

Ainda de acordo com esses autores, entre os fatores que explicam a influência do sistema financeiro no cenário econômico estão as regras contábeis de constituição da provisão para créditos de liquidação duvidosa. A expressão “provisão para créditos de liquidação duvidosa” é a denominação usada pelo Banco Central do Brasil para as perdas estimadas nos créditos concedidos por instituições financeiras. Nos padrões contábeis internacionais, tal provisão estaria representada pelas perdas por imparidade originárias de empréstimos e recebíveis.

Para Bikker e Metzemakers (2004Bikker, J. A., & Metzemakers, P. A. J. (2004, March). Bank provisioning behaviour and procyclicality. Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 209, 1-17. doi: 10.1016/j.intfin.2004.03.004.
https://doi.org/10.1016/j.intfin.2004.03...
), a provisão abre portas a julgamentos subjetivos, permitindo a discricionariedade no estabelecimento de níveis considerados “adequados”. O estudo desses autores identificou uma relação direta entre a provisão constituída pelos bancos e os ciclos econômicos, revelando que a suavização de resultados, o gerenciamento de capital e as regras de tributação também seriam determinantes à definição do nível da provisão.

Betancourt e Baril (2009Betancourt, L., & Baril, C. P. (2009, October/November). Accounting for loan losses: Is Dynamic provisioning the answer? Bank Accounting Finance, 22(6), 9-16. Retrieved from http://connection.ebscohost.com/c/articles/44680540/accounting-loan-losses-dynamic-provisioning-answer.
http://connection.ebscohost.com/c/articl...
) observam que no início de um ciclo econômico descendente há pouca provisão reconhecida no resultado dos bancos. Com o agravamento da crise, as provisões vão crescendo, deteriorando a situação patrimonial dos bancos e reduzindo os níveis de concessão de crédito quando o mercado mais necessita de recursos. Esse comportamento pró-cíclico estaria sendo adotado pelos bancos que seguem padrões internacionais de contabilidade para as provisões.

Os princípios contábeis nos Estados Unidos e os padrões do International Accounting Standard Board (IASB) adotam o modelo de perda incorrida, pois estabelecem que uma perda em operações de crédito somente será reconhecida no resultado se for provável sua ocorrência (relacionada a um evento de perda) e seu valor puder ser estimado com segurança.

Segundo Betancourt e Baril (2009Betancourt, L., & Baril, C. P. (2009, October/November). Accounting for loan losses: Is Dynamic provisioning the answer? Bank Accounting Finance, 22(6), 9-16. Retrieved from http://connection.ebscohost.com/c/articles/44680540/accounting-loan-losses-dynamic-provisioning-answer.
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), uma alternativa ao modelo de perda incorrida é o modelo de perda esperada, que reconhece provisões baseadas em expectativas de perdas futuras, independentemente de evidência objetiva. Tal modelo tem como referência a provisão dinâmica adotada pelo Banco de España, que admite a constituição de provisão genérica para proteger os bancos contra eventuais perdas adicionais em um determinado ciclo econômico.

No Brasil, a Resolução nº 2.682/1999, do Conselho Monetário Nacional, reza que a provisão seja constituída com base no nível de risco da operação, devendo seu valor ser revisto, no mínimo, mensalmente, em função do atraso no pagamento de principal ou encargos. Trata-se de sistema misto, com características de perda esperada (provisões baseadas em expectativas de perdas futuras) e de perda incorrida (provisões baseadas em evidências objetivas representadas pelos atrasos de pagamento).

Os três modelos contábeis estariam provocando comportamentos distintos da provisão em relação aos ciclos econômicos. Para confirmar tal premissa, urge investigar a relação entre os critérios contábeis para a constituição de provisão em bancos e os ciclos econômicos.

Estudos, como os de Bikker e Metzemakers (2004Bikker, J. A., & Metzemakers, P. A. J. (2004, March). Bank provisioning behaviour and procyclicality. Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 209, 1-17. doi: 10.1016/j.intfin.2004.03.004.
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) e de Boutavier e Lepetit (2007Bouvatier, V., & Lepetit, L. (2007). Banks’ procyclical behavior: Does provisioning matter? Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 18, 513-528. doi: 10.1016/j.intfin.2007.07.004.
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), já foram realizados para investigar a relação entre a provisão para créditos duvidosos e os ciclos econômicos. Além de restritos a certos aspectos da provisão, esses estudos usaram modelos e variáveis relativamente distintos, deixando espaço para novas incursões sobre o tema.

Raros são os estudos envolvendo o modelo brasileiro, presumivelmente anticíclico por ter a maior parte do valor das provisões como resultado da classificação das operações por nível de risco quando de sua concessão, e não da migração entre as categorias de risco por inadimplemento das operações.

O objetivo é analisar se os modelos contábeis voltados à constituição de provisão para créditos duvidosos em bancos são pró-cíclicos, anticíclicos ou acíclicos, utilizando-se um modelo econométrico com fundamentação teórica e construção empírica consistentes.

Foi especificado modelo econométrico em painéis de dados no qual a variável despesa de provisão para créditos de liquidação duvidosa, relativizada pelo ativo total, é regredida contra a variação do Produto Interno Bruto (PIB), sob controle da taxa de desemprego e de variáveis contábeis que afetam a provisão. Idêntica especificação é rodada para amostras de três diferentes sistemas contábeis de provisão (Reino Unido, Espanha e Brasil), buscando-se verificar se a covariância entre a provisão e o PIB é significativamente positiva (anticíclica), negativa (pró-cíclica) ou sem significância (acíclica).

Os resultados indicaram associação negativa e significativa entre a despesa de provisão e o PIB nos três países, sinalizando que o comportamento pró-cíclico confirmado empiricamente independe do modelo de provisão adotado. Uma provável conjectura sobre este achado é que os bancos podem estar gerenciando discricionariamente seu lucro através da provisão, mais do que compensando o efeito esperado dos modelos, mas esta é uma hipótese a ser investigada em futuras pesquisas.

Além desta introdução, este trabalho apresenta, na seção 2, a revisão da literatura; a seção 3 formula as três hipóteses da pesquisa; a seção 4 detalha a metodologia; a seção 5 apresenta, analisa e discute os resultados; e a seção 6 faz as considerações finais.

2. CONSIDERAÇÕES SOBRE CICLOS ECONÔMICOS E PRÓ-CICLICIDADE

Uma definição clássica de “ciclo econômico” é a de Burns e Mitchell (1946Burns, A. F., & Mitchell, W. C. (1946). Measuring business cycles. NBER Book Series Studies in Business Cycles, New York: National Bureau of Economic Research., tradução nossa):

Ciclos econômicos são espécies de flutuações verificadas na atividade econômica agregada de nações que organizam seu trabalho principalmente por meio de atividades empresariais: um ciclo consiste de expansões verificadas praticamente ao mesmo tempo em várias atividades econômicas, seguidas por recessões, contrações e revigoramentos de caráter também geral, que se mesclam à fase de expansão do próximo ciclo; em termos de duração, os ciclos econômicos variam de períodos superiores a 1 ano até dez ou doze anos.

Para Harrald e Sandal (2010Harrald, P., & Sandal, T. (2010, October). Addressing pro-cyclicality. Asia-Risk, 70-72. Retrieved from htttp://www.risk.net. ), a pró-ciclicidade é a forma pela qual o sistema bancário interage com a economia real acentuando os efeitos de um ciclo econômico. O custo da pró-ciclicidade depende da extensão pela qual os efeitos do ciclo são acentuados e do fato de esses efeitos serem danosos à economia. A pró-ciclicidade decorre dos incentivos para a aceleração da concessão de empréstimos em períodos de expansão e para a contração das referidas operações nas épocas de crise.

Segundo Bebczuk et al. (2010Bebczuk, R., Carrera, J., & Sangiácomo, M. (2010). A new look into credit procyclicality: International panel evidence. In BIS Consultative Council for the Americas Conference on “systemic risk, bank behavior and regulation over the business cycle”. Buenos Aires, Argentina.), a pró-ciclicidade é o movimento sincronizado do crescimento do crédito e da produção, ambos no tempo t. Uma excessiva ciclicidade da concessão de crédito pode gerar problemas como a exacerbação do ciclo econômico, o aumento do risco sistêmico e a alocação inadequada dos recursos para empréstimos.

Para Gonzales (2009Gonzales, J. E. N. (2009, July). The fundamentals of procyclicality of the financial system. Economic Newsletter. Bangko Sentral NG Pilipinas, 9(3). Retrieved from http://www.bsp.gov.ph/downloads/EcoNews/EN09-03.pdf.
http://www.bsp.gov.ph/downloads/EcoNews/...
), a pró-ciclicidade está presente quando as ações dos bancos tendem a reforçar os movimentos dos ciclos econômicos subjacentes, apontando para uma correlação entre referidas ações e os cenários econômicos vigentes. As medidas pró-cíclicas são, portanto, as que contribuem para o fortalecimento do ciclo econômico vigente.

3. A PROVISÃO PARA CRÉDITOS DE LIQUIDAÇÃO DUVIDOSA EM BANCOS

Hendriksen e Van Breda (1999Hendriksen, E. S., & Van Breda, M. F. (1999). Teoria da contabilidade. São Paulo, SP: Atlas.) declaram que um importante elemento da avaliação de recebíveis é o tratamento da incerteza quanto ao seu pagamento pelo cliente. Assim, a receita deve ser medida pelo valor que se espera receber. Na qualidade de reserva de valor, a provisão ajusta o valor bruto dos empréstimos em função do seu risco de crédito. Tal ajuste tem efeito direto no cálculo do lucro, afetando o montante a ser distribuído aos acionistas.

3.1. Modelos de Provisão

As regras de provisão de bancos podem ser: (i) backward-looking, baseadas nas perdas incorridas nas operações, considerados os eventos e as condições anteriores ao balanço; e (ii) forward-looking, constituídas com base nas perdas esperadas, a partir de análises de tendências (Bouvatier & Lepetit, 2012Bouvatier, V., & Lepetit, L. (2012, July). Provisioning rules and bank lending: A theoretical model. Journal of Financial Stability, 8(2), 25-31. Retrieved from http://ssrn.com/abstract=1148314.
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).

Segundo Cortavarria, Dziobek, Kanaya e Song (2000Cortavarria, L., Dziobek, C., Kanaya, A., & Song, I. (2000, December). Loan review, provisioning, and macroeconomic linkages. WP/00/195. IMF Working Paper. International Monetary Fund. Retrieved from http://www.imf.org/external/pubs/ft/wp/2000/wp00195.pdf.
http://www.imf.org/external/pubs/ft/wp/2...
), as provisões podem ser genéricas e específicas. As genéricas são as perdas possíveis ou latentes ainda não identificadas (ex-ante), aplicáveis a todas as operações. As específicas refletem perdas identificadas individualmente, relacionadas a um evento observável (ex-post).

3.2. Gerenciamento de Resultados via Provisão

As regras contábeis conferem o uso da discricionariedade e do julgamento na preparação das demonstrações contábeis (Cohen & Zarowin, 2007Cohen, D. A, & Zarowin, P. (2007, August). Earnings management over the business cycle. New York University. Stern School of Business. Retrieved from http://w4.stern.nyu.edu/emplibrary/EM_08_23_07FINAL.pdf.
http://w4.stern.nyu.edu/emplibrary/EM_08...
). Faculta-se usar o conhecimento e a expertise no negócio visando a selecionar métodos, estimativas e evidenciações contábeis mais apropriados. O problema é quando os gestores encontram incentivos para transmitir informação em benefício próprio, escolhendo métodos e estimativas contábeis que não refletem adequadamente as condições econômicas subjacentes.

Para Cohen e Zarowin (2007Cohen, D. A, & Zarowin, P. (2007, August). Earnings management over the business cycle. New York University. Stern School of Business. Retrieved from http://w4.stern.nyu.edu/emplibrary/EM_08_23_07FINAL.pdf.
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), essa discricionariedade da informação contábil pode ser tanto maximizadora de valor como oportunista, abrindo espaço para o “gerenciamento de resultados”. Este pode ser alcançado por meio da manipulação de accruals, que, segundo Martinez (2001Martinez, A. L. (2001). “Gerenciamento” dos resultados contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Ph.D. thesis). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP., p. 29), representam “a diferença entre o lucro líquido e o fluxo de caixa líquido”, ou por meio de transações reais, como a redução de gastos com pesquisa e desenvolvimento. No caso da provisão, o gerenciamento de resultados ocorre através da manipulação de accruals. Para Martinez (2001Martinez, A. L. (2001). “Gerenciamento” dos resultados contábeis: estudo empírico das companhias abertas brasileiras (Ph.D. thesis). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.), quando é facultado ao gestor fazer escolhas contábeis, este pode não se restringir ao fato contábil em si e utilizar variáveis exógenas, que também influenciarão a decisão. Assim, a provisão contemplará também aspectos que extrapolam a qualidade do crédito.

Estudos revelaram indícios da prática de gerenciamento de resultados por instituições financeiras no Brasil, a partir do uso da provisão para créditos de liquidação duvidosa. Macedo e Kelly (2016Macedo, M. A. S., & Kelly, V. L. A. (2016, May/August). Gerenciamento de resultados em instituições financeiras no Brasil: uma análise com base em provisões para crédito de liquidação duvidosa. Revista Evidenciação Contábil & Finanças, 4(2), 82-96.) identificaram que, de 2006 a 2012, a referida provisão sofreu influências do nível de lucro obtido pelas instituições financeiras. Resultado semelhante alcançaram Bortoluzzo, Sheng e Gomes (2016Bortoluzzo, A. B., Sheng, H. H., & Gomes, A. L. P. (2016) Earning management in Brazilian financial institutions. Revista de Administração da Universidade de São Paulo, 51(2), 182-197. ISSN 0080-2107. doi: 10.5700/rausp1233.
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), analisando o comportamento de 123 bancos brasileiros entre 2001 e 2012. Silva (2016Silva, C. A. M. (2016). Utilização da provisão para créditos de liquidação duvidosa para fins de gerenciamento de resultado nas instituições financeiras brasileiras e luso-espanholas (Master’s thesis). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de Brasília, Brasília, DF.) constatou que as instituições financeiras brasileiras e luso-espanholas fizeram, de junho de 2009 a dezembro de 2014, uso das despesas com provisão para gerenciar resultados. Cursio e Hasan (2015Curcio, D., & Hasan, I. (2015). Earnings and capital management and signaling: The use of loan-loss provisions by European banks. The European Journal of Finance, 21(1), 26-50. doi: 10.1080/1351847X.2012.762408.
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) constataram que, de 1996 a 2006, o gerenciamento de resultados revelou-se um importante determinante da provisão nos intermediários financeiros que atuam na zona do Euro.

3.3. Gerenciamento de Capital via Provisão

Na hipótese de gerenciamento de capital, os bancos constituem provisões maiores quando o seu capital regulatório apresenta-se relativamente baixo. Isso ocorre, segundo Bikker e Metzemakers (2004Bikker, J. A., & Metzemakers, P. A. J. (2004, March). Bank provisioning behaviour and procyclicality. Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 209, 1-17. doi: 10.1016/j.intfin.2004.03.004.
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), porque o Acordo de Basileia permite que as provisões acumuladas no balanço, embora limitadas a um percentual dos ativos ponderados pelo risco, componham o capital regulatório dos bancos. Tal permissão ocorre somente em relação ao capital nível 2, que é o capital regulatório de mais baixa qualidade, cujo valor não pode exceder o valor do capital nível 1, tido como capital principal.

3.4. Estudos Relacionando a Provisão com os Ciclos Econômicos

A Tabela 1 contempla estudos envolvendo a pró-ciclicidade da provisão em bancos.

Tabela 1
Síntese dos principais artigos envolvendo a análise da pró-ciclicidade da provisão para créditos de liquidação duvidosa em instituições financeiras.

4. HIPÓTESES DA PESQUISA

As hipóteses a serem testadas nesta pesquisa, formuladas em formato alternativo, são:

  • H 1  A provisão baseada no modelo de perda incorrida apresenta relação negativa com as variáveis que representam a atividade econômica, contribuindo para potencializar eventuais retrações experimentadas pela economia ou para ampliar os efeitos de ciclos econômicos favoráveis. Possui natureza pró-cíclica.
  • H 2  A provisão baseada no modelo de perda esperada apresenta relação positiva com as variáveis que representam a atividade econômica, impedindo que eventuais retrações da economia sejam potencializadas ou que os efeitos de ciclos econômicos favoráveis sejam ampliados. Possui natureza anticíclica.
  • H 3  A provisão baseada no modelo misto adotado no Brasil apresenta relação positiva com as variáveis que representam a atividade econômica, impedindo que eventuais retrações experimentadas pela economia sejam potencializadas ou que os efeitos de ciclos econômicos favoráveis sejam ampliados. Possui natureza anticíclica.

5. METODOLOGIA

5.1. Apresentação do Modelo e Discussão das Variáveis

Definiu-se um modelo de regressão linear para avaliar a relação entre as variáveis de interesse, visando a identificar como as provisões estão associadas às variáveis que caracterizam os ciclos econômicos. A maioria dos estudos relacionando provisões e ciclos econômicos utiliza esse tipo de modelo, a exemplo de Cavallo e Majnoni (2001Cavallo, M., & Majnoni, G. (2001, June). Do banks provision for bad loans in good times? Empirical evidence and policy implications. Working Paper Nº 2.619. World Bank Policy Research. Retrieved from https://openknowledge.worldbank.org/handle/10986/19607.
https://openknowledge.worldbank.org/hand...
), Bikker e Hu (2002Bikker, J. A., & Hu, H. (2002). Cyclical patterns in profits, provisioning and lending of banks and procyclicality of the new basel capital requirements. Banca Nazionale del Lavaro Quarterly Review, 55(221), 143-175. Retrieved from https://www.dnb.nl/binaries/ot039_tcm46-146052.pdf.
https://www.dnb.nl/binaries/ot039_tcm46-...
), Laeven e Majnoni (2003Laeven, L., & Majnoni, G. (2003, April). Loan loss provisioning and economic slowdowns: too much, too late? Journal of Financial Intermediation, 12(2), 178-197. Retrieved from http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1042957303000160.
http://www.sciencedirect.com/science/art...
), Bikker e Metzemakers (2004Bikker, J. A., & Metzemakers, P. A. J. (2004, March). Bank provisioning behaviour and procyclicality. Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 209, 1-17. doi: 10.1016/j.intfin.2004.03.004.
https://doi.org/10.1016/j.intfin.2004.03...
), Handorf e Zhu (2006Handorf, W. C., & Zhu, L. (2006, spring). US Bank loan-loss provisions, economic conditions, and regulatory guidance. Journal of Applied Finance, 16(1), 97-114. Retrieved from http://search.proquest.com/openview/ee52c0978ed6e519591ff513944a8a54/1?pq-origsite=gscholar&cbl=26518.
http://search.proquest.com/openview/ee52...
), Bouvatier e Lepetit (2007Bouvatier, V., & Lepetit, L. (2007). Banks’ procyclical behavior: Does provisioning matter? Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 18, 513-528. doi: 10.1016/j.intfin.2007.07.004.
https://doi.org/10.1016/j.intfin.2007.07...
) e Glen e Mondragón-Vélez (2011Glen, J., & Mondragón-Vélez, C. (2011, January). Business cycle effects on commercial bank loan portfolio performance in developing economies. Review of Development Finance, 1(2), 150-165. Retrieved from http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1754672.
http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?a...
).

O modelo é estimado com o método de dados em painel. Os testes empíricos baseiam-se no modelo a seguir, elaborado a partir dos objetivos e das hipóteses da pesquisa:

P R O V i t = β 0 + β 1 P I B t + β 2 D E S E M P t + β 3 L U C i t + β 4 l n E M P i t + β 5 E M P i t + β 6 P L i t + β 7 P O R T E i t i + ε i t (1)

onde:

  • PROVit = provisão para créditos de liquidação duvidosa sobre os ativos totais médios dos bancos i no tempo t.

  • PIB it = variação real do PIB no tempo t.

  • DESEMPt = taxa de desemprego no tempo t.

  • LUCit = lucro antes do imposto de renda, das participações e das provisões para créditos de liquidação duvidosa sobre os ativos totais médios dos bancos i no tempo t.

  • lnEMP it = variação dos saldos dos empréstimos dos bancos i no tempo t.

  • EMPit = saldo das operações de crédito sobre os ativos totais dos bancos i no tempo t.

  • PLit = capital próprio sobre os ativos totais dos bancos i no tempo t.

  • PORTEit = tamanho dos bancos i no tempo t.

O objetivo do modelo não é capturar uma eventual relação de causa e efeito entre variável dependente e variáveis independentes, mas identificar como a variável dependente se comporta diante da variação de cada variável independente, especialmente as macroeconômicas.

Apesar de as variáveis contábeis serem endógenas, a sua inclusão no modelo justifica-se por ser a provisão influenciada por fatores eminentemente contábeis, como recebíveis, lucros e capital próprio. Ademais, tais variáveis funcionam como variáveis de controle, auxiliando a captura mais adequada da relação entre a variável dependente e as independentes, tidas como críticas ao estudo (PIB e taxa de desemprego).

A maioria dos modelos que estudam a relação provisão-ciclos econômicos utiliza a provisão como variável dependente. Neste estudo, ela representa o montante líquido das despesas de provisão constituídas no período, obtido pela diferença entre as provisões constituídas e as revertidas.

As variáveis independentes podem ser classificadas em: (i) variáveis macroeconômicas dos países (crescimento real do PIB e taxa de desemprego); (ii) variáveis contábeis dos bancos (lucros antes do imposto de renda, das participações e das provisões para créditos de liquidação duvidosa sobre os ativos totais médios, variação dos saldos dos empréstimos, saldos dos empréstimos sobre os ativos totais e capital próprio sobre os ativos totais); e (iii) variáveis de controle (porte do banco).

A variação real do PIB é a variável crítica do modelo, sendo considerado o indicador mais útil para representar o ciclo econômico. O seu valor representa a variação percentual do PIB a preços constantes.

A taxa de desemprego é outra métrica representativa da fase corrente do ciclo econômico. No Brasil, ela indica a taxa de desocupação de pessoas a partir de 10 anos de idade, consideradas apenas as principais regiões metropolitanas do País.

A variável lucros sobre ativos totais, que sinaliza uma eventual utilização da provisão para gerenciar resultados, é resultado da divisão do valor dos lucros antes do imposto de renda, das participações e das provisões para crédito de liquidação duvidosa pelo valor do ativo total médio.

A variável crescimento dos empréstimos, indicativa da evolução do risco de crédito dos bancos, representa a variação dos saldos das operações de crédito, em termos reais. No caso brasileiro, o deflator utilizado foi o Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM). Para Espanha e Reino Unido, utilizou-se o Índice de Preços ao Consumidor (IPC). A variação do saldo dos empréstimos foi calculada por meio da diferença dos logaritmos naturais, da seguinte forma: ln(operações de créditoit/IGPMit) - ln(operações de créditoit-1/IGPMit-1).

A variável empréstimos sobre ativos totais contempla a exposição dos bancos a riscos de crédito, indicando o tamanho relativo da carteira de empréstimos. Representa a divisão do saldo das contas de operações de crédito a receber pelo valor do ativo total.

A variável capital próprio sobre os ativos totais, inserida no modelo para sinalizar uma eventual utilização da provisão como instrumento de gerenciamento de capital, é fruto da divisão do patrimônio líquido pelo ativo total.

A variável 𝑃𝑂𝑅𝑇𝐸𝑖𝑡 , definida como o logaritmo natural do ativo total, deflacionado pelo IGPM ou IPC, busca controlar os efeitos do tamanho das instituições. Espera-se que os bancos de maior porte, ou participantes de conglomerados, constituam provisões mais robustas.

5.2. Síntese dos Resultados Esperados

A Tabela 2 sintetiza os resultados esperados em relação ao comportamento e ao sinal dos coeficientes das variáveis explicativas, com base nas hipóteses formuladas.

Tabela 2
Síntese dos resultados esperados em relação às variáveis explicativas do modelo.

5.3. Testes Aplicados e Procedimentos de Robustez Adotados

Os testes Im, Pesaran e Shin - I.P.S, ADF-Fisher e PP-Fisher de raiz unitária indicaram que, nos países pesquisados, o risco de uma regressão espúria estava afastado.

A matriz de correlação de Pearson (tabelas 3, 4 e 5) comprovou inexistir correlação alta (superior a 0,8) entre as variáveis independentes nos países analisados.

Tabela 3
Matriz de correlação de Pearson - Brasil.
Tabela 4
Matriz de correlação de Pearson - Espanha.
Tabela 5
Matriz de correlação de Pearson - Reino Unido.

Avaliou-se o risco de multicolinearidade aplicando-se o teste de inflação de variância entre as variáveis explicativas, que não revelou problemas de multicolinearidade.

Realizou-se o teste de Chow para testar a existência de heterogeneidade individual e confirmar se o uso de dados em painel se aplicaria ao estudo. Nos três países, a opção foi utilizar a regressão com efeitos individuais. Em seguida, procedeu-se ao teste de Hausman para definir o melhor método de dados em painel para a estimação da regressão. Para o Brasil, o resultado indicou o modelo com efeitos aleatórios. Para Espanha e Reino Unido, o modelo com efeitos fixos.

Para analisar a existência de autocorrelação entre os resíduos da regressão, utilizou-se o teste de Durbin-Watson. Nos três países, o valor da estatística situou-se entre dl e du , indicando ser o teste inconclusivo. Adotando-se uma postura conservadora, a hipótese nula de inexistência de autocorrelação é rejeitada, ou seja, os resíduos do modelo aparentam ser autocorrelacionados.

Diante da possibilidade de existência de autocorrelação seccional dos resíduos, a utilização do método de erros padrão seccionais SUR (PCSE) na estimação do modelo surgiu como alternativa ao problema, permitindo a geração de parâmetros robustos mesmo na presença de autocorrelação dos resíduos.

A significância global do modelo foi comprovada por meio do teste F.

5.4. Definição da Amostra e Descrição da Fonte dos Dados

5.4.1 Em relação aos bancos que atuam no Brasil.

No Brasil, a amostra contemplou as instituições que, em 31 de dezembro de 2012, faziam parte do Consolidado Bancário I, formado pelo Conglomerado Bancário I (composto de pelo menos uma instituição do tipo Banco Comercial ou Banco Múltiplo com Carteira Comercial) e Instituições Bancárias Independentes I (Bancos Comerciais, Bancos Múltiplos com Carteira Comercial e Caixas Econômicas que não integrem conglomerado).

Noventa e oito instituições foram inicialmente contempladas. Em conjunto, tais instituições controlavam 84,1% dos ativos totais do Sistema Financeiro Nacional, na posição de 31 de dezembro de 2012.

O Banco Plural, o Morgan Stanley, o Banco BM&F, o Banco Opportunity, o BNY Mellon, o Wester Union e o Banco Petra foram excluídos da amostra por não apresentarem saldo de operações de crédito no período analisado.

Extraíram-se os dados das demonstrações contábeis semestrais das instituições selecionadas, nas posições de 30 de junho e 31 de dezembro entre os anos de 2001-2012, obtidas do sítio do Banco Central do Brasil na Internet.

5.4.2. Em relação aos bancos que atuam na Espanha.

A amostra contemplou todos os bancos espanhóis associados à Asociación Española de Banca (AEB). Cinquenta e oito instituições, entre conglomerados financeiros e bancos individuais, foram contempladas no estudo.

5.4.3. Em relação aos bancos que atuam no Reino Unido.

A seleção dos bancos que atuam no Reino Unido baseou-se na publicação “List of Banks as Compiled by the Bank of England on 31 March 2013”, que contempla a relação de bancos sob a supervisão do Banco da Inglaterra, disponível no sítio www.bankofengland.co.uk. A lista é composta por 153 instituições financeiras, tendo sido selecionados 45 bancos para compor a amostra (29,41% das instituições supervisionadas). A amostra priorizou instituições com exercício social encerrado em 31 de dezembro e que apresentassem suas informações em bases monetárias idênticas (libras esterlinas). As informações foram obtidas por meio do sítio da Company Check (www.companycheck.co.uk), que disponibiliza as demonstrações contábeis anuais de bancos que atuam no Reino Unido.

6. RESULTADOS

6.1. Estatísticas Descritivas da Variável Dependente

As estatísticas descritivas da variável dependente encontram-se na Tabela 6. Do segundo semestre de 2001 ao segundo semestre de 2012, os bancos comerciais que atuam no Brasil, na Espanha e no Reino Unido constituíram, em média, provisões em percentuais iguais a 0,83%, a 0,2668% e a 0,3607% dos ativos totais, respectivamente. Os desvios-padrões sinalizam uma grande variabilidade da provisão, talvez motivada pelo mecanismo de reversão, e indicam que as distribuições de frequência da provisão, nos três países, têm comportamento similar.

Tabela 6
Estatísticas descritivas da variável dependente do modelo - Brasil, Espanha e Reino Unido, no período de 2001 a 2012.

6.2. Estatísticas Descritivas das Variáveis Independentes

6.2.1. Brasil.

Tabela 7
Estatísticas descritivas das variáveis independentes do modelo - Brasil, no período de 2001 a 2012.

Conforme Tabela 7, em média apenas 34,34% dos recursos foram destinados a operações de crédito, percentual bastante inferior aos dos bancos que atuam na Espanha e no Reino Unido, que se situaram em torno de 82% e 71%, respectivamente.

A participação média dos recursos próprios sobre os investimentos totais dos bancos comerciais tem se mostrado bastante significativa, em torno de 23%, mais confortável que a dos bancos que atuam na Espanha (média de 20%) e bem superior à dos bancos que atuam no Reino Unido (média de 13,8%).

6.2.2. Espanha.

A Tabela 8 apresenta as estatísticas descritivas das variáveis independentes em relação aos bancos que atuam na Espanha. O retorno médio sobre o ativo ficou em torno de 0,53%, abaixo dos retornos dos bancos que atuam no Brasil (2,25%) e no Reino Unido (1,91%).

Tabela 8
Estatísticas descritivas das variáveis independentes do modelo - Espanha, no período de 2001 a 2012.

6.2.3. Reino Unido.

As estatísticas descritivas das variáveis independentes relacionadas aos bancos que atuam no Reino Unido são apresentadas na Tabela 9.

Tabela 9
Estatísticas descritivas das variáveis independentes do modelo - Reino Unido, no período de 2001 a 2012.

6.3. Teste das Hipóteses

6.3.1. H1: Bancos que atuam no Reino Unido.

O coeficiente de determinação (R2) indica que as variáveis independentes estão associadas a 38,87% do comportamento da variável dependente. A estatística F, com p-valor de 0,0000, confirma a significância estatística do modelo (Tabela 10).

Tabela 10
Coeficientes de Determinação e Estatística F do modelo - Reino Unido.

As variáveis macroeconômicas e as variáveis contábeis específicas dos bancos, exceto o PIB, não têm efeitos significativos nas provisões no Reino Unido. As variáveis “empréstimos sobre ativo total” e “crescimento dos empréstimos” não se revelaram significativas, contrariando a expectativa apresentada na Tabela 2.

A variável “lucro antes do imposto de renda, das participações e das provisões para créditos de liquidação duvidosa sobre o ativo total” também não se revelou significativa, sinalizando que variações no lucro não explicariam o comportamento das provisões, o que contraria a expectativa de pesquisa. O gerenciamento de resultados com o uso de provisões não parece ser uma prática comum dos bancos no Reino Unido.

Tabela 11
Resultados da regressão - Reino Unido.

A variável “patrimônio líquido sobre o ativo total” não se revelou significativa, contrariando a hipótese de gerenciamento de capital.

A um nível de significância de 1%, o coeficiente da variável “crescimento do PIB” revelou-se significativamente negativo, indicando um comportamento pró-cíclico dos bancos no Reino Unido, na linha do que foi anunciado na hipótese H1.

A variável “crescimento da taxa de desemprego” somente se revelou significativa a um nível de significância de 10%, contrariando as expectativas. Tal resultado, no entanto, corrobora os achados de pesquisas anteriores, como a de Bikkers e Metzemakers (2004Bikker, J. A., & Metzemakers, P. A. J. (2004, March). Bank provisioning behaviour and procyclicality. Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 209, 1-17. doi: 10.1016/j.intfin.2004.03.004.
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).

A variável de controle “porte” não se revelou também significativa.

6.3.2. H2: Bancos que atuam na Espanha.

Quanto aos bancos que atuam na Espanha, o coeficiente de determinação (R2) indica que as variáveis independentes estão associadas a 38,31% do comportamento da variável dependente. A estatística F, com p-valor de 0,0000, confirma a significância estatística do modelo (Tabela 12).

Tabela 12
Coeficientes de determinação e estatística F do modelo - Espanha.
Tabela 13
Resultados da regressão - Espanha.

As variáveis “empréstimos sobre ativo total”, “resultado sobre ativo total”, “crescimento do PIB” e “porte” têm efeitos significativos nas provisões para créditos duvidosos na Espanha, a diferentes níveis de significância, conforme se pode observar na Tabela 13. As demais variáveis não foram significativas.

A variável “empréstimos sobre ativo total” se revelou significativa, a um nível de significância de 10%. O sinal positivo do coeficiente corrobora a expectativa apresentada na Tabela 2, sinalizando que a provisão tende a subir quando a participação dos empréstimos sobre o ativo total aumenta.

Contrariando as expectativas, a variável “crescimento dos empréstimos” não se revelou significativa, indicando que a variação no volume de empréstimos concedidos não explica o comportamento das provisões.

A variável “lucro antes do imposto de renda, das participações e das provisões para créditos de liquidação duvidosa sobre o ativo total” se revelou significativa na Espanha, a um nível de significância de 1%. O sinal negativo do coeficiente indica o crescimento da provisão sempre que o lucro diminui e vice-versa, contrariando o esperado. Não há evidências de prática de gerenciamento de resultados com o uso de provisões pelos bancos espanhóis.

A variável “patrimônio líquido sobre o ativo total” não é significativa, contrariando a expectativa quanto ao uso da provisão para gerenciamento de capital.

Contrariamente à expectativa anunciada na hipótese H2, a um nível de significância de 1%, o coeficiente da variável “crescimento do PIB” revelou-se significativamente negativo, indicando um comportamento pró-cíclico.

A variável “taxa de desemprego” não se revelou significativa, contrariando as expectativas. A variável de controle “porte” revelou-se significativa, com sinal positivo, indicando que quanto maior o tamanho dos bancos, maior tende a ser o nível de provisão.

6.3.3. H3: Bancos que atuam no Brasil.

O coeficiente de determinação (R2) indica que as variáveis independentes do modelo estão associadas a 15,65% do comportamento da variável dependente (Tabela 14). A estatística F, que apresenta um p-valor igual a 0,0000, confirma a significância estatística do modelo.

Tabela 14
Coeficientes de determinação e estatística F do modelo - Brasil.
Tabela 15
Resultados da regressão - Brasil.

Conforme dados da Tabela 15, as variáveis macroeconômicas e as variáveis contábeis específicas dos bancos pesquisados no Brasil, à exceção da taxa de desemprego e do porte, têm efeitos significativos nas provisões.

A variável “empréstimos sobre ativo total” revelou-se significativa, a um nível de significância de 1%, com coeficiente positivo. Como esperado, quando um banco aumenta a participação das operações de crédito nos investimentos totais, o percentual da provisão também aumenta, confirmando a alegação de crescimento dos riscos nas fases de expansão econômica. Esse comportamento prudente dos bancos contribui para atenuar os efeitos causados por eventuais comportamentos pró-cíclicos.

A variável “crescimento dos empréstimos” somente se revelou significativa a um nível de significância de 10%. O coeficiente apresentou sinal negativo, indicando que as provisões costumam diminuir quando o saldo das operações de crédito aumenta. Tal constatação contraria a expectativa preliminar, que indicava uma provável relação positiva entre o crescimento do volume das operações de crédito e as provisões.

A variável “lucro antes do imposto de renda, das participações e das provisões para créditos de liquidação duvidosa sobre o ativo total” também se revelou significativa, a um nível de significância de 1%, indicando que variações no lucro têm relação com o comportamento das provisões. O sinal positivo do coeficiente indica o crescimento dos níveis de provisão sempre que o lucro aumenta e vice-versa, corroborando a expectativa apresentada na Tabela 2. O resultado indica o uso da provisão para gerenciar resultados, prática que ameniza os efeitos pró-cíclicos da provisão.

A variável “patrimônio líquido sobre o ativo total” revelou-se significativa, a um nível de significância de 1%. O sinal negativo do coeficiente contraria a expectativa de utilização da provisão para gerenciamento de capital. Supõe-se que os bancos elevem as provisões sempre que os seus níveis de capital forem mais confortáveis. Presume-se que o fato de os bancos no Brasil virem historicamente apresentando patrimônio de referência superior ao exigido pelo Banco Central e a própria ausência do instrumento da provisão genérica na regulamentação do país justifiquem esse resultado.

Sobre a hipótese H3, a um nível de significância de 1% o coeficiente da variável “crescimento do PIB” revelou-se significativamente negativo, indicando um comportamento pró-cíclico. Isso parece sinalizar a ausência de um mecanismo eficiente de avaliação de risco com caráter prospectivo.

Quanto à variável “crescimento da taxa de desemprego”, esta não se revelou significativa, contrariando a expectativa apresentada na Tabela 2. Dá-se o mesmo com a variável de controle “porte”. Não se pode afirmar que bancos maiores no Brasil, ou pertencentes a conglomerados, constituam provisões mais robustas do que os demais.

Como análise de sensibilidade, foram adicionadas aos modelos as variáveis PIB e taxa de desemprego defasadas. No Brasil e no Reino Unido, tais variáveis não se revelaram significativas, indicando que o efeito do comportamento de tais variáveis econômicas no cálculo da provisão ocorre no mesmo período contábil. Quanto à Espanha, a variável taxa de desemprego não se revelou significativa, mas a variável PIB mostrou-se significativa a um nível de significância de 1%.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Estudos como os de Bikker e Hu (2002Bikker, J. A., & Hu, H. (2002). Cyclical patterns in profits, provisioning and lending of banks and procyclicality of the new basel capital requirements. Banca Nazionale del Lavaro Quarterly Review, 55(221), 143-175. Retrieved from https://www.dnb.nl/binaries/ot039_tcm46-146052.pdf.
https://www.dnb.nl/binaries/ot039_tcm46-...
), Laeven e Majnoni (2003Laeven, L., & Majnoni, G. (2003, April). Loan loss provisioning and economic slowdowns: too much, too late? Journal of Financial Intermediation, 12(2), 178-197. Retrieved from http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1042957303000160.
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) e Bikker e Metzemakers (2004Bikker, J. A., & Metzemakers, P. A. J. (2004, March). Bank provisioning behaviour and procyclicality. Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 209, 1-17. doi: 10.1016/j.intfin.2004.03.004.
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) revelam que a escolha entre distintos modelos contábeis determinaria o comportamento da provisão frente aos ciclos econômicos. A expectativa é que o modelo de perda incorrida conduza a um comportamento pró-cíclico da provisão e o modelo de perda esperada culmine com um comportamento anticíclico da provisão. Esta pesquisa se propôs a investigar se os modelos de perda incorrida, conceitualmente pró-cíclicos, induziriam os bancos à constituição de provisões pró-cíclicas, e se os modelos de perda esperada, conceitualmente anticíclicos, levariam os bancos ao reconhecimento de provisões anticíclicas.

Dois países foram intencionalmente escolhidos para representar tais modelos contábeis: Espanha (perda esperada) e Reino Unido (perda incorrida). Um modelo misto adotado no Brasil também foi analisado. A prevalência de procedimentos típicos de modelos de perda esperada reforçou a hipótese de que o modelo brasileiro seria anticíclico.

A partir de modelos de regressão linear utilizados em estudos anteriores, especialmente os de Cavallo e Majnoni (2001Cavallo, M., & Majnoni, G. (2001, June). Do banks provision for bad loans in good times? Empirical evidence and policy implications. Working Paper Nº 2.619. World Bank Policy Research. Retrieved from https://openknowledge.worldbank.org/handle/10986/19607.
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), Bikker e Hu (2002Bikker, J. A., & Hu, H. (2002). Cyclical patterns in profits, provisioning and lending of banks and procyclicality of the new basel capital requirements. Banca Nazionale del Lavaro Quarterly Review, 55(221), 143-175. Retrieved from https://www.dnb.nl/binaries/ot039_tcm46-146052.pdf.
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), Laeven e Majnoni (2003Laeven, L., & Majnoni, G. (2003, April). Loan loss provisioning and economic slowdowns: too much, too late? Journal of Financial Intermediation, 12(2), 178-197. Retrieved from http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1042957303000160.
http://www.sciencedirect.com/science/art...
) e Bikker e Metzemakers (2004Bikker, J. A., & Metzemakers, P. A. J. (2004, March). Bank provisioning behaviour and procyclicality. Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 209, 1-17. doi: 10.1016/j.intfin.2004.03.004.
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), foram selecionadas variáveis para compor um modelo econométrico que identificasse a relação entre a provisão e os ciclos econômicos nos três países selecionados.

Duas variáveis foram inseridas no modelo visando a identificar a relação entre a provisão e os ciclos econômicos: a variação real do PIB e a taxa de desemprego. Contrariando as expectativas, a taxa de desemprego não se revelou estatisticamente significativa no Brasil nem na Espanha. Quanto ao Reino Unido, tal variável revelou-se significativa, a um nível de significância de 10%, apresentando um coeficiente positivo, o que indica que a provisão tende a crescer quando a taxa de desemprego aumenta. Ressalte-se que estudos como os de Bikker e Metzemakers (2004Bikker, J. A., & Metzemakers, P. A. J. (2004, March). Bank provisioning behaviour and procyclicality. Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 209, 1-17. doi: 10.1016/j.intfin.2004.03.004.
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) já revelavam que a taxa de desemprego não seria a melhor proxy para avaliar a relação da provisão com os ciclos econômicos, fato corroborado por esta pesquisa.

A variável tida como uma unanimidade nos estudos que envolvem a ciclicidade é a variação do PIB. Os achados desta pesquisa vêm se juntar a esses estudos, pois o PIB também se revelou uma variável estatisticamente significativa, a um nível de significância de praticamente 1%, para cada modelo contábil objeto desta pesquisa.

Quanto ao sinal do coeficiente da variável que reflete o PIB, duas das hipóteses formuladas não foram corroboradas. A maior surpresa deu-se na Espanha, cujo modelo contábil prescreve a constituição de provisões forward-looking, incluindo provisões de natureza genérica, que deveriam provocar provisões anticíclicas. O sinal do coeficiente da variável, que presumivelmente seria positivo, revelou-se negativo, indicando pró-ciclicidade. No Brasil, apesar de a regra geral ser a constituição de provisões forward-looking, embora nos atrasos nos pagamentos de principal e juros as provisões backward-looking acabem prevalecendo, o estudo revelou também um comportamento pró-cíclico. Infere-se que o caráter subjetivo da provisão e a própria dificuldade de previsão de cenários econômicos futuros, entre outros fatores, possam estar levando a provisões de natureza diversa da que pretendia o legislador ao estabelecer critérios mais específicos para a sua constituição. Somente em relação ao Reino Unido, confirmou-se a hipótese de que o modelo contábil adotado, baseado essencialmente nas regras do IASB, tem, de fato, provocado provisões de natureza pró-cíclica.

Ainda em relação ao Reino Unido, somente a variável crescimento do PIB revelou-se significativa, a um nível de significância de 5%. Pressupõe-se que as variáveis que representam o risco de crédito, como os “empréstimos sobre o ativo total” e o “crescimento dos empréstimos”, não tenham se revelado significativas pelas próprias características do modelo contábil adotado naquele país, que somente reconhece a provisão quando uma evidência objetiva de perda for identificada. Dessa forma, o impacto das duas variáveis somente se daria de forma indireta (uma maior participação dos empréstimos sobre o ativo ou um crescimento no volume dos empréstimos pode levar a uma maior probabilidade de ocorrência de evidências objetivas de perda no futuro). Essas variáveis podem, portanto, se alterar sem que os bancos do Reino Unido tenham que ajustar as suas provisões. No Reino Unido, também não se encontraram evidências de que os bancos estejam usando a provisão para gerenciamento de resultados, contrariando estudo de Silva (2016Silva, C. A. M. (2016). Utilização da provisão para créditos de liquidação duvidosa para fins de gerenciamento de resultado nas instituições financeiras brasileiras e luso-espanholas (Master’s thesis). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de Brasília, Brasília, DF.), ou para gerenciamento de capital.

No que diz respeito a gerenciamento de resultados, pressupõe-se ser essa uma realidade para os bancos comerciais no Brasil, corroborando os resultados dos estudos de Macedo e Kelly (2016Macedo, M. A. S., & Kelly, V. L. A. (2016, May/August). Gerenciamento de resultados em instituições financeiras no Brasil: uma análise com base em provisões para crédito de liquidação duvidosa. Revista Evidenciação Contábil & Finanças, 4(2), 82-96.), Bortoluzzo, Sheng e Gomes (2016Bortoluzzo, A. B., Sheng, H. H., & Gomes, A. L. P. (2016) Earning management in Brazilian financial institutions. Revista de Administração da Universidade de São Paulo, 51(2), 182-197. ISSN 0080-2107. doi: 10.5700/rausp1233.
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) e Silva (2016Silva, C. A. M. (2016). Utilização da provisão para créditos de liquidação duvidosa para fins de gerenciamento de resultado nas instituições financeiras brasileiras e luso-espanholas (Master’s thesis). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de Brasília, Brasília, DF.). A variável “lucros antes do imposto de renda, das participações e das provisões para créditos de liquidação duvidosa” revelou-se significativa, a um nível de significância de 1%, tendo apresentado um coeficiente positivo, indicando que as provisões tendem a crescer quando os resultados dos bancos aumentam. Em relação à Espanha, tal variável, apesar de significativa a um nível de significância de 1%, apresentou um sinal negativo, sinalizando que as provisões diminuem quando os resultados aumentam, contrariando estudo de Silva (2016Silva, C. A. M. (2016). Utilização da provisão para créditos de liquidação duvidosa para fins de gerenciamento de resultado nas instituições financeiras brasileiras e luso-espanholas (Master’s thesis). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de Brasília, Brasília, DF.).

A prática de gerenciamento de resultados, condenável em alguns aspectos, pode se colocar como contraponto à constituição de provisões pró-cíclicas, amenizando os seus efeitos sobre a fase corrente do ciclo econômico.

A prática de gerenciamento de capital também não se revelou uma realidade para os bancos comerciais do Brasil e da Espanha. No Brasil, apesar de significativa a um nível de 1%, a referida variável apresentou coeficiente positivo, indicando que quanto maior a participação do patrimônio líquido sobre o ativo total, maior a provisão constituída pelos bancos comerciais. Tal situação pode estar indicando que o nível confortável de capitalização apresentado pelos bancos no Brasil (em média, 23,20% do ativo total) esteja induzindo o aumento do nível de provisão sempre que o patrimônio líquido apresentar variação positiva, o que representa um procedimento conservador que também serve de contraponto à constituição de provisões pró-cíclicas. Na Espanha, a variável “patrimônio líquido sobre o ativo total” não se revelou significativa, indicando que o nível da provisão não é afetado pelo comportamento do capital próprio dos bancos comerciais que atuam naquele país.

A variável “porte” revelou-se estatisticamente significativa somente em relação aos bancos que atuam na Espanha. Nos demais países, o tamanho dos bancos não parece influenciar o nível de provisão.

Os resultados corroboram os estudos anteriores de Bikker e Hu (2002Bikker, J. A., & Hu, H. (2002). Cyclical patterns in profits, provisioning and lending of banks and procyclicality of the new basel capital requirements. Banca Nazionale del Lavaro Quarterly Review, 55(221), 143-175. Retrieved from https://www.dnb.nl/binaries/ot039_tcm46-146052.pdf.
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), Laeven e Majnoni (2003Laeven, L., & Majnoni, G. (2003, April). Loan loss provisioning and economic slowdowns: too much, too late? Journal of Financial Intermediation, 12(2), 178-197. Retrieved from http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1042957303000160.
http://www.sciencedirect.com/science/art...
) e Bikker e Metzemakers (2004Bikker, J. A., & Metzemakers, P. A. J. (2004, March). Bank provisioning behaviour and procyclicality. Journal of International Financial Markets, Institutions & Money, 209, 1-17. doi: 10.1016/j.intfin.2004.03.004.
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), no sentido de que o comportamento das provisões depende fortemente do ciclo econômico, indicando que as provisões geralmente crescem em tempos econômicos ruins. Outra similaridade dos resultados desta pesquisa com os referidos estudos é a constatação de que o efeito da pró-ciclicidade costuma ser mitigado pelo aumento da provisão nos períodos de lucros maiores (prática de gerenciamento de resultados).

Uma provável conjectura sobre o fato de a pesquisa ter revelado comportamento pró-cíclico quando se esperava comportamento anticíclico é que os bancos podem estar gerenciando discricionariamente o lucro por meio da provisão, mais que compensando o efeito esperado dos modelos, uma hipótese a ser investigada em futuras pesquisas.

Constatou-se, ainda, que, no Brasil e no Reino Unido, o efeito das variações econômicas no comportamento da provisão se dá no mesmo período contábil. No caso da Espanha, no entanto, a variação do PIB do período anterior revelou-se uma variável significativa.

Com relação ao modelo econométrico selecionado para a pesquisa, constatou-se que a natureza peculiar das regras de provisão do Reino Unido, em relação às do Brasil e da Espanha, pode estar determinando a diferença nos níveis de significância das variáveis explicativas do modelo, quando este é aplicado aos bancos comerciais do país que adota os padrões contábeis do IASB. Assim, pressupõe-se que adaptações sejam necessárias para adequar o modelo utilizado às especificidades próprias de países que utilizem regras contábeis relativamente distintas para a constituição da provisão.

Por se tratar de uma amostra intencional que contempla apenas um país de cada modelo contábil, os resultados não podem ser generalizados. Para trabalhos futuros, sugerem-se estudos com modelos econométricos distintos, incorporando variáveis não contempladas nesta pesquisa, especialmente as relacionadas a atrasos no pagamento de principal e juros e ao reconhecimento contábil de prejuízos. Avaliar a questão da ciclicidade considerando cenários contábeis distintos no mesmo país (por exemplo, o estudo da ciclicidade antes e após o advento da Resolução nº 2.682/1999) também pode se revelar uma experiência interessante para a reflexão sobre o comportamento da provisão em ambientes regulatórios distintos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Nov 2017
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2018

Histórico

  • Recebido
    11 Out 2016
  • Aceito
    08 Ago 2017
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