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Conservadorismo contábil em empresas complexas* * Trabalho apresentado no XVII International Conference in Accounting, São Paulo, SP, Brasil, julho de 2017.

RESUMO

O estudo busca averiguar a influência da complexidade de empresas nos níveis de conservadorismo contábil. O tema de análise, conservadorismo contábil em empresas complexas, pode ser considerado relevante porque analisa as práticas de conservadorismo levando em conta o contexto organizacional das empresas, fato ignorado em outros estudos que investigam os incentivos ou determinantes do conservadorismo contábil, pelo menos quanto à complexidade empresarial. A pesquisa apresenta evidências estatísticas de que o conservadorismo contábil varia de forma positiva com a assimetria da informação ocasionada por características específicas de ambientes complexos. Em contrapartida, quando estas apresentam, em conjunto, diversas características complexas, então a tendência é de pouca adoção do conservadorismo. Além disso, a presente pesquisa reúne evidências que visam a contribuir para a ciência contábil pela análise de empresas complexas e conservadorismo, e não práticas oportunistas observadas em estudos prévios. A amostra refere-se a 110 empresas de capital aberto no período de 2010 a 2016. A coleta de dados foi realizada por meio de relatórios das empresas, como formulários de referência, dados cadastrais e notas explicativas, bem como da base de dados Economatica®. A análise dos dados foi realizada por meio de regressão linear múltipla e regressão quantílica. Evidências obtidas na pesquisa indicam que o conservadorismo contábil varia conforme a assimetria de informação ocasionada por ambientes complexos em que pode apresentar uma relação positiva em empresas com poucas características de complexidade ou relação negativa se a empresa tem complexidade em diversas características ao mesmo tempo. Lança luz, então, sobre os diferentes níveis de conservadorismo observados nas empresas que muitas vezes podem ser atribuídos a mecanismos de governança, cultura organizacional, padrões contábeis, entre outros fatores, resultados que podem estar enviesados por não considerar o fator complexidade de empresas.

Palavras-chave
conservadorismo contábil; complexidade empresarial; assimetria informacional; informação contábil; empresas brasileiras

ABSTRACT

This study seeks to investigate the influence of the complexity of companies on levels of accounting conservatism. The subject of analysis, accounting conservatism in complex companies, can be considered relevant because it analyzes conservative practices taking into account the organizational context of companies; something that is ignored in other studies that investigate the incentives or determinants of accounting conservatism, at least as far as firm complexity is concerned. The research presents statistical evidence that accounting conservatism varies positively with the information asymmetry caused by specific characteristics of complex environments. On the other hand, when companies present several complex characteristics together, then the trend is one of little adoption of conservatism. In addition, this research brings together evidence that aims to contribute to accounting science by analyzing complex companies and conservatism and not the opportunistic practices observed in previous studies. The sample refers to 110 publicly traded companies from 2010 to 2016. The data collection was carried out using company reports, such as reference forms, registration data, and explanatory notes, as well as the Economatica® database. The data analysis was performed using multiple linear regression and quantile regression. The evidence obtained in the research indicates that accounting conservatism varies according to the information asymmetry caused by complex environments, in which it can present a positive relationship in companies with few characteristics of complexity, or a negative relationship if the company has complexity in several characteristics at the same time. It throws light on the different levels of conservatism observed in companies, which can often be attributed to mechanisms of governance, organizational culture, and accounting standards, among other factors, which are results that may be biased if the company complexity factor is not considered.

Keywords
accounting conservatism; firm complexity; information asymmetry; accounting information; Brazilian companies

1. INTRODUÇÃO

O conservadorismo contábil pode ser observado como um mecanismo de controle em organizações que favorece o reconhecimento de resultado do período menos oportunista, o que, segundo LaFond e Watts (2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.) e Chi e Wang (2010Chi, W., & Wang, C. (2010). Accounting conservatism in a setting of Information Asymmetry between majority and minority shareholders.The International Journal of Accounting, 45(4), 465-489.), pode auxiliar na redução da assimetria da informação. Esta, em contrapartida, pode ser agravada quando as empresas apresentam determinadas características complexas que, de acordo com Liu e Lai (2012Liu, C.-L., & Lai, S.-M. (2012). Organizational complexity and auditor quality. Corporate Governance: An International Review, 20(4), 352-368.) e Jennings e Tanlu (2014Jennings, J., & Tanlu, L. (2014). The effect of organizational complexity on earnings forecasting behavior. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2130119.
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
), limitam a transparência das informações. Nesse sentido, o presente estudo se dispõe a analisar a influência da complexidade de empresas sobre o nível de conservadorismo adotado nas informações evidenciadas pelas firmas.

A informação é de suma importância para todo e qualquer tipo de empresa, sendo que sua disparidade entre os usuários, além de fazer com que os processos da organização fiquem mais lentos, pode agravar conflitos de interesses internos e externos (Ndofor, Wesley & Priem, 2015Ndofor, H. A., Wesley, C., & Priem, R. L. (2015). Providing CEOs with opportunities to cheat the effects of complexity-based information asymmetries on financial reporting fraud.Journal of Management, 41(6), 1774-1797.). Nesse aspecto, custos nas organizações começaram a ser questionados pelos estudos de Spence e Zeckhauser (1971Spence, M., & Zeckhauser, R. (1971). Insurance, information, and individual action.The American Economic Review, 61(2), 380-387.) e Ross (1973Ross, S. A. (1973). The economic theory of agency: the principal’s problem. The American Economic Review, 63(2), 134-139.), objetivando alinhar os interesses entre o agente e o seu superior (Faria, Gomes, Dias & Alburquerque, 2011Faria, J. A., Gomes, S. M. S., Dias, J. M. Filho , & Albuquerque, V. (2011). A assimetria da informação na elaboração do orçamento: uma análise da produção científica nos periódicos internacionais entre 2005 e 2009.Contabilidade Vista & Revista, 22(2), 43-65.), com intuito de diminuir a disparidade ou assimetria da informação entre eles.

Roth e O’Donnell (1996Roth, K., & O’Donnell, S. (1996). Foreign subsidiary compensation strategy: an agency theory perspective.Academy of Management Journal, 39(3), 678-703.) argumentam que a assimetria da informação pode ser agravada quando a empresa apresenta situações complexas, com dificuldades de monitoramento e de verificação do comportamento do agente. Percebe-se, então, que a complexidade em empresas pode ser uma das possíveis causas do aumento do nível de assimetria informacional.

No que se refere à complexidade das empresas, esta pode ser definida por atividades e/ou fenômenos organizacionais que contrariam o paradigma da simplicidade, utilizando-se de uma visão multidimensional e multidisciplinar para se observar determinado fenômeno, ou seja, deve-se analisar sobre diferentes aspectos determinado fenômeno (Santos & Rodrigues, 2007Santos, I. C., & Rodrigues, F. S. S. (2007). Tempo, espaço e as organizações. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional, 3(2), 107-123.).

Não há somente uma forma de medição para a complexidade de empresas. De acordo com a literatura, esta pode ser identificada de acordo com várias medidas, tais como o número de segmentos de que a empresa participa (Barinov, Park & Yildizhan, 2014Barinov, A., Park, S. S., & Yildizhan, C. (2014). Firm complexity and post-earnings-announcement drift. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=2360338or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2360338.
https://ssrn.com/abstract=2360338...
; Baysinger & Hoskisson, 1989Baysinger, B., & Hoskisson, R. E. (1989). Diversification strategy and R&D intensity in multiproduct firms. Academy of Management Journal, 32(2), 310-332.; Demirkan, Radhakrishnan & Urcan, 2012Demirkan, S., Radhakrishnan, S., & Urcan, O. (2012). Discretionary accruals quality, cost of capital, and diversification. Journal of Accounting, Auditing & Finance, 27(4), 496-526.), a complexidade geográfica (Bushman, Chen, Engel & Smith, 2004Bushman, R., Chen, Q., Engel, E., & Smith, A. (2004). Financial accounting information, organizational complexity and corporate governance systems.Journal of Accounting and Economics, 37(2), 167-201.; Cetorelli & Goldberg, 2014Cetorelli, N., & Goldberg, L. S. (2014). Measures of complexity of global banks. Economic Policy Review, 20(2), 1-39.; Liu & Lai, 2012Liu, C.-L., & Lai, S.-M. (2012). Organizational complexity and auditor quality. Corporate Governance: An International Review, 20(4), 352-368.), a complexidade do negócio (Cetorelli & Goldberg, 2014Cetorelli, N., & Goldberg, L. S. (2014). Measures of complexity of global banks. Economic Policy Review, 20(2), 1-39.; Jennings & Tanlu, 2014Jennings, J., & Tanlu, L. (2014). The effect of organizational complexity on earnings forecasting behavior. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2130119.
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
), a complexidade industrial (Barinov et al., 2014Barinov, A., Park, S. S., & Yildizhan, C. (2014). Firm complexity and post-earnings-announcement drift. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=2360338or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2360338.
https://ssrn.com/abstract=2360338...
; Bushman et al., 2004Bushman, R., Chen, Q., Engel, E., & Smith, A. (2004). Financial accounting information, organizational complexity and corporate governance systems.Journal of Accounting and Economics, 37(2), 167-201.; Farooqi, Harris & Ngo, 2014Farooqi, J., Harris, O., & Ngo, T. (2014). Corporate diversification, real activities manipulation, and firm value. Journal of Multinational Financial Management, 27(C), 130-151.; Liu & Lai, 2012Liu, C.-L., & Lai, S.-M. (2012). Organizational complexity and auditor quality. Corporate Governance: An International Review, 20(4), 352-368.) e a complexidade organizacional (Farias, 2012Farias, K. T. R. (2012). Mecanismos de controle do reporting financeiro das companhias abertas do Brasil (Doctoral Thesis). Accounting, Universidade de São Paulo, São Paulo.; Silva, 2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.).

De acordo com Liu e Lai (2012Liu, C.-L., & Lai, S.-M. (2012). Organizational complexity and auditor quality. Corporate Governance: An International Review, 20(4), 352-368.), a complexidade das empresas pode limitar a transparência de informações aos usuários, aumentando a assimetria informacional. Isso ocorre, dentre outras causas, devido à preocupação da empresa com os segmentos que geram maior receita, o que pode resultar em menos atenção aos controles internos e à geração de informação mais concisa dos demais segmentos ou subsidiárias que não têm tanta representatividade na geração de receita. Ainda, segundo Jennings e Tanlu (2014Jennings, J., & Tanlu, L. (2014). The effect of organizational complexity on earnings forecasting behavior. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2130119.
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), torna-se oneroso, para os agentes, demonstrar as informações por segmento de empresas complexas, o que acaba por prejudicar a qualidade da informação para os usuários externos.

LaFond e Watts (2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.) argumentam que uma forma de auxiliar na redução da assimetria de informações entre investidores e gestores é o uso de uma forma conservadora da contabilidade. Assim, haveria redução nos incentivos dos gestores para mascarar resultados, reduzindo informações assimétricas e também perdas organizacionais que dela derivam. Outro estudo que evidencia os benefícios do conservadorismo contábil para empresas com incidências de informações assimétricas é o de Chi e Wang (2010Chi, W., & Wang, C. (2010). Accounting conservatism in a setting of Information Asymmetry between majority and minority shareholders.The International Journal of Accounting, 45(4), 465-489.), que concluíram que os níveis de conservadorismo contábil estavam negativamente relacionados com os níveis de assimetria da informação. Inferiu-se que o conservadorismo contábil contribui para a diminuição da assimetria da informação entre os usuários externos, por adotar práticas contábeis que não sobrevalorizam o lucro.

Além do conservadorismo como ferramenta para redução da assimetria, Silva (2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.) observou que, quando a empresa atinge um nível elevado de complexidade empresarial, sob a ótica da complexidade industrial, do negócio e organizacional, a assimetria da informação sofre uma queda pela melhora da qualidade da informação contábil. Nesse estudo, o aumento da qualidade da informação contábil deu-se pela redução de práticas oportunistas de gerenciamento de resultados, quando a empresa atingiu índices elevados de complexidade.

Depreende-se que, quando a empresa apresenta atividades complexas, os gestores podem adotar o conservadorismo ao contrário de práticas oportunistas, devido a controles internos ou pressões externas para diminuir a assimetria de informação. Entretanto, cabe salientar que o conservadorismo contábil pode ser motivado por inúmeras outras causas, como fatores fiscais, normas contábeis, cultura, remuneração de gestores, entre outros. No entanto, este estudo propõe observar tal prática sob a ótica da complexidade das atividades das empresas.

Assim, esta pesquisa é norteada pela seguinte pergunta: qual a relação entre o conservadorismo contábil e a complexidade empresarial? Como objetivo, busca-se averiguar a influência da complexidade de empresas nos níveis de conservadorismo contábil.

Este estudo apresenta evidências que visam a contribuir para a ciência contábil quanto aos estudos organizacionais, pela análise da mitigação da assimetria informacional em empresas complexas, devido à utilização do conservadorismo ao invés de redução de práticas oportunistas observadas por estudos internacionais, tais como os de Demirkan et al. (2012Demirkan, S., Radhakrishnan, S., & Urcan, O. (2012). Discretionary accruals quality, cost of capital, and diversification. Journal of Accounting, Auditing & Finance, 27(4), 496-526.), Barinov et al. (2014Barinov, A., Park, S. S., & Yildizhan, C. (2014). Firm complexity and post-earnings-announcement drift. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=2360338or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2360338.
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), Farooqi et al. (2014Farooqi, J., Harris, O., & Ngo, T. (2014). Corporate diversification, real activities manipulation, and firm value. Journal of Multinational Financial Management, 27(C), 130-151.) e Jennings e Tanlu (2014Jennings, J., & Tanlu, L. (2014). The effect of organizational complexity on earnings forecasting behavior. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2130119.
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).

Ademais, além das pesquisas de LaFond e Watts (2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.) e Chi e Wang (2010Chi, W., & Wang, C. (2010). Accounting conservatism in a setting of Information Asymmetry between majority and minority shareholders.The International Journal of Accounting, 45(4), 465-489.), já citadas anteriormente, pode ser observado o estudo de Almeida (2010Almeida, J. E. F. (2010). Qualidade da informação contábil em ambientes competitivos (Doctoral Thesis). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.), o qual analisou o conservadorismo contábil, gerenciamento de resultados, entre outros, em ambientes competitivos, concluindo que a prática de conservadorismo foi adotada em maior grau em tais ambientes para diminuir assimetrias e tornar a empresa atraente ao mercado. Contudo, esta pesquisa se diferencia do estudo de Almeida (2010Almeida, J. E. F. (2010). Qualidade da informação contábil em ambientes competitivos (Doctoral Thesis). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.) por tratar da complexidade das empresas, em vez da competividade do ambiente.

Devido à incipiência de pesquisas na área sobre a relação entre a complexidade de empresas e o conservadorismo, bem como considerando a literatura que afirma que empresas com maior nível de complexidade têm maior assimetria de informação, esta pesquisa justifica-se pela análise do conservadorismo como forma de limitação da assimetria informacional em empresas complexas. Pode, então, lançar luz sobre os diferentes níveis de conservadorismo observados nas empresas, que muitas vezes podem ser atribuídos a mecanismos de governança, cultura organizacional, padrões contábeis, entre outros fatores, resultados esses que podem estar enviesados por não considerar o fator complexidade de empresas, o qual poderia explicar parte das diferenças empíricas observadas.

2. CONSERVADORISMO CONTÁBIL

Dentre os aglomerados de práticas e procedimentos da contabilidade, a reflexão quanto à relação entre o conservadorismo e a regulamentação contábil e suas causalidades ainda é incipiente e/ou inconclusiva na literatura nacional (Santos & Costa, 2008Santos, L. S. R., & Costa, F. M. (2008). Conservadorismo contábil e timeliness: evidências empíricas nas demonstrações contábeis de empresas brasileiras com ADRs negociados na Bolsa de Nova Iorque. Revista Contabilidade & Finanças, 19(48), 27-36.). De acordo com Scalzer, Beiruth e Reina (2017Scalzer, R. S., Beiruth, A. X., & Reina, D. (2017). Empresas estatais e conservadorismo contábil: uma análise das empresas da BM&FBovespa. REAd. Revista Eletrônica de Administração, 23(2), 333-350.), estudos nacionais observaram resultados mistos em relação ao conservadorismo contábil e padrões de normas contábeis, apresentando resultados com relações positivas, negativas e até mesmo sem significância estatística.

Ao revisitar a literatura, encontra-se a distinção do conservadorismo contábil entre condicional e incondicional. O conservadorismo incondicional é menos pesquisado por não ter métricas consolidadas. Tem por definição que, na avaliação do patrimônio, deve-se optar por valores mínimos para o ativo/receita e máximos para o passivo/despesa (Paulo, Antunes & Formigoni, 2008Paulo, E., Antunes, M. T. P., & Formigoni, H. (2008). Conservadorismo contábil nas companhias abertas e fechadas brasileiras. RAE-Revista de Administração de Empresas, 48(3), 46-60.).

Ball e Shivakumar (2005Ball, R., & Shivakumar, L. (2005). Earnings quality in UK private firms: comparative loss recognition timeliness. Journal of Accounting and Economics, 39(1), 83-128.) descrevem o conservadorismo condicional como a tendência contábil de reconhecer as perdas econômicas mais rapidamente do que os ganhos. A adoção de práticas conservadoras é estimulada pelo mercado de dívidas (Ball, Kothari & Robin, 2000Ball, R., Kothari, S. P., & Robin, A. (2000). The effect of international institutional factors on properties of accounting earnings. Journal of Accounting and Economics, 29(1), 1-51.) e por mecanismos de governança corporativa (LaFond & Watts, 2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.).

A respeito do conservadorismo condicional, a contabilidade o expressa e o conhece tradicionalmente como o princípio da não antecipação de lucros, mas da antecipação de perdas (Bliss, 1924Bliss, J. H. (1924). Management through accounts. New York, NY: Ronald Press Company.), sendo considerado positivo escolher opções menos otimistas. Para Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.), a interpretação desse princípio é o grau de verificação da informação por usuários externos, em que a “boa notícia” denota ganho e, a “má notícia”, perda.

As más notícias são, em suma, as proxies de retornos negativos, reconhecidas de forma tempestiva e mais completa no resultado do que a boa notícia, medida pelos retornos positivos (Banker, Basu, Byzalov & Chen, 2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.; Basu, 1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.). Entretanto, por mais que seja assimétrico o reconhecimento de ativos/receitas e passivos/despesas, estes têm por intuito auxiliar na diminuição da assimetria informacional (LaFond & Watts, 2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.) pela divulgação de resultado conservador ao contrário de oportunista.

Para Watts (2003Watts, R. L. (2003). Conservatism in accounting part I: explanations and implications. Accounting Horizons, 17(3), 207-221.), a explicação da divulgação e a utilização dessas informações de forma assimétrica devem-se ao intenso vínculo do conservadorismo às relações contratuais, com intenção de assegurar garantias mínimas dos acontecimentos aos deveres preestabelecidos. Ainda, para o autor, em termos de contrato, observa-se o crescimento do valor da empresa pela utilização do conservadorismo, uma vez que restringe o comportamento oportunista dos gestores, mantendo mais neutros os números contábeis divulgados.

A relação entre conservadorismo e qualidade da informação contábil é controversa, principalmente após o International Accounting Standards Board (IASB) revisar seu framework e retirar o conservadorismo da condição de aspecto de representação fidedigna, por ser inconsistente com a neutralidade. Afinal, práticas contábeis conservadoras seriam benéficas para a qualidade da informação contábil ou não? Uma informação livre de viés (neutra), preconizada pelo IASB, aceita práticas contábeis conservadoras?

Apesar de essas perguntas ainda não terem uma resposta definitiva por parte da academia, autores (LaFond & Watts, 2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.) que pesquisam conservadorismo refletem sobre sua importância para as empresas e o consideram um mecanismo de governança nas empresas que contribui para a diminuição da assimetria da informação, restringindo a capacidade administrativa de manejar e, possivelmente, exceder seu desempenho financeiro. Portanto, pode-se associar o conservadorismo contábil como limitador de reconhecimento de resultados excessivamente otimistas, considerado um mecanismo de controle que impacta na diminuição da assimetria e na qualidade da informação.

Sob essa ótica, apesar de o conservadorismo contábil produzir informações possivelmente enviesadas (não neutras), ainda assim tem capacidade de melhorar a qualidade da informação contábil, mitigando práticas oportunistas que poderiam levar a resultados artificialmente inflados, o que talvez seja mais prejudicial aos usuários da informação contábil do que informações menos otimistas.

Para verificação da aderência do conservadorismo contábil por parte das empresas, tem-se, como formas de mensuração, diferentes modelos, sendo o mais reconhecido o de Basu, de 1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.. Recentemente, Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.), com intuito de aprofundar o modelo de Basu, propuseram uma modificação no modelo, combinando a teoria do conservadorismo da contabilidade financeira com a assimetria de custos da contabilidade de custos.

Os autores analisaram o modelo de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.) e demonstraram um erro aproximado de 25% na estimação do conservadorismo ocasionado pelo não controle da assimetria de custos. Isso se deve ao fato de a variação positiva (aumento) nos custos em períodos de vendas elevadas ser maior do que a variação negativa (redução) em períodos de queda nas vendas. Assim, os autores propuseram a inclusão de variáveis de assimetria de custos no modelo original de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.) para corrigir esse erro de estimação (Banker et al., 2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.).

Outro modelo utilizado para a medição de conservadorismo é o de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.), o qual auxilia na identificação deste a nível de empresa, também adaptando o modelo de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.). Os autores incluíram variáveis como tamanho, market-to-book e alavancagem de cada empresa no modelo original para identificar o nível de conservadorismo delas, chamado de C_Score.

Diante do exposto, considera-se que práticas contábeis conservadoras, observadas por modelos como o de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.), Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) e Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.), podem auxiliar na redução da assimetria informacional entre as empresas e seus diversos stakeholders, o que pode ser interessante especialmente para empresas complexas, que se caracterizam por ambientes com maior assimetria informacional.

2.1 Complexidade de Empresas e Formulação das Hipóteses

Entende-se por complexidade de empresas o aumento de elementos organizacionais diferentes, mas que devem ser tratados simultaneamente pela organização. Pode-se associar a complexidade de empresas como uma ambiguidade na organização e dificuldade de se conhecer e compreender as operações organizacionais (Jennings & Tanlu, 2014Jennings, J., & Tanlu, L. (2014). The effect of organizational complexity on earnings forecasting behavior. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2130119.
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).

Pode-se inferir que a complexidade de empresas se refere a características específicas que contrariam o paradigma da simplicidade em suas operações de negócio (Santos & Rodrigues, 2007Santos, I. C., & Rodrigues, F. S. S. (2007). Tempo, espaço e as organizações. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional, 3(2), 107-123.). Tais características podem ser divididas e/ou medidas em alguns agrupamentos, tais como: complexidade industrial, do negócio e organizacional (Silva, 2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.).

A complexidade foi analisada na contabilidade primeiramente na linha de estratégia, na linha de finanças e, atualmente, podem-se observar estudos em contabilidade financeira, mais especificamente sobre qualidade da informação contábil (Barinov et al., 2014Barinov, A., Park, S. S., & Yildizhan, C. (2014). Firm complexity and post-earnings-announcement drift. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=2360338or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2360338.
https://ssrn.com/abstract=2360338...
; Demirkan et al., 2012Demirkan, S., Radhakrishnan, S., & Urcan, O. (2012). Discretionary accruals quality, cost of capital, and diversification. Journal of Accounting, Auditing & Finance, 27(4), 496-526.; Farooqi et al., 2014Farooqi, J., Harris, O., & Ngo, T. (2014). Corporate diversification, real activities manipulation, and firm value. Journal of Multinational Financial Management, 27(C), 130-151.; Jennings & Tanlu, 2014Jennings, J., & Tanlu, L. (2014). The effect of organizational complexity on earnings forecasting behavior. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2130119.
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; Silva, 2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.).

De acordo com a literatura (Barinov et al., 2014Barinov, A., Park, S. S., & Yildizhan, C. (2014). Firm complexity and post-earnings-announcement drift. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=2360338or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2360338.
https://ssrn.com/abstract=2360338...
; Demirkan et al., 2012Demirkan, S., Radhakrishnan, S., & Urcan, O. (2012). Discretionary accruals quality, cost of capital, and diversification. Journal of Accounting, Auditing & Finance, 27(4), 496-526.; Farooqi et al., 2014Farooqi, J., Harris, O., & Ngo, T. (2014). Corporate diversification, real activities manipulation, and firm value. Journal of Multinational Financial Management, 27(C), 130-151.; Jennings & Tanlu, 2014Jennings, J., & Tanlu, L. (2014). The effect of organizational complexity on earnings forecasting behavior. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2130119.
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
; Liu & Lai, 2012Liu, C.-L., & Lai, S.-M. (2012). Organizational complexity and auditor quality. Corporate Governance: An International Review, 20(4), 352-368.; Silva, 2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.), a complexidade da empresa pode limitar a transparência de operações e informações aos usuários externos, o que pode agravar a assimetria da informação.

Jennings e Tanlu (2014Jennings, J., & Tanlu, L. (2014). The effect of organizational complexity on earnings forecasting behavior. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2130119.
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
) argumentam que à medida em que a empresa torna-se organizacionalmente complexa, mais oneroso e difícil será para os gestores analisar as informações realmente relevantes para serem divulgadas ao mercado. Isso pode comprometer a qualidade da comunicação entre a empresa e os usuários externos, aumentando a assimetria informacional.

Para reduzir essa assimetria, Watts (2003Watts, R. L. (2003). Conservatism in accounting part I: explanations and implications. Accounting Horizons, 17(3), 207-221.), LaFond e Watts (2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.) e Chi e Wang (2010Chi, W., & Wang, C. (2010). Accounting conservatism in a setting of Information Asymmetry between majority and minority shareholders.The International Journal of Accounting, 45(4), 465-489.) destacam o conservadorismo como importante atributo da divulgação da informação financeira, atuando como um mecanismo de controle que pode limitar conflitos de agência. Assim, infere-se que esse atributo da informação contábil poderia auxiliar na redução da assimetria da informação em ambientes complexos.

Almeida (2010Almeida, J. E. F. (2010). Qualidade da informação contábil em ambientes competitivos (Doctoral Thesis). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.) observou que, em ambientes competitivos, que apresentam medição semelhante com a complexidade, o grau de conservadorismo contábil é aumentado, a fim de diminuir assimetrias e tornar a empresa atraente ao mercado em relação à concorrência.

Dentre as medidas de complexidade, a industrial pode ser medida, de acordo com Liu e Lai (2012Liu, C.-L., & Lai, S.-M. (2012). Organizational complexity and auditor quality. Corporate Governance: An International Review, 20(4), 352-368.), Barinov et al. (2014Barinov, A., Park, S. S., & Yildizhan, C. (2014). Firm complexity and post-earnings-announcement drift. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=2360338or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2360338.
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,) Farooqi et al. (2014Farooqi, J., Harris, O., & Ngo, T. (2014). Corporate diversification, real activities manipulation, and firm value. Journal of Multinational Financial Management, 27(C), 130-151.) e Silva (2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.), pelo índice Herfindahl ou suas extensões, calculado pela relação das vendas de cada segmento da indústria com as vendas totais da empresa (Barinov et al., 2014Barinov, A., Park, S. S., & Yildizhan, C. (2014). Firm complexity and post-earnings-announcement drift. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=2360338or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2360338.
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; Hou & Robinson, 2006Hou, K., & Robinson, D. T. (2006). Industry concentration and average stock returns. The Journal of Finance, 61(4), 1927-1956.). A complexidade industrial pode comprometer a qualidade de comunicação entre os usuários, aumentando, assim, a assimetria da informação (Barinov et al., 2014Barinov, A., Park, S. S., & Yildizhan, C. (2014). Firm complexity and post-earnings-announcement drift. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=2360338or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2360338.
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). Para auxiliar na diminuição dessa assimetria, as empresas podem adotar níveis diferenciados de conservadorismo contábil. Desse modo, delimitou-se a primeira hipótese de pesquisa:

H1: quanto maior a complexidade industrial, maior o grau de conservadorismo contábil.

A complexidade do negócio pode ser observada pela quantidade de segmentos de atuação da empresa (Cetorelli & Goldberg, 2014Cetorelli, N., & Goldberg, L. S. (2014). Measures of complexity of global banks. Economic Policy Review, 20(2), 1-39.; Demirkan et al., 2012Demirkan, S., Radhakrishnan, S., & Urcan, O. (2012). Discretionary accruals quality, cost of capital, and diversification. Journal of Accounting, Auditing & Finance, 27(4), 496-526.; Doyle, Ge & Mcvay, 2007Doyle, J. T., Ge, W., & Mcvay, S. (2007). Accruals quality and internal control over financial reporting. The Accounting Review, 82(5), 1141-1170.; Jennings & Tanlu, 2014Jennings, J., & Tanlu, L. (2014). The effect of organizational complexity on earnings forecasting behavior. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2130119.
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; Silva, 2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.), que representa a diversificação de suas áreas de atuação. Segundo Liu e Lai (2012Liu, C.-L., & Lai, S.-M. (2012). Organizational complexity and auditor quality. Corporate Governance: An International Review, 20(4), 352-368.), o aumento de assimetria pode ser ocasionado, dentre outras causas, no momento em que empresas divulgam informações mais detalhadas apenas do segmento principal de atuação, diminuindo a transparência de informação sobre os demais. Os usuários externos conhecerão os fluxos de caixa agregados de empresas complexas, mas não os individuais por segmentos de atuação (Liu & Lai, 2012Liu, C.-L., & Lai, S.-M. (2012). Organizational complexity and auditor quality. Corporate Governance: An International Review, 20(4), 352-368.). Assim, apresenta-se a segunda hipótese, de que o conservadorismo pode ser utilizado em maior grau nessa situação de complexidade do negócio, a fim de auxiliar na diminuição de assimetria.

H2: quanto maior a complexidade do negócio, maior o grau de conservadorismo contábil.

A complexidade organizacional pode ser medida pela quantidade de subsidiárias que a empresa tem (Cetorelli & Goldberg, 2014Cetorelli, N., & Goldberg, L. S. (2014). Measures of complexity of global banks. Economic Policy Review, 20(2), 1-39.), que representa sua fragmentação, bem como pelo seu tamanho, pelos anos de atuação no mercado, pelas dívidas de longo prazo, pela estrutura de capital e pela rentabilidade que apresenta (Farias, 2012Farias, K. T. R. (2012). Mecanismos de controle do reporting financeiro das companhias abertas do Brasil (Doctoral Thesis). Accounting, Universidade de São Paulo, São Paulo.; Silva, 2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.).

O tamanho da empresa representa sua diversificação em termos de ativos (direitos e bens) (Silva, 2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.), a idade está relacionada ao ciclo de vida organizacional (Boone, Field, Karpoff & Raheja, 2007Boone, A. L., Field, L. C., Karpoff, J. M., & Raheja, C. G. (2007). The determinants of corporate board size and composition: an empirical analysis. Journal of Financial Economics, 85(1), 66-101.; Farias, 2012Farias, K. T. R. (2012). Mecanismos de controle do reporting financeiro das companhias abertas do Brasil (Doctoral Thesis). Accounting, Universidade de São Paulo, São Paulo.), as dívidas de longo prazo e a estrutura de capital demonstram a diversidade financeira da empresa (Farias, 2012Farias, K. T. R. (2012). Mecanismos de controle do reporting financeiro das companhias abertas do Brasil (Doctoral Thesis). Accounting, Universidade de São Paulo, São Paulo.; Linck, Netter & Yang, 2008Linck, J. S., Netter, J. M., & Yang, T. (2008). The determinants of board structure. Journal of Financial Economics, 87(2), 308-328. ; Silva, 2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.) e, por fim, sua rentabilidade representa a complexidade do lucro da organização (Cardinaels, Roodhooft & Warlop, 2004Cardinaels, E., Roodhooft, F., & Warlop, L. (2004). Customer profitability analysis reports for resource allocation: the role of complex marketing environments. Abacus, 40(2), 238-258.). Essas medidas impactam na forma de gerir a empresa, o que a torna complexa e, por vezes, pode incentivar os gestores a adotar práticas contábeis conservadoras para mitigar a assimetria da informação decorrente desse contexto. Assim, apresenta-se a terceira hipótese.

H3: quanto maior a complexidade organizacional, maior o grau de conservadorismo contábil.

Diante do exposto, acredita-se que, em um ambiente de complexidade empresarial, seja industrial, organizacional ou de negócio, a empresa, munida de controles internos ou até mesmo por pressões externas de investidores, pode adotar práticas contábeis para diminuir a assimetria informacional causada pela complexidade de suas operações organizacionais, como o conservadorismo contábil, por exemplo, visto que diminui a habilidade da gerência de exagerar ou até de manipular seu desempenho financeiro (LaFond & Watts, 2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.). Desse modo, delimita-se a quarta e última hipótese de pesquisa, com objetivo de capturar, de forma conjunta, a complexidade industrial, do negócio e organizacional em uma única medida. O objetivo é avaliar se, na presença de graus elevados de complexidade em diferentes características, as empresas preocupam-se em adotar maior nível de conservadorismo contábil.

H4: quanto maior a complexidade total das empresas, maior o grau de conservadorismo contábil.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A população do estudo compreendeu todas as empresas listadas na Bolsa de Valores Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&FBOVESPA). A amostra foi composta por 110 empresas que dispunham de informações em todas as variáveis e período analisado. O período de análise foi de 2010 a 2016, devido à adoção, a partir de 2010, do padrão contábil do IASB, o qual prevê o atributo da neutralidade na característica qualitativa de representação fidedigna (Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 2011 Comitê de Pronunciamentos Contábeis (Accounting Pronouncements Committee). 2011. CPC 00 (R1) - Estrutura conceitual para elaboração e divulgação de relatório contábil-financeiro. Retrieved from http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=80.
http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emi...
- CPC 00) em vez do princípio contábil da prudência e/ou da convenção do conservadorismo, presente nas normas contábeis locais antes de 2010.

Optou-se, nesta pesquisa, por analisar somente empresas brasileiras, em função de se considerar uma amostra adequada e suficiente para se testar as hipóteses, bem como pela devida indisponibilidade de informações sobre complexidade de empresas para firmas de outros países.

Os dados referentes aos modelos de conservadorismo contábil e às variáveis de complexidade organizacional tamanho da empresa (TAM), rentabilidade (ROE), dívidas de longo prazo (DLP) e estrutura de capital (EC) foram coletados na base de dados Economatica®. Os dados utilizados para calcular a complexidade industrial (CI) e a complexidade do negócio (CN) foram coletados em notas explicativas. Os dados sobre a quantidade de subsidiárias (SUB) que as empresas tinham foram coletados nos formulários de referência, enquanto a variável anos de atuação (AA) da empresa foi coletada nos dados cadastrais disponíveis no site da BM&FBOVESPA; ambas (AA, SUB) compõem também o grupo de complexidade organizacional. Apresenta-se, a seguir, os modelos de conservadorismo contábil utilizados.

L P A i t P i t - 1 = β 0 + β 1 R i t + β 2 D i t + β 3 D i t * R i t + ε i t (1)

em que LPA it é o resultado contábil do exercício (lucro/prejuízo) por ação da empresa i no ano t, P it-1 é o preço médio da ação da empresa i no ano t-1, R it é o retorno logaritmizado da ação da empresa i no ano t, D it é a variável dummy que assume 1 quando o retorno da ação da empresa i no ano t é negativo e 0 caso contrário e D it * R it é a diferença entre o impacto dos retornos positivos e negativos. O conservadorismo implica que esse coeficiente (β3 ) é positivo porque uma má notícia (retorno negativo) será refletida no lucro em maior medida do que uma boa notícia (retorno positivo).

A equação 1 representa o modelo de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.), o qual demonstra o nível de conservadorismo contábil pelo coeficiente β3 . De acordo com Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.), o β2 representa o retorno, tanto positivo quanto negativo, enquanto o β3 representa somente o retorno negativo. Se o β3 for significativo e positivo, evidencia-se a presença de conservadorismo contábil pelo reconhecimento oportuno de retornos negativos. Entretanto, de acordo com Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.), esse modelo pode apresentar um viés na estimação do coeficiente causado pela assimetria dos custos.

No estudo de Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.), em que um dos autores também é Sudipta Basu, buscou-se reformular o modelo de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.) com intuito de neutralizar a assimetria dos custos. Assim, utilizou-se, também, neste estudo, o modelo de Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.) para captar o conservadorismo condicional nas empresas da amostra e comparar com o coeficiente apurado pelo modelo original de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.). O modelo 2 refere-se ao modelo de conservadorismo contábil de Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.).

L P A i t P i t - 1 = β 0 + β 1 R i t + β 2 D i t + β 3 D i t * R i t + β 4 D S i t + β 5 S i t / P i t - 1 + β 6 D S i t * S i t / P i t - 1 v i t (2)

em que DS it é a variável dummy igual a 1 se há queda de vendas do ano t-1 para o ano t e 0 caso contrário, ∆S t /P it-1 é a mudança de vendas do ano t- 1 para o ano t (variação das vendas) dimensionada (dividido) pelo valor de mercado das ações (preço das ações) no início do ano fiscal e DS it * ∆S t /P it-1 é a multiplicação entre as variáveis DS it e ∆S t /P it-1 , a qual representa o nível de assimetria de custos das empresas, caso o coeficiente demonstre-se positivo.

Além dos modelos apresentados, este estudo ainda analisa o modelo de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) que se utiliza do G_Score e do C_Score para determinar a antecipação de boas e más notícias, respectivamente. Esse modelo, diferentemente do modelo de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.) e Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.), possibilita a mensuração do conservadorismo individual para cada empresa com base em seu modelo geral, do qual são retirados os coeficientes e determinado o C_Score (proxy de conservadorismo) com base no tamanho, market-to-book e alavancagem de cada empresa. O modelo de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) é apresentado na equação 3.

L P A i t P i t - 1 = β 0 + β 1 D i t + β 2 R i t μ 1 + μ 2 S i z e i + μ 3 M / B i + μ 4 L e v i + β 3 D i R i λ 1 + λ 2 S i z e i + λ 3 M / B i + λ 4 L e v i + δ 1 S i z e i + δ 2 M / B i + δ 3 L e v i + δ 4 D i S i z e i + δ 5 D i M / B i + δ 6 D i L e v i + ε i t (3)

em que Size i é o tamanho da empresa de acordo com o logaritmo natural do valor de mercado, M/B i é o market-to-book, Lev i é a alavancagem mensurada por meio da dívida de longo prazo e curto prazo deflacionada pelo valor de mercado e μi e λi são estimadores empíricos constantes para todas as empresas, mas que variam de acordo com o tempo, estimados por regressões transversais anuais.

De posse dos estimadores gerados pela equação 3, calcula-se G_Score e o C_Score por meio das equações 4 e 5, ressaltando que esses não são modelos de regressão, mas equações para obter o índice de conservadorismo para cada empresa de acordo com as boas (G_Score) e más notícias (C_Score).

G _ S c o r e = β 3 = μ 1 + μ 2 S i z e i + μ 3 M / B i + μ 4 L e v i (4)

C _ S c o r e = β 4 = λ 1 + λ 2 S i z e i + λ 3 M / B i + λ 4 L e v i (5)

O modelo de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.), expresso pela equação 3, inclui as equações 4 e 5 no modelo original de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.), expresso pela equação 1, com incremento dos termos do último parêntese, que são necessários para controlar as características das empresas separadamente. Assim, na apresentação e análise dos dados, os três modelos (Banker et al., 2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.; Basu, 1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.; Khan & Watts, 2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) são utilizados para uma análise inicial a fim de se observar o nível de mensuração de conservadorismo com base em cada equação.

Além disso, utilizou-se o modelo de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) para observação do conservadorismo individual das empresas com base no C_Score. Também foi mensurado o modelo de Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.), adaptado com base na metodologia de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.), para observar o C-score de cada empresa, em cujo modelo há correção da assimetria de custos, apresentado pela equação 6.

L P A i t P i t - 1 = β 0 + β 1 D i t + R i t μ 1 + μ 2 S i z e i + μ 3 M / B i + μ 4 L e v i + D i R i λ 1 + λ 2 S i z e i + λ 3 M / B i + λ 4 L e v i + δ 1 S i z e i + δ 2 M / B i + δ 3 L e v i + δ 4 D i S i z e i + δ 5 D i M / B i + δ 6 D i L e v i + D S i t ( ρ 1 + ρ 2 S i z e i + ρ 3 M / B i + ρ 4 L e v i ) + S i t / P i t - 1 ( τ 1 + τ 2 S i z e i + τ 3 M / B i + τ 4 L e v i ) + D S i t * S i t / P i t - 1 v i t ( φ 1 + φ 2 S i z e i + φ 3 M / B i + φ 4 L e v i ) + ε i t (6)

De posse dos coeficientes μi e λi do modelo da equação 6 calcularam-se novamente o G_Score e o C_Score que estarão agora com a correção da assimetria de custos. Com esses coeficientes de conservadorismo contábil individual originado pelos modelos de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) e Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.) adaptado de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.), rodaram-se novos modelos com dados anuais de complexidade de empresas, a fim de se observar a relação principal do estudo entre a complexidade de empresas e o conservadorismo contábil. Na Tabela 1 apresentam-se as variáveis de complexidade.

Tabela 1
Constructo da pesquisa

A variável de complexidade total (CT), apresentada na Tabela 1, foi desenvolvida pelos autores, que utilizaram os pesos das variáveis de complexidade industrial (CI), do negócio (CN) e organizacional, por meio da aplicação da entropia da informação, para criar um índice único de CT para cada empresa, por meio da aplicação do método de Técnica de Ordenação por Similaridade com a Solução Ideal (Topsis - The Technique for Order of Preference by Similarity to Ideal Solution).

Com base nas variáveis de complexidade de empresas (variáveis independentes) e de conservadorismo condicional observadas por meio do coeficiente de estimação dos modelos de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) e Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.) adaptado à metodologia de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.), formularam-se novas equações, a fim de se observar a relação entre a CI, CN e organizacional com o nível de conservadorismo contábil adotado pelas empresas.

C C k w i t = β 0 + β 1 C I i t + β 2 C N i t + β 3 S U B i t + β 4 A A i t + β 5 T A M i t + β 6 R O E i t + β 7 D L P i t + β 8 E C i t + β 9 C T i t + ε i t (7)

C C k w b i t = β 0 + β 1 C I i t + β 2 C N i t + β 3 S U B i t + β 4 A A i t + β 5 T A M i t + β 6 R O E i t + β 7 D L P i t + β 8 E C i t + β 9 C T i t + ε i t (8)

Para análise dos dados, utilizaram-se de estatística descritiva, regressão linear múltipla e regressão quantílica calculadas por meio do software STATA.

4. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Apresentam-se, nesta seção, a descrição e a análise dos dados. A Tabela 2 demonstra o resumo dos modelos 1, 2 e 3, os quais têm por intuito demonstrar a prática de conservadorismo contábil adotada pelas empresas brasileiras analisadas, de acordo com os modelos Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.), Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) e Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.), sendo que, nessas equações, analisaram-se todas as empresas em conjunto, sem ponderação anual, com intuito de análise somente do coeficiente do conservadorismo, e não a relação pretendida no trabalho.

Tabela 2
Resumo das equações 1 (Basu, 1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.), 2 (Banker et al., 2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.) e 3 Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.)

Observa-se, na Tabela 2, que as variáveis independentes elucidam significativamente a variável dependente. O poder de explicação dos modelos de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.) e Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.) pode ser considerado baixo, o que pode ser esclarecido pela dificuldade de estimação de um fenômeno contábil, o conservadorismo, por meio de um modelo econométrico.

O modelo de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) apresenta poder de explicação maior, podendo ser decorrente do acréscimo das variáveis size, market-to-book e Lev, que têm relação comprovada, de acordo com tal estudo, com a variável dependente. Destaca-se a relevância do modelo de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.), uma vez que este apresentou melhora de 30,55% no poder de explicação em relação ao maior R² dos outros dois modelos.

Quanto às variáveis independentes significativas do modelo de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.) e de Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.), percebe-se que ambas as variáveis D i (dummy de retorno da ação) e R i (retornos negativos) mostraram-se relacionadas ao lucro do período (variável dependente), sendo que o mesmo não ocorre com o modelo de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.). Além disso, o coeficiente de estimação da variável (D x R) apresentou-se com o sinal positivo nos modelos 1 e 2, embora não significativo, o que não permite confirmar o reconhecimento antecipado de más notícias pelas empresas analisadas.

Quanto à estimação do conservadorismo pelo modelo 3, a relação encontrada é negativa, indicando uma mudança nesse coeficiente com a inclusão das variáveis size, M/B e Lev, embora ainda não significativo. O modelo 3 destaca o endividamento (Lev) como variável determinante para explicar o resultado contábil do exercício por ação da empresa (LPA).

Observou-se, também, que as variáveis de assimetria de custos do modelo de Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.), tais como DS it (dummy de queda de vendas) e DS it X ∆S it / P it-1 (mudança de vendas quando essas estão em queda), apresentaram influência significativa na variável dependente de lucro, o que indica que o lucro também sofreu alteração em decorrência da assimetria de custos, e não somente pelo conservadorismo contábil.

Observadas as estimações de conservadorismo pelos modelos, apresenta-se, na Tabela 3, a estatística descritiva das variáveis utilizadas na análise principal da relação entre complexidade e conservadorismo contábil de cada empresa.

Tabela 3
Análise descritiva das variáveis das equações 7 e 8 - Scores de conservadorismo contábil e variáveis de complexidade

Com base na Tabela 3, percebe-se que a proxy de conservadorismo contábil (CCkw it ) pelo modelo de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) tem mínimo com valores negativos e máximo com valores positivos, sendo entendido que a empresa adota práticas conservadoras quando esse coeficiente apresenta valores positivos. Observa-se que a média das empresas (-0,2652) é de não adotar práticas conservadoras. Porém, como o desvio padrão (DP) tem valor considerável, com uma gama de empresas com valores distantes em relação à média, denota-se certa disparidade na amostra quanto à adoção de práticas conservadoras. A proxy de conservadorismo estimado pelo modelo Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.) adaptado à metodologia de Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) tem valores semelhantes ao do modelo original, com pequenas variações.

Assim, indica-se o baixo reconhecimento de informações de forma conservadora pelas empresas analisadas no período de 2010 a 2016, o qual coincide com o período de obrigatoriedade do CPC 00 (CPC, 2011Comitê de Pronunciamentos Contábeis (Accounting Pronouncements Committee). 2011. CPC 00 (R1) - Estrutura conceitual para elaboração e divulgação de relatório contábil-financeiro. Retrieved from http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=80.
http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emi...
), que prevê o reconhecimento de informações de forma neutra. Percebe-se uma possível aderência das empresas listadas na bolsa de valores a essa normativa de registro neutro e diminuição da utilização de práticas conservadoras de contabilidade.

Quanto à variável CI, por se tratar de um índice de entropia Herfindahl, tem variação entre 0 e 1, sendo que a média (0,2844) se aproxima mais de 0, o que corresponde à baixa CI entre as empresas analisadas, ou seja, há número reduzido de empresas com receita concentrada em poucos segmentos.

A variável CN demonstra a quantidade de segmentos em que as empresas atuam, constatando-se, de acordo com a média, que a maioria detém menos de três segmentos, tendo como mínimo o valor de um e o máximo de sete segmentos de atuação.

A quantidade de SUB, considerando-se apenas as controladas, apresentou média de 10, mas com DP superior à média, indicando elevada dispersão nos dados. Além disso, há empresas que não têm qualquer controle em outra empresa, como também algumas empresas que têm o máximo de 109 controladas. A quantidade de AA das empresas variou de zero a 122, sendo que algumas estavam operando em seu primeiro ano. A média das empresas foi de quase 40 anos.

A ROE apresentou, em média, rentabilidade positiva do patrimônio líquido (PL). Tanto a variável DLP quanto a TAM têm seus valores normalizados, sendo que ambas têm valores próximos de 6 e 7, com baixos DPs. Já a EC apresentou média de 24,40 com alto DP.

Por fim, a CT apresentou média mais próxima de 0 (0,2201), o que indica que a maioria das empresas apresentou pouca complexidade em diversas áreas ao mesmo tempo, sendo que o máximo de complexidade foi de 0,7915.

Realizada a análise da estatística descritiva das variáveis, apresenta-se, na Tabela 4, o resumo das equações 7 e 8, as quais medem a influência da complexidade das empresas no nível de conservadorismo contábil.

Tabela 4
Resumo das equações 7 e 8 - Influência das variáveis de complexidade em níveis de conservadorismo

Com base na Tabela 4, observa-se que o poder de explicação (R²) das equações apresentou-se baixo, o que também foi observado em estudos internacionais (Banker et al., 2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.; Khan & Watts, 2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.; LaFond & Watts, 2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.) sobre tal temática. Quanto à significância dos modelos, estes se demonstraram significativos, evidenciando que as variáveis independentes de complexidade explicaram significativamente parte do conservadorismo contábil adotado pelas empresas brasileiras. Nessa etapa da pesquisa, foram excluídas informações outliers de 3 DPs em relação à média.

Quanto às variáveis independentes de complexidade, observou-se que a ROE, o número de SUB, a CT (equações 7 e 8), a quantidade de AA (equação 8) e as DLP (equação 7) mostraram-se significativamente relacionadas à prática conservadora de resultados. Pode-se observar que quanto maior a rentabilidade do PL, número de SUB e AA, maior tende a ser a prática de conservadorismo contábil adotado. Em contrapartida, quanto maiores as DLP e a CT, menor tende a ser o nível de conservadorismo.

Com intuito de aprofundar as relações apresentadas pela Tabela 4, demonstra-se, na Tabela 5, a influência das variáveis de complexidade em diferentes quantis de conservadorismo contábil (10, 50, 90).

Tabela 5
Resumo das equações 7 e 8 - Influência das variáveis de complexidade em níveis de conservadorismo com regressão quantílica de 10, 50 e 90 para a variável dependente

De acordo com a Tabela 5, a relação entre práticas conservadoras e complexidade de empresas ocorre quando os níveis de conservadorismo são baixos e médios, o que não é percebido quando o conservadorismo é elevado.

Quanto às variáveis significativas independentes, evidencia-se que a ROE (quantil 10), o número de SUB (quantil 10 e 50), a quantidade de AA (quantil 10 e 50), a CN (quantil 10), o TAM (quantil 50) e a EC (quantil 50) demonstraram influência para o aumento do nível de conservadorismo contábil. Já as DLP (quantil 10) e a CT (quantil 10 e 50) demonstraram relação com a diminuição da prática conservadora de resultados.

Em relação à variável CI, por apresentar influência significativa para a diminuição do conservadorismo no quantil 10 e para aumento do conservadorismo no quantil 50, considerou-se resultado não conclusivo quando avaliado quantis de conservadorismo contábil, o que poderia ser mais bem explorado em estudos futuros.

Na Tabela 6, ainda com intuito de aprofundar as relações das equações 7 e 8, apresenta-se a mesma relação entre conservadorismo e complexidade, porém com a separação de amostras de empresas que apresentaram níveis baixos, médios e altos de CT.

Tabela 6
Resumo das equações 7 e 8 - Influência das variáveis de complexidade em níveis de conservadorismo para amostras de níveis baixos, médios e altos de complexidade total

Observa-se a significância dos modelos, sendo que há melhora do poder de explicação das equações 7 e 8 quando separado por amostras de empresas com níveis baixos, médios e altos de CT, em relação às análises anteriores.

Observou-se que a ROE (níveis médios e altos), o número de SUB (níveis baixos e altos), a quantidade de AA (nível baixo) e o TAM (níveis médios e altos) apresentaram influência para o aumento do nível de conservadorismo contábil. Porém, as DLP (níveis médios e altos) e a CT (nível baixo) demonstraram relação com a diminuição do conservadorismo.

A CI (nível baixo) demonstrou relação para a diminuição do nível de conservadorismo, entretanto, devido à análise da Tabela 5, considera-se, ainda, essa variável com explicação não conclusiva em relação ao conservadorismo, por apresentar coeficiente com sinal positivo e negativo. Em relação às demais variáveis significativas, observa-se tendência de relação entre elas e o conservadorismo contábil, mesmo com a alteração de quantis e amostras.

Com base no exposto, observou-se que a CI não demonstrou relação conclusiva com o nível de conservadorismo contábil, o que rejeita a H1.

Esse resultado vai de encontro ao obtido por Almeida (2010Almeida, J. E. F. (2010). Qualidade da informação contábil em ambientes competitivos (Doctoral Thesis). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.), o qual observou que as empresas adotam em maior grau o conservadorismo contábil quando há aumento da assimetria da informação decorrente de ambientes competitivos, que revela a representatividade desta em relação às demais empresas de seu segmento de atuação. No entanto, há diferença entre esse estudo e o resultado da presente pesquisa, pois esta considera a CI devido à diversificação de receita de determinado segmento frente a outros segmentos da mesma empresa, enquanto Almeida (2010Almeida, J. E. F. (2010). Qualidade da informação contábil em ambientes competitivos (Doctoral Thesis). Ciências Contábeis, Universidade de São Paulo, São Paulo.) considerou o TAM em relação a demais empresas do segmento.

A CN apresentou influência significativa para a adoção de conservadorismo, principalmente quando este tem nível baixo na organização, o que gera evidências para a não rejeição da H2.

Em relação às variáveis de complexidade organizacional, constatou-se que a rentabilidade do PL, o número de SUB, a quantidade de AA da empresa, o TAM e a EC influenciaram significativamente para o aumento da prática conservadora contábil; em contrapartida, as DLP apresentaram relação para a diminuição do conservadorismo.

Como algumas variáveis de complexidade organizacional apresentaram relação positiva com o conservadorismo, não se rejeita a H3, embora isso não se confirme para todas as variáveis que procuraram capturar a complexidade organizacional.

Esses resultados vão ao encontro do observado por Farooqi et al. (2014Farooqi, J., Harris, O., & Ngo, T. (2014). Corporate diversification, real activities manipulation, and firm value. Journal of Multinational Financial Management, 27(C), 130-151.) e Silva (2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.), que apontam que empresas que têm algumas medidas de complexidade podem adotar práticas para melhorar a qualidade da informação e reduzir a assimetria da informação ocasionada por ambientes complexos.

De acordo com Farooqi et al. (2014Farooqi, J., Harris, O., & Ngo, T. (2014). Corporate diversification, real activities manipulation, and firm value. Journal of Multinational Financial Management, 27(C), 130-151.) e Silva (2015Silva, A. (2015). Efeito da complexidade empresarial no gerenciamento de resultados de empresas brasileiras (Master’s Dissertation). Accounting Sciences, Universidade Regional de Blumenau, Blumenau.), a complexidade de empresas pode ser conceituada sob diversas medidas e assim impactar diferentemente na assimetria da informação, bem como na qualidade da informação contábil. Assim, esse resultado foi confirmado pelo atual estudo, sendo que as medidas de complexidade CN, ROE, SUB, AA, TAM e EC demonstraram influência significativa para o aumento da utilização de práticas conservadoras.

Em contrapartida, constatou-se que a variável CT, a qual demonstra empresas com várias características complexas ao mesmo tempo (CI, CN e organizacional), apresentou relação significativa com a redução do conservadorismo contábil, o que rejeitou a H4.

Esse resultado da CT pode ser decorrente do fato de a empresa não conseguir controlar todas as suas operações quando complexa em várias características, o que pode comprometer a adoção. Ou ainda, como possível explicação, as empresas com diversas características complexas preferem não adotar em maior grau o conservadorismo contábil, por mais que seja uma convenção, devido ao viés que pode remeter ao resultado, que porventura poderia aumentar ainda mais a percepção de assimetria da informação aos investidores, além de sua própria complexidade, conforme salientado por LaFond e Watts (2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.). De acordo com esses autores, o conservadorismo contábil é indicado para a redução da assimetria da informação; em contrapartida, no momento em que antecipa perdas e posterga ganhos, pode aumentar ainda mais o nível de percepção de assimetria por parte dos investidores, uma vez que cria viés no resultado, o que pode explicar esse resultado de relação negativa entre CT e conservadorismo.

Com base nos resultados, apresenta-se, na Tabela 7, o sinal esperado das hipóteses, bem como a aceitação ou rejeição dessas.

Tabela 7
Sinal observado das hipóteses

Com base na Tabela 7, verificam-se a observância de sinal positivo de CN e as variáveis de complexidade organizacional, sem considerar as DPL, conforme estipulado pelas hipóteses. Já a variável de CT apresentou sinal contrário ao esperado e a CI apresentou, em alguns modelos, sinal positivo e, em outros, negativo, o que torna seu resultado inconclusivo, podendo ser mais bem investigado em futuros estudos.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados evidenciaram a estimação do conservadorismo contábil adotado pelas empresas brasileiras no período de 2010 a 2016, de acordo com os modelos de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.), Khan e Watts (2009Khan, M., & Watts, R. L. (2009). Estimation and empirical properties of a firm-year measure of accounting conservatism. Journal of Accounting and Economics, 48(2-3), 132-150.) e Banker et al. (2016Banker, R. D., Basu, S., Byzalov, D., & Chen, J. Y. (2016). The confounding effect of cost stickiness on conservatism estimates. Journal of Accounting and Economics, 61(1), 203-220.). Observaram-se, na atual pesquisa, de acordo com o reportado por Banker et al. (2016), erros de estimação de conservadorismo no modelo original de Basu (1997Basu, S. (1997). The conservatism principle and the asymmetric timeliness of earnings. Journal of Accounting and Economics, 24(1), 3-37.) na amostra de empresas nacionais, ocasionados por assimetrias de custos.

Na análise da relação entre as medidas de complexidade e as práticas contábeis conservadoras, os resultados demonstraram que a CN e a complexidade organizacional, sob a ótica da rentabilidade do PL, quantidade de SUB, AA, TAM e EC, influenciaram para o aumento do nível de conservadorismo contábil adotado pelas empresas.

Ao considerar que a literatura prévia prevê que a complexidade de empresas pode limitar a transparência das informações e acarretar aumento substancial da assimetria de informação, infere-se que as empresas que apresentaram CN e organizacional (ROE, SUB, AA, TAM e EC) podem ter adotado práticas contábeis mais conservadoras com intuito de mitigar tal assimetria. Tal inferência se justifica porque, em um ambiente de maior incerteza, como pode ser caracterizado o ambiente das empresas complexas, o gestor ou o preparador das demonstrações contábeis pode optar por escolhas contábeis mais conservadoras, o que acaba gerando um reconhecimento assimétrico das perdas em relação aos ganhos (antecipação das perdas).

Conclui-se, assim, que certos ambientes empresariais complexos (CN, ROE, SUB, AA, TAM e EC) mostraram-se relacionados a práticas contábeis conservadoras, o que pode ser indicativo de redução da assimetria de informação em tais ambientes. Essas medidas de complexidade associaram-se ao aumento do nível de conservadorismo quando analisadas separadamente, ou seja, quando uma empresa tem somente CN, por exemplo, e talvez não as demais. Em contrapartida, as empresas que apresentaram ao mesmo tempo diversas medidas de complexidade, ao qual se refere a CT, demonstraram relação para a diminuição da prática conservadora.

Esse resultado da CT pode estar atrelado ao fato de que ambientes altamente complexos, como quando a empresa apresenta os três tipos de complexidade, sejam mais comuns em grandes corporações, que têm mais mecanismos de mitigação da assimetria informacional, não sendo necessário ou utilizando, de modo menos intenso, o conservadorismo contábil para tal. Ou, ainda, de acordo com LaFond e Watts (2008LaFond, R., & Watts, R. L. (2008). The information role of conservatism.The Accounting Review, 83(2), 447-478.), empresas altamente complexas podem estar adotando em menor grau o conservadorismo com intuito de diminuir a percepção de assimetria ao mercado externo, procurando reduzir possíveis custos políticos advindos da percepção de tal prática. No entanto, tais aspectos não foram objeto de investigação deste estudo e podem constituir uma lacuna de pesquisa a ser explorada por estudos futuros.

Além disso, como o conservadorismo contábil pode ser decorrente de inúmeros outros fatores, como normas contábeis, cultura organizacional da empresa, remuneração dos gestores, covenants contratuais, fatores fiscais, entre outros, os resultados encontrados neste estudo precisam ser vistos com parcimônia, pois novas pesquisas devem ser realizadas para analisar esses aspectos. Este estudo não objetivou esgotar a discussão sobre o tema, que é complexo e merece novas reflexões.

Como contribuição do estudo, constatou-se que o conservadorismo contábil varia conforme a assimetria de informação ocasionada por ambientes complexos, em que a relação depende se a empresa apresenta complexidade em poucas características (relação positiva) ou se tem complexidade em diversas características ao mesmo tempo (relação negativa). Portanto, esta pesquisa lança luz sobre um novo fator ou variável que pode influenciar as relações já estudadas na literatura entre conservadorismo e seus determinantes ou incentivos.

A principal implicação deste estudo consiste em sugerir que o ambiente organizacional das empresas, mais (menos) complexo, pode influenciar práticas contábeis menos (mais) conservadoras. Tal aspecto pode ajudar a explicar resultados contraditórios de estudos prévios sobre os determinantes ou incentivos do conservadorismo contábil, bem como auxiliar acadêmicos e usuários da informação contábil a entender melhor o comportamento mais (menos) conservador de algumas empresas, o qual pode influenciar a qualidade de seus relatórios.

Apresentam-se, ainda, como sugestões para futuras pesquisas, a análise da complexidade de empresas em relação a outras medidas de qualidade da informação contábil, contribuindo para o atual estudo, como também a análise do conservadorismo contábil em outros ambientes empresariais com menor ou maior nível de assimetria da informação. Também se incentiva a análise de não somente informações contábeis e econômicas, mas também sociais, visto que a assimetria de informação não se restringe somente a informações econômicas e contábeis.

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  • *
    Trabalho apresentado no XVII International Conference in Accounting, São Paulo, SP, Brasil, julho de 2017.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2019

Histórico

  • Recebido
    04 Set 2017
  • Aceito
    12 Maio 2018
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