Acessibilidade / Reportar erro

Influência da recessão e das variáveis macroeconômicas sobre a estrutura de capital setorial

Resumo

O objetivo do trabalho é analisar a influência da recente recessão e de variáveis macroeconômicas sobre o endividamento nos setores industriais brasileiros. A lacuna se configura pela preferência em investigar a reação da estrutura de capital em função dos setores econômicos. Entretanto, há de se considerar que setores industriais reagem de formas distintas diante de variações do cenário econômico, pois têm diferentes pontos ótimos de composição de estrutura de capital. A relevância do tema escolhido é realizar análise setorial do efeito da recessão e de variáveis macroeconômicas na composição da estrutura de capital, identificando os setores mais sensíveis. Também é relevante no aspecto de se apoiar em teorias financeiras clássicas aplicadas ao contexto atual, de forma a auxiliar na previsão da proporção do endividamento ante a oscilações de um conjunto de variáveis macroeconômicas. Como principais contribuições deste artigo, destacam-se a análise do nível de endividamento das empresas brasileiras ante a ocorrência de recessão e as variações na macroeconomia, identificando setores mais expostos a modificar sua estrutura de capital devido a esses fatores. Formularam-se seis hipóteses de pesquisa, testadas com o uso de regressão linear múltipla, com efeitos fixos em dois estágios a partir de dados em painel coletados de 211 empresas, classificadas em seis setores, com dados referentes ao período do primeiro trimestre de 2010 até o primeiro de 2018. Os resultados revelaram que a recente recessão brasileira foi relevante para a estrutura de capital dos setores pesquisados, sendo que a inflação foi significante apenas para o setor de saúde. O nível de endividamento do setor de materiais básicos mostrou-se o mais dependente das oscilações econômicas e o de telefonia e utilidades, o menos dependente. Adicionalmente, verificou-se que as variáveis específicas das empresas têm maior relevância na determinação da estrutura de capital quando comparadas às macroeconômicas.

Palavras-chave:
estrutura de capital; variáveis macroeconômicas; recessão; setores econômicos

Abstract

The aim of this paper is to analyze the influence of the recent recession and of macroeconomic variables over the indebtedness in Brazilian industry sectors. The gap derives from the preference for investigating the reaction of capital structure according to economic sectors. However, it has to be considered that industry sectors react differently to variations in the economic context, since they have different optimal points of capital structure composition. The relevance of the chosen topic lies in carrying out a sectorial analysis of the effect of recession and of macroeconomic variables on capital structure composition, identifying the most sensitive sectors. It is also relevant in terms of being based on classical financial theories applied to the current context, in order to help predict the proportion of debt given fluctuations in a set of macroeconomic variables. Standing out among the main contributions of this article are the analysis of the level of indebtedness of Brazilian companies given the occurrence of recession and variations in the macroeconomy, identifying sectors that are most exposed to modifying their capital structure due to these factors. Six research hypotheses were formulated and tested using multiple linear regression, with two-stage fixed effects based on panel data collected from 211 companies, classified into six sectors, with data relating to the first quarter of 2010 up to the first quarter of 2018. The results revealed that the recent Brazilian recession was relevant for the capital structure of the sectors studied, with inflation only being significant for the health sector. The level of indebtedness of the basic materials sector was shown to be the most dependent on economic fluctuations and that of telephony and utilities was shown to be the least dependent. In addition, it was verified that the company-specific variables have greater relevance in determining capital structure compared to the macroeconomic ones.

Keywords:
capital structure; macroeconomic variables; recession; economic sectors

1. INTRODUÇÃO

A teoria moderna da estrutura de capital tem sua raiz no trabalho de Modigliani e Miller (1958Modigliani, F., & Miller, M. H. (1958). The cost of capital, corporation finance, and the theory of investment. The American Economic Review, 48(3), 261-297.), que defendem a irrelevância das fontes de financiamento no valor da empresa. A teoria foi um marco nas finanças corporativas por gerar um debate que perdura sobre a existência ou não de estrutura ótima de capital. Inicialmente, a produção acadêmica focava em modelos qualitativos, com intuito de criar outras teorias contrárias ou convergentes à de Modigliani e Miller. Atualmente, os modelos quantitativos tornaram-se dominantes, havendo mais foco em descobrir fatores que influenciam os custos das fontes de capital (Hackbarth, Miao & Morellec, 2006Hackbarth, D., Miao, J., & Morellec, E. (2006). Capital structure, credit risk, and macroeconomic conditions. Journal of Financial Economics, 82(3), 519-550.).

Dentre os fatores que podem alterar o custo médio do capital de uma empresa ponderado pela sua estrutura de capital encontram-se as variáveis macroeconômicas, devido à sua relação direta com o fator risco (Chen, 2010Chen, H. (2010). Macroeconomic conditions and the puzzles of credit spreads and capital structure. The Journal of Finance , 65(6), 2171-2212.). Há de se considerar que os diferentes ciclos econômicos impactam nos fluxos de caixa organizacionais, o que produz efeitos no risco de default da organização e, consequentemente, torna o levantamento de recursos mais ou menos oneroso. Em situações de crise, o crédito fica mais escasso e oneroso, os riscos aumentam, as oportunidades de investimento são limitadas, afetando as decisões das empresas (Harrison & Widjaja, 2014Harrison, B., & Widjaja, T. W. (2014). The determinants of capital structure: Comparison between before and after financial crisis. Economic Issues, 19(2), 55-82.; Vithessonthia & Tongurai, 2015Vithessonthia, C., & Tongurai, J. 2015. The effect of firm size on the leverage - Performance relationship during the financial crisis of 2007-2009. Journal of Multinational Financial Management, 29(1), 1-29.). Ao mesmo tempo em que bancos enfrentam problemas de liquidez, as empresas ficam mais cautelosas em se alavancar devido ao receio de como o endividamento pode ser interpretado pelos mercados (Zeitun, Temimi & Mimouni, 2017Zeitun, R., Temimi, A., & Mimouni, K. (2017). Do financial crises alter the dynamics of corporate capital structure? Evidence from GCC countries. The Quarterly Review of Economics and Finance, 63(1), 21-33.).

Apesar da importância das variáveis macroeconômicas na escolha da forma de financiamento, essas podem provocar efeitos distintos na maneira como a composição da estrutura de capital pode variar em relação a oscilações nas taxas de juros, câmbio ou produto interno bruto (PIB), por exemplo. Dependendo do contexto e da política macroeconômica adotada, essas variáveis podem ou não ser relevantes na proporção de capital de terceiros organizacional. Diversos estudos foram realizados com intuito de averiguar os efeitos de oscilações macroeconômicas na composição da estrutura de capital. Terra (2007Terra, P. R. S. (2007). Estrutura de capital e fatores macroeconômicos na América Latina. Revista de Administração, 42(2), 192-204.) investiga os fatores econômicos determinantes da estrutura de capital de empresas de sete países da América Latina para o período de 1986 a 2000. Os resultados mostram que as variáveis macroeconômicas não são relevantes no nível de endividamento, mas que os fatores idiossincráticos de cada país são os principais determinantes da estrutura de capital. Posteriormente, Martins e Terra (2014Martins, H. C., & Terra, P. R. S. (2014). Determinantes nacionais e setoriais da estrutura de capital na América Latina. Revista de Administração Contemporânea, 18(5), 577-597.) realizam outro estudo acerca da temática para o período de 1996 a 2009, contendo os mesmos países mais os Estados Unidos da América. Os autores encontram evidências de significância das variáveis taxa de juros e inflação na alavancagem das empresas. Bastos, Nakamura e Basso (2009Bastos, D. D., Nakamura, W. T., & Basso, L. F. C. (2009). Determinantes da estrutura de capital das companhias abertas na América Latina: um estudo empírico considerando fatores macroeconômicos e institucionais. Revista de Administração Mackenzie, 10(6), 47-77.) também investigam os efeitos de índices econômicos na composição de capital organizacional, porém para cinco países latinos, de 2001 a 2006. Os resultados foram significantes apenas para o crescimento do PIB no aumento do endividamento das empresas.

Sendo assim, por depender de aspectos como período de análise, amostra, metodologia e ambiente econômico, o tema ainda é amplamente explorado e dificilmente haverá consenso sobre quais variáveis são de fato relevantes na composição da estrutura de capital.

Com base nesse contexto, o artigo objetiva analisar o efeito da recente recessão e de variáveis macroeconômicas sobre a estrutura de capital dos diferentes setores econômicos brasileiros. Como objetivo específico, o trabalho procura identificar a relação da estrutura de capital setorial com variáveis específicas das firmas (crescimento esperado, liquidez corrente, rentabilidade, tamanho e tangibilidade dos ativos). Para atender ao propósito da pesquisa, definiu-se um modelo de regressão linear múltipla, tendo o nível de endividamento como variável dependente, representada por dois indicadores (um contábil e outro a valor de mercado), bem como variáveis macroeconômicas e específicas das firmas como explanatórias. A amostra é composta por 211 empresas de capital aberto, classificadas em dois grupos quanto ao comportamento esperado em ciclos econômicos, divididas em seis subsetores, de acordo com classificação da Brasil Bolsa Balcão (B3). O período analisado, de março de 2010 a março de 2018, captura ciclos econômicos de expansão (no período de julho de 2009 a março de 2014, retornando após dezembro de 2016) e recessão (de abril de 2014 ao final de 2016) de acordo com o Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace) da Fundação Getúlio Vargas (FGV, 2015Fundação Getúlio Vargas. (2015). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/12/17/48/F4/978FE410F9AC5BD45C28C7A8/Comite%20de%20Datacao%20de%20Ciclos%20Economicos%20-%20Comunicado%20de%204_8_2015.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/12/...
, 2017Fundação Getúlio Vargas. (2017). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/C1/F8/E8/A18F66108DDC4E66CA18B7A8/Comite%20de%20Data__o%20de%20Ciclos%20Econ_micos%20-%20Comunicado%20de%2030_10_2017%20_1_.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/...
).

O trabalho se diferencia por focar na análise da estrutura de capital, visando identificar como diferentes setores se comportam em termos de sensibilidade a alterações no cenário macroeconômico e de fatores específicos. Pela ótica da metodologia, o alcance desse objetivo é facilitado pela opção de estimar modelos para cada subsetor separadamente, diferenciando-se de estudos cuja abordagem setorial foi feita por meio de variáveis binárias incluídas nos modelos. Por fim, o estudo é relevante por apoiar-se em teorias clássicas de finanças aplicadas ao contexto atual, de forma a auxiliar na previsão da proporção do endividamento ante a oscilações de um conjunto de variáveis macroeconômicas. Consequentemente, o artigo contribui para potencial ampliação das implicações para a teoria, órgãos reguladores e empresas pertencentes a diferentes nichos econômicos, devido à investigação do ponto de capital ótimo variável entre as indústrias.

O artigo é dividido em mais quatro partes além desta introdução: a seção seguinte apresenta o referencial teórico. A metodologia utilizada e os resultados são apresentados nas seções três e quatro, respectivamente, e a última seção traz as considerações finais.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1. Principais Teorias da Estrutura de Capital

Em 1958, Modigliani e Miller, apoiados na teoria do investimento, exploraram a relevância da estrutura de capital no valor de uma empresa. Os autores dividiram as fontes de capital em de terceiros e próprio. A teoria de estrutura de capital desenvolvida apoiou-se em duas proposições: a proposição 1 define que o valor de mercado de uma firma é independente da estrutura de capital, enquanto a proposição 2 afirma que o prêmio exigido pelo ativo está relacionado ao risco financeiro do endividamento da empresa, ou seja, que o custo de capital próprio aumenta com a alavancagem.

Embora a teoria de Modigliani e Miller (1958Modigliani, F., & Miller, M. H. (1958). The cost of capital, corporation finance, and the theory of investment. The American Economic Review, 48(3), 261-297.) tenha sido importante para as pesquisas financeiras, o trabalho sofreu uma série de críticas devido às restrições impostas, em especial no que diz respeito à ausência de tributação no modelo. Como resposta a esses questionamentos, Modigliani e Miller (1963Modigliani, F., & Miller, M. H. (1963). Corporate income taxes and the cost of capital: A correction. The American Economic Review , 53(3), 433-443.) incluíram o efeito dos impostos na estrutura de capital. Considerando-se que o imposto de renda é reduzido pelo endividamento, diferentemente da remuneração do capital próprio, fez-se correção do trabalho anterior. Em decorrência do benefício fiscal gerado, em períodos de elevada tributação, as empresas tendem a aumentar seu nível de endividamento, o que proporciona a redução de custo capital e o aumento do seu valor. Entretanto, acrescenta-se que nem por isso os tributos devem ser vistos como a força dominante na determinação da estrutura de capital.

A trade-off theory (TOT) se refere a um conjunto de teorias que considera que, além do benefício tributário, as empresas também devem considerar os efeitos dos custos do endividamento, concentrados, principalmente, no custo de falência e custo de agência. Dessa forma, uma empresa é capaz de atingir sua composição ótima de capital quando o benefício marginal de endividamento se igualar ao custo marginal. A abordagem mais conhecida derivada da família da TOT é a static trade-off (STO), que determina que o nível de endividamento é definido pelo trade-off de benefício fiscal e custo de falência em um período. Conforme releitura de Modigliani e Miller (1963Modigliani, F., & Miller, M. H. (1963). Corporate income taxes and the cost of capital: A correction. The American Economic Review , 53(3), 433-443.), à proporção que as empresas aumentam seu endividamento, reduzem a carga tributária e, consequentemente, geram alívio para o fluxo de caixa. Entretanto, o aumento do endividamento também amplia os custos de falência divididos nos custos administrativos e legais de default da empresa. Ainda que a falência seja evitada, esses custos tendem a deteriorar o valor da empresa, considerando-se que a alavancagem é interpretada como um fator de risco pelo mercado (Myers, 1984Myers, S. C. (1984). The capital structure puzzle. The Journal of Finance , 39(3), 574-592., 2003Myers, S. C. (2003). Financing of corporations. In G. M. Constantinides, M. Harris & R. M. Stulz (Orgs.), Handbook of the economics of finance (Vol. 1) (pp. 215-253). Oxford: Elsevier .).

Embora a TOT tenha papel importante nos estudos sobre estrutura de capital, a teoria não fornece nenhuma diretriz sobre qual seria a composição ideal de capital e se esta depende de fatores tanto específicos da empresa quanto da economia na qual está inserida (Hackbarth, Hennessy & Leland, 2007Hackbarth, D., Hennessy, C. A., & Leland, H. E. (2007). Can the trade-off theory explain debt structure? TheReview of Financial Studies , 20(5), 1389-1428.). Sendo assim, diversas teorias foram e ainda são desenvolvidas com objetivo de preencher a lacuna deixada. Uma das alternativas mais influentes consiste na pecking order theory (POT), que apresenta duas diferenças principais em relação à TOT: de acordo com a POT, empresas mais lucrativas tendem a se endividar menos, pois preferem fazer uso de lucros retidos para desenvolvimento de novos projetos. Em contrapartida, a abordagem da TOT segue a premissa de que uma alta lucratividade proporciona mais capacidade de endividamento ao levar em consideração a vantagem do benefício fiscal (Fama & French, 2002Fama, E. F., & French, K. R. (2002). Testing trade-off and pecking order predictions about dividends and debt. The Review of Financial Studies , 15(1), 1-33.). A segunda divergência consiste na hierarquia na forma de financiamento das empresas, uma vez que essas preferem realizar investimentos, primeiramente, com recursos internos, em seguida por dívidas e, em última hipótese, via emissão de ações (Tong & Green, 2005Tong, G., & Green, C. J. (2005). Pecking order or trade-off hypothesis? Evidence on the capital structure of Chinese companies. Applied Economics, 37(19), 2179-2189.). Essas diferenças ocorrem devido ao efeito da assimetria informacional entre investidores e agentes internos à empresa. Agentes internos emitem ações quando essas estão superestimadas. Os investidores, conscientes da assimetria de informação, descontam as novas e antigas ações negociadas, levando à subestimação do valor da empresa e à deterioração do valor presente do novo investimento (Fama & French, 2002Fama, E. F., & French, K. R. (2002). Testing trade-off and pecking order predictions about dividends and debt. The Review of Financial Studies , 15(1), 1-33.; Myers & Majluf, 1984Myers, S. C., & Majluf, N. S. (1984). Corporate financing and investment decisions when firms have information that investors do not have. Journal of Financial Economics , 13(2), 187-221.).

A comparação entre a POT e a TOT é amplamente explorada na literatura acadêmica (Harris & Raviv, 1991Harris, M., & Raviv, A. (1991). The theory of capital structure. The Journal of Finance , 46(1), 297-355.; López-Garcia & Sogorb-Mira, 2008López-Garcia, J., & Sogorb-Mira, F. (2008). Testing trade-off and pecking order theories financing SMEs. Small Business Economics, 31(2):117-136.), entretanto, não há consenso sobre qual seria a teoria prevalecente na estrutura de capital da empresa. Considerando-se que a escolha de financiamento depende de uma série de fatores que abrangem desde o código tributário aplicado até características dos setores aos quais as empresas pertencem, é de se esperar que não haja consenso entre os resultados. Desse modo, há um desdobramento de temas de pesquisas que busca identificar quais fatores são relevantes na escolha da composição de capital, principalmente considerando-se variáveis macroeconômicas, haja vista que a escolha na forma de financiamento varia ao longo do tempo em decorrência de alterações em seus custos e acessos.

2.2. Estrutura de Capital e Variáveis Macroeconômicas

O efeito das oscilações de indicadores econômicos no acesso ao crédito ainda é tema controverso. Considerando-se a teoria clássica, em períodos de recessão, as empresas enfrentam dificuldades na captação de empréstimos devido, principalmente, à deterioração do valor de seus ativos, aumentando a aversão ao risco e, consequentemente, ao prêmio exigido pelo empréstimo (Gertler & Kiyotaki, 2010Gertler, M., & Kiyotaki, N. (2010). Financial intermediation and credit policy in business cycle analysis. In B. M. Friedman & M., Woodford (Org.), Handbook of monetary economics (Vol. 3) (pp. 547-599). Oxford: Elsevier .). Pela perspectiva dos financiadores, principalmente dos bancos, crises financeiras aumentam suas restrições de concessão de crédito, reduzindo a oferta de capital e, consequentemente, aumentando seu custo. Embora essa seja a regra geral, a forma como empresas e bancos são afetados é heterogênea, uma vez que depende de fatores intrínsecos a eles. Bancos com foco em empréstimos para pequenas e médias empresas, por exemplo, enfrentam o problema adicional da concessão de garantias, que tendem a aumentar significativamente em cenário de turbulência econômica, como ocorrido em 2008. Outra característica relevante consiste no prazo dos itens do balanço patrimonial. Empresas com ativos de longo prazo e passivos de curto prazo tendem a ter menos exposição ao risco ante a recessões econômicas, tendo seu custo de acesso ao crédito menos prejudicado (Stiglitz, 2018Stiglitz, J. (2018). The theory of credit and macroeconomic stability. In A. G. Dastidar, F. Malhotra & V. Suneja (Eds.), Economic theory and policy amidst global discontent (pp. 145-201). New Delhi: Routledge.).

No que tange ao capital próprio, os ciclos econômicos também têm papel relevante, sendo a relação entre variáveis macroeconômicas e precificação de ativos um dos temas de finanças mais estudados. Períodos caracterizados por expansão econômica tendem a favorecer os retornos dos ativos, o que implica em custo de capital próprio reduzido, haja vista que as ações teoricamente estariam sobrevalorizadas. Consequentemente, empresas tendem a se aproveitar do otimismo do mercado e aumentar a proporção de capital próprio (Alti, 2006Alti, A. (2006). How persistent is the impact of market timing on capital structure?The Journal of Finance , 61(4), 1681-1710.). Apesar disso, a sensibilidade do percentual de capital próprio também depende de fatores intrínsecos. Segundo Korajczyk e Levy (2003Korajczyk, R. A., & Levy, A. (2003). Capital structure choice: Macroeconomic conditions and financial constraints. Journal of Financial Economics , 68(1), 75-109.), empresas com menos restrições financeiras (mais fluxo de caixa, mais oportunidade de crescimento, menos custo de agência) tendem a preferir o endividamento em períodos de recessão e a emissão de ações em períodos de expansão econômica, enquanto empresas com mais restrições financeiras têm preferência oposta. Esse tipo de comportamento é explicado pela teoria flight to quality, em que os agentes de mercado tendem a se desfazer de investimentos de mais risco, o que deteriora o preço das ações no mercado financeiro.

Diversos estudos foram feitos com intuito de identificar como o cenário econômico interfere nas decisões de financiamento das empresas no contexto não apenas de mercados desenvolvidos, mas também de mercados emergentes, haja vista que estes tendem a ter economias instáveis. Tsoy e Heshmati (2017Tsoy, L., & Heshmati, A. (2017). Impact of financial crises on dynamics of capital structure: Evidence from Korean listed companies. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2923637
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
) investigam o efeito da crise asiática de 1997 e da crise global de 2008 na estrutura de capital das empresas. Os resultados mostraram que, para a primeira crise, a participação de capital de terceiros foi significativamente reduzida, enquanto na de 2008 ocorreu o efeito inverso. Verificou-se, ainda, que o nível de endividamento depende de variáveis específicas das empresas, como tamanho, ativos tangíveis e lucro. Iqbal e Kume (2015Iqbal, A., & Kume, O. (2015). Impact of financial crisis on firms’ capital structure in UK, France, and Germany. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2472669
https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
) também analisam o efeito da crise de 2008 na estrutura de capital, porém para Inglaterra, França e Alemanha. Os autores encontraram evidências de aumento no endividamento durante a pré-crise, mas com o efeito amenizado no cenário posterior. Balios, Daskalakis, Eriotis e Vasiliou (2016Balios, D., Daskalakis, N., Eriotis, N., & Vasiliou, D. (2016). SMEs capital structure determinants during severe economic crisis: The case of Greece. Cogent Economics & Finance, 4(1), 1-11.) realizam estudo no contexto das crises econômicas ocorridas na Grécia. Os autores encontram que o efeito dos determinantes da estrutura de capital não se altera durante cenário de crise, mas que o crescimento econômico é positivamente relacionado com o nível de alavancagem. Embora os resultados não sejam uniformes, os estudos indicam que a estrutura de capital varia ao longo dos ciclos entre as empresas, tendo em vista que o acesso aos recursos de financiamento tende a responder às oscilações dos cenários econômicos, impactando diretamente nas decisões financeiras.

2.3. Resultados Esperados de Pesquisa

Tendo por objetivo analisar o efeito da recessão e variáveis macroeconômicas na estrutura de capital dos setores de empresas com ações negociadas na B3, são formuladas seis hipóteses para testes empíricos.

A construção das hipóteses de pesquisa foi feita com base nas teorias tradicionais de estrutura de capital, de forma que a relação esperada entre as variáveis macroeconômicas e o nível de endividamento total foi realizada considerando-se estudos empíricos anteriores. Assim, utilizaram-se cinco indicadores, com propósito de abranger diferentes fatores de risco macroeconômicos.

A primeira hipótese formulada testa o impacto do PIB na proporção de capital de terceiros. A TOT e a POT divergem no sinal esperado, uma vez que a primeira se baseia no crescimento de oportunidades ante o aumento do PIB, enquanto a segunda se apoia no aumento dos lucros internos das empresas. Com base na TOT, o sinal esperado é positivo, pois a expansão econômica favorece a oportunidade de novos projetos, assim como reduz o custo de falência, o que motiva as empresas a aumentarem seu nível de endividamento (Huang & Ritter, 2009Huang, R., & Ritter, J. R. (2009). Testing theories of capital structure and estimating the speed of adjustment. Journal of Financial and Quantitative Analysis , 44(2), 237-271.). A POT prevê efeito inverso, ao considerar que o crescimento econômico beneficia o fluxo de caixa das empresas, fazendo com que essas financiem seus projetos com recursos internos, haja vista a hierarquia na forma de financiamento (Bastos et al., 2009Bastos, D. D., Nakamura, W. T., & Basso, L. F. C. (2009). Determinantes da estrutura de capital das companhias abertas na América Latina: um estudo empírico considerando fatores macroeconômicos e institucionais. Revista de Administração Mackenzie, 10(6), 47-77.; Terra, 2007Terra, P. R. S. (2007). Estrutura de capital e fatores macroeconômicos na América Latina. Revista de Administração, 42(2), 192-204.).

A segunda hipótese a ser testada é a do impacto da alteração de taxas de juros na captação de recursos de terceiros. A taxa de juros está associada ao conceito de risco. Dado que a taxa de juros básica da economia normalmente é adotada como benchmark do ativo livre de risco, espera-se que a taxa de juros cobrada nas concessões de empréstimo a empresas seja superior àquela (Staking & Babbel, 1995Staking, K. B., & Babbel, D. F. (1995). The relation between capital structure, interest rate sensitivity, and market value in the property-liability insurance industry. Journal of Risk and Insurance, 62(4), 690-718.). O efeito dos juros sobre a estrutura de capital é outro ponto de discordância entre a POT e da TOT. O aumento nas taxas de juros incentiva a emissão de ações em decorrência do encarecimento da dívida, o que, sob a ótica da POT, pressupõe relação direta negativa. À luz da TOT, o aumento dos juros provoca a diminuição do valor da empresa e também de suas dívidas de longo prazo, entretanto, a primeira consequência ocorre de forma mais acentuada relativamente à segunda, o que tende a elevar a proporção do capital de terceiros na estrutura de capital, ou seja, relação positiva, embora indireta (Frank & Goyal, 2003Frank, M. Z., & Goyal, V. K. (2003). Capital structure decisions [Working Paper]. Social Science Electronic Publishing.; Medeiros & Daher, 2008Medeiros, O. R. D., & Daher, C. E. (2008). Testing alternative theories on the capital structure of Brazilian firms. Revista de Administração Contemporânea, 12(1), 177-199.).

A terceira hipótese está relacionada com a inflação. Segundo a TOT, altas taxas de inflação podem reduzir o custo real do financiamento, encorajando a firma a aumentar seu endividamento (Frank & Goyal, 2009Frank, M. Z., & Goyal, V. K. (2009). Capital structure decisions: Which factors are reliably important?Financial Management, 38(1), 1-37.; Zeitun et al., 2017Zeitun, R., Temimi, A., & Mimouni, K. (2017). Do financial crises alter the dynamics of corporate capital structure? Evidence from GCC countries. The Quarterly Review of Economics and Finance, 63(1), 21-33.), ou seja, uma inflação maior tem efeito positivo sobre o endividamento, pois as companhias optam por alongar a dívida, considerando que os valores reais dos benefícios fiscais são maiores neste caso. Em contrapartida, a utilização da taxa de juros como ferramenta de controle de preços, por meio do uso de política monetária contracionista, faz com que a elevação dos juros iniba o consumo e, como consequência, reduza a oferta de capital em circulação (Galí, 2015Galí, J. (2015). Monetary policy, inflation, and the business cycle: An introduction to the new Keynesian framework and its applications. Princeton, NJ: Princeton University Press.). Seguindo a lei da oferta e da demanda, o capital torna-se mais caro e o custo de captar recursos aumenta. Pela abordagem da POT, a relação entre endividamento e inflação é negativa devido à incerteza econômica gerada em cenários inflacionários, o que intimida empresas a contrair dívidas de longo prazo (Fan, Titman & Twite, 2012Fan, J. P., Titman, S., & Twite, G. (2012). An international comparison of capital structure and debt maturity choices. Journal of Financial and Quantitative Analysis, 47(1), 23-56.). Dessa forma, a captação de recursos de terceiros se torna mais onerosa, além de, consequentemente, aumentar os custos de falência da empresa (Gungoraydinoglu & Öztekin, 2011Gungoraydinoglu, A., & Öztekin, Ö. (2011). Firm-and country-level determinants of corporate leverage: Some new international evidence. Journal of Corporate Finance , 17(5), 1457-1474.).

A quarta hipótese testada corresponde ao efeito do dólar no nível de participação de capital de terceiros. O efeito da taxa de câmbio no custo de capital de terceiros associa-se não somente à captação de recursos estrangeiros como fonte de financiamento, mas também à percepção do risco interno ante a investidores externos. A POT e a TOT fornecem diretrizes sobre o efeito esperado da taxa de câmbio no nível de endividamento das empresas, ao assumirem que esse pode ser tido como proxy do risco-país. Sob a perspectiva da POT, o câmbio tem relação negativa com o nível de endividamento devido a dois fatores. Primeiramente, como esperado, a desvalorização da moeda local torna o endividamento estrangeiro mais oneroso. Adicionalmente, a conexão entre câmbio e endividamento também se relaciona com a teoria de agência, pois, ao considerar sua associação ao risco-país, os custos de agência tornam-se maiores, o que faz com que os financiadores estrangeiros exijam mais retornos sobre a dívida. Pela perspectiva da TOT, a relação entre o nível de endividamento e o câmbio depende de um terceiro fator, que consiste na taxa de juros local. Quanto maior a diferença entre a taxa de juros e a taxa de câmbio, maior o nível de endividamento via capital estrangeiro (Allayannis, Brown & Klapper, 2003Allayannis, G., Brown, G. W., & Klapper, L. F. (2003). Capital structure and financial risk: Evidence from foreign debt use in East Asia. The Journal of Finance, 58(6), 2667-2710.).

A quinta hipótese elaborada é a do impacto do mercado de ações e endividamento. A relação do mercado de capitais é abordada principalmente pela teoria do market timing, que se refere à prática de emissão de ações a elevado valor e sua recompra a baixo custo. Essa teoria se associa à estrutura de capital pelo fato de as empresas preferirem emissão de ações à emissão de dívidas em época em que investidores se encontram otimistas com futuros ganhos (Baker & Wurgler, 2002Baker, M., & Wurgler, J. (2002). Market timing and capital structure. The Journal of Finance , 57(1), 1-32.). Sendo assim, de acordo com o market timing, o nível de endividamento das empresas é inversamente proporcional ao desempenho do mercado financeiro, devido ao custo reduzido do capital próprio. Quando a análise é feita à luz da TOT, embora de início o boom do mercado tenha relação negativa com a participação de capital de terceiros, como as empresas se ajustam gradualmente ao seu ponto ótimo de endividamento, choques positivos não têm efeito duradouro e impactante previsto pelo market timing (Alti, 2006Alti, A. (2006). How persistent is the impact of market timing on capital structure?The Journal of Finance , 61(4), 1681-1710.; Mahajan & Tartaroglu, 2008Mahajan, A., & Tartaroglu, S. (2008). Equity market timing and capital structure: International evidence. Journal of Banking & Finance , 32(5), 754-766.).

Por último, será testado o efeito da recessão na estrutura de capital. A variável procura capturar as mudanças ocorridas no ambiente macroeconômico brasileiro de forma geral, considerando a recessão econômica que se instalou no Brasil no período de abril de 2014 a dezembro de 2016, segundo a FGV (2015Fundação Getúlio Vargas. (2015). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/12/17/48/F4/978FE410F9AC5BD45C28C7A8/Comite%20de%20Datacao%20de%20Ciclos%20Economicos%20-%20Comunicado%20de%204_8_2015.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/12/...
, 2017Fundação Getúlio Vargas. (2017). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/C1/F8/E8/A18F66108DDC4E66CA18B7A8/Comite%20de%20Data__o%20de%20Ciclos%20Econ_micos%20-%20Comunicado%20de%2030_10_2017%20_1_.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/...
).

Pelas diretrizes da POT, choques econômicos positivos tornam os custos de divisão de risco entre agentes internos e externos menores do que os custos de incentivo interno, o que motiva as empresas a gradualmente trocarem o endividamento por emissão de ações. Para choques econômicos negativos, esse efeito é revertido e os custos de agência tornam-se maiores do que os custos de incentivo. Sendo assim, para que a empresa consiga manter seu fluxo de caixa mínimo a um menor custo, a proporção de endividamento cresce ante a proporção de capital próprio. Dessa forma, a relação entre alavancagem e expansão econômica seria negativa, mas positiva em relação à recessão, uma vez que essa se comporta de modo contra cíclico (Levy & Hennessy, 2007Levy, A., & Hennessy, C. (2007). Why does capital structure choice vary with macroeconomic conditions? Journal of Monetary Economics, 54(6), 1545-1564.). Pela TOT, o efeito esperado é inverso, pois cenários de turbulência econômica estão diretamente atrelados à volatilidade financeira, o que, consequentemente, impacta no risco de default e aumenta os custos de captação de dívida. Nesse contexto, contrações econômicas aumentam o risco de default e, consequentemente, o custo de falência, reduzindo o incentivo ao endividamento da empresa (Hackbarth et al., 2006Hackbarth, D., Miao, J., & Morellec, E. (2006). Capital structure, credit risk, and macroeconomic conditions. Journal of Financial Economics, 82(3), 519-550.).

Com relação à análise setorial, espera-se que o comportamento do nível de endividamento varie entre os subsetores econômicos, considerando suas particularidades intrínsecas, como relações de oferta/demanda ou tributação, por exemplo. Simplificadamente, considerando-se o cerne do artigo, os setores foram divididos de acordo com sua sensibilidade ante a flutuações macroeconômicas em dois grandes grupos: cíclicos e não cíclicos. Os setores cíclicos têm mais sensibilidade de sua atividade em relação à economia na ocorrência de expansão ou recessão. Nesse grupo, incluíram-se os setores pró-cíclicos que têm relação direta com a expansão econômica, uma vez que são empresas que respondem em curto prazo a variações na renda. Sendo assim, são empresas vulneráveis a recessões econômicas, pois vendem menos em cenários econômicos desfavoráveis (Pindyck & Rubinfield, 2014Pindyck, R., & Rubinfeld, D. (2014). Microeconomics GE. Camberwell: Pearson Australia Pty.). Os setores não cíclicos, por sua vez, não são tão expostos a flutuações econômicas. São empresas que produzem bens inelásticos, como bens atrelados à saúde ou com características de monopólios naturais (energia elétrica, telefonia fixa, gás, água e saneamento), por exemplo, e com isso não tendem a sofrer com alterações em função de modificações na renda (Pearce & Michael, 2006Pearce II, J. A., & Michael, S. C. (2006). Strategies to prevent economic recessions from causing business failure. Business Horizons, 49(3), 201-209.). Nesse grupo foram incluídos os setores anticíclicos, que são aqueles que se beneficiam quando há retração econômica, podendo até mesmo ter desempenho positivo, considerando-se que os preços dos bens tendem a aumentar, o que acarreta crescimento da receita. Sendo assim, baseando-se nas características dos setores econômicos, à luz da TOT, espera-se que os subsetores pertencentes ao setor cíclico aumentem seu endividamento ante a variações econômicas que se caracterizam em cenários de expansão: aumento do PIB, redução de taxa de juros, redução de câmbio e boom do mercado financeiro. Esse fator ocorre devido à determinação da teoria de que aumento dos lucros implica que a empresa teria maior volume de renda tributável que, por sua vez, decresceria com o aumento do endividamento, resultando em menor risco financeiro e, consequentemente, menor custo (Myers, 2003Myers, S. C. (2003). Financing of corporations. In G. M. Constantinides, M. Harris & R. M. Stulz (Orgs.), Handbook of the economics of finance (Vol. 1) (pp. 215-253). Oxford: Elsevier .). Em contrapartida, seguindo a mesma lógica, na ocorrência de recessão, espera-se que o endividamento seja reduzido.

Um cuidado deve ser tomado em relação ao crescimento do índice inflacionário, característica de expansão econômica, pois, conforme descrito, a indústria cíclica tem mais sensibilidade e mais elasticidade preço-demanda ante a alteração nos preços. Com isso, embora a TOT preveja uma relação positiva entre inflação e endividamento, é de se esperar que o impacto inicial no setor cíclico seja positivo, porém que o coeficiente decresça com o aumento inflacionário contínuo e seu efeito na receita e no caixa das empresas.

Quando considerada a POT, espera-se que o endividamento apresente relação negativa com o PIB, índice da bolsa de valores e inflação, pois, segundo a teoria, empresas tendem a aumentar seu endividamento quando não têm caixa suficiente para cobrir seus investimentos. Como o setor é beneficiado pela expansão econômica, as empresas precisarão de menos recursos externos na sua ocorrência. O racional é invertido no caso de retração econômica, motivo pelo qual espera-se relação positiva com as variáveis taxa de juros, câmbio e recessão.

Para o setor não cíclico, a análise é mais complexa, haja vista que os bens e serviços fornecidos independem das flutuações macroeconômicas, podendo, até mesmo, reagir positivamente em cenários de recessão. Indústrias de saúde e de alimentos básicos, por exemplo, apresentam baixa elasticidade, uma vez que seu consumo permanece independente da variação do preço (Pearce & Michael, 2006Pearce II, J. A., & Michael, S. C. (2006). Strategies to prevent economic recessions from causing business failure. Business Horizons, 49(3), 201-209.). Dessa forma, considerando-se a teoria econômica de oferta e demanda, espera-se que variáveis macroeconômicas PIB, taxa de juros, câmbio e mercado financeiro não sejam significantes para o nível de endividamento do setor, de forma que esses tenham outros determinantes de estrutura de capital.

Para a inflação, considerando-se a baixa elasticidade dos bens desse setor, espera-se que apresente relação positiva sob a luz da TOT, pois mantendo demanda constante e aumentando os preços dos bens, os lucros crescem e, consequentemente, as empresas são instigadas a captar recursos de terceiros visando ao benefício fiscal. Sob a dimensão da POT, o sinal esperado é negativo, tendo em vista que empresas lucrativas têm recursos suficientes para realizar seus investimentos.

3. METODOLOGIA

As subseções a seguir descrevem os critérios para a seleção da amostra, o modelo e o método utilizado para atender ao objetivo da pesquisa.

3.1. Amostra

A amostra foi constituída por todas as empresas com ações listadas na B3, classificadas por subsetor econômico conforme critério estabelecido pela própria bolsa. Da amostra foram excluídas as empresas: (i) que não apresentaram dados suficientes para análise; (ii) que apresentaram o patrimônio líquido negativo durante o período da amostra; e (iii) pertencentes ao setor financeiro por terem regulação específica, o que leva à diferenciação da estrutura de capital em relação aos demais setores. A fim de garantir mais diversificação e melhor qualidade da amostra, subsetores com menos de 10 empresas não foram considerados. De acordo com esses critérios, selecionaram-se 211 empresas e seis subsetores, conforme demonstrado na Tabela 1. A fonte dos dados contábeis sobre a estrutura de capital foi o banco de dados do software da Thomson Reuters Eikon.

Tabela 1.
Subsetores econômicos - Classificação da Brasil Bolsa Balcão (B3)

A escolha do período, de março de 2010 a março de 2018, levou em consideração a adoção pelo Brasil do novo padrão contábil internacional a partir de 2010, conforme Instrução n. 457/2007 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM, 2007Comissão de Valores Mobiliários (Brazilian capital market regulator).(2007). CVM Instruction 457, of July 13th of 2007. Describes the elaboration and disclosure of consolidated financial statements, based on the international accounting standard issued by the International Accounting Standards Board (IASB). Retrieved from http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/legislacao/instrucoes/anexos/400/inst457consolid.pdf
http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/l...
), assim como a disponibilidade dos dados em frequência trimestral, conforme divulgação pelas empresas.

Esse intervalo captura diferentes ciclos econômicos pois, segundo a FGV (2015Fundação Getúlio Vargas. (2015). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/12/17/48/F4/978FE410F9AC5BD45C28C7A8/Comite%20de%20Datacao%20de%20Ciclos%20Economicos%20-%20Comunicado%20de%204_8_2015.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/12/...
), houve um período de expansão econômica de 20 trimestres, ocorrido de julho de 2009 a março de 2014, e outro de recessão, a partir do segundo trimestre de 2014, que se estendeu até o final de 2016 (FGV, 2017Fundação Getúlio Vargas. (2017). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/C1/F8/E8/A18F66108DDC4E66CA18B7A8/Comite%20de%20Data__o%20de%20Ciclos%20Econ_micos%20-%20Comunicado%20de%2030_10_2017%20_1_.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/...
). O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) corrobora esse diagnóstico ao constatar que, de 2009 a 2011, a economia brasileira viveu uma expansão econômica, entrando no período pré-expansão até 2013. Em 2014, os índices de crescimento tornaram-se decrescentes, atingindo valor negativo no final de 2015, período caracterizado como recessão. De acordo com a FGV, que faz as medições desde 1980, a recessão do período de 2014 a 2016, juntamente com a ocorrida de 1989 a 1992, foi uma das mais longas desde o início da série, com perda acumulada de 8,6% de PIB em 11 trimestres. Porém, a instituição identificou a ocorrência de um vale do ciclo de negócios brasileiro no quarto trimestre de 2016, o que representou o fim da recessão e a entrada do país em um período de expansão a partir de 2017 (FGV, 2017Fundação Getúlio Vargas. (2017). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/C1/F8/E8/A18F66108DDC4E66CA18B7A8/Comite%20de%20Data__o%20de%20Ciclos%20Econ_micos%20-%20Comunicado%20de%2030_10_2017%20_1_.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/...
).

Os dados das variáveis macroeconômicas foram coletados nas páginas eletrônicas do IBGE, do Banco Central do Brasil (BC) e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

3.2. Definição do Modelo

A utilização de dados de diferentes empresas e períodos oportunizou a análise em painel, que permite incorporar informações de seções transversais e de séries temporais. Ao utilizar essa técnica, assume-se, implicitamente, que os valores das variáveis e as relações entre elas são constantes ao longo do tempo e das unidades transversais da amostra. Como vantagens, cite-se o fato de que a combinação de dados ajuda a reduzir problemas de multicolinearidade, evita a perda de graus de liberdades, bem como reduz o impacto de variáveis omitidas.

A estrutura de capital, variável dependente, é composta pela proporção de capital próprio e de terceiros na composição de capitais da empresa. Para fins desta pesquisa, é definida pela participação do capital de terceiros no capital total. Baseando-se na literatura pregressa, utilizaram-se o endividamento total contábil e o endividamento total a valor de mercado como variáveis dependentes (Cook & Tang, 2010Cook, D. O., & Tang, T. (2010). Macroeconomic conditions and capital structure adjustment speed. Journal of Corporate Finance, 16(1), 73-87.; Frank & Goyal, 2009Frank, M. Z., & Goyal, V. K. (2009). Capital structure decisions: Which factors are reliably important?Financial Management, 38(1), 1-37.; Korajczyk & Levy, 2003Korajczyk, R. A., & Levy, A. (2003). Capital structure choice: Macroeconomic conditions and financial constraints. Journal of Financial Economics , 68(1), 75-109.; Lemmon, Roberts & Zender, 2008Lemmon, M. L., Roberts, M. R., & Zender, J. F. (2008). Back to the beginning: Persistence and the cross‐section of corporate capital structure. The Journal of Finance , 63(4), 1575-1608.), os quais foram calculados conforme especificado na Tabela 2.

Tabela 2.
Variáveis dependentes

Assim, embora o objetivo principal da pesquisa seja avaliar a relação entre a variável dependente, a estrutura de capital, e as variáveis independentes macroeconômicas, comuns a todas as empresas ao longo do tempo, incluíram-se variáveis de controle de corte transversal específicas das empresas, também com evolução no mesmo período, de forma que não se obtivessem resultados inconsistentes em função da ausência de dados das seções transversais. As variáveis de controle foram selecionadas a partir da revisão da literatura anterior (Bastos et al., 2009Bastos, D. D., Nakamura, W. T., & Basso, L. F. C. (2009). Determinantes da estrutura de capital das companhias abertas na América Latina: um estudo empírico considerando fatores macroeconômicos e institucionais. Revista de Administração Mackenzie, 10(6), 47-77.; Erel, Julio, Kim & Weisbach, 2011Erel, I., Julio, B., Kim, W., & Weisbach, M. S. (2011). Macroeconomic conditions and capital raising. The Review of Financial Studies, 25(2), 341-376.; Frank & Goyal, 2009Frank, M. Z., & Goyal, V. K. (2009). Capital structure decisions: Which factors are reliably important?Financial Management, 38(1), 1-37.; Korajczyk & Levy, 2003Korajczyk, R. A., & Levy, A. (2003). Capital structure choice: Macroeconomic conditions and financial constraints. Journal of Financial Economics , 68(1), 75-109.; Martins & Terra, 2014Martins, H. C., & Terra, P. R. S. (2014). Determinantes nacionais e setoriais da estrutura de capital na América Latina. Revista de Administração Contemporânea, 18(5), 577-597.; Nakamura et al., 2007Nakamura, W., Martin, D., Forte, D., Carvalho, A., Costa, A., & Amaral, A. (2007). Determinantes de estrutura de capital no mercado brasileiro: análise de regressão com painel de dados no período 1999-2003. Revista Contabilidade & Finanças , 18(44), 72-85. ; Terra, 2007Terra, P. R. S. (2007). Estrutura de capital e fatores macroeconômicos na América Latina. Revista de Administração, 42(2), 192-204.).

As hipóteses para os sinais dos coeficientes angulares de acordo com a POT e a TOT são apresentadas na Tabela 3. Não obstante, ainda que não sejam o foco principal da pesquisa, essas variáveis permitiram identificar se os setores se comportam de forma diferenciada do previsto pelas teorias.

Tabela 3.
Variáveis específicas

Algumas pesquisas sobre a estrutura de capital no Brasil, tais como Bastos, Nakamura e Basso (2009Bastos, D. D., Nakamura, W. T., & Basso, L. F. C. (2009). Determinantes da estrutura de capital das companhias abertas na América Latina: um estudo empírico considerando fatores macroeconômicos e institucionais. Revista de Administração Mackenzie, 10(6), 47-77.), Bastos e Nakamura (2009Bastos, D. D., & Nakamura, W. T. (2009). Determinantes da estrutura de capital das companhias abertas no Brasil, México e Chile no período 2001-2006. Revista Contabilidade & Finanças, 20(50), 75-94.) e Martins e Terra (2014Martins, H. C., & Terra, P. R. S. (2014). Determinantes nacionais e setoriais da estrutura de capital na América Latina. Revista de Administração Contemporânea, 18(5), 577-597.), utilizando dados em painel, incluíram setores econômicos como variáveis binárias nas regressões, com objetivo de verificar se a estrutura de capital é sensível ao tipo de subsetor no qual as empresas atuam. Nesse aspecto, este trabalho se diferencia ao estimar os modelos separadamente para cada setor, para que a sensibilidade e a relação da estrutura de capital com as variáveis explicativas possam ser verificadas e comparadas por subsetores. Para atender ao propósito da pesquisa, definiu-se a equação 1.

EC i t = β 0 + β 1 PIB t 2 T J t + β 3 INF t + β 4 CAM t + β 5 I BOV t + β 6 REC t + β 7 MTB i t + β 8 LIQ i t + β 9 ROA i t + β 10 TAM i t + β 11 TANG i t + μ it (2)

em que ECit é o nível endividamento para cada empresa i no período t, assumindo as definições de EC (endividamento contábil) ou EM (endividamento a mercado), PIBt é a variação trimestral sobre o mesmo trimestre do ano anterior do PIB a preços de mercado, dessazonalizado no período t, TJt é a variação trimestral da taxa de juros anual no Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic) deflacionada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no período t ou t-3, INFt é a variação trimestral da taxa de inflação anual medida pelo IPCA no período t, CAMt é a variação trimestral do índice da taxa de câmbio real efetiva (IPCA) anual no período t, IBOVt é a variação trimestral real do retorno anual do índice Bovespa (Ibovespa) no período t, RECt é a variável dicotômica indicativa de recessão, assumindo 1 no período de abril de 2014 a dezembro de 2016 e 0 para os demais períodos, MTBit é a variável de controle “crescimento esperado” para cada empresa i no período t, LIQit é a variável de controle “liquidez” para cada empresa i no período t, ROAit é a variável de controle “rentabilidade” para cada empresa i no período t, TAMit é a variável de controle “tamanho” para cada empresa i no período t, TANGit é a variável de controle “tangibilidade” para cada empresa i no período t e uit é o erro aleatório da regressão.

4. ANÁLISE DOS RESULTADOS

4.1. Estatísticas Descritivas

A evolução das variáveis macroeconômicas por ciclo econômico apresentada na Tabela 4 permite constatar que o mais longo período recessivo registrado no Brasil desde 1980 (FGV, 2017Fundação Getúlio Vargas. (2017). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/C1/F8/E8/A18F66108DDC4E66CA18B7A8/Comite%20de%20Data__o%20de%20Ciclos%20Econ_micos%20-%20Comunicado%20de%2030_10_2017%20_1_.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/...
), com duração de 11 trimestres, caracterizou-se por retração da atividade econômica combinada com elevadas taxas de juros, taxa cambial e inflação em relação aos períodos anterior e posterior. O mercado de ações, que já apresentava retorno médio negativo antes da recessão, apresentou baixo desempenho nominal (se tornando negativo quando descontada a deflação) no período recessivo, com considerável melhora após a reversão do ciclo econômico, para expansão a partir de 2017, conforme constatado pela FGV (2017Fundação Getúlio Vargas. (2017). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/C1/F8/E8/A18F66108DDC4E66CA18B7A8/Comite%20de%20Data__o%20de%20Ciclos%20Econ_micos%20-%20Comunicado%20de%2030_10_2017%20_1_.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/...
).

Tabela 4.
Evolução das variáveis macroeconômicas por ciclo econômico

A Tabela 5 demostra que o menor endividamento médio foi apresentado pelo subsetor de saúde e o maior, pelo subsetor de bens industriais, tanto pelo indicador contábil quanto pelo valor de mercado.

Tabela 5.
Estatísticas descritivas das variáveis dependentes [endividamento contábil (EC) e endividamento a mercado (EM)] e variáveis de controle por subsetor

A área de saúde também foi a que apresentou a maior dispersão do EC. Dentre as variáveis específicas, observando a média do período, o maior crescimento esperado (MTB) foi o do subsetor de consumo não cíclico. O subsetor de materiais básicos apresentou maior liquidez corrente. A maior rentabilidade foi a dos bens industriais e a menor, negativa, a de saúde, que também apresentou maior dispersão nesse quesito. Com relação ao tamanho, o maior subsetor é o de consumo não cíclico e o mais tangível é o de materiais básicos.

4.2. Testes Preliminares

Para verificar o risco de multicolinearidade, o primeiro teste foi a matriz de correlação entre as variáveis pela qual não se identificou correlação maior que 0,8, o que, segundo Gujarati e Porter (2011Gujarati, D. N., & Porter, D. C. (2011). Econometria básica (5th ed.) Porto Alegre, RS: AMGH.), evidencia risco relevante. Porém, a análise de fator de inflação de variância (FIV) (FIV = (1 - R2 k )-1) permite investigação mais robusta sobre a questão da multicolinearidade. De acordo com esse teste, quando o FIV da variável dependente, em relação às demais variáveis, é maior que 4, é necessário aprofundamento da análise. Os resultados dos testes de FIV indicaram fraca possibilidade de existência de multicolinearidade, com indicadores menores que 3 para todas as variáveis. Adicionalmente, a hipótese de existência de raiz unitária foi rejeitada para todas as séries pelo teste augmented Dickey-Fuller (ADF)-Fisher.

Inicialmente, todas as estimações foram realizadas pelo método de mínimos quadrados ordinários (MQO) com efeitos fixos juntamente com o método de covariância dos coeficientes seemingly unrelated regressions (SUR) (panel corrected standard error - PSCE) cross-sectional para controlar problemas de heteroscedasticidade e autocorrelação. Uma vez que existem três formas de estimações em painel (pooled regression - regressão agrupada -, efeitos fixos e efeitos aleatórios), o primeiro passo para subsidiar a escolha mais adequada foi realizar o teste de redundância de efeitos fixos, cuja hipótese nula é de que os efeitos fixos são significantes, o que, se confirmado, indica que o melhor método é o de regressão agrupada. A hipótese nula foi rejeitada em todos os casos, o que indica que a regressão agrupada não é adequada.

Em função da opção pela estimação por SUR (PCSE) cross-seccional, não foi realizado o teste de Hausman para fundamentar a escolha entre efeitos fixos e aleatórios, pois as premissas desse teste não são compatíveis com a estimação por SUR. Entretanto, todas as estimações foram realizadas também com efeitos aleatórios, e o que se observou foi pouca variação nos resultados em relação às significâncias e sinais dos coeficientes angulares, mas R2 menor em todos os casos. Assim, apresenta-se para análise apenas os resultados das estimações com efeitos fixos.

Para checar problemas de simultaneidade, verificou-se a correlação dos termos de erro aleatório de todas as regressões com as variáveis dependentes, constatando-se que algumas variáveis poderiam ser endógenas. Por esse motivo, as estimações foram novamente realizadas por mínimos quadrados em dois estágios com efeitos fixos e matriz SUR. A exceção foi o subsetor MB, no qual não se verificou correlação do termo erro com a variável dependente, motivo pelo qual os modelos foram estimados por MQO. Estimaram-se dois modelos para os seis subsetores econômicos já descritos: um com cada variável dependente (EC e EM).

Cabe melhor detalhamento em relação à variável taxa de juros, instrumento de política monetária pelo regime de metas de inflação que vigora no Brasil. Taylor (1995Taylor, J. B. (1995). The monetary transmission mechanism: An empirical framework. Journal of Economic Perspectives 9(1), 11-26.) define como mecanismo de transmissão monetária o processo pelo qual as decisões de política monetária são transmitidas para a economia real. Tomazzia e Meurer (2009Tomazzia, E. C., & Meurer, R. (2009). O mecanismo de transmissão da política monetária no Brasil: uma análise em VAR por setor industrial. Economia Aplicada, 13(4), 371-398.) avaliaram o mecanismo de transmissão da política monetária no Brasil por setores, identificando que o efeito máximo da reação do subsetor de bens de consumo não duráveis ocorria entre o oitavo e o nono mês após alterações na Selic. Já nos subsetores de bens de consumo duráveis, bens de capital e bens intermediários, o efeito máximo se deu entre quatro e dez meses, em seis meses e entre seis e nove meses, respectivamente. Esses achados corroboram a afirmação da autoridade monetária brasileira, que afirma que os efeitos da política monetária são defasados (Banco Central do Brasil [BC], 2016Banco Central do Brasil (Central Bank of Brazil). (2016). Notice 1/2016−BCB. Open Letter that addresses the single paragraph of art. 4 of Decree n. 3,088, of June 21st of 1999. Retrieved from https://www.bcb.gov.br/htms/relinf/carta2016.pdf
https://www.bcb.gov.br/htms/relinf/carta...
).

Diante desses estudos, ainda em outro contexto, o da estrutura de capital, caso os testes inicialmente sem defasagem não encontrassem significância estatística da variável taxa de juros, realizaram-se estimações com até quatro períodos defasados, sendo que os melhores resultados foram encontrados com defasagem de três períodos (nove meses) nas regressões com a variável dependente EC (subsetores de materiais básicos e de telecomunicações e utilidades públicas) e EM (subsetores de bens industriais, saúde, materiais básicos de telecomunicações e utilidades públicas).

4.3. Resultados Empíricos

A Tabela 6 apresenta os resultados obtidos a partir da estimação de subsetores utilizando efeitos fixos. Verifica-se que a significância global de todos os modelos foi comprovada pela estatística F ao nível de 1%. A significância estatística do coeficiente angular na maioria das regressões demonstra que podem existir variáveis relevantes para o comportamento da estrutura de capital distintas das investigadas neste estudo.

Tabela 6.
Resultados das estimações - Subsetores

Inicialmente, considerando-se o nível de 5% de significância, nota-se que as variáveis explanatórias tiveram maior influência para o EM do que para o contábil. A possível explicação seria de que o primeiro é mais suscetível a oscilações externas por captar as expectativas de crescimento ou redução, enquanto o segundo reflete os ativos já pertencentes à empresa (Barclay, Smith & Morellec, 2006Barclay, M. J., Smith, C. W., & Morellec, E. (2006). On the debt capacity of growth options. The Journal of Business, 79(1), 37-60.). O percentual de variáveis significantes para as duas mensurações de endividamento foi superior para o grupo de fatores específicos, quando comparados com os fatores macroeconômicos. Os resultados são condizentes com os de Kayo e Kimura (2011Kayo, E. K., & Kimura, H. (2011). Hierarchical determinants of capital structure. Journal of Banking & Finance, 35(2), 358-371.) e Bernardo, Albanez e Securato (2018Bernardo, C. J., Albanez, T., & Securato, J. R. (2018). Macroeconomic and institutional factors, debt composition and capital structure of Latin American companies. Brazilian Business Review, 15(2), 152-174.), que sugerem maior relevância dos aspectos característicos das empresas devido à sua dinamicidade e volatilidade, considerando que índices econômicos tendem a ser mais estáveis e duradouros e podem não impactar de imediato no nível ótimo de alavancagem.

Dentre os indicadores macroeconômicos, a recessão foi a variável mais significante para a estrutura de capital setorial, enquanto a inflação foi a com menor relevância. Sobre os indicadores específicos, a rentabilidade foi significante para todos os subsetores e mensurações de endividamento, mas crescimento e liquidez tiveram o menor número de coeficientes significantes.

O PIB foi significante para o endividamento a valor de mercado do subsetor de materiais básicos e para os dois endividamentos do subsetor de bens industriais. Para ambos, o coeficiente foi negativo, indicando preferência do uso de recursos internos como forma de financiamento devido ao crescimento desses ante a expansão econômica, o que é sustentado pela POT.

Tal resultado era esperado sob o ponto de vista do comportamento cíclico desses dois subsetores, juntamente com o de consumo cíclico, que não se confirmou. Nota-se que, para os subsetores não cíclicos, a não significância do PIB era esperada, o que foi confirmado, haja vista que se trata de empresas cujo desempenho é pouco influenciado por variações macroeconômicas, o que se reflete nas suas decisões de financiamento. De forma geral, os resultados vão de encontro aos de Terra (2007Terra, P. R. S. (2007). Estrutura de capital e fatores macroeconômicos na América Latina. Revista de Administração, 42(2), 192-204.), havendo poucas evidências do poder explicativo dessa variável na oscilação dos níveis de endividamento dos setores.

A taxa de juros foi significante para os subsetores de bens industriais, materiais básicos, saúde e telecomunicações e utilidades públicas, assumindo coeficientes negativos, também convergindo com a POT. Pela teoria, os juros interferem negativamente, considerando-se que as empresas atingem mais rapidamente sua capacidade de endividamento.

À luz da teoria econômica sobre a elasticidade-renda da demanda, observa-se que os resultados estatisticamente significantes corroboram o esperado para os subsetores cíclicos (bens industriais e materiais básicos), que têm relação negativa com o aumento das taxas de juros, e para o subsetor de consumo não cíclico, para o qual esperava-se que não houvesse influência das taxas de juros no endividamento. A não significância da relação da taxa de juros com o endividamento também era esperada para os subsetores de saúde, telecomunicações e utilidades públicas, o que não foi possível constatar nos resultados. Possível explicação pode estar relacionada ao fato de que muitos subsetores, cuja demanda é inelástica, têm tarifa ou receita regulada, o que garante a estabilidade de seus fluxos de caixa, mesmo em condições adversas da economia. Isso pode garantir que, em momento de alta de juros, tais empresas consigam reduzir seu endividamento. De fato, a carta do Instituto de Economia Aplicada (IPEA, 2015Instituto de Pesquisa Economia Aplicada (Applied Economic Research Institute). (2015). Carta de Conjuntura n. 29. Retrieved from http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=26918&Itemid=3
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?...
) demonstra que, mesmo com a crise instalada no país, as atividades dos setores de eletricidade e gás, água, esgoto e limpeza urbana avançaram 1,1% em 2015, comprovando a relativa insensibilidade macroeconômica desses subsetores.

Outra explicação sobre o comportamento da estrutura de capital ante a taxas de juros pode ser dada pela teoria keynesiana, em que o aumento da taxa de juros adotado pela política monetária é utilizado com o propósito de conter a inflação, reduzindo o capital em circulação e, consequentemente, elevando seu custo de captação.

A variável inflação mostrou pouco poder explicativo do nível de endividamento, diferentemente do esperado, haja vista que, considerando-se a relação entre consumo e inflação, era de se inferir que empresas pertencentes aos subsetores diretamente relacionados ao consumo seriam afetadas. Terra (2007Terra, P. R. S. (2007). Estrutura de capital e fatores macroeconômicos na América Latina. Revista de Administração, 42(2), 192-204.) explica que grande parte dos contratos de dívidas é atrelada a um índice de preços, de forma que a inflação pouco interfere nas diretrizes da alavancagem. Com relação aos subsetores, a inflação foi significante apenas para o de saúde, com o coeficiente negativo, novamente corroborando a POT e a teoria econômica, pois, considerando-se que os bens de saúde apresentam baixa elasticidade da demanda, as empresas tendem a se beneficiar da alta dos preços.

O câmbio não foi significante apenas para o endividamento a valor contábil dos subsetores de bens industriais, de telecomunicações e endividamento a valor de mercado do setor de consumo cíclico. Diferentemente do esperado, majoritariamente a relação foi positiva, o que não condiz com nenhuma das teorias apresentadas. Esse efeito pode ser explicado pela desvalorização do real ante o dólar, o que incentiva a entrada de capital estrangeiro no mercado interno. Entretanto, essa análise é limitada ao considerar que a composição da amostra não levou em consideração a diferenciação das empresas financiadas por capital estrangeiro. Além disso, no que se refere aos subsetores cíclicos, o fato de a variável ser significante para os segmentos de bens industriais e materiais básicos, mas não para o subsetor de consumo cíclico, pode ser reflexo de alguma diferenciação da influência das exportações, tanto na receita e fluxo de caixa quanto no endividamento em moeda estrangeira dos dois primeiros subsetores em relação ao terceiro, dado que, nesse caso, haveria proteção cambial fornecida pela compatibilidade de fluxos em uma mesma moeda. Já os setores não cíclicos, cuja relação positiva do câmbio com o endividamento não era esperada, possível motivação pode estar relacionada a importações de equipamentos, acesso a linhas de financiamento em moeda estrangeira ou, ainda, alguma parte de seu custo atrelado à moeda estrangeira, pois esses subsetores são aparentemente mais dedicados a atender ao consumo interno (saúde e indústrias de rede).

O desempenho do mercado de ações foi significante para o endividamento a valor de mercado dos subsetores de bens industriais, materiais básicos, consumo cíclico, consumo não cíclico e saúde, assim como para o endividamento a valor contábil de consumo cíclico e materiais básicos. Os coeficientes também foram majoritariamente positivos, diferentemente do previsto pelo market timing. Os resultados corroboram os de Gajurel (2006Gajurel, D. (2006). Macroeconomic influences on corporate capital structure. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=899049.
https://ssrn.com/abstract=899049...
) e Dincergok e Yalciner (2011Dincergok, B., & Yalciner, K. (2011). Capital structure decisions of manufacturing firms’ in developing countries. Middle Eastern Finance and Economics, 12(7), 86-100.), em que a teoria do market timing não se aplica para países emergentes, de forma que esses aumentam seu endividamento ante a períodos favoráveis no mercado financeiro. Apenas para o subsetor de consumo cíclico, a relação encontrada foi negativa.

Com relação à teoria econômica sobre a elasticidade-renda da demanda, percebe-se que a intensidade da relação com o Ibovespa é diferenciada entre os três subsetores cíclicos. Possivelmente, a resposta está relacionada à participação das exportações nas receitas e à dependência ao mercado interno. De fato, o IPEA (2015Instituto de Pesquisa Economia Aplicada (Applied Economic Research Institute). (2015). Carta de Conjuntura n. 29. Retrieved from http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=26918&Itemid=3
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?...
) mencionou que durante a crise interna o crescimento das exportações líquidas amorteceu os impactos da retração doméstica no PIB, já que a desaceleração de rendimentos das famílias provocou forte queda na demanda por bens de consumo duráveis. Em contrapartida, ainda segundo o IPEA (2015Instituto de Pesquisa Economia Aplicada (Applied Economic Research Institute). (2015). Carta de Conjuntura n. 29. Retrieved from http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=26918&Itemid=3
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?...
), somente ao final de 2015 o setor de mineração (materiais básicos) recuou sua atividade pela primeira vez, embora a recessão tenha se instalado no país desde abril de 2014. Ainda assim, os preços dos produtos dessas empresas por vezes são cotados em dólares, como no caso das commodities. Portanto, considera-se que o desempenho das exportações pode explicar a diferenciação dos resultados dos subsetores cíclicos. Com relação aos não cíclicos, os resultados esperados para o de telecomunicações e utilidades públicas foram confirmados (relação não significante), mas isso não ocorreu para saúde e consumo não cíclico, que apresentaram relação positiva.

Por fim, verificou-se o efeito da recessão na alavancagem dos subsetores. A variável não foi significante apenas para o endividamento a valor contábil de bens industriais, consumo cíclico e saúde. Para os dois primeiros, considerando serem subsetores do setor de consumo cíclico, esperava-se que a recessão fosse relevante para o nível de alavancagem. Para os coeficientes significantes, os valores foram positivos, convergindo com os de Gertler e Gilchrist (1993Gertler, M., & Gilchrist, S. (1993). The role of credit market imperfections in the monetary transmission mechanism: Arguments and evidence. The Scandinavian Journal of Economics, 95(1), 43-64.) e Frank e Goyal (2009Frank, M. Z., & Goyal, V. K. (2009). Capital structure decisions: Which factors are reliably important?Financial Management, 38(1), 1-37.). Para esses autores, o aumento do endividamento em períodos de recessão é explicado pela redução de capital interno, consequência das contrações monetárias que levam à necessidade de captação de recursos externos. Pela POT, acrescenta-se, ainda, o aumento dos custos de falência. Entretanto, a variável recessão não foi capaz de diferenciar os setores em cíclicos e não cíclicos em relação ao endividamento, pois foi a única que teve efeito positivo para todos os subsetores. Para os setores não cíclicos, esperava-se que não fosse significante, o que não ocorreu. A hipótese é que, apesar da inelasticidade-renda da sua demanda, outros itens de seu balanço ou resultado foram afetados pela recessão, como os custos e os ativos, entre outros. Ademais, relembre-se o diagnóstico da FGV (2017Fundação Getúlio Vargas. (2017). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/C1/F8/E8/A18F66108DDC4E66CA18B7A8/Comite%20de%20Data__o%20de%20Ciclos%20Econ_micos%20-%20Comunicado%20de%2030_10_2017%20_1_.pdf
https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/...
) sobre a recessão abordada neste estudo: foi uma das mais longas desde o início da série, com perda acumulada de 8,6% de PIB em 11 trimestres. Sua intensidade pode explicar a relevância para a estrutura de capital de todos os subsetores.

No que tange às variáveis específicas, o crescimento esperado foi significante para os subsetores de consumo não cíclico, materiais básicos, bens industriais e telecomunicações e utilidades públicas, em que os sinais obtidos para esses subsetores foram majoritariamente negativos. A liquidez foi significante para todos os subsetores, prevalecendo a relação positiva, o que contradiz a POT, tendo em vista que liquidez corrente reflete a folga do disponível, havendo preferência do uso de recursos internos para financiamento de projetos. A rentabilidade foi a variável de maior relevância na determinação do endividamento, sendo significativa para todos os subsetores, com relação negativa, convergindo com a POT, indicando que empresas de maior lucro têm menos dívidas. O tamanho também foi significante para todos os subsetores, retornando, porém, relações heterogêneas. Os valores foram positivos para bens industriais, consumo cíclico e consumo não cíclico, convergindo com a POT, e negativos para materiais básicos e saúde, o que condiz com a TOT, que considera que empresas maiores têm facilidade de acesso a recursos de terceiros. Por fim, a tangibilidade se mostrou relevante apenas para bens industriais, consumo cíclico, saúde e telecomunicações e utilidades públicas. Os coeficientes foram negativos, convergindo com a POT.

Em resumo, os resultados entre os subsetores foram relativamente homogêneos, havendo pouca divergência entre os sinais dos coeficientes econômicos entre os subsetores para cada variável macroeconômica. A POT predominou para três das seis variáveis, mostrando um indicativo de preferência de uso de capital interno para os setores do mercado brasileiro, corroborando os estudos de Medeiros e Daher (2008Medeiros, O. R. D., & Daher, C. E. (2008). Testing alternative theories on the capital structure of Brazilian firms. Revista de Administração Contemporânea, 12(1), 177-199.), Bastos et al. (2009Bastos, D. D., Nakamura, W. T., & Basso, L. F. C. (2009). Determinantes da estrutura de capital das companhias abertas na América Latina: um estudo empírico considerando fatores macroeconômicos e institucionais. Revista de Administração Mackenzie, 10(6), 47-77.), Bernardo et al. (2009) e Martins e Terra (2014Martins, H. C., & Terra, P. R. S. (2014). Determinantes nacionais e setoriais da estrutura de capital na América Latina. Revista de Administração Contemporânea, 18(5), 577-597.). Ainda que, de forma geral, as variáveis macroeconômicas tenham mostrado importância, as variáveis específicas demonstraram maior poder explicativo para a determinação do nível de endividamento.

Quando comparados os subsetores, o nível de alavancagem de materiais básicos pertencentes ao setor de consumos cíclico mostrou maior dependência das variáveis econômicas, enquanto o de telecomunicações e utilidades públicas, pertencente ao setor de consumo não cíclico, o menor. Isso talvez possa ser explicado, em parte, pelo fato de os subsetores de saúde, telecomunicações e utilidades públicas, conforme descrito anteriormente, terem empresas com demanda inelástica, serem monopólio natural (indústrias de redes, com barreiras à entrada e necessidade volumosa de capital para investimento de novos entrantes) e terem preços, receita ou atividade regulada. Essas características parecem funcionar como blindagem desses setores às variações macroeconômicas, diferentemente do setor de materiais básicos, por exemplo.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo teve como objetivo analisar a influência da recessão e das variáveis macroeconômicas sobre a estrutura de capital das empresas com ações negociadas na B3. Para isso, utilizou-se a regressão linear múltipla e a análise de dados de painel. As empresas da amostra foram divididas em seis subsetores, adotando a classificação da B3. O nível de endividamento das empresas, em termos contábeis e a mercado, foi utilizado como variável dependente do estudo.

Primeiramente, corroborando estudos anteriores, verificou-se que fatores intrínsecos das empresas têm maior poder explicativo na composição de capital do que variáveis macroeconômicas. Dentre as variáveis específicas, a rentabilidade foi a que demonstrou maior influência, sendo significante para todos os subsetores e para todas as mensurações de endividamento. O segundo aspecto observado foi que o endividamento a valor de mercado mostrou-se mais dependente das oscilações das variáveis do estudo do que o endividamento a valor contábil, o que também condiz com estudos anteriores, haja vista que o primeiro é precificado pela expectativa do mercado.

Com relação às variáveis macroeconômicas, os resultados demonstram que, considerando-se os coeficientes significantes, para as variáveis PIB, taxa de juros e recessão, o sinal dos parâmetros convergiu conforme previsto pela POT. A inflação mostrou baixo poder explanatório, sendo significante apenas para o subsetor saúde. O câmbio foi a segunda variável com maior número de coeficientes significantes, apresentando, porém, relação positiva com o endividamento, diferentemente do esperado. O retorno do Ibovespa apresentou coeficientes majoritariamente positivos, indo contra a teoria do market timing, indicando que parte dos recursos levantados pelo mercado é utilizada para captar recursos de terceiros. Dentre os setores econômicos, o de materiais básicos foi aquele com maior número de variáveis significantes, enquanto o de telecomunicações e utilidades públicas mostraram-se menos dependentes. De forma geral, as variáveis macroeconômicas apresentaram efeito homogêneo no nível de endividamento das empresas, uma vez que, dentre os coeficientes significantes, a variação do sinal foi pequena dentre os setores. Além disso, o contexto de recessão mostrou-se relevante na determinação do endividamento de todos subsetores econômicos pesquisados, com influência positiva.

O artigo apresenta duas limitações: a primeira por não considerar os prazos das dívidas, de forma que os resultados encontrados poderiam ser divergentes caso os endividamentos fossem segregados em curto e em longo prazos; a segunda, advinda da variável câmbio, uma vez que também não foram segregadas as empresas que usam recursos estrangeiros e as que não usam. Dessa forma, o resultado pode ser visto sob o uso do câmbio como uma proxy risco-país.

Como proposta de investigação futura, sugere-se a replicação da análise setorial do endividamento para outros países emergentes, objetivando identificar se empresas pertencentes a um mesmo nicho econômico tendem a seguir o mesmo padrão. A partir dos resultados, também é possível comparar a resposta, entre países com distintos níveis de desenvolvimento econômico, do nível de endividamento ante a crises econômicas. Dessa forma, verificam-se as diferenças entre a vulnerabilidade de empresas de um mesmo setor, mas pertencentes a países distintos.

REFERENCES

  • Allayannis, G., Brown, G. W., & Klapper, L. F. (2003). Capital structure and financial risk: Evidence from foreign debt use in East Asia. The Journal of Finance, 58(6), 2667-2710.
  • Alti, A. (2006). How persistent is the impact of market timing on capital structure?The Journal of Finance , 61(4), 1681-1710.
  • Baker, M., & Wurgler, J. (2002). Market timing and capital structure. The Journal of Finance , 57(1), 1-32.
  • Balios, D., Daskalakis, N., Eriotis, N., & Vasiliou, D. (2016). SMEs capital structure determinants during severe economic crisis: The case of Greece. Cogent Economics & Finance, 4(1), 1-11.
  • Banco Central do Brasil (Central Bank of Brazil). (2016). Notice 1/2016−BCB. Open Letter that addresses the single paragraph of art. 4 of Decree n. 3,088, of June 21st of 1999. Retrieved from https://www.bcb.gov.br/htms/relinf/carta2016.pdf
    » https://www.bcb.gov.br/htms/relinf/carta2016.pdf
  • Barclay, M. J., Smith, C. W., & Morellec, E. (2006). On the debt capacity of growth options. The Journal of Business, 79(1), 37-60.
  • Bastos, D. D., & Nakamura, W. T. (2009). Determinantes da estrutura de capital das companhias abertas no Brasil, México e Chile no período 2001-2006. Revista Contabilidade & Finanças, 20(50), 75-94.
  • Bastos, D. D., Nakamura, W. T., & Basso, L. F. C. (2009). Determinantes da estrutura de capital das companhias abertas na América Latina: um estudo empírico considerando fatores macroeconômicos e institucionais. Revista de Administração Mackenzie, 10(6), 47-77.
  • Bernardo, C. J., Albanez, T., & Securato, J. R. (2018). Macroeconomic and institutional factors, debt composition and capital structure of Latin American companies. Brazilian Business Review, 15(2), 152-174.
  • Chen, H. (2010). Macroeconomic conditions and the puzzles of credit spreads and capital structure. The Journal of Finance , 65(6), 2171-2212.
  • Comissão de Valores Mobiliários (Brazilian capital market regulator).(2007). CVM Instruction 457, of July 13th of 2007. Describes the elaboration and disclosure of consolidated financial statements, based on the international accounting standard issued by the International Accounting Standards Board (IASB). Retrieved from http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/legislacao/instrucoes/anexos/400/inst457consolid.pdf
    » http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/legislacao/instrucoes/anexos/400/inst457consolid.pdf
  • Cook, D. O., & Tang, T. (2010). Macroeconomic conditions and capital structure adjustment speed. Journal of Corporate Finance, 16(1), 73-87.
  • Dincergok, B., & Yalciner, K. (2011). Capital structure decisions of manufacturing firms’ in developing countries. Middle Eastern Finance and Economics, 12(7), 86-100.
  • Erel, I., Julio, B., Kim, W., & Weisbach, M. S. (2011). Macroeconomic conditions and capital raising. The Review of Financial Studies, 25(2), 341-376.
  • Fama, E. F., & French, K. R. (2002). Testing trade-off and pecking order predictions about dividends and debt. The Review of Financial Studies , 15(1), 1-33.
  • Fan, J. P., Titman, S., & Twite, G. (2012). An international comparison of capital structure and debt maturity choices. Journal of Financial and Quantitative Analysis, 47(1), 23-56.
  • Frank, M. Z., & Goyal, V. K. (2003). Capital structure decisions [Working Paper]. Social Science Electronic Publishing.
  • Frank, M. Z., & Goyal, V. K. (2007). Tradeoff and pecking order theories of debt. In B. E. Eckbo. (Org.). Handbook of Empirical Corporate Finance(Vol. 2). (pp. 135-202). Oxford: Elsevier.
  • Frank, M. Z., & Goyal, V. K. (2009). Capital structure decisions: Which factors are reliably important?Financial Management, 38(1), 1-37.
  • Fundação Getúlio Vargas. (2015). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/12/17/48/F4/978FE410F9AC5BD45C28C7A8/Comite%20de%20Datacao%20de%20Ciclos%20Economicos%20-%20Comunicado%20de%204_8_2015.pdf
    » https://portalibre.fgv.br/data/files/12/17/48/F4/978FE410F9AC5BD45C28C7A8/Comite%20de%20Datacao%20de%20Ciclos%20Economicos%20-%20Comunicado%20de%204_8_2015.pdf
  • Fundação Getúlio Vargas. (2017). Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace). Retrieved from https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/C1/F8/E8/A18F66108DDC4E66CA18B7A8/Comite%20de%20Data__o%20de%20Ciclos%20Econ_micos%20-%20Comunicado%20de%2030_10_2017%20_1_.pdf
    » https://portalibre.fgv.br/data/files/F3/C1/F8/E8/A18F66108DDC4E66CA18B7A8/Comite%20de%20Data__o%20de%20Ciclos%20Econ_micos%20-%20Comunicado%20de%2030_10_2017%20_1_.pdf
  • Gajurel, D. (2006). Macroeconomic influences on corporate capital structure. Retrieved from https://ssrn.com/abstract=899049
    » https://ssrn.com/abstract=899049
  • Galí, J. (2015). Monetary policy, inflation, and the business cycle: An introduction to the new Keynesian framework and its applications. Princeton, NJ: Princeton University Press.
  • Gertler, M., & Gilchrist, S. (1993). The role of credit market imperfections in the monetary transmission mechanism: Arguments and evidence. The Scandinavian Journal of Economics, 95(1), 43-64.
  • Gertler, M., & Kiyotaki, N. (2010). Financial intermediation and credit policy in business cycle analysis. In B. M. Friedman & M., Woodford (Org.), Handbook of monetary economics (Vol. 3) (pp. 547-599). Oxford: Elsevier .
  • Gujarati, D. N., & Porter, D. C. (2011). Econometria básica (5th ed.) Porto Alegre, RS: AMGH.
  • Gungoraydinoglu, A., & Öztekin, Ö. (2011). Firm-and country-level determinants of corporate leverage: Some new international evidence. Journal of Corporate Finance , 17(5), 1457-1474.
  • Hackbarth, D., Hennessy, C. A., & Leland, H. E. (2007). Can the trade-off theory explain debt structure? TheReview of Financial Studies , 20(5), 1389-1428.
  • Hackbarth, D., Miao, J., & Morellec, E. (2006). Capital structure, credit risk, and macroeconomic conditions. Journal of Financial Economics, 82(3), 519-550.
  • Harris, M., & Raviv, A. (1991). The theory of capital structure. The Journal of Finance , 46(1), 297-355.
  • Harrison, B., & Widjaja, T. W. (2014). The determinants of capital structure: Comparison between before and after financial crisis. Economic Issues, 19(2), 55-82.
  • Huang, R., & Ritter, J. R. (2009). Testing theories of capital structure and estimating the speed of adjustment. Journal of Financial and Quantitative Analysis , 44(2), 237-271.
  • Instituto de Pesquisa Economia Aplicada (Applied Economic Research Institute). (2015). Carta de Conjuntura n. 29. Retrieved from http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=26918&Itemid=3
    » http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=26918&Itemid=3
  • Iqbal, A., & Kume, O. (2015). Impact of financial crisis on firms’ capital structure in UK, France, and Germany. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2472669
    » https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2472669
  • Kayo, E. K., & Kimura, H. (2011). Hierarchical determinants of capital structure. Journal of Banking & Finance, 35(2), 358-371.
  • Korajczyk, R. A., & Levy, A. (2003). Capital structure choice: Macroeconomic conditions and financial constraints. Journal of Financial Economics , 68(1), 75-109.
  • Lemmon, M. L., Roberts, M. R., & Zender, J. F. (2008). Back to the beginning: Persistence and the cross‐section of corporate capital structure. The Journal of Finance , 63(4), 1575-1608.
  • Levy, A., & Hennessy, C. (2007). Why does capital structure choice vary with macroeconomic conditions? Journal of Monetary Economics, 54(6), 1545-1564.
  • López-Garcia, J., & Sogorb-Mira, F. (2008). Testing trade-off and pecking order theories financing SMEs. Small Business Economics, 31(2):117-136.
  • Mahajan, A., & Tartaroglu, S. (2008). Equity market timing and capital structure: International evidence. Journal of Banking & Finance , 32(5), 754-766.
  • Martins, H. C., & Terra, P. R. S. (2014). Determinantes nacionais e setoriais da estrutura de capital na América Latina. Revista de Administração Contemporânea, 18(5), 577-597.
  • Medeiros, O. R. D., & Daher, C. E. (2008). Testing alternative theories on the capital structure of Brazilian firms. Revista de Administração Contemporânea, 12(1), 177-199.
  • Modigliani, F., & Miller, M. H. (1958). The cost of capital, corporation finance, and the theory of investment. The American Economic Review, 48(3), 261-297.
  • Modigliani, F., & Miller, M. H. (1963). Corporate income taxes and the cost of capital: A correction. The American Economic Review , 53(3), 433-443.
  • Myers, S. C. (1984). The capital structure puzzle. The Journal of Finance , 39(3), 574-592.
  • Myers, S. C. (2003). Financing of corporations. In G. M. Constantinides, M. Harris & R. M. Stulz (Orgs.), Handbook of the economics of finance (Vol. 1) (pp. 215-253). Oxford: Elsevier .
  • Myers, S. C., & Majluf, N. S. (1984). Corporate financing and investment decisions when firms have information that investors do not have. Journal of Financial Economics , 13(2), 187-221.
  • Nakamura, W., Martin, D., Forte, D., Carvalho, A., Costa, A., & Amaral, A. (2007). Determinantes de estrutura de capital no mercado brasileiro: análise de regressão com painel de dados no período 1999-2003. Revista Contabilidade & Finanças , 18(44), 72-85.
  • Pearce II, J. A., & Michael, S. C. (2006). Strategies to prevent economic recessions from causing business failure. Business Horizons, 49(3), 201-209.
  • Pindyck, R., & Rubinfeld, D. (2014). Microeconomics GE. Camberwell: Pearson Australia Pty.
  • Staking, K. B., & Babbel, D. F. (1995). The relation between capital structure, interest rate sensitivity, and market value in the property-liability insurance industry. Journal of Risk and Insurance, 62(4), 690-718.
  • Stiglitz, J. (2018). The theory of credit and macroeconomic stability. In A. G. Dastidar, F. Malhotra & V. Suneja (Eds.), Economic theory and policy amidst global discontent (pp. 145-201). New Delhi: Routledge.
  • Taylor, J. B. (1995). The monetary transmission mechanism: An empirical framework. Journal of Economic Perspectives 9(1), 11-26.
  • Terra, P. R. S. (2007). Estrutura de capital e fatores macroeconômicos na América Latina. Revista de Administração, 42(2), 192-204.
  • Tomazzia, E. C., & Meurer, R. (2009). O mecanismo de transmissão da política monetária no Brasil: uma análise em VAR por setor industrial. Economia Aplicada, 13(4), 371-398.
  • Tong, G., & Green, C. J. (2005). Pecking order or trade-off hypothesis? Evidence on the capital structure of Chinese companies. Applied Economics, 37(19), 2179-2189.
  • Tsoy, L., & Heshmati, A. (2017). Impact of financial crises on dynamics of capital structure: Evidence from Korean listed companies. Retrieved from https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2923637
    » https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2923637
  • Vithessonthia, C., & Tongurai, J. 2015. The effect of firm size on the leverage - Performance relationship during the financial crisis of 2007-2009. Journal of Multinational Financial Management, 29(1), 1-29.
  • Zeitun, R., Temimi, A., & Mimouni, K. (2017). Do financial crises alter the dynamics of corporate capital structure? Evidence from GCC countries. The Quarterly Review of Economics and Finance, 63(1), 21-33.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Jan 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    27 Nov 2018
  • Revisado
    28 Jan 2019
  • Aceito
    09 Set 2019
Universidade de São Paulo, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Departamento de Contabilidade e Atuária Av. Prof. Luciano Gualberto, 908 - prédio 3 - sala 118, 05508 - 010 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: (55 11) 2648-6320, Tel.: (55 11) 2648-6321, Fax: (55 11) 3813-0120 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: recont@usp.br