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Explorando a interdependência entre gainsharing e avaliação de desempenho em uma cooperativa de crédito* * Artigo apresentado no XIII Congresso da Anpcont, São Paulo, SP, Brasil, junho de 2016. ,** ** Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo apoio financeiro na realização desta pesquisa. Adicionalmente, os autores agradecem aos pareceristas pelas contribuições recebidas.

RESUMO

Este estudo tem o objetivo de investigar a interdependência entre o gainsharing e a avaliação de desempenho (objetiva e subjetiva) em uma cooperativa de crédito. Há um debate recente sobre a interdependência entre as práticas de controle gerencial, o qual emerge da discussão de pacotes ou sistemas de controle. Este estudo aprofunda-se nesta discussão ao investigar a complementariedade entre gainsharing (modalidade de incentivos em grupo) e a avaliação de desempenho em um contexto de cooperativa de crédito, tendo em vista a necessidade de estudos empíricos qualitativos sobre esse fenômeno. Este estudo é considerado relevante pois o uso conjunto de práticas de controle gerencial pode permitir às organizações mitigar de forma mais efetiva os problemas de controle, como a falta de direção, motivação e competência. Esta pesquisa promove insights sobre o funcionamento das práticas de controle gerencial - tendo em vista a discussão da complementariedade entre gainsharing, que não é um sistema de incentivos predominante na maior parte das organizações - bem como sobre a avaliação objetiva e subjetiva de desempenho. A metodologia consiste em um estudo de campo qualitativo em uma cooperativa de crédito utilizando, como coleta de dados, a realização de entrevistas e o acesso a documentos, que foram analisados a partir de abordagem interpretativista. Esta pesquisa apresenta evidências sobre o fenômeno da interdependência entre as práticas de controle gerencial, agregando a literatura ao abordar diferentes formas de complementariedade entre um sistema de incentivos em grupo na modalidade de gainsharing e a avaliação de desempenho. Evidenciou-se que o gainsharing reforça o processo de avaliação objetiva de desempenho ao mitigar os problemas de motivação e direção, enquanto a avaliação subjetiva de desempenho compensa a avaliação objetiva de desempenho ao deslocar o foco da avaliação para as competências do indivíduo.

Palavras-chave:
práticas de controle gerencial; complementariedade; gainsharing; avaliação de desempenho; cooperativa de crédito

ABSTRACT

This study aims to investigate the interdependence between gainsharing and performance evaluation (objective and subjective) in a credit union. There is a recent debate on the interdependence between management control practices, which emerges from the discussion of control packages or systems. This study delves into this discussion by investigating the complementarity between gainsharing (group incentive modality) and performance evaluation in a credit union context, given the need for qualitative empirical studies on this phenomenon. This study is considered relevant because the joint use of management control practices can allow organizations to effectively mitigate control problems such as lack of direction, motivation, and competence. This research promotes insights into management control practices’ operation - given the discussion of complementarity between gainsharing, which is not a prevalent incentive system in most organizations - and objective and subjective performance evaluation. The methodology consists of a qualitative field study in a credit union using data collection, interviews, and access to documents analyzed using an interpretive approach. This research presents evidence on the phenomenon of interdependence between management control practices, adding to the literature by addressing different forms of complementarity between a group incentive system in the form of gainsharing and performance evaluation. It became evident that gainsharing reinforces the objective performance evaluation process by mitigating motivation and direction problems, while the subjective performance evaluation compensates the objective performance evaluation by shifting the focus of the evaluation to the individual's skills.

Keywords:
management control practices; complementarity; gainsharing; performance evaluation; credit union

1 INTRODUÇÃO

Nos últimos anos tem ocorrido um debate crescente a respeito da conceituação e do tratamento das práticas de controle gerencial sob a lógica de pacote ou de sistemas (Grabner & Moers, 2013Grabner, I., & Moers, F. (2013). Management control as a system or a package? Conceptual and empirical issues. Accounting, Organizations and Society, 38(6-7), 407-419.; Malmi & Brown, 2008Malmi, T., & Brown, D. A. (2008). Management control systems as a package: opportunities, challenges and research directions. Management Accounting Research, 19(4), 287-300.; Merchant & Otley, 2020Merchant, K. A., & Otley, D. (2020). Beyond the systems versus package debate. Accounting, Organizations and Society, 86, 101185.). Segundo Grabner e Moers (2013), as práticas de controle gerencial formam um sistema quando são interdependentes entre si. A interdependência “implica que o valor de uma prática de controle gerencial depende do uso de outra prática de controle gerencial, e vice-versa” (Grabner & Moers, 2013, p. 408). Choi (2020Choi, J. W. (2020). Studying “and”: a perspective on studying the interdependence between management control practices. Accounting, Organizations and Society, 86, 101188.) sugere, a partir do modelo de força dinâmica, que a interdependência consiste na interação entre as práticas de controle gerencial, no sentido de que uma prática influencia a direção e a magnitude do benefício desempenhado por outra prática de controle gerencial. Bedford (2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.) pondera acerca da magnitude dos efeitos de interdependência entre as práticas, bem como sobre a conexão delas dentro de um pacote.

Decorrente do conceito de interdependência, surge a noção de complementariedade e de substituição entre as práticas de controle gerencial. A complementariedade define como aumentam os benefícios do uso de uma prática com o uso de outra de controle gerencial (Grabner & Moers, 2013Grabner, I., & Moers, F. (2013). Management control as a system or a package? Conceptual and empirical issues. Accounting, Organizations and Society, 38(6-7), 407-419.). Recentemente, Bedford (2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.) relatou a existência de três formas de gerar os efeitos de complementariedade, uma vez que uma prática de controle gerencial: (i) compensa as limitações de outra prática (ii), reforça a efetividade de outra prática e (iii) habilita e cria as condições para outra prática a fim de que se mitiguem problemas de controle, como a falta de direção quanto aos objetivos, a falta de motivação e as limitações dos indivíduos (Merchant & Van der Stede, 2014Merchant, K. A., & Van der Stede, W. A. (2014). Management control systems: performance measurement, evaluation and incentives. London, United Kingdom: Pearson Education.).

Apoiados nessa discussão, Friis, Hansen e Vámosi (2015Friis, I., Hansen, A., & Vámosi, T. (2015). On the effectiveness of incentive pay: exploring complementarities and substitution between management control system elements in a manufacturing firm. European Accounting Review, 24(2), 241-276.) investigaram a relação de complementariedade e de substituição de práticas de controle gerencial a partir do contexto de mudança de um sistema de incentivos. De acordo com Friis et al. (2015), há dois grupos de estudos que discutem essa temática: o primeiro trata sobre a relação de interdependência entre duas práticas (por exemplo a inter-relação entre o sistema de incentivos e outra prática de controle gerencial) e o segundo trata da inter-relação do sistema de incentivos com uma série de práticas dentro do sistema de controle gerencial (Friis et al., 2015). Demartini e Otley (2020Demartini, M. C., & Otley, D. (2020). Beyond the system vs. package dualism in performance management systems design: a loose coupling approach. Accounting, Organizations and Society, 86, 101072.), por sua vez, discutiram a complementariedade dos diferentes mecanismos de controle a partir de díades de práticas de controle gerencial, como a avaliação de desempenho, orçamento e uso de medidas não financeiras e seus efeitos sobre a efetividade dos controles e a inovação de processos, a partir da abordagem do loose-coupling (dualidade entre eficiência e flexibilidade). Ademais, há outros estudos que discutem conceitualmente a interdependência e a complementariedade das práticas de controle gerencial (Bedford, 2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.; Choi, 2020Choi, J. W. (2020). Studying “and”: a perspective on studying the interdependence between management control practices. Accounting, Organizations and Society, 86, 101188.), que lançaram luz sobre aspectos que podem ser investigados por futuros estudos empíricos (Merchant & Otley, 2020Merchant, K. A., & Otley, D. (2020). Beyond the systems versus package debate. Accounting, Organizations and Society, 86, 101185.).

Considerando a necessidade de mais evidências empíricas qualitativas para investigar o fenômeno da interdependência, em particular da complementaridade e dos seus efeitos nas organizações (Merchant & Otley, 2020Merchant, K. A., & Otley, D. (2020). Beyond the systems versus package debate. Accounting, Organizations and Society, 86, 101185.), este artigo pretende discutir a seguinte questão de pesquisa: de que maneira a interdependência das práticas de avaliação de desempenho e de sistema de recompensas se desdobram em uma cooperativa de crédito?

As práticas investigadas abrangem dois dos três componentes que Brickley, Smith e Zimmerman (2015Brickley, J., Smith, C., & Zimmerman, J. (2015). Managerial economics and organizational architecture. New York, NY: McGraw-Hill Education.) consideram a arquitetura organizacional, quais sejam: a avaliação de desempenho (objetiva e subjetiva) e o sistema de incentivos. As organizações adotam mecanismos de monitoramento como avaliação objetiva e subjetiva de desempenho, bem como o sistema de recompensas individuais e coletivas, financeiras e não financeiras, que têm o intuito de influenciar a tomada de decisões (He et al., 2020He, W., Li, S. L., Feng, J., Zhang, G., & StuHe, W., Li, S. L., Feng, J., Zhang, G., & Sturman, M. C. (2020). When does pay for performance motivate employee helping behavior? The contextual influence of performance subjectivity. Academy of Management Journal, (in press).). Além do papel de influenciar comportamentos, o sistema de recompensas, por meio do foco da atenção e da melhoria do conhecimento, é capaz de facilitar as decisões e as escolhas que afetam o desempenho da organização.

Uma gama de estudos trata das perspectivas e das recompensas individuais. No entanto, alguns autores ponderam que há diversas oportunidades de estudo, comparativamente, com foco no papel dos sistemas de recompensas em grupo (Nyberg, Maltarich, Abdulsalam, Essman, & Cragun, 2018Nyberg, A. J., Maltarich, M. A., Abdulsalam, D. D., Essman, S. M., & Cragun, O. (2018). Collective pay for performance: a cross-disciplinary review and meta-analysis. Journal of Management, 44(6), 2433-2472.; Pizzini, 2010Pizzini, M. (2010). Group‐based compensation in professional service firms: an empirical analysis of medical group practices. The Accounting Review, 85(1), 343-380.). O sistema de recompensas financeiras variáveis em grupo é o Plano de Participação nos Resultados (PPR) ou gainsharing (tratados como sinônimos neste artigo), que se insere nessa classificação por ser considerado um mecanismo de remuneração coletivo que interliga o pagamento por resultados baseados na mensuração de desempenho em grupo (Gerhart, Rynes, & Fulmer, 2009Gerhart, B., Rynes, S. L., & Fulmer, I. S. (2009). 6 pay and performance: individuals, groups, and executives. Academy of Management Annals, 3(1), 251-315.; Nyberg, et al., 2018).

O objetivo desta pesquisa é investigar a interdependência entre o gainsharing e a avaliação de desempenho (objetiva e subjetiva) em uma cooperativa de crédito, considerando as particularidades de seu contexto. Assim, este estudo busca atender à chamada proposta por Merchant e Otley (2020Merchant, K. A., & Otley, D. (2020). Beyond the systems versus package debate. Accounting, Organizations and Society, 86, 101185.) para realização de estudos qualitativos sobre o fenômeno da interdependência entre as práticas de controle gerencial e suas implicações para as organizações, o que ocorre nesta pesquisa por meio de um estudo de caso qualitativo em uma cooperativa de crédito. Com isso, o pano de fundo do artigo indica que a interdependência entre as práticas de gainsharing e a avaliação objetiva e subjetiva de desempenho pode se desdobrar de diferentes formas (Bedford, 2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.) permitindo compreender de que forma a complementariedade entre as práticas de controle gerencial tornam-no mais efetivo em mitigar problemas com motivação, direção e competência nas organizações (Merchant & Van der Stede, 2014).

Portanto, este estudo contribui com a literatura de contabilidade gerencial no sentido de aprofundar a discussão sobre a interdependência e, particularmente, sobre a complementariedade entre as práticas de controle gerencial, debate recente na área (Bedford, 2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.; Choi, 2020Choi, J. W. (2020). Studying “and”: a perspective on studying the interdependence between management control practices. Accounting, Organizations and Society, 86, 101188.; Demartini & Otley, 2020Demartini, M. C., & Otley, D. (2020). Beyond the system vs. package dualism in performance management systems design: a loose coupling approach. Accounting, Organizations and Society, 86, 101072.; Grabner & Moers, 2013Grabner, I., & Moers, F. (2013). Management control as a system or a package? Conceptual and empirical issues. Accounting, Organizations and Society, 38(6-7), 407-419.; Merchant & Otley, 2020Merchant, K. A., & Otley, D. (2020). Beyond the systems versus package debate. Accounting, Organizations and Society, 86, 101185.), a fim de apresentar evidências sobre outras práticas de controle, como gainsharing e avaliação objetiva e subjetiva de desempenho, pouco abordadas por estudos anteriores.

Do ponto de vista prático, este estudo se insere no contexto das cooperativas de crédito, que são norteadas por princípios sociais e coletivos (Jovanović, Arnold, & Voigt, 2017Jovanović, T., Arnold, C., & Voigt, K. I. (2017). Cooperative banks in need of transition: the influence of Basel III on the business model of German cooperative credit institutions. Journal of Co-operative Organization and Management, 5(1), 39-47.) e, ao mesmo tempo, são instituições que pertencem ao setor bancário, que utiliza mecanismos para atuar no monitoramento das atividades e auxiliar na tomada de decisão (Jovanović et al., 2017). Este estudo também promove insights a respeito de como as práticas de controle gerencial funcionam em uma cooperativa de crédito, considerando o sistema de incentivos na modalidade de gainsharing que é o principal incentivo financeiro utilizado pela cooperativa.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Pacote e Sistema: Discussão sobre as Práticas de Controle Gerencial

A discussão a respeito das práticas de controle gerencial como um pacote é relativamente recente na literatura de contabilidade gerencial, tópico abordado com mais profundidade inicialmente por Malmi e Brown (2008Malmi, T., & Brown, D. A. (2008). Management control systems as a package: opportunities, challenges and research directions. Management Accounting Research, 19(4), 287-300.). Como caracterizam os autores, o conceito de pacote aponta para uma coleção de práticas que não devem ser definidas como um único sistema (Malmi & Brown, 2008), uma vez que são práticas independentes que abordam problemas de controle que não estejam relacionados (Grabner & Moers, 2013Grabner, I., & Moers, F. (2013). Management control as a system or a package? Conceptual and empirical issues. Accounting, Organizations and Society, 38(6-7), 407-419.).

Particularmente, Grabner e Moers (2013Grabner, I., & Moers, F. (2013). Management control as a system or a package? Conceptual and empirical issues. Accounting, Organizations and Society, 38(6-7), 407-419., p. 408) argumentam que o pacote “representa o conjunto completo de práticas de controle em ação, independentemente de as práticas de controle gerencial serem interdependentes e/ou as escolhas de design levarem em consideração as interdependências”. Malmi e Brown (2008Malmi, T., & Brown, D. A. (2008). Management control systems as a package: opportunities, challenges and research directions. Management Accounting Research, 19(4), 287-300.), a partir da visão de pacote, segregam as práticas do Sistema de Controle Gerencial (SCG) em cinco dimensões de controle: planejamento, controles cibernéticos, sistema de recompensa e incentivos, além de controles administrativos e culturais. Para avançar essa reflexão, Grabner e Moers (2013) propõem que as práticas de controle gerencial possam ser utilizadas de forma interdependente e, portanto, sugerem a ideia da complementariedade para entender a interdependência entre as práticas de controle gerencial.

Nesse sentido, os autores discutem que as práticas podem ser percebidas como sistemas “internamente consistentes” de dois tipos: complementos e substitutos. Segundo Grabner e Moers (2013Grabner, I., & Moers, F. (2013). Management control as a system or a package? Conceptual and empirical issues. Accounting, Organizations and Society, 38(6-7), 407-419., p. 408), “a interdependência implica que o valor de uma prática de controle gerencial depende do uso de outra prática de controle gerencial e vice-versa”, e a complementariedade é caracterizada quando o valor de uma prática aumenta a partir do uso de outra. Outros estudos empíricos foram desenvolvidos sob a perspectiva das interdependências entre as práticas de controle gerencial (Bedford, Malmi, & Sandelin, 2016Bedford, D. S., Malmi, T., & Sandelin, M. (2016). Management control effectiveness and strategy: An empirical analysis of packages and systems. Accounting, Organizations and Society, 51, 12-28.; Demartini & Otley, 2020Demartini, M. C., & Otley, D. (2020). Beyond the system vs. package dualism in performance management systems design: a loose coupling approach. Accounting, Organizations and Society, 86, 101072.; Friis et al., 2015Friis, I., Hansen, A., & Vámosi, T. (2015). On the effectiveness of incentive pay: exploring complementarities and substitution between management control system elements in a manufacturing firm. European Accounting Review, 24(2), 241-276.). Friis et al. (2015) discutem acerca da implementação de um novo sistema de incentivos apresentando relacionamentos complementares e substitutos em uma empresa de manufatura. Argumentam que a complementariedade das práticas de controle gerencial aumenta a eficácia do controle gerencial e mencionam a complementariedade quando um mecanismo de controle aumenta o retorno de outro mecanismo.

Recentemente, Demartini e Otley (2020Demartini, M. C., & Otley, D. (2020). Beyond the system vs. package dualism in performance management systems design: a loose coupling approach. Accounting, Organizations and Society, 86, 101072.) ponderaram sobre a relevância da definição das práticas de controle gerencial dentro da ótica de pacote ou de sistema. Defenderam um olhar mais integrador no sentido de tratar essa discussão não como um dualismo, mas como um espectro com dois extremos: um totalmente descoordenado e outro perfeitamente integrado, considerando a abordagem teórica denominada loose-coupling. Nesse contexto, os autores discutem a complementariedade dos diferentes mecanismos de controle - a avaliação de desempenho, o orçamento e o uso de medidas não financeiras - considerando o tipo e o grau de suas interações. Por conseguinte, analisam o impacto dessa complementariedade sobre a efetividade e inovação (construtos organizacionais) (Demartini & Otley, 2020).

Choi (2020Choi, J. W. (2020). Studying “and”: a perspective on studying the interdependence between management control practices. Accounting, Organizations and Society, 86, 101188.) considera a interdependência entre as práticas de controle gerencial como o relacionamento entre as práticas em que dada situação de uma prática de controle gerencial pode alterar o direcionamento e/ou a intensidade do papel que é desempenhado por outra prática de controle gerencial. Além disso, Choi (2020) trata a interdependência a partir da lente da força dinâmica, segundo a qual a complementariedade representa a força determinante que uma prática de controle gerencial D pode elevar a magnitude da força exercida pela prática C e, posteriormente, a complementariedade surge como uma noção de causa positiva, em que a força para ser desempenhada pela prática C necessita da presença da prática D (Choi, 2020).

Bedford (2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.) elenca três elementos que geram os efeitos de complementariedade das práticas de controle gerencial: compensatório, de reforço e habilitante. Os efeitos compensatórios ocorrem quando tal prática absorve as fraquezas ou barreiras de outra prática de controle. Já os efeitos de reforço ocorrem quando uma prática de controle gerencial eleva a eficácia de outra prática de controle. Por fim, os efeitos habilitantes são decorrentes de uma prática de controle gerencial que proporciona as condições para outra prática ajudar a solucionar problemas de controle (Bedford, 2020). Além desses três, os autores destacam três formas causais para compreender a substituição (inibidora, exacerbadora e instigante) e quatro formas acerca da independência entre as práticas de controle gerencial (suplementar, conflitante, redundante e intercambiável).

É nessa discussão que este estudo se insere ao analisar a interdependência a partir da perspectiva de complementariedade tratada por Bedford (2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.), com foco em identificar como esse elemento ocorre diante das práticas do sistema de recompensas em grupo (PPR-gainsharing), da avaliação objetiva de desempenho e da avaliação subjetiva de desempenho. Esse recorte, quanto às práticas de controle gerencial, reflete o contexto da organização em que essas práticas existem e são percebidas como relevantes para o processo de gestão. Além do mais, as práticas estão alinhadas com dois elementos principais da arquitetura organizacional (Brickley et al., 2015Brickley, J., Smith, C., & Zimmerman, J. (2015). Managerial economics and organizational architecture. New York, NY: McGraw-Hill Education.) que foram investigados pela literatura em contabilidade gerencial (Demartini & Otley, 2020Demartini, M. C., & Otley, D. (2020). Beyond the system vs. package dualism in performance management systems design: a loose coupling approach. Accounting, Organizations and Society, 86, 101072.). Nesse sentido, para Friis et al. (2015Friis, I., Hansen, A., & Vámosi, T. (2015). On the effectiveness of incentive pay: exploring complementarities and substitution between management control system elements in a manufacturing firm. European Accounting Review, 24(2), 241-276.) há a lacuna de estudos que discutam empiricamente a complementariedade entre as práticas mencionadas.

2.2 Gainsharing

Como uma das modalidades de sistemas de recompensas financeiras, o Plano de Participação nos Resultados (PPR), ou gainsharing, é considerado um mecanismo que integra o desempenho e as recompensas às metas e objetivos organizacionais, além de ser capaz de incentivar que as ações em grupo dos colaboradores alcancem o desempenho desejado (Gomez-Mejia, Welbourne & Wiseman, 2000Gomez-Mejia, L. R., Welbourne, T. M., & Wiseman, R. M. (2000). The role of risk sharing and risk taking under gainsharing. Academy of Management Review, 25(3), 492-507.; Zondo, 2018Zondo, R. W. (2018). The impact of gainsharing in the automotive parts manufacturing industry of South Africa. South African Journal of Economic and Management Sciences, 21(1), 1-8.). Com isso, a ênfase do gainsharing se concentra mais nos objetivos em equipe do que nos resultados individuais (Masternak & Ross, 1992Masternak, R. L., & Ross, T. L. (1992). Gainsharing: a bonus plan or employee involvement? Compensation & Benefits Review, 24(1), 46-54.).

Entre suas vantagens, o gainsharing pode ser personalizado conforme os diversos tipos de objetivos da organização, como satisfazer o cliente e atingir metas financeiras (Gerhart, Rynes & Fulmer, 2009Gerhart, B., Rynes, S. L., & Fulmer, I. S. (2009). 6 pay and performance: individuals, groups, and executives. Academy of Management Annals, 3(1), 251-315.). Além disso, as metas tendem a ser objetivas e baseadas em informações históricas, tornando-se mais claras e aceitáveis para o colaborador (Case, 1998Case, J. (1998). The open-book experience: Lessons from over 100 companies who successfully transformed themselves. Basic Books.). Ressalta-se, também, a capacidade do gainsharing de delinear a cultura de uma organização e elevar o relacionamento e o repasse de conhecimento (Masternak & Ross, 1992Masternak, R. L., & Ross, T. L. (1992). Gainsharing: a bonus plan or employee involvement? Compensation & Benefits Review, 24(1), 46-54.; Arthur & Kim, 2005Arthur, J. B., & Kim, D. O. (2005). Gainsharing and knowledge sharing: the effects of labour-management co-operation. The International Journal of Human Resource Management, 16(9), 1564-1582.) estimulando as sugestões de aperfeiçoamento e de novas ideias por parte dos colaboradores (Arthur & Kim, 2005).

Outro fator relevante sobre a diferença entre o gainsharing e os demais sistemas de recompensas em grupo é a participação nos resultados a partir de medidas não financeiras (Gerhart et al., 2009Gerhart, B., Rynes, S. L., & Fulmer, I. S. (2009). 6 pay and performance: individuals, groups, and executives. Academy of Management Annals, 3(1), 251-315.; Nyberg et al., 2018Nyberg, A. J., Maltarich, M. A., Abdulsalam, D. D., Essman, S. M., & Cragun, O. (2018). Collective pay for performance: a cross-disciplinary review and meta-analysis. Journal of Management, 44(6), 2433-2472.). Além disso, o gainsharing geralmente envolve os colaboradores na elaboração de planos (Arthur & Kim, 2005Arthur, J. B., & Kim, D. O. (2005). Gainsharing and knowledge sharing: the effects of labour-management co-operation. The International Journal of Human Resource Management, 16(9), 1564-1582.) como forma de influenciar suas ações. Como resultante desse efeito, as recompensas em grupo tendem a estimular os colaboradores a auxiliar no progresso dos objetivos e no monitoramento entre os pares (Welbourne & Gomez-Mejia, 1995Welbourne, T. M., & Gomez-Mejia, L. R. 1995. Gainsharing: A critical review and a future research agenda. Journal of Management, 21(3), 559-609.).

Por conseguinte, o gainsharing tende a ser definido para um ambiente temporal de curto prazo, com o intuito de tornar a prática mais aderente às metas de desempenho (Aguiar, Teixeira, Nossa, & Gonzaga, 2012Aguiar, A. B. D., Teixeira, A. J. C., Nossa, V., & Gonzaga, R. P. (2012). Associação entre sistema de incentivos gerenciais e práticas de contabilidade gerencial. Revista de Administração de Empresas, 52(1), 40-54.). Ademais, ele se diferencia do plano de participação nos lucros pela capacidade de mensurar o desempenho do grupo ou do setor organizacional, além de a frequência dos pagamentos poder ser maior (Kgoedi & Pillay, 2018Kgoedi, T., & Pillay, A. S. (2018). The impact of compensation on the performance of employees at a bank in Mpumalanga. Journal of Management & Administration, 2018(2), 135-162.).

Desse modo, as organizações optam por recompensas em grupo, como o gainsharing, visando impulsionar os benefícios da cooperação entre membros de um grupo (Nyberg et al., 2018Nyberg, A. J., Maltarich, M. A., Abdulsalam, D. D., Essman, S. M., & Cragun, O. (2018). Collective pay for performance: a cross-disciplinary review and meta-analysis. Journal of Management, 44(6), 2433-2472.; Pizzini, 2010Pizzini, M. (2010). Group‐based compensation in professional service firms: an empirical analysis of medical group practices. The Accounting Review, 85(1), 343-380.). Além disso, Pizzini (2010) considera que os determinantes da recompensa em grupo podem estar ligados à interdependência entre tarefas, monitoramento mútuo dos membros da empresa e tamanho da organização. Nesse contexto, como contribuição empírica, Zondo (2018Zondo, R. W. (2018). The impact of gainsharing in the automotive parts manufacturing industry of South Africa. South African Journal of Economic and Management Sciences, 21(1), 1-8.) ressalta que o gainsharing se torna eficaz quando alinhado ao processo de avaliação de desempenho.

Por conseguinte, Doucouliagos, Laroche, Kruse e Stanley (2020Doucouliagos, H., Laroche, P., Kruse, D. L., & Stanley, T. D. (2020). Is profit sharing productive? A meta‐regression analysis. British Journal of Industrial Relations, 58(2), 364-395.), ao realizarem uma meta-análise, identificaram um efeito positivo do gainsharing sobre o desempenho. Porém, esse efeito ocorreu com mais intensidade em organizações cooperativas em economias de países emergentes. Dessa forma, as organizações que têm como propósito elevar a motivação e o engajamento dos colaboradores, bem como alinhar os comportamentos aos objetivos organizacionais, têm na implementação do gainsharing uma alternativa para alcançar esse objetivo (Zondo, 2018Zondo, R. W. (2018). The impact of gainsharing in the automotive parts manufacturing industry of South Africa. South African Journal of Economic and Management Sciences, 21(1), 1-8.). Dentro da lógica de sistema de controle, o sistema de recompensas, como o gainsharing, tende a proporcionar maior uso de outras práticas de controle gerencial, como a avaliação de desempenho.

2.3 Avaliação de Desempenho

A avaliação de desempenho visa monitorar, acompanhar, comparar e facilitar que os objetivos sejam alcançados, além de permitir que a implementação das estratégias possa ocorrer a partir de mecanismos formais e informais (Ferreira & Otley, 2009Ferreira, A., & Otley, D. (2009). The design and use of performance management systems: an extended framework for analysis. Management Accounting Research, 20(4), 263-282.; Groen; Wouters, & Wilderom, 2017Groen, B. A., Wouters, M. J., & Wilderom, C. P. M. (2017). Employee participation, performance metrics, and job performance: a survey study based on self-determination theory. Management Accounting Research, 36, 51-66.; Malmi & Brown, 2008Malmi, T., & Brown, D. A. (2008). Management control systems as a package: opportunities, challenges and research directions. Management Accounting Research, 19(4), 287-300.). De acordo com a literatura, a avaliação de desempenho pode ser entendida em duas vertentes: objetiva e subjetiva. Segundo Woods (2012Woods, A. (2012). Subjective adjustments to objective performance measures: the influence of prior performance. Accounting, Organizations and Society, 37(6), 403-425., p. 403), “a medida objetiva existe como uma quantidade em e por si mesma; em contraste, as medições subjetivas são baseadas em atitudes, crenças e percepções”. Sendo assim, a avaliação objetiva de desempenho é aquela que independe da pessoa que a está realizando; já a segunda vertente (subjetiva) envolve certo nível de discricionariedade e julgamento no processo de avaliação (Beuren, Von Eggert, & Santos, 2020Beuren, I. M., Von Eggert, N. S., & Santos, E. A. (2020). Influência da avaliação de desempenho formal e seus mecanismos na confiança interpessoal entre gestores: justiça processual e qualidade do feedback percebidos. Organizações & Sociedade, 27(92), 113-131.; Moers, 2005Moers, F. (2005). Discretion and bias in performance evaluation: the impact of diversity and subjectivity. Accounting, Organizations and Society, 30(1), 67-80.).

A avaliação objetiva de desempenho também é conhecida como uma avaliação formal, podendo focalizar a mensuração e o acompanhamento do desempenho dos indivíduos, das equipes ou da organização como um todo (Ittner, Larcker, & Meyer, 2003Ittner, C. D., Larcker, D. F., & Meyer, M. W. (2003). Subjectivity and the weighting of performance measures: Evidence from a balanced scorecard. The Accounting Review, 78(3), 725-758.; Moers, 2005Moers, F. (2005). Discretion and bias in performance evaluation: the impact of diversity and subjectivity. Accounting, Organizations and Society, 30(1), 67-80.). Ressalta-se que essa avaliação está atrelada às metas orçamentárias e/ou aos indicadores de desempenho estabelecidos na organização, podendo ou não estar relacionada ao sistema de recompensa (Groen et al., 2017Groen, B. A., Wouters, M. J., & Wilderom, C. P. M. (2017). Employee participation, performance metrics, and job performance: a survey study based on self-determination theory. Management Accounting Research, 36, 51-66.). Na visão de Hartmann e Slapničar (2012Hartmann, F., & Slapničar, S. (2012). The perceived fairness of performance evaluation: the role of uncertainty. Management Accounting Research, 23(1), 17-33.), a avaliação objetiva de desempenho está associada às métricas financeiras, baseando-se nos dados apresentados ao final de determinado período em uma organização.

Se por um lado o uso de medidas objetivas para avaliação do desempenho permite alta formalização do processo e certa “objetividade” ao tirar o efeito de quem realiza a avaliação, por outro essa prática também é vista como rígida e limitada (Lau & Moser, 2008Lau, C. M., & Moser, A. (2008). Behavioral effect of nonfinancial performance measures: the role of procedural fairness. Behavioral Research in Accounting, 20(1), 55-71.), indicando incompletude (Bol, 2008Bol, J. C. (2008). Subjectivity in compensation contracting. Journal of Accounting Literature, 27, 1-32.; Bol & Smith, 2011).

A literatura tem fornecido indícios de que a avaliação de desempenho baseada apenas nesses indicadores pode ser insuficiente por não contemplar, por exemplo, as características e as competências dos funcionários (Bol & Smith, 2011Bol, J. C., & Smith, S. D. (2011). Spillover effects in subjective performance evaluation: Bias and the asymmetric influence of controllability. The Accounting Review, 86(4), 1213-1230.; Kunz; 2015Kunz, J. (2015). Objectivity and subjectivity in performance evaluation and autonomous motivation: an exploratory study. Management Accounting Research, 27, 27-46.). Segundo aponta a literatura, as limitações da avaliação objetiva de desempenho podem, inclusive, impactar o resultado da organização, por causa da insatisfação dos colaboradores quanto à efetividade do sistema de avaliação (Groen et al., 2017Groen, B. A., Wouters, M. J., & Wilderom, C. P. M. (2017). Employee participation, performance metrics, and job performance: a survey study based on self-determination theory. Management Accounting Research, 36, 51-66.; Jordan & Messner, 2012Jordan, S., & Messner, M. (2012). Enabling control and the problem of incomplete performance indicators. Accounting, Organizations and Society, 37(8), 544-564.).

No intuito de entender os efeitos comportamentais e psicológicos envolvidos no processo de avaliação e de recompensa nas organizações, a literatura da área tem avançado a discussão mobilizando também a perspectiva da avaliação subjetiva de desempenho (Bol & Smith, 2011Bol, J. C., & Smith, S. D. (2011). Spillover effects in subjective performance evaluation: Bias and the asymmetric influence of controllability. The Accounting Review, 86(4), 1213-1230.; Kunz, 2015Kunz, J. (2015). Objectivity and subjectivity in performance evaluation and autonomous motivation: an exploratory study. Management Accounting Research, 27, 27-46.; Moers, 2005Moers, F. (2005). Discretion and bias in performance evaluation: the impact of diversity and subjectivity. Accounting, Organizations and Society, 30(1), 67-80.). Como já visto, esta perspectiva envolve o julgamento pessoal dos gestores quanto aos subordinados, observando medidas de desempenho qualitativas (Moers, 2005). Em específico, Gibbs et al. (2004Gibbs, M., Merchant, K. A., Stede, W. A. V. D., & Vargus, M. E. (2004). Determinants and effects of subjectivity in incentives. The Accounting Review, 79(2), 409-436.) destacam que a avaliação subjetiva de desempenho pode envolver: (i) o uso de medidas subjetivas de desempenho; (ii) a flexibilidade na atribuição de peso (ex post) na avaliação objetiva de desempenho; e/ou (iii) a permissão para ajustes discricionários ex post com base em fatores diferentes da medida de desempenho especificada ex ante.

O desempenho dos colaboradores de uma organização, muitas vezes, é influenciado pelos incentivos financeiros. Desse modo, a combinação de medidas objetivas e subjetivas de desempenho tende a facilitar o controle da avaliação de desempenho, pois o foco apenas nas medidas objetivas de desempenho pode não ser a melhor solução para a recompensa. Entretanto, o uso das medidas subjetivas também pode levar os avaliadores ao viés da avaliação, sobretudo quando essas avaliações estão associadas às promoções na organização.

Desse modo, uma alternativa para obter resultados melhores e manter o equilíbrio na organização quanto à avaliação de desempenho é utilizar medidas objetivas e subjetivas de desempenho, observando os resultados dos funcionários e suas habilidades e competências (Bol & Smith, 2011Bol, J. C., & Smith, S. D. (2011). Spillover effects in subjective performance evaluation: Bias and the asymmetric influence of controllability. The Accounting Review, 86(4), 1213-1230.; Jordan & Messner, 2012Jordan, S., & Messner, M. (2012). Enabling control and the problem of incomplete performance indicators. Accounting, Organizations and Society, 37(8), 544-564.).

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A metodologia da pesquisa caracteriza-se como um estudo de caso, por meio do qual é possível se aprofundar sobre o contexto, o que permite investigar ambientes organizacionais específicos (Ahrens & Chapman, 2006Ahrens, T., & Chapman, C. S. (2006). Doing qualitative field research in management accounting: Positioning data to contribute to theory. In C. S. Chapman, A. G. Hopwood, & M. D. Shields (Ed.), Handbooks of management accounting research (Vol. 1, pp. 299-318). Amsterdam, Holanda: Elsevier.). A pesquisa segue a abordagem interpretativista, cujo fundamento é a compreensão dos significados por meio das pessoas que vivenciam os fenômenos investigados (Chua, 1986Chua, W. F. (1986). Radical developments in accounting thought. Accounting Review, 61(4), 601-632.; Crotty, 1998Crotty, M. (1998). The foundations of social research: meaning and perspective in the research process. Thousand Oaks, CA: Sage.).

Para a seleção do caso observaram-se organizações com mecanismos de controle gerencial estruturado, como planejamento, uso de medidas de desempenho e sistema de recompensas (Ferreira & Otley, 2009Ferreira, A., & Otley, D. (2009). The design and use of performance management systems: an extended framework for analysis. Management Accounting Research, 20(4), 263-282.). Nesse caso, a cooperativa selecionada atende aos requisitos quanto à estrutura, diversidade e complexidade das operações, bem como quanto ao uso de mecanismos de controle gerencial (Chenhall & Langfield-Smith, 2003Chenhall, R. H., & Langfield-Smith, K. (2003). Performance measurement and reward systems, trust, and strategic change. Journal of Management Accounting Research, 15(1), 117-143.).

Os procedimentos utilizados para coleta de dados foram entrevistas semiestruturadas e análises de documentos. Inicialmente, após a definição do objeto do estudo, os pesquisadores realizaram contato direto via telefone e e-mail com o diretor administrativo da cooperativa, a fim de averiguar o interesse da organização na realização de pesquisas acadêmicas.

O primeiro contato permitiu conhecer um documento em que se disponibiliza a Política de Governança Corporativa, tornando possível identificar princípios das diretrizes que regem a cooperativa do estudo, sua administração e o controle. A formalização da pesquisa com a cooperativa objeto de estudo ocorreu em 2018, por meio da entrega da carta de apresentação e do protocolo ético da pesquisa ao diretor administrativo. Antes da aplicação, os pesquisadores estruturaram o roteiro das entrevistas para compreender as práticas de controle gerencial da cooperativa, o que envolvia por exemplo: (i) a estruturação da cooperativa (Chenhall & Langfield-Smith, 2003Chenhall, R. H., & Langfield-Smith, K. (2003). Performance measurement and reward systems, trust, and strategic change. Journal of Management Accounting Research, 15(1), 117-143.); (ii) a definição de metas/objetivos (Ferreira & Otley, 2009Ferreira, A., & Otley, D. (2009). The design and use of performance management systems: an extended framework for analysis. Management Accounting Research, 20(4), 263-282.); (iii) a avaliação objetiva e subjetiva de desempenho (Van Veen-Dirks, 2010Van Veen-Dirks, P. (2010). Different uses of performance measures: the evaluation versus reward of production managers. Accounting, Organizations and Society, 35(2), 141-164.); (iv) o sistema de recompensas (Nyberg et al., 2018Nyberg, A. J., Maltarich, M. A., Abdulsalam, D. D., Essman, S. M., & Cragun, O. (2018). Collective pay for performance: a cross-disciplinary review and meta-analysis. Journal of Management, 44(6), 2433-2472.; Van Veen-Dirks, 2010); e (v) o uso das medidas de desempenho (Ferreira & Otley, 2009; Grafton, Lillis, & Widener 2010Grafton, J., Lillis, A. M., & Widener, S. K. (2010). The role of performance measurement and evaluation in building organizational capabilities and performance. Accounting, Organizations and Society, 35(7), 689-706.). A Tabela 1 apresenta exemplos das perguntas para cada construto.

Tabela 1
Exemplos de perguntas aos entrevistados

Vale ressaltar que, aderente à abordagem qualitativa, este estudo envolveu o processo abduction (Dubois & Gadde, 2002Dubois, A., & Gadde, L. E. (2002). Systematic combining: an abductive approach to case research. Journal of Business Research, 55(7), 553-560., Lukka, 2014Lukka, K. (2014). Exploring the possibilities for causal explanation in interpretive research. Accounting, Organizations and Society, 39(7), 559-566.), no qual ocorre: (i) a identificação de uma discussão a nível teórico (etic) (uso de medidas de desempenho e uso de sistema de recompensa - gainsharing); (ii) seguida da identificação no campo quanto aos entendimentos dos indivíduos (emic) sobre o uso destas práticas; e, por fim, (iii) a interação entre a perspectiva etic e emic, reformulando ou focando a questão de pesquisa do estudo a partir do aprofundamento do fenômeno investigado, gerando novos insights. Deste modo, ressalta-se o processo “back and forth” entre o campo e a teoria (Dubois & Gadde, 2002; Timmermans & Tavory, 2012Timmermans, S., & Tavory, I. (2012). Theory construction in qualitative research from grounded theory to abductive analysis. Sociological Theory, 30(3), 167-186.).

Adicionalmente, foram disponibilizados e discutidos individualmente com cada entrevistado o termo de consentimento para gravação, a transcrição das entrevistas e o protocolo de ética da pesquisa. Em específico, o protocolo ético estabelecia o anonimato dos respondentes, quanto às entrevistas, e a possibilidade de gravação, com a permissão do entrevistado. De modo geral, continha as informações sobre a pesquisa, os procedimentos de coleta e o tratamento dos dados.

Por questões de acesso e com o objetivo de entrevistar pessoas que atuassem no dia a dia da cooperativa, realizaram-se sete entrevistas: as seis primeiras ocorreram em 2018 e a sétima em 2020 para coletar informações adicionais. Procurou-se entrevistar pessoas que atuassem nas principais áreas de interesse do estudo. Desse modo, foram entrevistados o diretor administrativo, o diretor executivo, um responsável pela gerência regional e mais quatro responsáveis pelos cargos de coordenadores, entre os quais dois coordenadores da sede administrativa e dois de postos de atendimento. As entrevistas semiestruturadas (Tabela 2) foram conduzidas por duas pesquisadoras e ocorreram nas dependências da cooperativa.

Tabela 2
Caracterização dos entrevistados

Após a realização das entrevistas os pesquisadores transcreveram-nas. Os dados transcritos resultaram em 79 páginas de registros. Posteriormente, os pesquisadores realizaram a leitura e a discussão em conjunto das evidências levantadas por meio das entrevistas e dos documentos reunidos ao longo da pesquisa de campo, a exemplo de organograma, manuais e relatórios, como o Planejamento Estratégico e a Cartilha de Avaliação de Desempenho.

4 ANÁLISE DOS RESULTADOS

4.1 Contextualização da Cooperativa: Estrutura e Mecanismos

Conforme observado nas entrevistas e nos documentos internos disponibilizados pela cooperativa, a organização estudada conta com uma estrutura dividida, com cargos, hierarquias e funções formalmente definidas. Dentre os órgãos que compõem a estrutura de governança da cooperativa, pode-se destacar a Assembleia dos Cooperados, o Conselho de Administração, o Conselho Fiscal e a Diretoria Executiva.

O Conselho de Administração é formado por sete membros que, além de outras atribuições, são responsáveis por eleger uma diretoria executiva. A diretoria é formada por três membros: um coordenador da diretoria, um diretor administrativo e um diretor operacional. Os diretores coordenam as atividades de treze gerentes, entre os quais dez são denominados gerentes regionais, cuja responsabilidade é coordenar um grupo de postos de atendimento, em consonância com as diretrizes estratégicas da cooperativa (cartilha que trata das competências). Os outros três gerentes atuam no apoio aos gerentes regionais, divididos entre: gerência de crédito, gestão de pessoas e organização do quadro social.

Os gerentes regionais fazem a ponte entre as expectativas determinadas pela diretoria executiva e os gerentes dos postos de atendimento, designados na cooperativa como coordenadores. Os coordenadores atuam como gestores das equipes que trabalham em cada posto de atendimento, com a responsabilidade de definir os planos de ação (Cartilha de Competências). Subordinados hierarquicamente a esses coordenadores estão os analistas, auxiliares e os estagiários.

A cooperativa adota mecanismos para gestão dos resultados de curto, médio e longo prazo, que estão alinhados à perspectiva do sistema de avaliação de desempenho (Ferreira & Otley, 2009Ferreira, A., & Otley, D. (2009). The design and use of performance management systems: an extended framework for analysis. Management Accounting Research, 20(4), 263-282.). Ela desenvolve o planejamento estratégico de três em três anos, a partir do qual estabelece os objetivos estratégicos a serem alcançados, bem como as estratégias a serem implementadas. Conforme ilustrado pela Cartilha do Planejamento Estratégico (2018-2020), o processo é desenvolvido de maneira lúdica para os colaboradores, contemplando doze diretrizes estratégicas que são desdobradas em planos táticos e operacionais, com um total de 118 propósitos para cumprimento do planejamento estratégico.

Na visão de Frezatti (2009Frezatti, F. (2009). Orçamento empresarial: planejamento e controle gerencial. São Paulo, SP: Atlas.), o planejamento estratégico é desdobrado para o horizonte de um ano, por meio do orçamento, cuja função é determinar as metas operacionais e financeiras. Dentre os objetivos globais desdobrados na organização, o Diretor 2 pontua a ampliação do número de cooperados, o aumento do volume de recursos administrados e o aumento do volume de concessão de crédito, além da identificação de oportunidades de negócios com os cooperados. A partir desse processo de definição do plano, estabelecem-se os objetivos, os indicadores e as metas que balizam o plano de participação nos resultados (PPR), artefato que será explorado na próxima subseção.

4.2 Sistemas de Incentivos da Cooperativa (PPR)

A cooperativa implementa, há mais de 20 anos, um sistema de recompensas em grupo, por meio de metas de desempenho, denominado na literatura internacional como gainsharing (Nyberg et al., 2018Nyberg, A. J., Maltarich, M. A., Abdulsalam, D. D., Essman, S. M., & Cragun, O. (2018). Collective pay for performance: a cross-disciplinary review and meta-analysis. Journal of Management, 44(6), 2433-2472.), ou na nacional como Plano de Participação nos Resultados (PPR). Como uma das prioridades da cooperativa é o espírito coletivo, o PPR é para todos, desde o estagiário à diretoria (Masternak & Ross, 1992Masternak, R. L., & Ross, T. L. (1992). Gainsharing: a bonus plan or employee involvement? Compensation & Benefits Review, 24(1), 46-54.). Esse atributo é ilustrado pelo Diretor 2, ou seja, por ser uma cooperativa “a gente preza muito pelo trabalho coletivo, pelo trabalho de equipe, por um trabalho de apoio entre as equipes, e não por competição entre os colaboradores”.

Esse sistema de incentivos é desenhado a partir de indicadores de desempenho decorrentes do planejamento estratégico. Com base nesse sistema, os colaboradores são recompensados duas vezes ao ano, ou seja, semestralmente, uma vez que essa lógica permite à diretoria a possibilidade de revisar os indicadores de desempenho, bem como os percentuais de alcance das respectivas metas, ajustando o sistema de incentivos em face das circunstâncias internas e externas.

Para a composição do PPR são apontados aproximadamente 40 indicadores de desempenho que fazem parte do planejamento estratégico. A partir desse portfólio de indicadores, a diretoria executiva define de 4 a 7 indicadores de desempenho para fazerem parte do sistema de incentivos em grupo, por exemplo: taxa de crescimento no número de cooperados, inadimplência, crescimento do volume de ativos, índice de eficiência operacional.

Além disso, conforme documentos apresentados aos pesquisadores, a definição de pesos, a tabela de ganhos e a tabela de proporcionalidade de cada indicador com a respectiva meta é acordada pela diretoria executiva em conjunto com gerências regionais. Segundo o Diretor 2: “Então se dá um peso maior para aquele [indicador] que está precisando de mais força e diminui-se o peso daquele que não está. Nem tudo entra no PPR, só alguns, os mais estratégicos, os mais importantes [...]

Por outro lado, além dos indicadores obrigatórios, cada posto de atendimento tem liberdade para sugerir indicadores que não estejam no portfólio para o próximo semestre, fazendo com que o PPR seja um influenciador de comportamentos e facilitador perante decisões de aperfeiçoamento e novas ideias apresentadas pelos colaboradores nos postos de atendimento (Van Veen-Dirks, 2010Van Veen-Dirks, P. (2010). Different uses of performance measures: the evaluation versus reward of production managers. Accounting, Organizations and Society, 35(2), 141-164.; Zondo, 2018Zondo, R. W. (2018). The impact of gainsharing in the automotive parts manufacturing industry of South Africa. South African Journal of Economic and Management Sciences, 21(1), 1-8.). A Coordenadora 2 diz: “Para o mesmo semestre não conseguimos alterar os indicadores, porque tem que ter toda uma base histórica, tem que ver se é uma oportunidade de ter isso como indicador [...]

Assim, a função do PPR na cooperativa é intensificar os resultados almejados e, ao mesmo tempo, alinhar e olhar para o colaborador diante da forma como o resultado deve ser atingido, ou seja, a visão de um PPR com propósitos. Nesse sentido, conforme a Coordenadora 4, a função do PPR: “tem relação com o reconhecimento do colaborador em relação ao trabalho realizado e incentivar, claro, os resultados da cooperativa.

Outro fator interessante é que o PPR passa por mudanças internas. Por exemplo, utilizar a nomenclatura “Propósito + Participação = Resultado”, conforme a Coordenadora 4 relata: “Ele não deixa de ser o PPR, mas quando a gente fala da sigla internamente, hoje o significado dele pra nós mudou, então ele continua sendo o PPR, mas nós falamos internamente pra trazer esse sentido pro colaborador”. Com isso, a forma como o PPR é chamado dentro da cooperativa tende a influenciar o comportamento e os propósitos do colaborador, visto que o PPR será uma consequência do exercício de suas habilidades e competências para servir o cooperado e, consequentemente, atingir os resultados organizacionais.

Nesse sentido, apesar de a recompensa variável ser coletiva, existem porcentagens diferentes entre os postos de atendimento. Conforme relata o Diretor 2, há metas para cada posto de atendimento, que são diretamente ligadas aos indicadores de desempenho de cada unidade, a partir dos quais serão atribuídos percentuais a serem atingidos para o PPR. Cabe destacar que, como se trata de um sistema de incentivos em grupo, os entrevistados não relataram a existência de algum critério de elegibilidade, que é utilizado em sistemas de incentivos individuais de executivos.

Com isso, o objetivo do PPR é fornecer uma recompensa para os colaboradores e não os punir (Bonner & Sprinkle, 2002Bonner, S. E., & Sprinkle, G. B. (2002). The effects of monetary incentives on effort and task performance: theories, evidence, and a framework for research. Accounting, Organizations and Society, 27(4-5), 303-345.). A punição aqui retratada não se refere a demissões, mas sim ao não recebimento do PPR, conforme a Coordenadora 2 relata: “a maior penalidade é o não recebimento dessa participação, querendo ou não ali nós recebemos 135% do nosso salário. A Gerente 1 afirma que “todos os postos de atendimento têm a mesma meta, mas lá na área de controle (administrativo), por exemplo, eles têm metas diferentes, metas aqui traduzidas como indicadores de desempenho.

Dessa maneira, o PPR adotado na cooperativa investigada está estruturado segundo a perspectiva da recompensa em grupo, o que é afirmado pelo Diretor 1: “na cooperativa, não há salário variável individual, tudo é coletivo, o que chamamos de PPR”. Como relata a Coordenadora 2: “[...] a cooperativa tem uma forma de trabalhar que eu particularmente gosto muito, que é a busca dos resultados de forma coletiva, então nós não temos comissões, nós não temos extra, nós temos outros tipos de benefícios, e o PPR, nossa participação nos resultados, é um deles.

Em suma, segundo os gestores entrevistados, o PPR tem como objetivo influenciar as equipes (seja o posto de atendimento ou toda a cooperativa) a alcançarem as metas preestabelecidas para determinados indicadores e, por consequência, a atingirem o resultado econômico e social. Dessa forma, constata-se que o PPR é capaz de estimular o uso dos indicadores de desempenho quando utilizado de maneira complementar à avaliação de desempenho (Friis et al., 2015Friis, I., Hansen, A., & Vámosi, T. (2015). On the effectiveness of incentive pay: exploring complementarities and substitution between management control system elements in a manufacturing firm. European Accounting Review, 24(2), 241-276.).

4.3 Avaliação Objetiva e Subjetiva de Desempenho

Na cooperativa, a avaliação objetiva de desempenho ocorre em nível organizacional. Nesse caso, os indicadores de desempenho são utilizados para avaliar todas as equipes da cooperativa com o intuito de influenciar o alcance dos objetivos considerando a remuneração variável que é o PPR. Esse é um dos aspectos que diferenciam a avaliação objetiva da subjetiva, na qual todos são avaliados individualmente.

Nessa cooperativa, os indicadores de desempenho objetivos não são utilizados em nível individual, como na avaliação subjetiva (avaliação de competências). Conforme afirma a Coordenadora 4, “a gente não tem avaliação individual por desempenho ou por resultado né... O que a gente tem de avaliação por resultado mais objetivo é o nosso PPR, o PPR ele tem indicadores macros”. Desse modo, o foco da avaliação objetiva de desempenho é alcançar metas baseadas no Planejamento Estratégico e desmembradas no orçamento anual, sendo o PPR a remuneração variável da cooperativa. Tais afirmações condizem com a literatura de contabilidade gerencial (Groen et al., 2017Groen, B. A., Wouters, M. J., & Wilderom, C. P. M. (2017). Employee participation, performance metrics, and job performance: a survey study based on self-determination theory. Management Accounting Research, 36, 51-66.; Ittner, Larcker, e Meyer, 2003Ittner, C. D., Larcker, D. F., & Meyer, M. W. (2003). Subjectivity and the weighting of performance measures: Evidence from a balanced scorecard. The Accounting Review, 78(3), 725-758.), pois os indicadores de desempenho objetivos são guiados conforme o orçamento estabelecido pela organização.

Cabe ressaltar que a avaliação objetiva e a avaliação subjetiva de desempenho ocorrem por meio de controles formais e informais que, no caso da avaliação objetiva, são os indicadores macro de desempenho. A cooperativa monitora esses dados utilizando controles formais, tais como o sistema Business Intelligence (BI), considerado um “Semáforo”, tornando possível realizar a verificação diária dos resultados e, posteriormente, as reuniões formais.

O sistema BI permite aos gerentes regionais e coordenadores dos postos de atendimento designar a avaliação dos indicadores de desempenho que foram projetados, a fim de promover ações de desempenho. Segundo a Coordenadora 2, a avaliação dos indicadores promove ação interna entre os colaboradores. Segundo seu exemplo; “tem o indicador que eu já atingi, onde preciso gastar mais energia? O que nós vamos fazer de diferente? O que nós vamos fazer pra alavancar isso?” Assim, acompanhar o painel de indicadores permite aos gestores avaliar os principais números de crescimento e as principais carteiras de crédito, dentre outros fatores.

Adicionalmente à avaliação dos indicadores de desempenho são realizadas reuniões de cascateamento das informações, com o objetivo de criar ações internas de alavancagem dos objetivos. Segundo a Gerente 1, “as reuniões formais ocorrem uma vez por mês com a diretoria, a cada quinze dias com os gerentes e uma vez por mês com os coordenadores. Além da avaliação objetiva de desempenho com base em indicadores, a cooperativa realiza avaliações subjetivas, no caso, uma avaliação de competências cujo foco é acompanhar o desenvolvimento do colaborador na cooperativa.

A avaliação de competências é anual e ocorre conjuntamente em toda cooperativa durante um período específico. Na avaliação subjetiva os colaboradores são avaliados por meio de quatro competências consideradas essenciais: relacionamento interpessoal, comunicação assertiva, senso de cooperação e foco no resultado econômico e social. Essas quatro competências são avaliadas conforme cada função, distribuídas entre diretores, gerentes, coordenadores e analistas. Por conseguinte, a cooperativa tem as chamadas competências funcionais, que também são divididas de acordo com cada função, mas que devem ser praticadas todos os dias.

A avaliação de desempenho dos colaboradores da cooperativa faz parte do PDI. Conforme os documentos disponibilizados, esse programa de avaliação acontece quando o colaborador completa 12 meses na cooperativa; o foco de análise se concentra em avaliações individuais entre o líder e o liderado. Segundo afirma a coordenadora 4: “O formato dela é o colaborador faz a autoavaliação, o líder faz a autoavaliação dele e o resultado da avaliação na verdade é um consenso dessas duas. Com toda essa análise individual, o objetivo geral é o desenvolvimento de todos os colaboradores, com o apoio da cooperativa nos pontos fortes e fracos individuais e, consequentemente, coletivos.

Dentro dos postos de atendimento, a cada trimestre ou quadrimestre, os coordenadores realizam feedbacks formais com base nos planos de ação acordados na avaliação anual, quando são preenchidos, conversados e registrados no passaporte. E como feedbacks informais, há as conversas diárias. Segundo a Coordenadora 1: “[...] por meio dos acompanhamentos informais que são feitos e do plano de desenvolvimento daquilo que tu percebes que na avaliação de desempenho precisa ser melhorado, são lançadas algumas ações para o colaborador”. O acompanhamento dos colaboradores e o uso de feedbacks para a avaliação de desempenho são considerados mecanismos-chave para o desenvolvimento a longo prazo, conforme afirmam Bol e Smith (2011Bol, J. C., & Smith, S. D. (2011). Spillover effects in subjective performance evaluation: Bias and the asymmetric influence of controllability. The Accounting Review, 86(4), 1213-1230.).

Nesse sentido, as ações para o desenvolvimento do colaborador são capazes, na maioria das vezes, de gerar aprendizados de maneira eficaz e eficiente. No entanto, as ações só geram resultados se forem monitoradas, conforme afirma a Coordenadora 1: “[...] tu tens que acompanhar, tu tens que perceber. Eu não vou dizer que tem casos que não acontecem, que não conseguem, mas aí cabe ao coordenador perceber a pessoa certa no lugar certo e talvez ele perceba esse sinal”. Sendo assim, o acompanhamento individual é uma das bases para o desenvolvimento desse colaborador e, posteriormente, da equipe. Segundo a coordenadora 4, se não existisse esse momento de feedback que a avaliação subjetiva propõe, “[...] a gente deixaria muito solto [...] Então eu acho que a perda seria de clareza também e a garantia de um momento formal para isso.

De maneira geral, quando se trata da avaliação objetiva (sendo a objetiva a base do PPR), a cooperativa tem avaliações de desempenho concisas em nível individual para avaliação de competências e no âmbito de equipes. A avaliação objetiva não ocorre no nível individual, mas sim a partir de um olhar coletivo. De acordo com a Coordenadora 4, acerca dos indicadores de desempenho que norteiam o PPR: “são os nossos indicadores de desempenho, só que eles são indicadores de desempenho coletivos, da cooperativa toda, então, o PPR é a nossa avaliação de resultado, é objetiva”.

Ambas as avaliações (objetiva e subjetiva) são importantes para a cooperativa; a combinação desses dois tipos de avaliação é eficaz para o desenvolvimento individual e, consequentemente, coletivo.

5. INTERDEPENDÊNCIA ENTRE O GAINSHARING E A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO

A discussão proposta por Bedford (2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.) permite aprofundar a forma como a interdependência (tratada em termos de complementariedade e de substituição) e a independência entre as práticas de controle gerencial se manifestam na prática. Considerando a investigação sobre a interdependência entre as práticas de controle gerencial, o gainsharing, a avaliação objetiva e subjetiva de desempenho, pode-se proceder com algumas reflexões.

Primeiro, em relação à interdependência entre a avaliação subjetiva e a avaliação objetiva de desempenho, identifica-se que ambas focalizam aspectos e níveis hierárquicos de maneira distinta. A avaliação subjetiva de desempenho ocorre no nível do indivíduo e baseia-se em atributos relacionados a competências essenciais e funcionais que possuem diferentes olhares conforme os níveis hierárquicos (Beuren et al., 2020Beuren, I. M., Von Eggert, N. S., & Santos, E. A. (2020). Influência da avaliação de desempenho formal e seus mecanismos na confiança interpessoal entre gestores: justiça processual e qualidade do feedback percebidos. Organizações & Sociedade, 27(92), 113-131.; Moers, 2005Moers, F. (2005). Discretion and bias in performance evaluation: the impact of diversity and subjectivity. Accounting, Organizations and Society, 30(1), 67-80.). Desse modo, os níveis são caracterizados como evidências comportamentais: diretores, gerentes e analistas; cada um deles têm diferentes responsabilidades e necessitam exercer determinado comportamento.

Por outro lado, a avaliação objetiva compete aos indicadores de desempenho, com base no planejamento estratégico da cooperativa, envolvendo os níveis organizacionais, de maneira global, regional ou em postos de atendimento (Woods, 2012Woods, A. (2012). Subjective adjustments to objective performance measures: the influence of prior performance. Accounting, Organizations and Society, 37(6), 403-425.). Nesse contexto, a avaliação objetiva relaciona-se aos canais formais e informais que são capazes de verificar e acompanhar os resultados da organização, a fim de direcionar esforços (Ittner, Larcker, & Meyer, 2003Ittner, C. D., Larcker, D. F., & Meyer, M. W. (2003). Subjectivity and the weighting of performance measures: Evidence from a balanced scorecard. The Accounting Review, 78(3), 725-758.; Moers, 2005Moers, F. (2005). Discretion and bias in performance evaluation: the impact of diversity and subjectivity. Accounting, Organizations and Society, 30(1), 67-80.). Entretanto, torna-se complexo captar apenas por meio de reuniões, análise dos resultados de cada indicador ou conversas informais, os problemas relacionados às competências interpessoais e a necessidade de cada nível organizacional (Bol & Smith, 2011Bol, J. C., & Smith, S. D. (2011). Spillover effects in subjective performance evaluation: Bias and the asymmetric influence of controllability. The Accounting Review, 86(4), 1213-1230.; Kunz, 2015Kunz, J. (2015). Objectivity and subjectivity in performance evaluation and autonomous motivation: an exploratory study. Management Accounting Research, 27, 27-46.).

Assim, considera-se que a avaliação subjetiva foca no desenvolvimento do colaborador para mitigar limitações pessoais que a avaliação objetiva não consegue captar. Como a cooperativa analisa seus resultados com foco no grupo, no qual o alcance dos objetivos depende do alinhamento de esforços e da motivação, a avaliação subjetiva auxilia perante o controle e a análise comportamental de cada indivíduo, por meio dos planos de desenvolvimento individuais. Ou seja, o controle do comprometimento e do desempenho do colaborador torna-se um fator importante para que ele continue motivado e direcionado a atingir os objetivos organizacionais.

Outro fator importante a considerar é que o plano de desenvolvimento realizado com cada indivíduo pode ser alterado a qualquer momento após a realização dos feedbacks e esses fatores de acompanhamento podem gerar oportunidades para melhorar o desempenho organizacional (Gibbs et al., 2004Gibbs, M., Merchant, K. A., Stede, W. A. V. D., & Vargus, M. E. (2004). Determinants and effects of subjectivity in incentives. The Accounting Review, 79(2), 409-436.). Nesse sentido, a Coordenadora 4 relata que: “Como os nossos times são todos de cargos muito parecidos, a gente tem a possibilidade de olhar para isso e dentro da regional, por exemplo, sugerir algumas transferências para deixar a equipe mais equilibrada, no sentido de dar mais propulsão para o desenvolvimento das pessoas.

Portanto, é surpreendente como a avaliação de desempenho focada em indicadores subjetivos do colaborador pode agir de maneira a compensar as limitações da avaliação objetiva de desempenho, permitindo lidar com problemas de motivação e alinhamento de interesses (Merchant & Van der Stede, 2014Merchant, K. A., & Van der Stede, W. A. (2014). Management control systems: performance measurement, evaluation and incentives. London, United Kingdom: Pearson Education.). Nesse sentido, o sentimento de trabalhar em equipe e motivação (financeira e não financeira) instiga o colaborador a exercer suas atividades de maneira alinhada com os objetivos estratégicos e, ao mesmo tempo, a atingir sua performance funcional.

Para finalizar, o elemento complementar compensatório proposto por Bedford (2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.) e identificado na cooperativa trata da evolução do colaborador no que tange ao desenvolvimento das competências, por exemplo, os resultados positivos dos planos de ações individuais. Conforme elencado pela Coordenadora 4, a ligação entre a avaliação subjetiva e a avaliação objetiva são as consequências dos comportamentos dos colaboradores,[...] porque o colaborador trabalha de uma forma mais assertiva, está mais conectado com a cooperativa, então quanto mais os colaboradores evoluem, melhor é o desenvolvimento dele de resultado no trabalho [...]”. Apesar de a avaliação objetiva não ser analisada de maneira individual, suas fraquezas podem ser atenuadas pela avaliação subjetiva, pois, em conformidade com a Coordenadora 4, “[...] o desenvolvimento do colaborador, a evolução do colaborador, vai gerar impacto direto no resultado da cooperativa, por meio do monitoramento dos resultados e implementação de planos de ação. Assim, chega-se à Proposição 1 (P1): “A avaliação subjetiva de desempenho neutraliza as fraquezas ou as limitações da avaliação objetiva de desempenho na resolução do problema de controle de limitação de competências.

Segundo, quanto à interdependência entre o gainsharing e a avaliação objetiva de desempenho, pode-se dizer que a primeira prática aumenta a eficácia da segunda em mitigar os problemas de falta de direção e de falta de motivação (Bedford, 2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.) na cooperativa estudada. Esse ponto também é sustentado por Friis et al. (2015Friis, I., Hansen, A., & Vámosi, T. (2015). On the effectiveness of incentive pay: exploring complementarities and substitution between management control system elements in a manufacturing firm. European Accounting Review, 24(2), 241-276.) em termos do aumento da eficácia do controle gerencial na organização. Portanto, argumenta-se que a complementariedade entre essas duas práticas pode ser qualificada dentro da forma causal denominada por Bedford (2020) de reforço.

Quanto às evidências do campo que sugerem essa relação, percebe-se que os indicadores de desempenho definidos para o gainsharing são utilizados com mais intensidade, tanto do ponto de vista formal quanto do informal, na avaliação objetiva de desempenho dos postos de atendimento e em relação à organização. Como controles formais, a cooperativa monitora e avalia em tempo real os indicadores por meio do sistema BI e, posteriormente, realiza reuniões formais para discutir os planos de ação. Quanto aos controles informais, eles referem-se a comunicações por meio de diversos mecanismos, com certo nível de autonomia, conforme relatado pela Gerente 1: “ocorre por ligação, mensagem, e-mail ou pessoalmente quando eu vou fazer alguma coisa bem diferente, aí eu vou lá com o diretor e digo que eu estava pensando.

Dessa forma, a complementariedade entre o gainsharing e a avaliação objetiva de desempenho é evidenciada, também, pelo fato de que os indicadores do gainsharing decorrem dos indicadores definidos no Planejamento Estratégico e, portanto, são os mesmos indicadores que balizam a avaliação objetiva de desempenho. Cabe destacar que, para o desenho do gainsharing, definem-se os indicadores de desempenho, mas atribuem-se pesos e revisam-se as metas características que direcionam a atenção dos gestores no processo de avaliação objetiva de desempenho, por meio de canais formais (como reuniões, sistemas com dados em tempo real) e informais (como conversas ou um questionamento por telefone, e-mails, face a face) (Hartman & Slapničar, 2012).

Em outras palavras o gainsharing e a avaliação objetiva de desempenho se apoiam, principalmente, nos mesmos indicadores de desempenho, que tendem a elevar a efetividade de ambas as práticas de controle gerencial, bem como auxiliar no direcionamento e na atenção dos colaboradores da cooperativa para o alcance de resultados superiores, desde a sede administrativa até a “ponta”, ou seja, os postos de atendimento. Por outro lado, as conversas informais face a face tendem a facilitar a criação de ideias para que o objetivo da organização seja atingido (Van Veen-Dirks, 2010Van Veen-Dirks, P. (2010). Different uses of performance measures: the evaluation versus reward of production managers. Accounting, Organizations and Society, 35(2), 141-164.; Zondo, 2018Zondo, R. W. (2018). The impact of gainsharing in the automotive parts manufacturing industry of South Africa. South African Journal of Economic and Management Sciences, 21(1), 1-8.). A Figura 1 evidencia os meios pelos quais o gainsharing complementa a avaliação objetiva de desempenho, particularmente ao reforçar seu papel de influenciar comportamentos e promover a direção para alcançar os objetivos.

Figura 1
Complementariedade entre gainsharing e avaliação objetiva de desempenho

Portanto, na cooperativa o gainsharing atua como uma prática capaz de auxiliar na eficácia da avaliação objetiva de desempenho. Ou seja, ele é um norteador pelo qual os indicadores são observados, instigados e alterados semestralmente. Dessa forma, conforme a Coordenadora 4: “acredito que o PPR tem uma função importante de reconhecimento, que faz com que as pessoas busquem, tem impacto no olhar do colaborador e isso acaba motivando mais a busca por resultados”. Em outras palavras, o gainsharing promove o debate pelo alinhamento dos esforços e, ao mesmo tempo, motiva os colaboradores a alcançarem os resultados. A partir do exposto, estabelece-se a Proposição 2 (P2): “O gainsharing aumenta a eficácia da avaliação objetiva de desempenho na mitigação de problemas relacionados à falta de motivação e à falta de direção”.

Terceiro, em se tratando da relação entre o gainsharing e a avaliação subjetiva de desempenho, percebe-se que são práticas interdependentes em que o gainsharing é desenvolvido, por um grupo responsável na cooperativa, com base em indicadores de desempenho objetivos, que podem variar conforme a necessidade de cada semestre, e avaliação subjetiva de desempenho, com foco nas competências do indivíduo. Os indicadores que fazem parte do gainsharing correspondem aos resultados da cooperativa e dos cooperados, por exemplo: captação de recursos, operações de crédito, vinculação dos cooperados, inadimplência, número de cooperados e pesquisa de satisfação.

Por outro lado, a avaliação subjetiva de desempenho está atrelada diretamente às competências do colaborador. São realizadas avaliações de maneira individual, bem como a inserção PDI, além de feedbacks frequentes para analisar o comportamento dos colaboradores perante o comprometimento em evoluir. O uso dessa avaliação subjetiva visa mitigar problemas de limitações pessoais e de comportamento. Esse desenvolvimento não ocorre de maneira imediata, mas gradativa, o que pode resultar em recompensas futuras.

Sendo assim, a realização da avaliação de desempenho com foco no colaborador tende a influenciar os resultados do comportamento individual e coletivo a partir da mudança no comportamento desses colaboradores. A visão a longo prazo é uma influência indireta na resolução de problemas pessoais, sendo um auxiliar no direcionamento de objetivos promovidos pelo PPR. Segundo a Gerente 1: “independente do PPR, a avaliação de competências ela gera resultados melhores e nós vamos desenvolvendo equipes mais maduras, mais autoconfiantes.

Assim, pode-se considerar que a avaliação subjetiva de desempenho tem um efeito habilitador sobre o gainsharing na cooperativa, se o colaborador desenvolve suas competências. Por exemplo, “foco no resultado econômico e social”, que significa a capacidade de planejar, decidir, orientar e executar ações que beneficiem os resultados da cooperativa e da comunidade que, alinhada ao planejamento estratégico, tendem a gerar desempenhos que permitam alcançar o PPR.

Além disso, os indicadores subjetivos que competem apenas à avaliação subjetiva do colaborador agem indiretamente na otimização do PPR, por meio das ações do PDI da avaliação de desempenho individual. Conforme indicado por Bol e Smith (2011Bol, J. C., & Smith, S. D. (2011). Spillover effects in subjective performance evaluation: Bias and the asymmetric influence of controllability. The Accounting Review, 86(4), 1213-1230.), a avaliação subjetiva de desempenho tende a gerar benefícios a longo prazo. Ainda segundo Kunz (2015Kunz, J. (2015). Objectivity and subjectivity in performance evaluation and autonomous motivation: an exploratory study. Management Accounting Research, 27, 27-46.), existe uma mudança no comportamento das pessoas quando os gestores complementam a ideia da avaliação objetiva e subjetiva de desempenho, pois o colaborador acaba se adaptando à cultura organizacional e os gestores conseguem influenciar a mudança do comportamento dos funcionários baseando-se em outras perspectivas, com o objetivo de aprimorar a motivação e, consequentemente, o desempenho individual e organizacional na empresa. Apresenta-se, então, a Proposição 3 (P3): “A avaliação subjetiva de desempenho, ao mitigar problemas de limitações pessoais, cria as condições para o gainsharing contribuir na resolução dos problemas de direção e motivação a longo prazo”.

Em vista desta discussão apoiada no modelo desenvolvido por Bedford (2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.) foram elaboradas três proposições que refletem a complementariedade entre as práticas estudadas (Figura 2).

Figura 2
Modelo teórico da pesquisa

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste estudo foi investigar a interdependência entre o gainsharing e a avaliação de desempenho (objetiva e subjetiva) em uma cooperativa de crédito. Para alcançar este objetivo foram conduzidas entrevistas e analisados documentos para captar a estrutura da cooperativa, as características do gainsharing (PPR), os indicadores de desempenho utilizados e como avaliação objetiva e subjetiva de desempenho ocorre nos diversos níveis hierárquicos da cooperativa - diretoria, gerência e coordenação de postos de atendimento.

Assim, este estudo contribuiu com a literatura de controle gerencial ao discutir a interdependência e analisar especificamente a complementariedade entre as práticas de controle gerencial, tema que é recente na área (Bedford, 2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.; Choi, 2020Choi, J. W. (2020). Studying “and”: a perspective on studying the interdependence between management control practices. Accounting, Organizations and Society, 86, 101188.; Merchant & Otley, 2020Merchant, K. A., & Otley, D. (2020). Beyond the systems versus package debate. Accounting, Organizations and Society, 86, 101185.). Focou-se nas práticas gainsharing e na avaliação objetiva e subjetiva de desempenho, que são utilizadas com intensidade pela cooperativa e que foram pouco exploradas conjuntamente por estudos anteriores. Do ponto de vista prático, o contexto de cooperativas de crédito permitiu analisar de maneira clara como o gainsharing é posicionado devido aos princípios sociais e coletivos, além da utilização de mecanismos de avaliação de desempenho perante o controle dos resultados.

Posteriormente, identificou-se que a interdependência entre o gainsharing e a avaliação objetiva e subjetiva de desempenho é evidenciada por meio de três elementos de complementariedade - compensatório, reforço e habilitante - caracterizados por Bedford (2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.). Nesse sentido, denota-se que a avaliação subjetiva de desempenho procura compensar as fraquezas e as limitações no que concerne às competências da avaliação objetiva de desempenho. Por conseguinte, o gainsharing reforça o processo de avaliação objetiva de desempenho elevando a efetividade ao mitigar os problemas de motivação e direção, enquanto a avaliação subjetiva de desempenho, após atenuar problemas de limitações de competências, habilita o gainsharing para atuar no processo de motivação e direção perante os objetivos de longo prazo.

Apesar das contribuições, este estudo tem algumas limitações. Ressalta-se entre elas a seleção dos postos de atendimento e de entrevistados, que talvez possa evidenciar outras realidades na organização não captadas nesta pesquisa. Ademais, por ser um estudo de caso específico com uma cooperativa de crédito, os resultados não podem ser generalizados.

Como sugestão para futuras pesquisas, recomenda-se a análise de múltiplos casos, como a investigação do gainsharing ou a avaliação de desempenho com outros mecanismos de controle gerencial, para avaliar os níveis de integração e o grau de eficácia (Bedford, 2020Bedford, D. S. (2020). Conceptual and empirical issues in understanding management control combinations. Accounting, Organizations and Society, 86, 101187.; Demartini & Otley, 2020Demartini, M. C., & Otley, D. (2020). Beyond the system vs. package dualism in performance management systems design: a loose coupling approach. Accounting, Organizations and Society, 86, 101072.). Além disso, sugerem-se estudos qualitativos que aprofundem a discussão da complementariedade (integração e substituição) e sua ênfase sobre os resultados organizacionais (Merchant & Otley, 2020Merchant, K. A., & Otley, D. (2020). Beyond the systems versus package debate. Accounting, Organizations and Society, 86, 101185.). Por fim, sugere-se o desenvolvimento de estudos que analisem a complementariedade entre dois ou mais sistemas sob a perspectiva longitudinal e, até mesmo, sobre outros setores, pois é uma área que apresenta poucas evidências empíricas.

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    Artigo apresentado no XIII Congresso da Anpcont, São Paulo, SP, Brasil, junho de 2016.
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    Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo apoio financeiro na realização desta pesquisa. Adicionalmente, os autores agradecem aos pareceristas pelas contribuições recebidas.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2021

Histórico

  • Recebido
    03 Maio 2020
  • Revisado
    23 Maio 2020
  • Aceito
    23 Dez 2020
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