INTRODUÇÃO
A eficiência reprodutiva é um dos fatores que mais contribui para melhorar o desempenho e a lucratividade dos rebanhos leiteiros (KOZICK et al., 2005).
A inserção de biotecnologias da reprodução como a Inseminação Artificial (IA) figura como importante ferramenta para melhorar a eficiência reprodutiva do rebanho. Entretanto, as falhas na detecção de estro e o anestro pós-parto constituem os principais gargalos para o sucesso dos programas de IA convencional (INFORZATTO et al., 2008). Para tanto, o emprego de fármacos permite sincronizar o estro e a ovulação proporcionando a Inseminação Artificial em tempo fixo (IATF) (BARUSELLI, 2004; PINHEIRO et al., 2009).
O uso da IATF possibilita à fazenda uma produção programada, concentração do período de parto, além da diminuição do intervalo entre partos, proporcionando maior rentabilidade para a propriedade (INFORZATTO et al., 2008).
Atualmente, existem diversos protocolos de IATF com variações de hormônios, sendo que os mais utilizados são aqueles à base de estrógenos e progestágenos para sincronizar a onda folicular (BÓ et al., 1995), seguida do uso da prostaglandina no momento da remoção do progestágeno para permitir o término da fase luteínica de forma sincronizada e, posteriormente, faz-se a indução da ovulação utilizando GnRH ou análogos e os estrógenos e seus ésteres (BÓ et al., 2003; PINHEIRO et al., 2009). Dentre os fármacos utilizados para a indução da ovulação, o éster de estradiol, por ser eficiente e economicamente viável, possui amplo emprego em programas comerciais de IATF (RODRIGUES, 2011).
Diante deste quadro, alguns pesquisadores demonstraram que em vacas de corte o Benzoato de Estradiol foi eficiente em induzir a ovulação quando aplicado 24h após a remoção da progesterona (BARUSELLI et al., 2006), no entanto, outros experimentos demonstraram que a substituição deste, pelo Cipionato de Estradiol, aplicado no momento de retirada da progesterona (AYRES et al., 2006), eliminaria o manejo adicional, tornando a execução dos protocolos mais simples (CREPALDI, 2009).
As taxas de sucesso com a IATF, em termos de gestação, encontram-se estacionadas em torno de 35% para bovinos de leite. Neste contexto, alguns ajustes nos protocolos podem proporcionar uma melhora nos resultados (LUCY, 2011).
Portanto, objetivou-se avaliar o efeito da utilização de dois ésteres de estradiol sobre o Diâmetro do Folículo Ovulatório (DFOL) e a taxa de gestação de fêmeas bovinas leiteiras submetidas a um programa de IATF.
MATERIAIS E MÉTODOS
O experimento foi realizado entre os meses de agosto e outubro de 2013 na fazenda Gameleira, localizada no município de Riachão do Jacuípe/BA, propriedade situada no semiárido baiano com latitude de 11º 48' 25" sul e longitude de 39º 23' 08" oeste. A propriedade adota o sistema semi-intensivo de criação em pastagem de capimbuffel e urochloa, suplementação mineral e água ad libitum.
Foram utilizadas 94 fêmeas multíparas lactantes mestiças de Holandês x Gir com grau sanguíneo 1/4, 1/2, 3/8, 3/4 e 5/8, com média de idade de 6,69 ± 3,60 anos, Escore de Condição Corporal (ECC), atribuído em uma escala (1-5), de 3,38 ± 0,51 e intervalo pós-parto de 81,36 ± 32,04 dias. Previamente ao início do experimento, todos os animais foram submetidos a exame clínico ginecológico e ultrassonografia transretal utilizando transdutor linear de 5,0MHz (Mindray, DP2200vet, São Paulo, Brasil), sendo utilizado apenas animais com ausência de qualquer anormalidade do trato reprodutivo.
Para a realização deste experimento, os animais foram distribuídos uniformemente em relação ao ECC, intervalo pós-parto e graus de sangue em dois grupos, sendo submetidos ao seguinte protocolo hormonal: no dia 0, as fêmeas receberam um dispositivo intravaginal de progesterona-P4 (DIB®, Zoetis, São Paulo, Brasil) associado a 2mg de Benzoato de Estradiol (Gonadiol ®, Zoetis, São Paulo, Brasil) via intramuscular (i.m.). No D8, os dispositivos foram removidos e administrados 500µg de Cloprostenol sódico – prostaglandina – F2α (Ciosin ®, MSD saúde Animal, São Paulo, Brasil) i.m. e 300 UI de gonadotrofina coriônica equina-eCG (Novormon®, Zoetis, São Paulo, Brasil) i.m. Neste momento, os animais foram divididos em dois grupos experimentais: 50 vacas foram alocadas no grupo CE e receberam 1mg de Cipionato de Estradiol (ECP®, Zoetis, São Paulo, Brasil) i.m.; enquanto outras 44 fêmeas foram classificadas como grupo BE sendo tratadas com 1mg de BE i.m., 24 horas após a remoção do dispositivo intravaginal (D9). No D10, 48 a 56 horas após a remoção do dispositivo de progesterona, foram realizadas as inseminações e, previamente a cada procedimento de IA, foi executada a mensuração do DFOL por meio de ultrassonografia transretal, utilizando-se um transdutor linear com frequência de 5,0MHz (Mindray, DP2200vet, São Paulo, Brasil) (Figura 1).

BE = Benzoato de Estradiol; CE = Cipionato de Estradiol; eCG = Gonadotrofina Coriônica equina; PGF= Prostaglandina; IATF = Inseminação Artificial em Tempo Fixo; US = Ultrassonografia.
Figura 1 Representação esquemática dos protocolos de sincronização utilizado para realização da Inseminação Artificial em Tempo Fixo (IATF) em fêmeas bovinas mestiças Holandês-Gir
Todas as inseminações foram realizadas por um mesmo técnico utilizando doses de sêmen criopreservados de um mesmo touro da raça Girolanda. No momento da inseminação, o sêmen foi descongelado a 37ºC por 30 segundos.
O diagnóstico de gestação foi realizado por ultrassonografia transretal 55 dias após a IATF, utilizando-se um transdutor linear com frequência de 5,0MHz (Mindray, DP2200vet, São Paulo, Brasil). Foi considerado diagnóstico de gestação positivo a presença de um feto viável e com batimento cardíaco detectado.
A taxa de gestação foi calculada pela proporção de vacas gestantes sobre o total de vacas inseminadas. Para a análise estatística dos dados, foi utilizado o Statistical Package for Social Science (SPSS, versão 19), considerando nível de significância de 5%.
Para avaliar a diferença entre as médias do Diâmetro do Folículo Ovulatório (DFOL) nos grupos BE e CE, foi utilizada a análise de variância por meio do teste T de Student. Já a taxa de gestação foi comparada entre os grupos utilizando-se uma análise de dispersão de frequências por meio do teste do Qui-quadrado (x2).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A média geral do DFOL foi 10,99 ± 2,41mm. Na comparação do DFOL entre os tratamentos, não houve diferença significativa e as médias encontradas para os grupos BE e CE foram, respectivamente, 11,45 ± 2,34 e 10,71 ± 2,43mm (Tabela 1).
Tabela 1 Média e desvio-padrão (S) do Diâmetro do Folículo Ovulatório (DFOL) nos grupos de fêmeas submetidas aos tratamentos de indução da ovulação com Cipionato de Estradiol (CE) no momento da remoção do dispositivo de progesterona (P4) ou Benzoato de Estradiol (BE) 24 horas após a remoção da P4
Tratamento | N | DFOL (mm) |
---|---|---|
GRUPO BE | 44 | 11,45±2,34 |
GRUPO CE | 50 | 10,71±2,43 |
Total | 94 | 10,99±2,41 |
Médias comparadas pelo teste T de Student a 5% de probabilidade.
Resultados similares foram descritos por Andrade et al. (2012) em um estudo com IATF utilizando distintos ésteres de estradiol para indução da ovulação. Estes autores verificaram que o DFOL não diferiu entre os tratamentos que empregou CE simultânea a remoção da progesterona ou BE 24h após, sendo, respectivamente, de 13,03 ± 2,24mm e 12,40 ± 1,34mm, porém estes pesquisadores trabalharam com fêmeas Nelore.
Da mesma forma, Sales et al. (2012), em experimentos semelhantes em vacas Nelore, não encontraram diferença entre o DFOL de fêmeas tratadas com CE no momento da remoção do dispositivo de progesterona que foi de 13,90±0,40 ou BE 24h após que foi de 13,10±0,40mm.
Estes resultados se assemelham aqueles reportados por Freitas et al. (2013) que, trabalhando com vacas lactantes da raça Holandesa, avaliou a eficiência da utilização do BE ou CE como indutores de ovulação em protocolo de sincronização da ovulação para IATF. Estes autores observaram que não houve diferença em relação à média de DFOL para os animais que receberam CE no dia oito (15,0±0,5mm) e o BE (13,9±0,5mm) no dia nove do protocolo. Contudo, os resultados acima esboçados demonstram uma média geral de DFOL numericamente superior à obtida no presente estudo sugerindo que esta divergência ocorreu devido a este último ter sido realizado com fêmeas mestiças.
A similaridade entre os diâmetros foliculares formados pela ação de ambos os indutores da ovulação indicam que os mesmos foram eficazes em estimular um crescimento folicular proporcionando a formação de DFOLs acima de 10,00mm, os quais, conforme demonstrado por Sartori et al. (2001), apresentam responsividade a ação do LH e a ovulação em fêmeas leiteiras.
No que se refere à taxa de gestação, de um total de 94 animais, 35 ficaram gestante perfazendo uma taxa de gestação geral de 37,20%. Não foi verificada diferença significativa entre os grupos experimentais, o grupo BE apresentou um índice de 34,10%, enquanto no grupo CE apresentou 40,00% de taxa de gestação (Tabela 2).
Tabela 2 Taxa de gestação por exame ultrassonográfico aos 55 dias após IATF de fêmeas mestiças Holandesas submetidas aos tratamentos de indução da ovulação com Cipionato de Estradiol (CE) no momento da remoção do dispositivo de progesterona ou Benzoato de Estradiol (BE) 24h após a remoção da P4
Tratamento | N | Taxa de Gestação |
---|---|---|
GRUPO BE | 44 | 34,10% (15/44) |
GRUPO CE | 50 | 40,00% (20/50) |
Total | 94 | 37,20% (35/94) |
Médias comparadas pelo teste qui-quadrado (x2) a 5% de probabilidade.
Apesar das condições climáticas adversas que a região atravessou nos últimos anos, onde as pastagens se mostraram bem deficientes podendo comprometer o desempenho reprodutivo das fêmeas, a média de prenhez ficou dentro dos valores esperados para programas comerciais de IATF em bovinos leiteiros que é de 35%. Estas condições são mais críticas em vacas de leite criadas em regiões tropicais, as quais normalmente apresentam diminuição na qualidade oocitária e queda da taxa de gestação em programas de IA (RODRIGUES et al., 2008).
Estes índices foram semelhantes aos observados por Pfeifer et al. (2005), os quais obtiveram em média 50% de taxa de gestação em vacas lactantes submetidas a um protocolo a base de progesterona com a utilização de CE no momento da remoção do dispositivo de progesterona ou BE 24h após. Adicionalmente, foi verificada que administração de CE no momento da retirada do implante de progesterona resultou em uma excelente sincronia entre o estro e a ovulação (AYRES et al., 2006).
Seguindo a mesma linha de pesquisa, Crepaldi (2009), ao avaliar a taxa de gestação em vacas Nelore submetidas a um protocolo de sincronização utilizando CE como indutor da ovulação aplicado concomitante à remoção da progesterona ou BE 24h depois, encontraram resultados equivalentes ao deste estudo com índices de gestação de 47,30% para o tratamento com CE e 53,30%, para o tratamento com BE.
De forma semelhante, Sales et al. (2012)também encontraram taxas de gestação parecidas em protocolos de IATF em vacas Nelore utilizando o CE concomitante a remoção da progesterona ou o BE 24h após, sendo respectivamente, de 61,80% e 57,50%. Estes autores justificaram tal achado, ao fato de ambos os fármacos serem eficientes na indução da ovulação e formação de corpos lúteos capazes de favorecer o estabelecimento e a manutenção da gestação.
Corroborando aos resultados do presente estudo, Rodrigues et al. (2008) encontraram taxa de gestação de 41,60%, quando empregaram 1mg de CE como indutor da ovulação em um protocolo de IATF à base de progesterona em vacas leiteiras. Contudo, em seu delineamento experimental, os autores não comparam os efeitos do BE como indutor. Estes autores concluíram que a indução da ovulação com CE foi eficiente em um programa de IATF em fêmeas bovinas leiteiras por reduzir o número de manejos com os animais.
Os resultados encontrados neste trabalho foram superiores aos achados por Rodrigues et al. (2011). Em um experimento realizado com vacas leiteiras holandesas de alta produção no período de verão, testaram a utilização de implante de progesterona novo com aplicação de Cipionato de Estradiol, concomitantemente com a retirada da progesterona com aplicação de eCG, realizando diagnóstico de gestação aos 30 e 60 dias, obtendo taxas de gestação de 19,2% e 17,3%. Os mesmos atribuem as baixas taxas de concepção provavelmente devido ao estresse calórico pelo qual os animais passaram.
Danieli et al. (2008) trabalhando com protocolo semelhante, utilizando CE no momento da retirada do dispositivo de progesterona, verificaram em vacas e novilhas mestiças leiteiras taxas de gestação de 42,5% para novilhas e 50% para vacas, assemelhando-se aos resultados desta pesquisa.
No entanto, Cardoso et al. (2010), utilizando Cipionato de Estradiol no dia da retirada do implante, obtiveram taxa de 35,7% em vacas mestiças Zebu x Holandês no estado de São Paulo.
Contudo, a maioria dos trabalhos existentes na literatura aborda o tema em animais de corte, existindo uma deficiência destes estudos em fêmeas bovinas leiteiras. Os resultados mostraram que a utilização do CE no momento da remoção do dispositivo de progesterona ou BE 24 horas após não afetaram o DFOL e as taxas de gestação do protocolo de IATF e ambos os fármacos podem ser empregados eficientemente em programas de sincronização de vacas mestiças leiteiras.
A substituição do BE por um tratamento com CE como indutor da ovulação parece não comprometer os índices reprodutivos em protocolos de IATF à base de progesterona, representando uma alternativa para simplificar os programas de sincronização em fêmeas mestiças Holandês-Gir.