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Avaliação do pool de plasma caseiro como controle normal para o tempo de tromboplastina parcial ativada (TTP)

Evaluation if in-house preparations of polled plasma can be used as a normal control of partial thromboplastin time (PTT)

Resumos

INTRODUÇÃO: A utilização correta de um plasma-controle para a comparação com o plasma do paciente nos testes de coagulação é fundamental para a garantia de um resultado seguro dessas provas laboratoriais. OBJETIVO: O presente estudo analisou a viabilidade do uso de um pool de plasma caseiro, realizado com cinco (P5) e 20 (P20) amostras a partir de pacientes normais, para ser utilizado como controle normal do tempo de tromboplastina parcial (TTP). MATERIAL E MÉTODO: Os dois pools de plasma caseiro foram analisados em relação a um controle normal comercial (AP). Foram 10 dias de experimento e a cada dia os dois pools caseiro eram feitos. Para cada dia foi feito o TTP de P5, P20 e AP. Todos os pacientes com solicitação de TTP, em cada dia do experimento, tiveram a relação de tempos (R) determinada frente a P5, P20 e AP. As ferramentas estatísticas utilizadas foram média (X), análise de variância e teste de Tukey. RESULTADOS: A análise estatística demonstrou que os valores de TTP são significativamente diferentes entre AP e P5 e entre AP e P20, mas não há diferença significativa entre P5 e P20. Quando a relação de tempos foi analisada, não houve diferença significativa entre AP, P5 e P20. CONCLUSÃO: O estudo demonstrou que pode ser utilizado como controle normal um pool de plasma caseiro, feito a partir de cinco ou 20 amostras.

Tempo de tromboplastina parcial ativada; Pool de plasma caseiro; Controle de qualidade interno


INTRODUCTION: Proper utilization of plasma control for comparison with the plasma of patients with coagulation tests is critical to ensure a safe outcome of these laboratory tests. OBJECTIVE: The purpose of this work was to know if in-house preparations of polled plasma can be used as a normal control of partial thromboplastin time (PTT). MATERIAL AND METHOD: We make two polled plasma, one with five (P5) samples and another with 20 (P20) samples, both of them from normal patients. Both pooled plasma were analyzed in comparison with a commercial lyophilized control (AP). The experiment was performed in 10 days, and P5 and P20 were made daily. At each day PTT was performed for P5, P20 and AP. All patients who asked for TTP, in each day of this experience, got a time relation (R) determined by a P5, P20 e AP. Tukey test was used as statistical analysis. RESULTS: Statistically significant differences were detected among the PTT for AP and P5, AP and P20, but no difference between P5 and P20 was observed. When the time relations were tested, there were no significant difference, among AP, P5, and P20. CONCLUSION: We found that in-house preparations of polled plasma (P5 and P20) can be used as a normal control of PTT.

Partial thromboplastin time; In-house preparations of pooled plasma; Quality control


ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL PAPER

Avaliação do pool de plasma caseiro como controle normal para o tempo de tromboplastina parcial ativada (TTP)

Evaluation if in-house preparations of polled plasma can be used as a normal control of partial thromboplastin time (PTT)

Railson HennebergI; Paulo Henrique da SilvaII; Rogério Luiz KoppIII; Aguinaldo José do NascimentoIV; Janaína Risczik Arruda CorreaV; Fernanda Dal MolinVI

IMestre em Análises Clínicas pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), Araraquara; professor assistente 3 da Universidade Federal do Paraná (UFPR)

IIDoutor em Biologia Celular e Molecular pela UFPR; professor adjunto 3 do Departamento de Patologia Médica da UFPR

IIIDoutor em Ciências Biológicas pela UFPR; professor associado 2 do Departamento de Patologia Médica da UFPR

IVPhD em Bioquímica; professor sênior do Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas da UFPR

VEspecialista em Hematologia pela Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC); farmacêutica-bioquímica do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (HUEC)

VIEspecialista em Análises Clínicas pela UFPR; farmacêutica-bioquímica do HUEC

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Paulo Henrique da Silva Av. Lothário Meissner, 632 Jardim Botânico CEP: 80210-170 - Curitiba-PR

RESUMO

INTRODUÇÃO: A utilização correta de um plasma-controle para a comparação com o plasma do paciente nos testes de coagulação é fundamental para a garantia de um resultado seguro dessas provas laboratoriais.

OBJETIVO: O presente estudo analisou a viabilidade do uso de um pool de plasma caseiro, realizado com cinco (P5) e 20 (P20) amostras a partir de pacientes normais, para ser utilizado como controle normal do tempo de tromboplastina parcial (TTP).

MATERIAL E MÉTODO: Os dois pools de plasma caseiro foram analisados em relação a um controle normal comercial (AP). Foram 10 dias de experimento e a cada dia os dois pools caseiro eram feitos. Para cada dia foi feito o TTP de P5, P20 e AP. Todos os pacientes com solicitação de TTP, em cada dia do experimento, tiveram a relação de tempos (R) determinada frente a P5, P20 e AP. As ferramentas estatísticas utilizadas foram média (X), análise de variância e teste de Tukey.

RESULTADOS: A análise estatística demonstrou que os valores de TTP são significativamente diferentes entre AP e P5 e entre AP e P20, mas não há diferença significativa entre P5 e P20. Quando a relação de tempos foi analisada, não houve diferença significativa entre AP, P5 e P20.

CONCLUSÃO: O estudo demonstrou que pode ser utilizado como controle normal um pool de plasma caseiro, feito a partir de cinco ou 20 amostras.

Unitermos: Tempo de tromboplastina parcial ativada, Pool de plasma caseiro, Controle de qualidade interno.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Proper utilization of plasma control for comparison with the plasma of patients with coagulation tests is critical to ensure a safe outcome of these laboratory tests.

OBJECTIVE: The purpose of this work was to know if in-house preparations of polled plasma can be used as a normal control of partial thromboplastin time (PTT).

MATERIAL AND METHOD: We make two polled plasma, one with five (P5) samples and another with 20 (P20) samples, both of them from normal patients. Both pooled plasma were analyzed in comparison with a commercial lyophilized control (AP). The experiment was performed in 10 days, and P5 and P20 were made daily. At each day PTT was performed for P5, P20 and AP. All patients who asked for TTP, in each day of this experience, got a time relation (R) determined by a P5, P20 e AP. Tukey test was used as statistical analysis.

RESULTS: Statistically significant differences were detected among the PTT for AP and P5, AP and P20, but no difference between P5 and P20 was observed. When the time relations were tested, there were no significant difference, among AP, P5, and P20.

CONCLUSION: We found that in-house preparations of polled plasma (P5 and P20) can be used as a normal control of PTT.

Key words: Partial thromboplastin time, In-house preparations of pooled plasma, Quality control

Introdução

O controle de qualidade em coagulação é essencial para obterem-se resultados precisos e confiáveis na prática clínica. Além do controle de qualidade externo, que faz uma avaliação de proficiência comparativa com outros laboratórios(4), o controle de qualidade interno é uma forma de cada laboratório medir individualmente suas variações diárias(5). Considerando que os resultados laboratoriais em hemostasia são criticamente dependentes da qualidade da amostra, do método, dos instrumentos, dos reagentes(7) e das condições do equipamento empregado na realização do teste, mais importante se torna o papel do controle de qualidade no resultado final desse processo.

O tempo de tromboplastina parcial ativada (TTP) é um teste screening usado para a detecção de deficiências ou inibições dos fatores de coagulação correspondentes às vias intrínseca e comum e do anticoagulante lúpico, além de ser utilizado no monitoramento de pacientes sob uso de heparina de alto peso molecular(6).

Diferentemente do tempo de protrombina (TP), os resultados de TTP não utilizam valores da relação normatizada internacional (RNI) e nem são avaliados pelo índice de sensibilidade internacional (ISI). O TTP do paciente é expresso em comparação a um pool de plasma normal, geralmente adquirido no comércio e de boa procedência. Muitos laboratórios utilizam um pool de plasma normal, feito no próprio laboratório, como controle do TTP, e a composição (número de plasmas que o compõe) varia de laboratório para laboratório(3). O resultado do TTP deve ser informado em segundos e comparado com o valor do controle normal, e o valor de referência deve ser dado em relação ao controle normal(8). O resultado do TTP também pode ser liberado por uma relação de tempos (R) entre o valor do TTP do paciente e o do controle normal; essa relação de tempos é um parâmetro de uso clínico(10).

Os laboratórios de análises clínicas utilizam como controle normal, para o TTP, um plasma comercial liofilizado ou um pool de plasma caseiro. A discussão que fica é se o pool de plasma caseiro pode ou não ser utilizado como controle normal. Além disso, para laboratórios de pequeno a médio porte, que realizam entre cinco e 10 TTP por dia, o custo do plasma comercial pode onerar o exame a ponto de tornar-se um prejuízo realizá-lo nos padrões de qualidade especificados. O presente estudo visa validar uma alternativa ao controle comercial: a produção de um controle normal caseiro a partir de um pool de plasmas de pacientes normais.

Material e método

Foram utilizados dois pools de plasma normais preparados diariamente a partir de plasmas de pacientes atendidos no Ambulatório do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (HUEC) entre os dias 17 e 30 de março de 2010, totalizando 10 dias de experimento. O primeiro pool consistiu da mistura de cinco plasmas (P5) e o segundo, de 20 plasmas (P20). Os plasmas utilizados em P5 também foram utilizados em P20. As amostras selecionadas para o pool foram as que apresentaram resultados de TTP entre a faixa de referência de normalidade de ± 5 segundos do valor do controle normal(8). Amostras com hemólise, lipêmicas ou ictéricas foram recusadas. Para o preparo dos respectivos pools, separou-se o volume de 500 μl de plasma de cada amostra em tubos de plástico para ser misturado com os demais em duas porções distintas: um tubo contendo cinco plasmas dentro da normalidade (P5) e outro contendo 20 plasmas dentro da normalidade (P20). O pool de plasma comercial (AP) utilizado foi da marca Siemens.

A cada dia foi feito um P5 e um P20. Após a realização dos pools, foi feito um TTP do P5, do P20 e do AP. A cada dia do experimento, para todos os pacientes que tinham solicitação de TTP, foi realizada também a relação de tempos (R). Cada paciente do dia tinha uma relação de tempos para P5, P20 e AP. O tamanho amostral utilizado foi de 960 pacientes, sendo 320 para cada controle (P5, P20 e AP); esse tamanho amostral foi utilizado para o cálculo de R. O TTP foi realizado no sistema de coagulação da Dade-Behring BCS®, que utiliza um sistema ótico para o processamento coagulométrico das amostras. O fotômetro faz leituras das amostras nos comprimentos de onda de 340, 405 ou 570 nm.

Para a comparação dos resultados obtidos, foram realizadas duas análises estatísticas: a primeira comparou os valores do TTP para AP, P5 e P20 e a segunda, a relação de tempos de cada paciente do dia para P5, P20 e AP. Os dados foram avaliados utilizando-se as ferramentas estatísticas, média (X), análise de variância e teste de Tukey.

Resultados

Na Tabela são apresentados os valores do TTP com AP, P5 e P20 para cada dia do experimento. A Figura 1 mostra a análise estatística dos valores diários de TTP para AP, P5 e P20. A análise da variância e o teste de Tukey indicaram que existe diferença estatisticamente significativa entre AP e P5 e entre AP e P20; P5 e P20 não diferem estatisticamente.


A análise da variância, para R, indica que há pelo menos uma diferença entre as médias dos três tratamentos. Essa análise está representada na Figura 2. O teste de Tukey indicou que a única diferença ocorreu entre o tratamento AP e o P20. Todas as outras combinações apresentaram médias semelhantes estatisticamente. Não há diferença entre P5 e AP, nem entre P5 e P20.


As médias por experimento variaram de 1,04 a 1,35, o que dá credibilidade aos resultados. Os valores médios são muito próximos (AP = 1,07; P5 = 1,13; P20 = 1,17), o que reflete uma variação percentual de aumento de 6% e 10% para P5 e P20 em relação ao controle, respectivamente, o que pode ser considerado desprezível, dentro do erro experimental. A Figura 3 representa esses valores.


Discussão

Como o TTP deve ser avaliado em relação a um controle normal e a partir deste se faz o valor de referência (geralmente o valor de referência é o controle normal ± 5 segundos), a discussão que se faz é de qual controle normal utilizar: um plasma comercial ou um pool de plasma caseiro. O pool de plasma caseiro pode ser mais representativo da população que o laboratório atende(8). Contudo, que diferença tem um pool de plasma caseiro com poucas amostras de um pool de plasma caseiro com muitas amostras? Os autores diferem quanto ao número de amostras que compõem o pool. Para Silva et al.(8), em laboratórios com rotina elevada, o pool caseiro deve ser preparado utilizando-se entre 30 e 50 amostras de plasmas normais. Já de acordo com o resumo produzido pelo Programa Nacional de Controle de Qualidade (PNCQ)(1), gerenciado pela Sociedade Brasileira de Análises Clínicas, um pool de plasmas normal pode ser produzido pelo laboratório e usado para controle interno de qualidade desde que seja preparado com amostras de, pelo menos, cinco indivíduos sem histórico de sangramento. Segundo Barrantes(2), para se preparar um plasma-controle representativo, deve ser feito um pool de 10 amostras de pacientes normais.

Devido a essas discrepâncias é que se fez a comparação estatística entre P5, P20 e AP. Os resultados do TTP para P5, P20 e AP foram estatisticamente diferentes e os valores de P5 e P20 foram mais baixos que os valores de AP. Isso demonstra que o pool de plasma caseiro é mais representativo dos valores de TTP da população atendida. O pool de plasma caseiro passa pelas mesmas etapas das amostras com as quais terá seu resultado comparado (coleta, centrifugação, pipetagem e manuseio), além de fazer parte do universo delas. O controle comercial é produzido industrialmente e obtido a partir de um pool de plasmas estabilizado com tampão, liofilizado e, então, para uso, reconstituído com água. Portanto, ele não passa pelas mesmas condições de preparo das amostras analisadas em um laboratório de análises clínicas. Alguns autores, como Barrantes(2) e Stiene-Martin et al.(9), concordam que os plasmas-controle normais podem ser preparados no próprio laboratório. Além do aspecto econômico, a vantagem de um controle interno produzido com amostras do público atendido pelo laboratório é minimizar as variáveis as quais o teste de TTP está sujeito.

Quando a relação de tempos é analisada, existe uma diferença estatística entre AP e P20, que é desprezível quando se considera o erro experimental. A relação de tempos não mostrou diferença significativa entre P5, P20 e AP. A relação de tempos é utilizada quando o paciente está fazendo uso de heparina de alto peso molecular (quanto maior for R, mais anticoagulado está o paciente). Para avaliação de coagulopatia, o valor de referência é estabelecido a partir do controle normal.

Os dados obtidos neste estudo mostram que se pode utilizar um pool de plasma, preparado diariamente a partir de amostras com resultados normais, como controle de qualidade interno e substituir o uso do controle comercial normal na realização do TTP.

A proposta do uso de pool de plasma de pacientes normais como controle de qualidade nos testes de TTP pode, portanto, ser empregada em laboratórios de pequeno porte, visto que estes não precisarão mais do que cinco amostras de pacientes normais para a confecção do pool. Laboratórios de grande porte, com rotina elevada, podem utilizar um pool de 20 plasmas normais como controle de qualidade.

  • 1
    ASSESSORIA CIENTÍFICA DO PNCQ. Principais problemas observados nas determinações hematológicas no laboratório clínico Disponível em: <http://www.pncq.org.br/biblioteca/problemas_hematologia.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2010.
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  • Endereço para correspondência:
    Paulo Henrique da Silva
    Av. Lothário Meissner, 632
    Jardim Botânico
    CEP: 80210-170 - Curitiba-PR
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Mar 2011
    • Data do Fascículo
      Fev 2011
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