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Pseudotumor fibroso do cordão espermático: relato de uma lesão infrequente

Fibrous pseudotumor of the spermatic cord: report of an unusual lesion

Resumos

Os pseudotumores fibrosos são lesões incomuns que ocorrem geralmente em resposta a cirurgia, trauma, infecção ou inflamação. Relatamos um caso de paciente com 25 anos de idade que apresentou massa escrotal indolor. Realizou-se orquiectomia radical. O diagnóstico anatomopatológico foi de pseudotumor fibroso do cordão espermático.

Pseudotumor fibroso; Cordão espermático


Fibrous pseudotumors are uncommon lesions that mostly occur in response to surgery, trauma, infection or inflammation. We report the case of 25 year-old patient, who presented painless scrotal mass. A total orchidectomy was performed. The anatomopathological diagnosis was fibrous pseudotumor of the spermatic cord.

Fibrous pseudotumor; Spermatic cord


RELATO DE CASO CASE REPORT

Pseudotumor fibroso do cordão espermático: relato de uma lesão infrequente

Fibrous pseudotumor of the spermatic cord: report of an unusual lesion

Daniel Cury OgataI; Elisiário Pereira NetoII; Daniel Oseias SezerinoII

IMestre em Cirurgia ; patologista do Laboratório PHD - Patologia Humana Diagnóstico; docente do curso de Medicina da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI)

IIPatologista do Laboratório PHD; patologista e docente do curso de Medicina da UNIVALI

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Laboratório PHD Rua Jacob Schimdt, 102/304 CEP: 88330-015 - Balneário Camboriú-SC

RESUMO

Os pseudotumores fibrosos são lesões incomuns que ocorrem geralmente em resposta a cirurgia, trauma, infecção ou inflamação. Relatamos um caso de paciente com 25 anos de idade que apresentou massa escrotal indolor. Realizou-se orquiectomia radical. O diagnóstico anatomopatológico foi de pseudotumor fibroso do cordão espermático.

Unitermos: Pseudotumor fibroso, Cordão espermático

ABSTRACT

Fibrous pseudotumors are uncommon lesions that mostly occur in response to surgery, trauma, infection or inflammation. We report the case of 25 year-old patient, who presented painless scrotal mass. A total orchidectomy was performed. The anatomopathological diagnosis was fibrous pseudotumor of the spermatic cord.

Key words: Fibrous pseudotumor, Spermatic cord

Introdução

O pseudotumor fibroso (PF) é uma rara entidade que se encontra no espectro de lesões paratesticulares benignas(4). Essas lesões situam-se em uma categoria de proliferações pseudotumorais, que podem mimetizar o câncer(6). São consideradas reacionais e o estímulo inicial pode ser trauma, cirurgia, infecção ou inflamação. Geralmente apresenta-se como massa escrotal unilateral em pacientes de todas as idades(5).

Relato de caso

Paciente de 25 anos de idade procurou auxílio médico devido a queixas de massa escrotal indolor, com aumento progressivo no último ano. Não havia indícios clínicos de infecção ou inflamação. A história pregressa era insignificante, não havendo recordação de trauma ou procedimentos cirúrgicos prévios. Os exames laboratoriais foram normais, incluindo os marcadores alfa feto proteína (AFP) e gonodotrofina coriônica humana (HCG). Realizou-se exame ultrassonográfico, que revelou a presença de múltiplas massas isoecoicas na região paratesticular, sendo a maior de 2,5 × 1,2 cm. Observou-se também discreto fluido livre no escroto. O paciente foi submetido à orquiepididectomia e o material enviado para exame anatomopatológico.

Macroscopicamente, o testículo era branco-acinzentado e liso e media 4,2 × 3,5 × 3 cm. O cordão espermático era alongado e repleto de nodulações brancacentas, medindo entre 0,5 e 2,2 cm (Figura 1). A superfície de corte mostrou tecido acinzentado e firme de consistência fibrosa. A microscopia revelou lesão com pouca celularidade, formada por denso estroma colagenoso e moderado infiltrado inflamatório, predominantemente linfoplasmocitário. Foram observados alguns vasos com proliferação miointimal, resultando em redução do calibre vascular. Não havia calcificação distrófica nem do tipo psamomatosa no material examinado (Figura 2). O estudo imuno-histoquímico mostrou discreta positividade para citoceratina, com demais marcadores, entre eles desmina e actina músculo liso, negativos. O diagnóstico final foi PF do cordão espermático.



Discussão

As lesões paratesticulares reúnem todas aquelas que se originam de túnicas vaginal e albugínea, epidídimo e cordão espermático. São localizações incomuns para acometimento de tumores intraescrotais e correspondem a menos de 5% de todos os casos. Nesse grupo, o lipoma constitui a lesão mais comum, sendo seguida pelo PF. Esta última doença tem incidência exata desconhecida, uma vez que existem poucos casos relatados na literatura(5).

O PF pode afetar indivíduos de todas as faixas etárias, tendo como maior pico de incidência a terceira década de vida. Raramente ocorrem em indivíduos com menos de 18 anos de idade(5). A origem dessa proliferação pseudotumoral tem sido relacionada com cirurgia prévia, infecção, inflamação e trauma não detectado ou remoto(3, 5). Alguns agentes infecciosos têm sido associados ao PF, como Epstein-Barr vírus, Mycobacterium avium intracellulare e herpes vírus do tipo 8(3). Acredita-se que a inflamação ou a infecção pode conduzir a um quadro de endarterite, seguido de estreitamento vascular e isquemia. Esta última situação seria a principal responsável pela proliferação miofibroblástica. Da mesma forma, pacientes com história clínica de PFs do cordão espermático tiveram diagnósticos incidentais após herniorrafia abdominal, sugerindo que a isquemia tinha importante papel patogênico(6).

Estudos citogenéticos realizados em alguns PFs (mediastinais e abdominais) têm mostrado anormalidade clonal na região 2p22-24, com quebra na banda p22-24 e específico envolvimento do 2p23. Em alguns casos de PFs, um gene ALK, localizado na fração 2p23, tem sido implicado na patogênese dessa lesão(3). Em outro trabalho, foi observado um número expressivo de plasmócitos com positividade para imunoglobulina G4 (IgG4). Esse dado indica que os PFs podem pertencer ao grupo de doenças IgG4 relatadas, que inclui fibrose retroperitoneal, pancreatite e colangite esclerosante, tireoidite de Riedel e sialoadenite esclerosante(2).

A principal manifestação clínica do PF do cordão espermático é a massa escrotal solitária e indolor. Aproximadamente metade dos casos é acompanhada de hidrocele e 30%, de trauma ou orquiepididimite. A aparência ultrassonográfica dessas lesões é incaracterística, podendo se apresentar como massa única ou múltiplas de variável tamanho e ecogenicidade(5). O fato desses achados serem inespecíficos faz que não seja possível o diagnóstico definitivo no pré-operatório.

O exame anatomopatológico mostra macroscopicamente múltiplos nódulos firmes, brancos ou acinzentados e com tamanhos variados de 0,5 cm a 8 cm(5). Microscopicamente, a lesão é tipicamente composta de denso estroma colagenoso hialinizado, acompanhado de proeminente infiltrado inflamatório crônico, particularmente plasmócitos e mastócitos(4, 5). O componente de células fusiformes tem núcleos balonizados e atípicos. O índice mitótico é variável(4). Infelizmente, a complementação com estudo imuno-histoquímico tem se mostrado limitada. As células fusiformes têm sido positivas para os marcadores actina músculo liso, actina músculo específico, vimentina e, com menor intensidade, desmina(1, 7). A citoqueratina é excepcionalmente expressa(1). A superexpressão da proteína ALK-1 (p80) é observada em aproximadamente 40% dos casos(4).

Várias opções de tratamento clínico têm sido propostas para essas lesões e incluem o uso de imunossupressores, antibióticos e irradiação, com sucesso variável. A regressão espontânea tem sido relatada. Entretanto, a ressecção cirúrgica é definitiva para excluir etiologia maligna para massas escrotais(3). O paciente deste relato, assim como a maioria dos casos descritos na literatura, foi submetido a tratamento cirúrgico.

Em resumo, os PFs da região paratesticular são lesões incomuns, cujo diagnóstico definitivo só pode ser realizado por meio de estudo histológico. A cirurgia é recomendável em todos os casos, uma vez que essas proliferações pseudotumorais podem mimetizar neoplasias malignas.

Primeira submissão em 12/12/10

Última submissão em 12/12/10

Aceito para publicação em 15/05/11

Publicado em 20/08/11

  • 1. ALGABA F. et al Pseudoneoplastic lesions of the testis and paratesticular structures. Virchows, v.451, p.987-97,2007.
  • 2. BÖSMÜLLER, H. et al Paratesticular fibrous pseudotumor - an IgG4-related disorder? Virchows, 2010. [Epub ahead of print]
  • 3. DANGLE, P. P.; WANG, W. P.; POHAR, K. S. Inflammatory myofibroblastic tumor of the epididymis: a case report and review of literature. World J Surg Oncol, v.6, p.119,2008.
  • 4. KIM, N. R. et al Inflammatory pseudotumor of the paratesticular area: a case report. Korean J Pathol, v.38, p.208-11,2004.
  • 5. MEMON, A. A.; SOOMRO, Q. Diffuse fibrous pseudotumor of paratesticular tissue. Journal of Surgery Pakistan, v.14, n.2, p.96-8,2009.
  • 6. MILANEZI, M.; SCHMITT, F. Pseudosarcomatous myofibroblastic proliferation of the spermatic cord (proliferative funiculitis). Histopathology, v.31, n.4, p.387-8,1997.
  • 7. OROSZ, Z.; BESZNYAK, I. Diffuse inflammatory pseudotumor of the testis, the epididymis and the spermatic cord. Pathol Oncol Res, v.1, n.1, p.75-9,1995.
  • Endereço para correspondência:
    Laboratório PHD
    Rua Jacob Schimdt, 102/304
    CEP: 88330-015 - Balneário Camboriú-SC
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Set 2011
    • Data do Fascículo
      Ago 2011

    Histórico

    • Recebido
      12 Dez 2010
    • Aceito
      15 Maio 2011
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