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Bacteriemia por Chryseobacterium indologenes em diabético em hemodiálise ambulatorial

Bacteremia by Chryseobacterium indologenes in a diabetic patient undergoing ambulatory hemodialysis

Resumos

Chryseobacterium indologenes é uma bactéria de baixa virulência, encontrada no meio ambiente, raramente associada às infecções não hospitalares. A maioria das infecções causadas por ela associa-se ao uso de dispositivos invasivos durante a permanência em hospital. O presente relato trata de paciente renal crônico, diabético, apresentando episódios de bacteriemia durante sessões de hemodiálise ambulatorial por meio de cateter permcath.

Chryseobacterium; Infecções oportunistas; Nefropatias diabéticas; Bacteriemia; Diálise renal; Relatos de casos


Chryseobacterium indologenes is a low-virulent bacterium found in the environment, which is rarely associated with non-nosocomial infections. Most infections caused by this pathogen are associated with the use of invasive devices in hospitalized patients. This study reports the case of a diabetic patient with chronic renal disease presenting episodes of bacteremia undergoing ambulatory hemodialysis with permcath catheter.

Chryseobacterium; Opportunistic infections; Diabetic nephropathies; Bacteremia; Renal dialysis; Case reports


RELATO DE CASO CASE REPORT

Bacteriemia por Chryseobacterium indologenes em diabético em hemodiálise ambulatorial

Bacteremia by Chryseobacterium indologenes in a diabetic patient undergoing ambulatory hemodialysis

Marcus Machado Ramos Souza de SouzaI; Cassiano Augusto Braga SilvaII; Edson Luiz PaschoalinIII; José Andrade Moura JúniorIV; Raphael Pereira PaschoalinV; Ernesto Pereira de OliveiraVI

IFarmacêutico bioquímico; diretor técnico do Laboratório do Instituto de Hematologia de Feira de Santana/BA

IIEspecialista em nefrologia; nefrologista do Serviço de Hemodiálise da Clínica Senhor do Bonfim de Feira de Santana/BA

IIIDoutor em Medicina; urologista do Serviço de Hemodiálise da Clínica Senhor do Bonfim de Feira de Santana/BA

IVDoutor em Medicina; nefrologista do Serviço de Hemodiálise da Clínica Senhor do Bonfim de Feira de Santana/BA

VMédico do Serviço de Hemodiálise da Clínica Senhor do Bonfim de Feira de Santana/B

VIMestre em Ciências; professor assistente do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia (UFBA)

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Ernesto Pereira de Oliveira Rua Domingos Barbosa de Araújo, 378 - Kalilândia CEP: 44001-280 - Feira de Santana-BA e-mail: epo@ufba.br

RESUMO

Chryseobacterium indologenes é uma bactéria de baixa virulência, encontrada no meio ambiente, raramente associada às infecções não hospitalares. A maioria das infecções causadas por ela associa-se ao uso de dispositivos invasivos durante a permanência em hospital. O presente relato trata de paciente renal crônico, diabético, apresentando episódios de bacteriemia durante sessões de hemodiálise ambulatorial por meio de cateter permcath.

Unitermos:Chryseobacterium, Infecções oportunistas, Nefropatias diabéticas, Bacteriemia, Diálise renal , Relatos de casos

ABSTRACT

Chryseobacterium indologenes is a low-virulent bacterium found in the environment, which is rarely associated with non-nosocomial infections. Most infections caused by this pathogen are associated with the use of invasive devices in hospitalized patients. This study reports the case of a diabetic patient with chronic renal disease presenting episodes of bacteremia undergoing ambulatory hemodialysis with permcath catheter.

Key words:Chryseobacterium, Opportunistic infections, Diabetic nephropathies, Bacteremia, Renal dialysis, Case reports

Introdução

A diversidade dos agentes etiológicos nos processos infecciosos e de colonização em sítios de indivíduos em ambiente ambulatorial está bem referida na literatura(9), o que vem exigindo atenção e habilidade crescente dos profissionais envolvidos com o diagnóstico.

Chryseobacterium indologenes compõe o grupo dos bacilos Gram-negativos não fermentadores, oxidase positivos. Suas colônias têm bom crescimento em ágar sangue e não se desenvolvem em eosin methylene blue agar (EMB) ou McConkey; são circulares, de bordos bem definidos, mucoides e amareladas. A espécie, desmembrada do gênero Flavobacterium(8), é encontrada no meio ambiente e pode colonizar superfícies e equipamentos nosocomiais, sobretudo os úmidos e de plástico. É pouco patogênica, mas dispõe de alguns fatores de virulência, como a produção de protease e a capacidade de formar biofilme(5-7).

Como principal representante do gênero, Chryseobacterium indologenes está raramente associada às infecções não hospitalares e, mesmo quando relacionada com o nosocômio, inclusive com algum surto relatado(3), seu isolamento é pouco referido, representando 0,03% dos relatos do SENTRY entre 1997 e 2001(4). As infecções mais comuns são as da corrente sanguínea, especialmente as associadas ao cateter, as intra-abdominais e as de feridas cirúrgicas. Como esperado, os casos são mais frequentes em indivíduos com patologias de base imunodepressora ou em terapias imunossupressoras(7).

O caso que se descreve foi diagnosticado em um paciente diabético, portador de insuficiência renal crônica em programa regular de hemodiálise ambulatorial, com síndrome febril no período de junho a setembro de 2010. O termo de consentimento livre e esclarecido foi concedido pelo indivíduo e o estudo foi registrado no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Feira de Santana (CEP/UEFS).

Caso clínico

L.P.S., 60 anos, sexo masculino, sabidamente portador de diabetes mellitus tipo 2 há aproximadamente 20 anos, em esquema de hemodiálise desde fevereiro de 2003. Foi transferido diversas vezes entre os serviços de hemodiálise de São Paulo/SP e Feira de Santana/BA, por vontade própria e por motivos familiares. Dialisava por fístula arteriovenosa (FAV) até novembro de 2009, quando, perdendo a FAV, implantou um cateter de longa permanência, o permcath, em veia subclávia esquerda. Até 29 de junho de 2010, quando se isolou Chryseobacterium indologenes em hemocultura, apresentou alguns episódios sugestivos de bacteriemia durante sessões de hemodiálise, sempre tratados no momento com antibióticos e mantidos em uso domiciliar. As drogas utilizadas foram cefazolina, cefepima, amicacina, ciprofloxacina e vancomicina. Nesse período, em alguns desses episódios, evidenciaram-se os agentes causais Escherichia coli e Klebsiella pneumoniae. Em nenhum momento houve alteração significativa do leucograma ou do ecocardiograma, exames realizados em 5 de maio e 30 de agosto de 2010 para excluir possível endocardite.

Em 29 de junho de 2010, durante sessão de hemodiálise em que o paciente apresentou calafrios, colheu-se amostra de sangue para hemocultura com o intuito de estabelecer o agente etiológico. O crescimento foi detectado após três dias de incubação e o repique em ágar sangue revelou crescimento de colônias com morfologia típica de Chryseobacterium, inclusive oxidase positivas, identificadas como Chryseobacterium indologenes por meio do sistema API® (BioMérieux, Durham, NC), com galeria de auxotipagem ID32GN® e com 99,9% de concordância (Figura). Haja vista a disponibilidade de somente uma amostra de hemocultura, a análise de consistência do achado demandou a consideração dos dados clínicos e epidemiológicos do indivíduo para validar o resultado como significativo.


Apesar de não existirem padrões definidos para a realização e a interpretação de teste de sensibilidade a antimicrobianos (TSA), realizou-se o teste pelo método de disco-difusão de Kirby-Bauer, que demonstrou sensibilidade às quinolonas e aos carbapenêmicos, assim como às cefalosporinas de terceira e quarta gerações. Além dos aminoglicosídeos e das cefalosporinas de primeira e segunda gerações, também foi resistente às associações com inibidores de betalactamases, o que é concordante com o que cita a literatura(2, 4).

Com base no resultado da hemocultura e do TSA, decidiu-se pela manutenção da antibioticoterapia com ciprofloxacina e, como não houve melhora dos parâmetros clínicos associados, optou-se pela retirada do permcath em 3 de setembro, isolando também, em sua cultura quantitativa, o Chryseobacterium indologenes. Desde então, após implante de cateter duplo lúmen em veia femural, o indivíduo mantém quadro clínico estável sem qualquer sinal de infecção.

Discussão

A constatação de melhora clínica depois da retirada do permcath, assim como o isolamento do microrganismo a partir de cultura do cateter, permite inferir que os episódios de bacteriemia resultavam da colonização do cateter por Chryseobacterium indologenes, que conta com a capacidade de formação de biofilme como um de seus fatores de virulência.

Tal desfecho vai ao encontro do que descrevem Akay et al.(1) em um caso de indivíduo transplantado hospitalizado, em que bacteriemia associada a cateter por Chryseobacterium indologenes é uma condição grave, a qual não se resolve apenas com o uso de antibiótico, necessitando-se da retirada do cateter, sobretudo quando os pacientes envolvidos são imunocomprometidos.

Em situações como a descrita, a frequência crescente de infecções causadas por microrganismos oportunistas ou exóticos se deve, ao menos em parte, à ampliação da diversidade de intervenções e tratamentos de saúde em ambiente ambulatorial ou semi-hospitalar, bem como ao aumento da expectativa de vida dos indivíduos imunocomprometidos ou imunossuprimidos. Tal realidade exige dos serviços de saúde maior atenção ao possível envolvimento desses agentes de menor virulência ou de menor frequência, bem como para análise mais apurada da consistência desses achados e de evidências para a melhor definição de estratégia terapêutica.

  • 1. AKAY, M.; GUNDUZ, E.; GULBAS, Z. Catheter-related bacteremia due to Chryseobacterium indologenes in a bone marrow transplant recipient. Bone Marrow Transplantation, v. 37, p. 435-6, 2006.
  • 2. FERREIRA, R. S.; BRANDÃO, F. F. B.; LOBO, S. M. Infecção por Chryseobacterium indologenes: relato de um caso. Rev Bras Ter Intensiva, v. 22, n. 1, p. 96-8, 2010.
  • 3. HSUEH, P. R. et al. Increasing incidence of nosocomial chryseobacterium indologenes infections in Taiwan. Eur J Clin Microbiol Infect Dis, v. 16, p. 568-74, 1997.
  • 4. KIRBY, J. T. et al. Antimicrobial susceptibility and epidemiology of a worldwide collection of Chryseobacterium spp.: report from the SENTRY antimicrobial surveillance program (1997-2001). J Clin Microbiol, v. 42, n. 1, p. 445-8, 2004.
  • 5. LU, P. C.; CHAN, J. C. Flavobacterium indologenes keratitis. Opthalmologica, v. 211, p. 98-100, 1997.
  • 6. PAN, H. J. et al. High protease activity of Chryseobacterium indologenes isolates associated with invasive infection. J Microbiol Immunol Infect, v. 33, n. 4, p. 223-6, 2000.
  • 7. SAKURADA, A. Z. Chryseobacterium indologenes Rev Chil Infect, v. 25, n. 6, p. 446, 2008.
  • 8. VANDAMME, P. et al. New perspectives in the classification of the flavobacteria: description of Chryseobacterium gen. nov., Bergeyella gen. nov., and Empedobacter norn. rev. Int J Syst Bacteriol, v. 44, n. 4, p. 827-31, 1994.
  • 9. VERONESI, R.; FOCACCIA, R. Tratado de infectologia 3. ed. São Paulo: Atheneu, 2006.
  • Endereço para correspondência
    Ernesto Pereira de Oliveira
    Rua Domingos Barbosa de Araújo, 378 - Kalilândia
    CEP: 44001-280 - Feira de Santana-BA
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Mar 2012
    • Data do Fascículo
      Fev 2012
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