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Tratamento de aneurisma da artéria renal por embolização e técnica de remodelamento de colo: relato de caso

Endovascular treatment of renal artery utilizing embolization and aneurism neck remodeling technique: case report

Resumos

O tratamento endovascular dos aneurismas de artéria renal tem sido descrito como alternativa à cirurgia convencional. Relatamos o caso de uma paciente com um aneurisma de artéria renal complexo à direita que apresentava hipertensão arterial de difícil controle. O tratamento endovascular foi realizado com a técnica de remodelagem de colo (técnica de Moret), ou técnica de embolização assistida por balão. A paciente obteve normalização da pressão arterial após o procedimento sem recidiva dos sintomas ou necessidade do uso de drogas anti-hipertensivas.

Aneurisma; artéria renal; procedimentos endovasculares


Endovascular treatment of renal artery aneurysms has been described as an alternative to conventional surgery. We report the case of a patient with complex renal artery aneurysm on the right kidney who had hard-to-control arterial hypertension. Endovascular treatment was performed with the aneurysm neck remodeling technique (Moret technique), or balloon-assisted coil embolization. The patient achieved blood pressure normalization after the procedure without recurrence of symptoms or need for antihypertensive drugs.

Aneurysm; renal artery; endovascular procedures


RELATO DE CASO

Tratamento de aneurisma da artéria renal por embolização e técnica de remodelamento de colo: relato de caso

Endovascular treatment of renal artery utilizing embolization and aneurism neck remodeling technique: case report

Luis Carlos Mendes de BritoI; João de Toledo MartinsII; Eliane PassosIII; Amanda Jardim dos SantosIV; Rodrigo Assad Diniz da GamaIV; Gabriela Ximenes FurlaniV

IRadiologista Intevencionista e Cirurgião Vascular do Hospital Santa Lucinda, do Centro de Ciências Médicas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), do Serviço de Hemodinâmica e Arteriografia Digital do Hospital Evangélico de Sorocaba e do Hospital da Unimed de Sorocaba, Sorocaba (SP), Brasil

IIRadiologista Intervencionista do Hospital Santa Lucinda do Centro de Ciências Médicas e da Saúde da PUC-SP, do Serviço de Hemodinâmica e Arteriografia Digital do Hospital Evangélico de Sorocaba e do Hospital da Unimed de Sorocaba, Sorocaba (SP), Brasil

IIIClínica Geral e Cardiologista do Hospital Unimed de Sorocaba, Sorocaba (SP), Brasil

IVAcadêmica do curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da PUC-SP, Sorocaba (SP), Brasil

VAcadêmica do Curso de Medicina da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID), São Paulo (SP), Brasil

Correspondência Correspondência: Amanda Jardim dos Santos Rua Padre Clemente Marton Segura, 94 - Cidade Nova CEP 15085-480 - São José do Rio Preto (SP), Brasil E-mail: amandajardimsa@gmail.com

RESUMO

O tratamento endovascular dos aneurismas de artéria renal tem sido descrito como alternativa à cirurgia convencional. Relatamos o caso de uma paciente com um aneurisma de artéria renal complexo à direita que apresentava hipertensão arterial de difícil controle. O tratamento endovascular foi realizado com a técnica de remodelagem de colo (técnica de Moret), ou técnica de embolização assistida por balão. A paciente obteve normalização da pressão arterial após o procedimento sem recidiva dos sintomas ou necessidade do uso de drogas anti-hipertensivas.

Palavras-chave: Aneurisma; artéria renal; procedimentos endovasculares.

ABSTRACT

Endovascular treatment of renal artery aneurysms has been described as an alternative to conventional surgery. We report the case of a patient with complex renal artery aneurysm on the right kidney who had hard-to-control arterial hypertension. Endovascular treatment was performed with the aneurysm neck remodeling technique (Moret technique), or balloon-assisted coil embolization. The patient achieved blood pressure normalization after the procedure without recurrence of symptoms or need for antihypertensive drugs.

Keywords: Aneurysm; renal artery; endovascular procedures.

Introdução

Os aneurismas de artéria renal (AAR) constituem 22% dos aneurismas viscerais1 e 1% de todos os aneurismas2,3. O tratamento cirúrgico é frequentemente complexo, principalmente se os aneurismas forem intraparenquimatosos ou acometerem a bifurcação da artéria renal. A conduta mais comum é a aneurismectomia combinada com a arterioplastia ou ponte aorto-renal. A aneurismectomia pode ser realizada com sucesso em mais de 95% dos casos de aneurismas extraparenquimatosos, enquanto que, em certos tipos de aneurismas intraparenquimatosos ou que acometem a bifurcação da artéria renal, a aneurismectomia pode levar à nefrectomia parcial ou total. Recentemente, o tratamento endovascular tem sido empregado, principalmente para os aneurismas complexos, evitando infartos segmentares renais e nefrectomias4,5. O advento de microcateteres, fios-guias e diversos materiais embólicos, usados originalmente na Neurorradiologia intervencionista, possibilitou uma embolização mais seletiva, mesmo em lesões mais complexas de artéria renal e de colo largo6.

A técnica de Moret ou técnica de remodelagem de colo consiste na embolização assistida por balão. Trata-se de técnica amplamente utilizada no tratamento de aneurismas intracranianos de colo largo e que, atualmente, tem sido realizada com sucesso no tratamento de aneurismas complexos da artéria renal7.

Relatamos o caso de uma paciente em que se realizou o tratamento endovascular com técnica de microcatéter assistida por balão com colocação de microcoils em aneurisma saculiforme da bifurcação da artéria renal direita, com preservação do fluxo sanguíneo renal.

Descrição do caso

Mulher branca, 56 anos, encaminhada com quadro de hipertensão arterial de difícil controle há 26 anos, mesmo com o uso de 4 drogas anti-hipertensivas e tentativas de troca de drogas sem melhora. Apresentava diabetes melito e obesidade (índice de massa corporal >30). No último ano, apresentou piora progressiva e descontrole da doença, com quadro de cefaleia noturna e hipertensão arterial grave, indicando-se, então, tratamento intervencionista. A pressão arterial no pré-operatório era de 220/110 (medida em membro superior direito e esquerdo). Medicamentos em uso: irbesartana 300 mg, hidroclorotiazida 25 mg, atenolol 50 mg, enalapril 10 mg, metformina 850 mg, glimeperida 2 mg. Realizou-se ultrassom Doppler, sugerindo estenose maior que 70% em artéria renal direita. A arteriografia demonstrou aneurisma saculiforme de 9 mm de diâmetro em artéria renal direita na sua bifurcação (Figura 1). Apresentava creatinina sérica de 1,2 mg/dL, proteinúria de 137 mg, ureia 41 mg/dL, clearance de creatinina 76 mL/min.


Decidiu-se realizar embolização com a técnica de remodelamento de colo (técnica de Moret). A artéria renal foi cateterizada com cateter guia RDC 7F e, através dele, foram passadas duas microguias 0,014 inc, uma para a artéria de maior calibre, que direcionou e posicionou o balão para o remodelamento do colo (Hiperglide EV3 de 6 mm), e a outra foi posicionada dentro do saco aneurismático e utilizada para levar o microcateter Excel 10 para dentro do saco. O balão foi insuflado até 4 mm e, em seguida, através do microcateter, preencheu-se o saco aneurismático com 6 micromolas de largagem controlada (GDC Boston Scientific, Natick, MA, USA) (Figura 2). Após o preenchimento do aneurisma, o balão foi esvaziado e retirado. Realizou-se angiografia de controle após o procedimento, que demonstrou a exclusão do saco aneurismático, com a artéria renal e seus ramos pérvios e com bom nefrograma, sem áreas de isquemia (Figura 3). Imediatamente após a realização do procedimento, a paciente já se encontrava normotensa. Durante um ano de acompanhamento clínico, até este momento, não houve recidivas dos sintomas, nem a necessidade do uso de anti-hipertensivos.



Discussão

Os AAR, apesar de representarem patologia pouco usual, constituem 22% dos aneurismas viscerais. Seu achado é frequentemente incidental em estudos por imagem durante investigação de doenças como a hipertensão, especialmente. Esses aneurismas são mais prevalentes no sexo feminino, a maioria é sacular e não calcificada, ocorrendo com maior frequencia na bifurcação da artéria renal principal7. Tem como causas: doenças degenerativas (aterosclerose e displasia fibromuscular), vasculites, trauma, origem idiopática, neoplasias, iatrogenia aneurismas micóticos e outras causas em menor frequencia. Os AAR associam-se à hipertensão arterial em até 70% dos casos8, podendo apresentar origem renovascular devido a certas causas, dentre elas, embolização, compressão extrínseca e tortuosidade da artéria adjacente9,10. Outras complicações associadas aos AAR consistem em dissecção, infarto renal e fístula arteriovenosa. A indicação do tratamento deve levar em consideração a idade do paciente, sexo, idade fértil para as mulheres, presença de sintomas, hipertensão grave associada, características anatômicas do aneurisma, ruptura, tamanho, expansão e embolização distal. Frequentemente, aneurismas maiores que 20 mm de diâmetro têm sido indicados para o tratamento cirúrgico ou endovascular; entretanto, há relatos de ruptura em aneurismas com diâmetros inferiores8,11-14.

Devido ao fato de os AAR terem uma tendência de ocorrer na bifurcação da artéria renal principal, a oclusão da artéria renal durante procedimento cirúrgico convencional ou utilização de endoprótese pode levar a infarto significativo do parênquima renal. Com o desenvolvimento de microcateteres e microguias, utilizados originalmente em Neurorradiologia, aneurismas saculares complexos podem ser excluídos seletivamente e com maior segurança, sem o comprometimento do parênquima renal.

A técnica de remodelamento do colo, assistida por balão, foi descrita por Moret et al.11. Consiste no uso de microcateter com balão, o qual oclui temporariamente o colo aneurismático durante a colocação das micromolas, funcionando como barreira contra a migração para a artéria adjacente, além de proporcionar estabilidade ao microcateter.

Abath et al.6 descreveram a técnica assistada por balão e classificaram os AAR de acordo com as melhores alternativas para o tratamento endovascular. Na classificação, o tipo I (aneurismas saculares da artéria renal principal) teria como indicação o implante de stent recoberto ou com colocação de micromolas; o tipo II (aneurismas da bifurcação da artéria renal), a liberação de micromolas por meio da técnica de remodelagem, complementadas ou não com agentes embólicos líquidos, e o tipo III (aneurismas de pequenos ramos segmentares intraparenquimatosos), a oclusão da artéria nutridora com micromolas ou agentes líquidos6.

Conclusão

O tratamento endovascular de AAR a longo prazo ainda não está bem estabelecido, apesar da melhora dos controles pressóricos da paciente após a exclusão do aneurisma. Não se sabe sobre a possibilidade de recidiva dos sintomas ou expansão desses aneurismas. Entretanto, a técnica de micromolas associada à técnica assistida com balão está bem estabelecida na literatura e possui eficácia e segurança comprovadas no tratamento de aneurismas intracranianos, podendo ser facilmente adaptada para o tratamento bem sucedido de aneurismas da artéria renal complexos.

Submetido em: 11.08.2010

Aceito em: 18.05.2011

Não foram declarados conflitos de interesse associados à publicação deste artigo.

Contribuições dos autores:

Concepção e desenho do estudo: LCMB, JTM, AJS, RADG

Análise e interpretação dos dados: LCMB, JTM, AJS, RADG

Coleta de dados: LCMB, EP, AJS, RADG

Redação do artigo: LCMB, AJS, RADG, GXF

Revisão crítica do texto: LCMB, AJS, RADG

Aprovação final do artigo*: LCMB, JTM, AJS, RADG, GXF

Análise estatística: N/A

Responsabilidade geral pelo estudo: LCMB

Informações sobre financiamento: N/A

*Todos os autores leram e aprovaram a versão submetida ao J Vasc Bras.

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  • Correspondência:
    Amanda Jardim dos Santos
    Rua Padre Clemente Marton Segura, 94 - Cidade Nova
    CEP 15085-480 - São José do Rio Preto (SP), Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Ago 2011
    • Data do Fascículo
      Jun 2011

    Histórico

    • Aceito
      18 Maio 2011
    • Recebido
      11 Ago 2010
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