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Aneurisma de enxerto de veia safena após reconstrução arterial: relato de caso

Resumos

A veia safena magna é usualmente utilizada como conduto em derivações vasculares. Sua degeneração e dilatação aneurismática são raras e têm causas desconhecidas. Este relato trata-se de um paciente masculino de 32 anos, hígido, que evolui, 19 anos depois de uma reconstrução arterial com enxerto venoso, com o aneurisma do enxerto. Foi tratado com substituição do mesmo por prótese de PTFE, evoluindo sem intercorrências. A microscopia mostrou área de dissecção da parede do enxerto com deposição de células espumosas.

aneurisma; veia safena; enxerto vascular


The saphenous vein is usually used as a conduit in vascular bypass. Its degeneration and aneurysm are rare and have unknown causes. This report comes from a male patient 32 years old, healthy, evolving, 19 years later of an arterial reconstruction with venous graft with the aneurysm of this graft. He was treated with replacement of it by PTFE bypass, evolving without complications. Microscopy showed dissection area of the graft wall with deposition of foam cells.

aneurysm; saphenous vein; vascular grafting


RELATO DE CASO

Aneurisma de enxerto de veia safena após reconstrução arterial: relato de caso

Aneurysm of saphenous vein graft after arterial reconstruction: case report

Milton Alves das Neves JuniorI; Rafael Couto MeloII; Catarina Coelho de AlmeidaII; Allison Roxo FernandesII; Alexandre PetnysI; Maria Lucia Sayuri IwasakiI; Juliana PettinatiIII; Edgar RaboniIV

ICirurgiões Vasculares; médicos assistentes do Hospital do Servidor Público Municipal - São Paulo (SP), Brasil

IICirurgiões Vasculares; ex-residentes do Hospital do Servidor Público Municipal - São Paulo (SP), Brasil

IIIPatologista do Hospital do Servidor Público Municipal - São Paulo (SP), Brasil

IVCirurgião Vascular; chefe do Serviço de Cirurgia Vascular do Hospital do Servidor Público Municipal - São Paulo (SP), Brasil

Correspondência Correspondência: Milton Alves das Neves Junior Serviço de Cirurgia Vascular do Hospital do Servidor Municipal de São Paulo Rua Castro Alves, 60 - Liberdade CEP: 01532-090 - São Paulo (SP), Brasil E-mail: miltonanj@yahoo.com.br

RESUMO

A veia safena magna é usualmente utilizada como conduto em derivações vasculares. Sua degeneração e dilatação aneurismática são raras e têm causas desconhecidas. Este relato trata-se de um paciente masculino de 32 anos, hígido, que evolui, 19 anos depois de uma reconstrução arterial com enxerto venoso, com o aneurisma do enxerto. Foi tratado com substituição do mesmo por prótese de PTFE, evoluindo sem intercorrências. A microscopia mostrou área de dissecção da parede do enxerto com deposição de células espumosas.

Palavras-chave: aneurisma; veia safena; enxerto vascular.

ABSTRACT

The saphenous vein is usually used as a conduit in vascular bypass. Its degeneration and aneurysm are rare and have unknown causes. This report comes from a male patient 32 years old, healthy, evolving, 19 years later of an arterial reconstruction with venous graft with the aneurysm of this graft. He was treated with replacement of it by PTFE bypass, evolving without complications. Microscopy showed dissection area of the graft wall with deposition of foam cells.

Keywords: aneurysm; saphenous vein; vascular grafting.

Introdução

A veia safena magna é usualmente utilizada como conduto em derivações vasculares, sendo considerada, pela maioria dos cirurgiões, o melhor e mais duradouro substituto arterial nas posições infra-inguinais. Sua degeneração e formação de aneurismas verdadeiros são extremamente raras1.

A causa dessa degeneração ainda permanece desconhecida1,2, sendo sugerida por alguns autores como aterosclerótica3 ou como um processo de dilatação global dos vasos4 em pacientes acometidos. Em estudos histopatológicos, foram notadas lesões proliferativas e fibróticas da íntima que levaram ao enfraquecimento da parede venosa e, assim, favorecendo a formação do aneurisma do enxerto5.

A dilatação aneurismática da veia safena magna, quando utilizada em pontes aorto-coronárias, é a mais citadas na literatura5,6. Entretanto, relatos de pontes aorto-renais7, ilíaco-femorais8, carótido-carotídeas9 e infra-inguinais1,2 com esta mesma ocorrência também são descritas.

A maioria dos pacientes evolui de forma assintomática. Podem cursar como uma massa pulsátil quando o enxerto encontra-se em posição superficial. Da mesma forma que os aneurismas arteriais verdadeiros, podem apresentar sintomas compressivos.

Se não tratados, os aneurismas verdadeiros de enxerto venoso tendem a complicar com sua ruptura ou mesmo formação de fistulas com órgãos adjacentes7 levando a quadros potencialmente fatais.

Relato de caso

Paciente masculino, 32 anos, casado, treinador de time de futebol, hígido. De antecedentes, refere hipertensão arterial sistêmica controlada; nega tabagismo, etilismo, diabetes ou dislipidemia. Há 19 anos foi submetido, em outro serviço, a enxerto fêmoro-femoral superficial à esquerda com veia safena contralateral reversa devido a ferimento por arma de fogo com lesão da artéria femoral superficial. Há três meses, notou aparecimento de massa pulsátil em coxa esquerda, sob a incisão da cirurgia prévia. A massa era indolor e de crescimento lento. O paciente negava claudicação ou história de trauma local. Ao exame físico, apresentava pulsos femorais, poplíteos, tibiais posteriores e pediosos 4+ bilateralmente, com boa perfusão dos membros. Notava-se massa pulsátil de aproximadamente 3 x 3 cm de diâmetro na região anteromedial da coxa esquerda, sob o trajeto vascular. O paciente foi submetido à ultrassonografia com doppler (Figura 1) que evidenciou uma dilatação aneurismática do enxerto venoso prévio de 3,78 cm no seu maior diâmetro, com fluxo e trombos em seu interior. Realizada a arteriografia do membro inferior esquerdo (Figura 1), que confirmou a presença da dilatação aneurismática do enxerto, sem quaisquer outras alterações sugestivas de aterosclerose ou aneurismas em outros sítios. O paciente foi submetido então à cirurgia, com a ressecção do aneurisma do enxerto e reconstrução arterial com enxerto fêmoro-femoral superficial esquerdo com prótese de PTFE 7 mm (Figura 2). Ao término da cirurgia, o paciente já apresentava todos os pulsos presentes, com boa perfusão do membro; evoluiu sem intercorrências pós-operatórias recebendo alta hospitalar no quinto dia pós-operatório. O retorno ao ambulatório aconteceu em dez dias, e a ferida operatória estava em ótimo estado, sendo retirados os pontos. Em 30 dias, o paciente voltou a suas atividades habituais, sem limitações. No retorno de 90 dias, apresentava-se bem, sem queixas, todos os pulsos presentes e ótima perfusão do membro. O exame histológico da peça (Figura 3) evidenciou área de dissecção médio-intimal do enxerto, com deposição de histiócitos espumosos, fibrina e colágeno, sugerindo assim a causa da dilatação aneurismática.




Discussão

Os aneurismas de enxertos venosos com veia safena são bastante raros em nosso meio1,2,6,9. A literatura atual dispõe apenas de relatos de casos sobre o assunto, impossibilitando dados consistentes sobre sua etiologia e evolução clínica.

Cassina et al.3 afirmaram que a doença aneurismática de enxertos venosos é causada pela progressão da aterosclerose, com depósitos de colesterol subendoteliais e formações de células espumosas, mas que outros fatores etiopatogênicos poderiam estar envolvidos.

Corriere et al.2 referem-se à raridade desta doença e relataram a presença de inflamação e degeneração médio-intimal na parede do enxerto analisado.

Recentemente, Bikk et al.1 referiram-se à origem aterosclerótica de um aneurisma de enxerto com veia safena reversa em posição fêmoro-poplítea e ainda ressaltam a importância do tratamento adequado prevenindo-se a ruptura dos mesmos.

Nishibe et al.4, em 2004, relataram um caso em que o aneurisma do enxerto venoso é visto como parte de uma doença sistêmica. A análise da parede da veia dilatada mostrava apenas o processo degenerativo sem evidências de aterosclerose.

Em nosso relato, mostramos um caso de diagnóstico relativamente simples e de evolução lenta. Talvez o grande diagnóstico diferencial a ser feito fosse o pseudoaneurisma anastomótico, entidade mais frequente que os aneurismas verdadeiros de enxertos venoso.

Os exames complementares baseiam-se na ultrassonografia color doppler, que confirma a suspeita diagnóstica e a arteriografia e permite o planejamento cirúrgico adequado fornecendo informações importantes da árvore arterial do membro.

A substituição do enxerto venoso por uma prótese plástica foi a opção de escolha neste caso, na tentativa de evitar nova dilatação venosa nesta posição. Atenção especial deve ser dada à dificuldade técnica de uma reoperação com fibrose e aderências perienxerto. Isso evita lesões de estruturas adjacentes e ruptura intraoperatória do aneurisma.

A análise microscópica da peça mostrou a parede do vaso infiltrada por células espumosas a partir de um ponto de dissecção. Acreditamos que estes eventos possam ter causado o enfraquecimento da parede venosa, levando à dilatação do enxerto.

Submetido em: 30.08.10.

Aceito em: 02.08.11

Fonte de financiamento: nenhuma.

Conflito de interesses: nada a declarar.

Contribuições dos autores

Concepção e desenho do estudo: MANJ

Análise e interpretação dos dados: MANJ, RCM, CCA, ARF, JP

Coleta de dados: MANJ, RCM, CCA, ARF

Redação do artigo: MANJ, RCM, CCA, ARF, AP, MLSI, ER

Revisão crítica do texto: AP, MLSI, ER

Aprovação final do artigo*: MANJ, RCM, CCA, ARF, AP, MLSI, ER, JP

Análise estatística: não se aplica

Responsabilidade geral pelo estudo: MANJ

*Todos os autores leram e aprovaram a versão final submetida ao J Vasc Bras.

Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia Vascular do Hospital do Servidor Público Municipal - São Paulo (SP), Brasil.

  • 1. Bikk A, Rosenthal MD, Wellons ED, et al. Atherosclerotic aneurysm formation in a lower extremity saphenous vein graft. Vascular. 2006;14(3):173-6.
  • 2. Corriere MA, Passman MA, Guzman RJ, et al. Mega-aneurysmal degeneration of a saphenous vein graft following infrainguinal bypass. A case report. Vasc Endovascular Surg. 2004;38(3):267-71.
  • 3. Cassina PC, Hailemariam S, Schmid RA, et al. Infrainguinal aneurysm formation in arterialized autologous saphenous. J Vasc Surg. 1998;28(5):944-8.
  • 4. Nishibe T, Muto A, Kaneko K, et al. True aneurysms in a saphenous vein graft placed for repair of a popliteal aneurysm: etiologic considerations. Ann Vasc Surg. 2004;18(6):747-9.
  • 5. Memon AQ, Huang RI, Marcus F, et al. Saphenous vein graft aneurysm: case report and review. Cardiol Rev. 2003;11(1):26-34.
  • 6. Levy MM, Kiang W, Johnson JM, et al. Saphenous vein graft aneurysm with graft-enteric fistula after renal artery bypass. J Vasc Surg. 2008;48(3):738-40.
  • 7. Flores J, Shiiya N, Takashi K, et al. True aneurysm of an ilio-femoral saphenous vein graft. J Cardiovasc Surg (Torino). 2005;46(2):182-3.
  • 8. Souza LCG, Rojas SO, Mazzieri R, et al. Aneurisma em ponte de veia safena para artéria coronária marginal esquerda, roto para o brônquio esquerdo. Rev Bras Cir Cardiovasc. 1996;11(4):311-3.
  • 9. Nishinari K, Wolosker N, Yazbek G, et al. Covered stent treatment for an aneurysm of a saphenous vein graft to the common carotid artery. Ann Vasc Surg. 2010;24(7):954.e9-954.e12.
  • Correspondência:

    Milton Alves das Neves Junior
    Serviço de Cirurgia Vascular do Hospital do Servidor Municipal de São Paulo
    Rua Castro Alves, 60 - Liberdade
    CEP: 01532-090 - São Paulo (SP), Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Recebido
      30 Ago 2010
    • Aceito
      02 Ago 2011
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