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Síndrome do desfiladeiro torácico - ressecção de costela cervical por videotoracoscopia

Thoracic outlet syndrome - cervical rib resection through videothoracoscopic surgery

Resumos

A base do tratamento cirúrgico da Síndrome do Desfiladeiro Torácico (SDT) é a ressecção da primeira costela, podendo associar-se à escalenectomia ou ainda à ressecção de costela cervical. Esta última é feita tradicionalmente por meio de um acesso supraclavicular ou mesmo axilar, o qual é tecnicamente mais trabalhoso. Pode ser realizada também por meio de acesso paraescapular. Embora tecnicamente atrativa e associada à menor invasividade e maior segurança, com ótimo resultado estético, a ressecção da primeira costela torácica, por intermédio de cirurgia videoassistida transaxilar ou pela técnica videotoracoscópica, é pouco relatada na literatura, e nenhuma referência foi encontrada sobre ressecção de costela cervical mediante essa técnica. Neste artigo, apresentamos essa inovação cirúrgica realizada com sucesso para ressecção de costela cervical em duas pacientes.

cirurgia vídeo-assistida; costela cervical; Síndrome do Desfiladeiro Torácico; Síndromes de Compressão Nervosa


The basis of Thoracic Outlet Syndrome (TOS) surgical treatment is the first rib resection and may be associated with scalenectomy or cervical rib resection. The latter is traditionally done through a supraclavicular or axillary access, which is the most technically challenging. It can also be achieved through parascapular access. Although technically attractive and associated with less invasiveness and increased security, with excellent aesthetic results, the first thoracic rib resection via video-assisted transaxillary surgery or videothoracoscopic technique is seldom reported in the literature, and no reference was found on cervical rib resection through this technique. In this article, we introduced this innovation successfully performed for surgical cervical rib resection in two patients.

video-assisted surgery; cervical rib; Thoracic Outlet Syndrome; Nerve Compression Syndromes


ARTIGO DE INOVAÇÃO

Síndrome do desfiladeiro torácico – ressecção de costela cervical por videotoracoscopia

Thoracic outlet syndrome – cervical rib resection through videothoracoscopic surgery

Mario Claudio GhefterI; Winston Bonetti YoshidaII; Daniele Cristina CataneoIII; Erica Nishida HasimotoIV; Ricardo Alvarenga YoshidaV; Paulo Cesar Buffara BoscardimVI; Antonio José Maria CataneoVII

IDiretor do Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo (HSPE) – São Paulo (SP), Brasil

IIProfessor Titular da Disciplina de Cirurgia Vascular do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu; e Professor do Programa de Pós-graduação em Bases Gerais da Cirurgia da Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho" (UNESP) – São Paulo (SP), Brasil

IIIProfessora Assistente Doutora da Disciplina de Cirurgia Torácica do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu; Professora do Programa de Pós-graduação em Bases Gerais da Cirurgia da UNESP – São Paulo (SP), Brasil

IVProfessora Substituta da Disciplina de Cirurgia Torácica do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu; Pós-graduanda do Programa de Pós-graduação em Bases Gerais da Cirurgia da UNESP – São Paulo (SP), Brasil

VCirurgião Vascular; Doutor Egresso do Programa de Pós-graduação em Bases Gerais da Cirurgia da UNESP – São Paulo (SP), Brasil

VIResponsável pelo Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR) – Paraná (PR), Brasil

VIIProfessor Titular da Disciplina de Cirurgia Torácica do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu; Professor do Programa de Pós-graduação em Bases Gerais da Cirurgia da UNESP – São Paulo (SP), Brasil

Correspondência Correspondência Mario Claudio Ghefter Rua Pedro de Toledo 1800, 10 º andar CEP 04039-901 – São Paulo (SP), Brasil E-mail: ghefter@me.com

RESUMO

A base do tratamento cirúrgico da Síndrome do Desfiladeiro Torácico (SDT) é a ressecção da primeira costela, podendo associar-se à escalenectomia ou ainda à ressecção de costela cervical. Esta última é feita tradicionalmente por meio de um acesso supraclavicular ou mesmo axilar, o qual é tecnicamente mais trabalhoso. Pode ser realizada também por meio de acesso paraescapular. Embora tecnicamente atrativa e associada à menor invasividade e maior segurança, com ótimo resultado estético, a ressecção da primeira costela torácica, por intermédio de cirurgia videoassistida transaxilar ou pela técnica videotoracoscópica, é pouco relatada na literatura, e nenhuma referência foi encontrada sobre ressecção de costela cervical mediante essa técnica. Neste artigo, apresentamos essa inovação cirúrgica realizada com sucesso para ressecção de costela cervical em duas pacientes.

Palavras-chaves: cirurgia vídeo-assistida; costela cervical; Síndrome do Desfiladeiro Torácico; Síndromes de Compressão Nervosa.

ABSTRACT

The basis of Thoracic Outlet Syndrome (TOS) surgical treatment is the first rib resection and may be associated with scalenectomy or cervical rib resection. The latter is traditionally done through a supraclavicular or axillary access, which is the most technically challenging. It can also be achieved through parascapular access. Although technically attractive and associated with less invasiveness and increased security, with excellent aesthetic results, the first thoracic rib resection via video-assisted transaxillary surgery or videothoracoscopic technique is seldom reported in the literature, and no reference was found on cervical rib resection through this technique. In this article, we introduced this innovation successfully performed for surgical cervical rib resection in two patients.

Keywords: video-assisted surgery; cervical rib; Thoracic Outlet Syndrome; Nerve Compression Syndromes.

Introdução

A abertura superior do tórax é delimitada em sua base pela primeira costela, pela face anterolateral do corpo da primeira vértebra torácica (T1) e pela borda superior do manúbrio esternal. O desfiladeiro torácico inclui três espaços estreitos (por isso o nome desfiladeiro) que se estendem da abertura do tórax até a região axilar. A porção proximal desse desfiladeiro inclui o triângulo interescaleno, formado entre o escaleno anterior e médio, e o espaço costoclavicular, formado entre a clavícula e primeira costela, enquanto a porção distal (axilar) compreende o espaço toraco-córaco-peitoral (espaço retropeitoral menor). Por dentro desses espaços restritos passam a artéria subclávia e o plexo braquial. A veia subclávia passa anteriormente ao triângulo interescaleno e pelo espaço costoclavicular1.

Problemas vasculares e neurológicos são frequentes por causa das compressões extrínsecas2. A veia subclávia pode sofrer trombose, e dilatações pós-estenóticas podem ocorrer na artéria subclávia, ambas complicadas por fenômenos tromboembólicos3. Os sintomas venosos são caracterizados principalmente por edema e cianose do membro superior afetado, e os arteriais, por isquemia de dedos e/ou claudicação.

Compressões nervosas são frequentes, mas são de diagnóstico mais difícil, porque os pacientes costumam apresentar sintomas de esfriamento e alterações de cor em razão dos estímulos simpatomiméticos decorrentes de compressão de fibras simpáticas que acompanham as raízes mais inferiores do plexo braquial (C7 e T1)1,4. Manifestam-se principalmente por parestesia, fraqueza e/ou dor não só do membro superior como também da região cervical1,4.

Quando conseguimos comprovar o comprometimento neural mediante exame específico, a Síndrome do Desfiladeiro Torácico é dita neurogênica (SDTn). Quando não conseguimos essa comprovação, diante de sintomas e sinais da síndrome neurogênica, ela é classificada como Síndrome do Desfiladeiro Torácico sintomática (SDTs). O exíguo espaço da saída torácica pode ficar ainda mais restrito com a presença de uma costela cervical e, nesse caso, os sintomas neurogênicos costumam prevalecer5.

A ressecção de costela cervical é feita tradicionalmente por meio de acesso supraclavicular ou axilar. Pode ser feita também por via paraescapular, embora esta seja mais utilizada em reoperações4. Embora tecnicamente atrativa e associada à menor invasividade e à segurança, apresentando ótimo resultado estético, a ressecção de primeira costela torácica por meio de cirurgia video-assistida transaxilar6 ou de cirurgia torácica vídeo-assistida (VATS)7 é pouco relatada na literatura, e nenhuma referência foi encontrada sobre ressecção de costela cervical anômala por esta última técnica (VATS).

Relato Dos Casos

Caso 1

Paciente do sexo feminino, 27 anos, branca, a qual exerce exclusivamente atividades do lar, há dois anos, começou a apresentar dor em região de ombro direito, em queimação e de média intensidade, desencadeada por esforço físico, que piorava com a movimentação e melhorava com o repouso. A dor irradiava para as regiões cervical, têmporo-mandibular, dorsal e para o membro superior ipsilateral. A paciente negava qualquer outro sintoma nos demais aparelhos, hipertensão arterial, diabetes e tabagismo. Teve tuberculose pulmonar na infância, tratada corretamente, e referiu arritmia cardíaca em uso de propranolol (40 mg/dia). Ao exame físico, apresentava sinais vitais normais, pressão arterial de 115×65 mmHg em ambos os membros superiores. Na palpação da fossa supraclavicular direita, havia uma protuberância endurecida com sopro local. Não apresentava alterações tróficas, de motricidade, sensibilidade nem alterações vasomotoras em região cervical e em membro superior direito. Todos os pulsos arteriais dos membros estavam presentes e simétricos. Os testes provocativos (Teste de Adson, Teste de Halsted ou costoclavicular, Teste de hiperabdução e Teste de Roos) para avaliar a integridade do pulso radial foram todos positivos para o membro superior direito. As radiografias de tórax e de região cervical (Figura 1) mostraram a presença de costela cervical completa (tipo I) à direita, e ao Doppler arterial observou-se redução da velocidade de pico sistólico das artérias subclávia e axilar direita, com presença de onda monofásica durante a realização das manobras de estresse.


A paciente foi diagnosticada como sendo portadora de Síndrome do Desfiladeiro Torácico arterial (SDTa) e submetida, por meio de videotoracoscopia com três pequenas incisões, à ressecção da primeira costela e da costela cervical. Pela história prévia de tuberculose, encontramos muitas aderências pleuropulmonares que tiveram que ser desfeitas, o que trouxe mais dificuldade ao procedimento.

A paciente recebeu alta no terceiro dia de pós-operatório. Em seguimento ambulatorial após um ano do procedimento (Figura 2), ela relatou melhora dos sintomas, o que lhe permitiu voltar a realizar suas atividades habituais sem o incômodo de dores ou limitações de movimentos no membro superior tratado.


Caso 2

Paciente do sexo feminino, 39 anos, branca, auxiliar de produção, há cinco anos começou a apresentar dor em região torácica, com irradiação para o braço direito, acompanhada de parestesia do braço, mas principalmente dos dedos e perda da força muscular da mão direita. Os sintomas pioraram progressivamente, sem melhora com tratamento fisioterápico. Negava outras patologias. Apresentava, ao exame físico, dor à palpação da região supraclavicular direita. Não apresentava alterações tróficas, mas foi constatada diminuição da força da mão direita em relação à esquerda, mesmo a paciente sendo destra. Os pulsos arteriais dos membros superiores estavam presentes e simétricos em repouso. Dois testes provocativos para o lado direito foram positivos, o Teste de Adson e o Teste de Roos (houve reprodução dos sintomas parestésicos e dolorosos com 30 segundos de teste). À radiografia de tórax, foi evidenciada a presença de uma costela cervical completa, confirmada pela tomografia computadorizada (tipo I) (Figura 3). O estudo por Doppler arterial revelou moderada compressão vascular costoclavicular bilateral, mais acentuada à direita. O estudo neurofisiológico sugeriu comprometimento do plexo braquial, no seu tronco inferior, por diminuição na velocidade de condução no nervo ulnar (<60 m/s). Com o diagnóstico de Síndrome do Desfiladeiro Torácico neurogênico (SDTn), a paciente foi submetida à videotoracoscopia direita, com três pequenas incisões, com ressecção da primeira costela, da costela cervical e de uma bleb pulmonar apical (achado intraoperatório). Recebeu alta hospitalar no segundo dia de pós-operatório em boas condições. Ao final do primeiro mês de pós-operatório, relatava melhora do quadro doloroso, mas permanecia com parestesia dos dedos. Após seis meses, apresentava-se sem dor, e a parestesia nos dedos ocorria somente quando realizava trabalhos domésticos. Após um ano e três meses, persiste com a parestesia do membro superior direito aos esforços, com melhora acentuada do quadro doloroso.


Descrição da técnica

Sob anestesia geral e intubação com sonda de duplo lúmen, as doentes foram posicionadas em decúbito lateral do lado oposto ao lado a ser operado, com o braço ipsilateral fletido anteriormente, a aproximadamente 90º com o tronco, sem qualquer grau de abdução (Figura 4).


Inicialmente, sob ventilação monopulmonar contralateral, foi realizada a primeira incisão de 1,0 cm, na linha axilar média, na altura do sétimo ou oitavo espaço intercostal, introduzindo-se por esta uma óptica de 10 mm 30º acoplado a um sistema de vídeo.

Foi realizada uma exploração inicial da cavidade pleural. No caso 1, encontramos aderências pleuropulmonares, sugestivas de processo inflamatório antigo, que tiveram que ser desfeitas; no caso 2, foi evidenciada uma bolha pulmonar apical, que ao final do procedimento foi ressecada com o uso de sutura mecânica endoscópica (Echelon 60, Ethicon Endo-Surgery®, Cincinnati, OH).

A primeira costela foi identificada, e posteriormente foram realizadas as duas outras incisões, uma anterior na altura do terceiro espaço intercostal, junto à borda lateral do músculo peitoral maior, e outra posterior, na altura do sexto espaço intercostal, junto à ponta inferior da escápula. Por meio dessas duas incisões, foram introduzidos os instrumentos específicos na cavidade pleural para a dissecção e ressecção óssea.

Os instrumentos utilizados foram: bisturi harmônico (Ethicon Endo-Surgery®, Cincinnati, OH), dissectores periostais do tipo Cobb, ressectores Kerrison e costótomo, todos eles para uso videotoracoscópico (Medtronic Sofamor Danek®, Nashville, TN) (Figura 5).


Após comprovação do colapso pulmonar, foi realizada a secção da pleura parietal sobre a segunda costela e dissecção da pleura parietal cranialmente até se atingir a face mediastinal com o uso do bisturi harmônico (gancho ou espátula). Essa dissecção levou consigo o coxim gorduroso apical, facilitando a identificação da cabeça da primeira costela e da raiz de T1.

Iniciamos a dissecção da primeira costela pela sua borda inferior, de forma extraperiostal, seccionando a musculatura intercostal; posteriormente, dissecamos a borda superior, tomando muito cuidado com sua porção mais medial, permitindo a passagem de um dissector Cobb angulado (ângulo reto) por trás da costela, exatamente por sob a artéria subclávia. Passamos então a dissecar a face externa da primeira costela, com manobras rombas. Nesse ponto, foi possível identificar a veia subclávia, o músculo escaleno anterior e a artéria subclávia.

Com a primeira costela dissecada (Figura 6A) e com o objetivo de facilitar a mobilização do arco costal, o seccionamos ao meio, exatamente no trajeto criado, por sob a artéria subclávia, mantendo o músculo escaleno anterior preso à porção anterior da costela. Foram utilizados para essa secção inicialmente um Kerrison e depois um costótomo endoscópico, o que criou um mecanismo de porta bang-bang. Isso feito, mobilizamos essa porção anterior criada e, assim, completamos a dissecção da face externa da costela. Seccionamos com o bisturi harmônico a junção costoesternal (sincondrose costoesternal), de forma que essa porção óssea ficou presa à parede torácica pelo ligamento costoclavicular, músculo subclávio e músculo escaleno anterior. Com uma tração firme, mas delicada, seccionamos no sentido anteroposterior inicialmente o ligamento costoclavicular e o músculo subclávio, liberando assim completamente a veia subclávia. Nesse ponto, foi possível identificar exatamente o músculo escaleno anterior, o qual tracionamos e seccionamos o mais distante possível do arco costal, permitindo uma escalenectomia anterior parcial. Por essa via de acesso, o nervo frênico fica fora do campo operatório, evitando-se uma eventual lesão. A porção anterior do arco foi retirada pela incisão anterior.


 





Passamos então à dissecção do segmento posterior do primeiro arco. Seccionamos a inserção da costela cervical na primeira costela, facilitando a dissecção desta última. Caminhamos na direção posterior, identificamos o músculo escaleno médio logo posterior ao plexo braquial e o seccionamos com o bisturi harmônico. Chegamos então à articulação costotransversa e costovertebral. Nesse ponto, os ligamentos que fixam a costela ao corpo vertebral e processo transverso foram seccionados com o bisturi harmônico e os dissectores de Cobb. Com isso, conseguimos obter a total mobilização dessa porção posterior da costela, que foi então desarticulada e também removida pela incisão anterior.

Após a retirada da primeira costela, foi possível identificar junto ao plexo braquial a ponta da costela cervical. Seguimos seu trajeto de forma delicada e paciente, evitando trações sobre as estruturas nervosas. Por ser um osso anormal, ou a costela cervical não contém todos os elementos de fixação à coluna ou eles são rudimentares e, portanto, facilmente seccionados. Assim, sua desarticulação foi conseguida de maneira relativamente simples. O cuidado nesse ponto da cirurgia destina-se ao plexo braquial, que mantém íntima relação com essa estrutura anômala (Figura 6B e 6C). O arco anômalo foi então retirado pela incisão anterior (Figura 6D). Após a ressecção dos dois arcos costais (Figura 7), lavou-se a cavidade pleural com soro fisiológico e foi feita uma hemostasia rigorosa, permitindo então o fechamento da cavidade torácica. Obtivemos a expansão pulmonar, o ar foi retirado da cavidade por uma fina sonda (14 French) e as incisões foram suturadas sem a necessidade de se manter um dreno torácico.


DISCUSSÃO

A costela cervical é uma costela anômala que tem origem no processo transverso de C7 ou uma primeira costela extranumerária que tem origem no processo transverso de T18. A incidência de ambas é de aproximadamente 0,76 e 0,74%, respectivamente, variando de 0,45 a 1,5% da população9. Do ponto de vista de tratamento, não há necessidade de se estabelecer uma diferença entre ambas. Em cerca de 70% dos casos, as costelas cervicais são incompletas, mas quase sempre apresentam fusão fibrosa com a primeira costela. Somente 10% dessa população apresentam sintomas relacionados à sua presença. São descritas quatro variedades de costela cervical, apresentadas na Tabela. De modo geral, quando presente, ela costuma dar origem a sintomas mais neurológicos que arteriais e mais frequentemente que costelas anômalas4. Em pacientes com SDT, é importante se fazer uma radiografia simples de coluna cérvico-torácica, a qual pode facilmente detectar a presença dessa anormalidade.

De modo geral, o tratamento inicial deve ser clínico, fazendo-se uso da fisioterapia8. Recentemente, alguns autores mostraram alívio temporário de sintomas com o uso de toxina botulínica (Botox) na musculatura escalênica, o qual poderia ser preditivo de igual sucesso em futura intervenção cirúrgica eventualmente necessária10.

A indicação de cirurgia deverá ser cogitada para pacientes cujos sintomas sejam resistentes ao tratamento clínico, comprometam a qualidade de vida ou alterem a condução nervosa provocando atrofias musculares ou dores crônicas1. As intervenções cirúrgicas disponíveis, por serem delicadas, trabalhosas, invasivas e deixarem cicatrizes aparentes, devem ser indicadas com parcimônia. As abordagens consensuais incluem escalenectomia, ressecção da costela cervical, acompanhada ou não de ressecção da primeira costela. As vias de abordagem convencionais são as vias transaxilar e supraclavicular11. A abordagem da costela cervical pelas vias infraclavicular e transaxilar são pouco usadas em razão da dificuldade de acesso à costela cervical3. De fato, não há evidências oriundas de estudos randomizados sobre a superioridade de algum tipo de tratamento na SDT2.

Não encontramos na literatura nenhum estudo prévio utilizando a VATS para a ressecção de costela cervical. Existem relatos de ressecções de primeira costela por meio dessa técnica tanto por via transtorácica6,12 como por via transaxilar7. Há também relatos de facilidade técnica na dissecção do plexo braquial em cadáveres por meio da VATS13. Ambas as pacientes tinham uma costela cervical responsável por sintomas importantes e pela limitação da qualidade de vida. A abordagem tradicional nesses casos seria a ressecção por via supraclavicular, pois a via transaxilar nos casos de costela cervical anômala é mais trabalhosa e apresenta maior risco de complicações. Com a experiência adquirida previamente por um dos cirurgiões (MCG) na ressecção de primeira costela por VATS em mais de 20 pacientes, optamos por essa via de acesso para ressecar também a costela cervical. Potenciais complicações dessa abordagem poderiam ser quilotórax14, parestesias15, lesões inadvertidas de plexo braquial, nervos ou vasos subclávios e pneumotórax persistente16. A potencial vantagem do método é, sem dúvida, a magnificação da imagem, permitindo assim identificar muito bem as estruturas normais e anômalas, tão frequentes nesta afecção, assim como a posição do braço, que permanece relaxado durante toda a operação, pois não há necessidade de tração, como nos casos de abordagem transaxilar.

Mediante somente dois casos não se pode tirar conclusões objetivas sobre a efetividade e a segurança do procedimento proposto. Entretanto, com o avanço técnico alcançado com a cirurgia vídeo-assistida em todo o mundo e também no Brasil, nas áreas que incluem gastroenterologia17, ginecologia18, urologia19, cirurgia vascular20 e cirurgia torácica21, pode-se estimar que haja uma potencial vantagem no uso da VATS para ressecção de costela cervical pela facilidade de acesso, menor invasividade e recuperação pós-operatória precoce.

Submetido em: 13.12.11.

Aceito em: 03.05.12

Conflito de interesse: nada a declarar

Fonte de financiamento: nenhuma

Contribuições dos autores

Concepção e desenho do estudo: MCG

Análise e interpretação dos dados: Não houve análise e interpretação de dados por se tratar de um artigo de inovação de técnica/relato de casos.

Coleta de dados: MCG, WBY, ENH, RAY, PCBB

Redação do artigo: MCG, WBY, ENH, RAY

Revisão crítica do texto: MCG, WBY, ENH, AJMC

Aprovação final do artigo: MCG, WBY, DCC, ENH, RAY, PCBB, AJMC

Análise estatística: Não houve análise estatística neste estudo.

Responsabilidade geral pelo estudo: MCG, DCC, AJMC

*Todos os autores leram e aprovaram a versão final submetida ao J Vasc Bras.

Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo, na Disciplina de Cirurgia Torácica, da Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho" (UNESP), Botucatu – São Paulo (SP), Brasil, e Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR) – Paraná (PR), Brasil.

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  • Correspondência

    Mario Claudio Ghefter
    Rua Pedro de Toledo 1800, 10
    º andar
    CEP 04039-901 – São Paulo (SP), Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Out 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2012

    Histórico

    • Recebido
      13 Dez 2011
    • Aceito
      03 Maio 2012
    Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular (SBACV) Rua Estela, 515, bloco E, conj. 21, Vila Mariana, CEP04011-002 - São Paulo, SP, Tel.: (11) 5084.3482 / 5084.2853 - Porto Alegre - RS - Brazil
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