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Editorial

Editorial

Este número inicia a publicação do terceiro volume de Scientiæ udia, agora em nova fase. Dada a acolhida favorável do público acadêmico no Brasil e face à repercussão da revista no meio acadêmico filosófico na Argentina, ela se transforma, a partir deste volume, em Revista Latino-Americana de Filosofia e História da Ciência, e passa a publicar textos de autores de língua espanhola. Scientiæ udia pretende contribuir desse modo para a maior integração universitária do Cone Sul, para a difusão do português entre a comunidade de fala espanhola e do espanhol entre a comunidade de fala portuguesa e para o aprofundamento da cooperação entre grupos de pesquisadores filosóficos e científicos da América Latina.

No artigo que abre o número, Charbel Niño El-Hani e João Queiroz apresentam o que pretendem ser uma prova da existência de propriedades, ditas comumente emergentes, que são intrinsecamente irredutíveis a propriedades físico-químicas. Trata-se, com efeito, de entender o sentido dessa irredutibilidade de propriedades, que pode ser tomada em duas direções, seja como não-analisabilidade, seja como não-dedutibilidade. Os autores mostram então que o modo de irredutibilidade que se mostra válido para as propriedades emergentes de sistemas biológicos é a de não-dedutibilidade das propriedades de sistemas complexos a partir de propriedades de sistemas vivos mais simples. Com isso, espera-se proporcionar uma contribuição decisiva para a discussão sobre as possibilidades e limitações do reducionismo e, conseqüentemente, sobre o lugar que se deve atribuir ao emergentismo nas ciências biológicas. No segundo artigo, Christián Carlos Carman inaugura a publicação de textos escritos em espanhol com sua tentativa de promover uma elucidação da expressão "realismo científico". A análise semântica então empreendida acaba presidindo a elaboração de uma curiosa taxonomia da posição filosófica realista, taxonomia na qual são especificadas 1111 possíveis posições realistas concernentes à ciência. Proposto para discussão, esse primeiro mapa pretende ser completado por uma síntese posterior que reduza a amplitude da caracterização das formas de realismo científico. No último artigo, Karla Chediak afasta-se da tese que explica os diferentes níveis de organização biológica com base na multiplicidade de níveis da unidade de seleção natural. A autora mostra existir uma conexão entre os conceitos de indivíduo (o processo de individuação) e de seleção natural (o processo pelo qual a natureza seleciona aqueles que se mantêm na existência por meio da sobrevivência e da reprodução), apresentando como índice dessa conexão conceitual a existência de características biológicas no processo de individuação, pelo qual o indivíduo se apresenta como a unidade de seleção natural; o que se mostra com razoável evidência, pois ao aumento da pressão da seleção natural sobre certo nível de organização biológica corresponde um aumento da individuação da organização biológica do nível concernido.

Scientiæ udia tem a satisfação de publicar como documento científico a Vênus física de Pierre-Louis Moreau de Maupertuis. Obra, sem dúvida, singular pelo estilo que amalgama literatura e ciência e ao qual se deve o grande sucesso que teve nos salões do século XVIII. Esse estilo de discursar literariamente, de expressão bem torneada e sentido afinado, sobre os assuntos científicos da reprodução e da geração dos animais e do homem, não separa as dimensões do prazer e da dor, da vida e da morte. Assim, ao mesmo tempo em que descobre sob o microscópio os vermes espermáticos, Maupertuis reflete sobre a condição humana, sobre a condição de fragilidade no nascimento do mais soberbo dos animais, num movimento do pensamento que retoma a encruzilhada de Pascal entre os dois infinitos. No ensaio que serve de introdução ao documento, Maurício de Carvalho Ramos põe em destaque e comenta os aspectos mais inovadores da obra, sobretudo aqueles associados à crítica de Maupertuis às teorias da geração mais aceitas na época. No amplo conjunto de notas que acompanha a tradução da Vênus física, o leitor encontrará informações históricas e biográficas dos principais autores utilizados como fontes, bem como referências e citações da maioria dos documentos originais aos quais Maupertuis recorreu na construção de sua teoria.

Pablo Rubén Mariconda

editor responsável

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Maio 2010
  • Data do Fascículo
    Mar 2005
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