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Editorial

Editorial

Esta edição de Scientiæ udia está, em sua maior parte, dedicada à obra de Albert Einstein, por ocasião dos 100 anos da publicação de seu trabalho fundador da teoria da relatividade especial e de seus trabalhos seminais para a teoria dos quanta. Mas o cientista consagrado gênio pelo século xx evoca também, de forma mais ampla, a nossa época e as formas pelas quais articula ciência e indústria para a realização de fins econômicos e políticos. Por isso, este número põe em pauta, 60 anos depois dos ataques nucleares a Hiroshima e Nagasaki, o tema da construção de armas nucleares, com o intuito de manter viva a consciência da tragédia à qual pode conduzir o poder desmesurado da atualização social das potencialidades de controle humano da natureza desveladas pela razão científica.

Os artigos estão todos dedicados à obra de Albert Einstein e ordenam-se cronologicamente. Alejandro Cassini e Leonardo Levinas começam em 1905, apresentando a reinterpretação do experimento de Michelson-Morley realizada pela teoria da relatividade especial de Einstein. Visam com ela marcar a importância do contexto científico, conceitual e teórico, para a interpretação de experimentos e resultados experimentais; mostram, em particular, como as interpretações de um experimento dependem de conceitualizações teóricas historicamente datadas e questionam que os experimentos possam ser tomados como "fatos permanentes" independentemente de toda teoria interpretativa. John Stachel, por sua vez, analisa o manuscrito de 1912, uma revisão de suas concepções relativísticas expressamente formuladas até então, defendendo a existência, no texto, de indicações claras sobre o desenvolvimento da teoria da relatividade especial (ou restrita); muito particularmente, mostra a importância do experimento de Fizeau para resolver a aparente incompatibilidade entre o princípio da constância da velocidade da luz e o princípio de relatividade. Finalmente, Michel Paty propõe que a investigação física de Einstein possui um estilo científico característico, que está claramente presente, desde o início, seja na direção da pesquisa quântica, seja na direção da pesquisa relativística. Esse estilo consiste em conduzir, paralelamente, uma abordagem heurística, baseada em um método probabilista, para o domínio quântico e uma abordagem fundamental, baseada em princípios físicos como o da invariância, para o domínio gravitacional e cosmológico. Como mostra Paty, o estilo científico de Einstein, que representa seu modo característico de fazer ciência, está profundamente enraizado em um entendimento peculiar da relação entre a teoria física e seu objeto e, em particular, em realçar as propriedades e aspectos físicos dos fenômenos considerados.

Os documentos científicos estão divididos em duas partes. Na primeira parte, publicamos um documento inédito e até aqui ignorado pelos biógrafos de Einstein: uma carta de Norbert Wiener a sua irmã, escrita em 1925 logo após seu encontro casual com Albert Einstein. Michel Paty e Olival Freire Júnior introduzem a esse retrato bastante vivo de Einstein, conduzindo-nos a uma viagem no tempo para produzir como que um flash do grande cientista em 1925. O leitor ficará maravilhado com a lucidez vaticinadora com que Wiener apresenta seu singular personagem. Na segunda parte, Scientiæ udia tem a satisfação de publicar três textos de Albert Einstein, compostos entre 1919 e 1926, que tratam respectivamente da distinção entre dedução e indução e seu uso na física, da relação entre a geometria e a experiência e, finalmente, da relação entre as geometrias não-euclidianas e a física. Michel Paty, em seu ensaio introdutório, situa esses textos no conjunto das reflexões de Einstein, mostrando como eles estão ligados a preocupações epistemológicas e de fundamentos decorrentes da formulação da teoria da relatividade geral (1916) e fazem parte do domínio da cosmologia.

Na nota crítica deste número, Ronaldo Rogério de Freitas Mourão descreve o esforço dispendido para a construção dos primeiros artefatos nucleares no contexto da Segunda Guerra Mundial e apresenta as razões para experimentar a nova arma particularmente por meio de um ataque ao Japão, considerando o trágico episódio como um dos marcos balizadores do início da Guerra Fria. A nota crítica é completada por um Apêndice que fornece uma cronologia dos principais fatos políticos e científicos ligados ao desenvolvimento de armas nucleares.

Encerra este número de Scientiæ udia um conjunto de cinco resenhas voltadas para um exame das mais importantes publicações comemorativas em português dos 100 anos dos feitos de Einstein. Assim, Olival Freire Júnior analisa o efeito da cultura globalizada sobre a divulgação científica praticada pela Scientific American Brasil. Samuel Simon se estende na exposição sumariada dos artigos que compõem o número comemorativo sobre Einstein da revista Ciência e Ambiente. Edelcio Gonçalves de Souza comenta a "edição prospectiva" da Scientific American Brasil, discutindo a apresentação dos desenvolvimentos matemáticos e cosmológicos recentes propiciados pelas concepções einstenianas das dimensões espaço-temporais, bem como os estudos com vistas à formulação de uma teoria unificada. Irinéa de Loudes Baptista, debruçando-se sobre o número especial da Revista Brasileira de Ensino de Física, discute a questão do uso para o ensino de ciências dos textos originais de cientistas como Einstein, para ressaltar a necessidade de mobilizar recursos interdisciplinares da filosofia, da história e da própria ciência considerada na contextualização dos textos científicos originais. Encerra o conjunto a notícia bibliográfica de Valter Alnis Bezerra com uma apresentação sucinta e organizada do que existe de relevante na Internet sobre Einstein, de modo que o leitor pode usá-la como guia para o acesso rápido e a obtenção segura de material bibliográfico do próprio Einstein e de alguns de seus principais intérpretes.

Pablo Rubén Mariconda

editor responsável

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Maio 2010
  • Data do Fascículo
    Dez 2005
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